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A CIÊNCIA A PARTIR DO OLHAR KANTIANO

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Academic year: 2021

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A CIÊNCIA A PARTIR DO OLHAR

KANTIANO

Robson Pedro Véras∗ robson.veras@yahoo.com.br

Recebido em: 15/08/2014 Aceito em: 25/08/2014 Publicado: 30/08/2014

Resumo. Este trabalho visa mostrar a forma em que o filósofo Kant percebe o conceito de ciência e interage com ele na escrita da Crítica da Razão Pura, por essa razão, é necessário recorrermos a textos do período pré-crítico onde poderemos perceber como foi construído o conceito de ciência em Kant a partir daquilo que ele vivia no século XVIII. Assim, esse texto possui seis alíneas descritivas, quais sejam: a primeira norteia o leitor a entender o ponto de onde partimos e o caminho a ser percorrido, seguido pela descrição do problema que envolve a ciência em suas nuances. A terceira alínea descreve a formação Kantiana, em sua historicidade, desde o que se estudava na Alemanha, seguido pela forma em que Kant apresenta o conceito de ciência como condição de possibilidade e a última aponta uma possibilidade de reflexão à luz daquilo que Kant entende sobre ciência.

Palavras-chaves: Ciência. Mecânica. Espaço. Tempo. Juízos Sintéticos.

SCIENCE TO LOOK FROM KANTIAN

Abstract. This work aims to show the way in which the philosopher Kant realizes the concept of science and interacts with him in writing of the Critique of Pure Reason, therefore, it is necessary to resort to texts of the pre-critical period where we can see how it was constructed concept science in Kant from what he lived in the eighteenth century. Thus, this text has six descriptive paragraphs, namely: the first guides the reader to understand the point of where we started and the way to go, followed by the description of the

Doutorando em Filosofia na PUC-SP. Mestre em Ciências da Religião pela PUC Goiás.

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problem involves the science in its nuances. The third paragraph describes the Kantian training in its historicity, from what they studied in Germany, followed by the way in which Kant introduced the concept of science as a condition of possibility and the last points to a possibility of reflection in the light of what Kant understands about science.

Keywords: Science. Mechanics. Space. Time. Synthetic judgments.

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Introdução

Para a construção e desenvolvimento de qualquer pressuposto alimentado pelo pensamento do filósofo Kant (1724-1804), se faz necessário que o leitor tenha alguma pressuposição filosófica. Como esse texto é uma construção transversal ao cenário da filosofia, ou seja, o público ao qual esse texto dialoga são de pesquisa-dores oriundos de uma formação filosófica e para as ciências que se dispõem em debater o cenário da razão, isso, não em sua ordem de importância, tão pouco por seus predicados. Assim, para que essa construção tenha significado, apresentarei, pontualmente, o que temos entendido sobre a ciência iluminada pelo conceito histórico, base epistemológica [grund] de formação do filosofo Kant, com cume no prefácio da segunda edição (1787) da Crítica da Razão Pura, a colocar a ciência no cerne do debate do racionalismo de Kant.

Por assim dizer, tentarei caminhar por uma lógica que buscará fazer com que o leitor entenda como Kant percebeu a ciência e como, a partir disso, ele considerou a escrita da Critica da Razão Pura. Dessa forma, os elementos textuais que seguem, possuem bases epistemológicas, quais sejam: a ciência em sua cons-tituição na Alemanha do século XVIII e antes disso, e a base de formação desse período, a Mecânica de Descartes até a Newtoniana.

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O problema da ciência

Para a descrição acerca das problemáticas que envolvem o conceito de ciência em sua relação histórica, é necessário que se faça certa análise na conjuntura que envolveu Kant em sua formação mais sublime. Isso para que não sejamos conduzidos à realização de analíticas precipitadas e recorrentes dos conceitos contemporâneos que emergem sob o olhar daqueles que possuem uma leitura mínima acerca da história da filosofia que envolve a vida e obra de Kant.

Por assim dizer, é possível que exista, historicamente, uma enorme falha na interpretação dos textos do período dado pelos séculos XIII à XIX. É claro, estamos no século XXI e toda a nossa carga hermenêutica se dispõe acerca de nossa sociedade, de como ela se estabelece em sua estrutura. Por isso, diante dos textos do período descrito, somos, aparentemente, apressados ou ingênuos em darmos o significado contemporâneo aos termos consolidados pela Idade Média e períodos seguintes.

Assim, é possível que sejam feitas leituras apressadas acerca de vários temas. O filósofo Kant talvez tenha sido ao longo dos anos, o que mais vezes foi injustiçado. Kant em todo o seu conjunto de obras, principalmente em seu período

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Crítico, foi um filósofo que buscou conciliar a razão, a ética e algumas variações que permitiriam ao ser humano o gozo de certa liberdade.

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A ciência e sua formação histórica: a visão primeira de Kant

Kant foi um filósofo preocupado com sua conduta filosófica, por isso mesmo, deve-se, antes da tessitura de quaisquer condições de possibilidade, trazê-lo ao período intitulado como pré-crítico.1

É desse modo que para quem se disponha a fazer uma leitura pare passo de toda a Crítica da Razão Pura, não obterá êxito em encontrar quaisquer subterfúgios que demonstre qual o conceito de ciência admitido por Kant. Kant não reserva nenhum fragmento nessa obra para a descrição do que ele entende sobre ciência. Por assim dizer, o bojo dessa informação está contido em suas obras anteriores ao ano de 1781. O conceito de ciência de Kant parte de uma junção histórica ao qual é submetida à Alemanha e desenvolvida criticamente pelo filósofo de Königsberg.

Dessa forma, é no transcurso do período de 1747 a 1781 que Kant emprega em suas obras lampejos da forma em que entende o conceito de ciência, sobretudo, no texto de 1747 – Pensamentos sobre o verdadeiro valor das forças vivas. É nessa obra que Kant apresenta seu conceito sobre ciência e a partir dela considera este conceito como algo já entendido e assimilado por seus leitores.

Ainda para o período acima descrito, a base do entendimento de como se estrutura o conhecimento científico foi sendo constituída gradualmente. Basta saber que um conceito em si possui uma base epistemológica muito vasta, tendo seu cume em determinado período. Por assim dizer, o conceito de ciência admitido por Kant, e considerado na Crítica da Razão Pura, se apresenta como fruto do trabalho de muitos pensadores, dentre eles Platão (428-347 a.C.), Aristóteles (348-322 a.C.), Descartes (1596-1650), Leibniz (1646-1716), Newton (1642-1727) , Wolff (1679-1754) e outros. Dos nomes acima descritos, para esse momento, cabe uma ênfase sobre os pensadores Descartes, Leibniz e Newton.

Descartes foi o pensador que teceu o pano de fundo para o desenvolvi-mento de toda a vastidão científica dos séculos XVII e XVIII. Esse pano de fundo ficou sendo conhecido como mecanicismo. O mundo estava construído e mantido por meio de processos mecânicos nas vias dos movimentos dos corpos (DESCAR-TES, 1968). Dessa forma, o mundo em suas relações físicas possuía certa escassez acerca de propriedades dos próprios corpos, tais como: tamanho, quantidade de elementos que formam o todo e as partes, extensão, profundidade e outras. Nessa descrição é possível identificar a diferenciar a proposta científico-físico de Descartes daquilo que propôs, por exemplo, Leibniz. A proposta de Leibniz não permitia a visão do corpo e do outro, sobretudo, por ser Leibniz oriundo de uma filosofia que prima pelo individual. Assim, a diferenciação entre a proposta de Descartes e Leibniz estaria na contextualização de um processo mecanicista de percepção das coisas-em-si.

1 Período assim denominado por ser um momento de reflexão filosófica e anterior a escrita de

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Mesmo assim, o que parece interessante da relação entre Descartes e Leib-niz, em sua conjuntura, não parece ser aquilo que os distância, pelo contrário, as intersecções de seus pensamentos foram suficientemente interessantes para que chamassem atenção de Kant.

Para ilustrar a descrição acima, cabe observarmos o seguinte fragmento:

As físicas de Descartes e de Leibniz diferem em várias “questões” fundamentais. Entretanto, importa observar que no marco destas diferenças, elas têm quatro pontos em comum: [. . . ] 1. Descartes e Leibniz (e todos os racionalistas em geral) compartilham uma ideia de ciência que tem suas raízes na Antiguidade Clássica, se-gundo a qual a ciência é conhecimento universal e necessário [. . . ] 2. Em segundo lugar tanto Descartes como Leibniz trabalham naquele projeto, comum à ciência moderna, de matematizar o universo. 3. [. . . ] ambos vinculam estreitamente suas físicas com suas metafísicas [. . . ] 4. [. . . ] tanto Descartes como Leibniz funda-mentam suas físicas em suas metafísicas [. . . ]. (PORTA, 2002, p. 108-109).

A prerrogativa de ciência, como conhecimento universal e necessário, fez com que Leibniz se apresente como alguém que estaria radicalizando a dimensão do pensamento de Descartes. Basta saber que Leibniz, em seu caráter individual (mônada), não permitiria que a razão dependesse do pensamento de alguém, isso porque ainda Deus teria condição de pensar racionalmente. A questão em si, que envolve tanto Descartes como Leibniz, se desenvolve à luz do entendimento sobre o que é cabido ao mundo físico, ao metafísico e ao mundo natural. Essa questão Kant irá tratar e fazer severa distinção em sua primeira obra, descrevendo acerca das Forças Vivas. Ainda assim, no caso de uma essência modificada, esta pode se tornar outra coisa que não à essência em sua gênese. Mesmo assim, a querela entre Descartes e Leibniz tem seu capítulo crucial na definição (ou indefinição) acerca do conceito de força (ARANA, 1982, p. 42).

Com isso, é possível afirmar que Descartes lança ao mundo por muitos séculos uma infinidade de possibilidades de mensurar o aspecto mecânico dos cor-pos, possibilitando, para isso, uma analítica vasta sobre as propriedades materiais das formas.

A questão sobre a mecânica de Descartes é abraçada e implementada por Isaac Newton. É Newton que dá ao conceito mecânico de Descartes certo caráter complementar. Ora, ele incrementou alguns princípios teóricos de caráter quantitativos, sobretudo, partindo de uma analítica precisa acerca dos fenômenos, o que possibilitaria uma explicação acerca da multiplicidade dos fenômenos físicos por meio de pressuposições, como, por exemplo, as noções de espaço e tempo.

Para que possamos continuar na descrição do avanço do pensamento acerca do conceito de Ciência até o apoderamento kantiano dessa temática, se faz necessário recorremos ao seguinte recorte:

O próprio Newton, certa vez, assinalou que, “se eu vi mais adi-ante [do que os outros homens], foi porque me ergui por sobre

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os ombros de gigantes”. Realmente, é verdade que seus precurso-res, especialmente homens como Galileu, Descartes, Boyle, foram gigantes – eles prepararam o caminho para a mais estupenda rea-lização pessoal da mente humana – , mas o que Newton viu mais além foi, com certeza, meramente decorrência da oportunidade de sua posição. Para inventar o instrumento necessário, e, com sua ajuda, reduzir os maiores fenômenos de todo o universo da matéria a uma simples lei matemática, ele valeu-se de sua capa-cidade natural para absorver em alto grau todas as qualidades essenciais à mente científica – proeminentemente da imaginação matemática –, a qual, provavelmente nunca foi igualada. (BURTT, 1991, p. 167).

A descrição de Burtt nos ajuda no entendimento de algumas características importantes, principalmente, a de ressignificação de alguns conceitos outrora con-solidados por Descartes e agora redimensionados por Newton. Por isso mesmo, hermeneuticamente, nos limitaremos na descrição de alguns conceitos, quais se-jam: O conceito newtoniano vai além da distinção (substância) entre alma (cogito) e corpo (extensão) proposto por Descartes, podendo, inclusive, haver a possibili-dade de redução da física a geometria. Newton estabelece a ideia de que o corpo pode não ser mera extensão, a física seria uma espécie de legitimadora daquilo que efetivamente é real. Dessa forma, a visão de Newton geraria certo imbróglio desde a concepção de ciência até a condição da metafísica proposta por Descartes e mais ainda (diante da influência na Alemanha) a proposta por Leibniz.

O gigante (Newton), então, consegue uma visão além de uma eventual percepção natural daquilo que apresentava Descartes como, por exemplo, tendo a existência de Deus e da alma como centro da percepção metafísica.

Ainda para essa descrição é importante que se entenda que o mundo de onde Kant surge como filósofo está numa questão crucial na descrição do conceito de ciência e de algo que, de certa forma, justifique uma proposição metafísica.

Kant é contemporâneo a todas essas questões descritas até aqui. Seus olhos enquanto jovem se dispõe na observação da mecânica de Descartes até Newton, da metafísica de Leibniz e Wolff (nas vias do uso de manuais recorrentes após a morte de Leibniz) e na prerrogativa de que o problema da ciência poderiam ser as leis e suas relações com fenômenos.

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A visão de Kant diante da conjuntura da ciência na Alemanha do

século XVIII

Para que possamos propor uma construção acerca da concepção de Kant sobre a ciência, foi necessário uma retomada inicial de todo processo que envolveu o Kant historicamente. Isso foi feito para que fosse efetivamente mostrado aquilo que o filósofo alemão recebia em sua escola, nas conversas com seus amigos e, sobretudo, naquilo que Kant se ocupava em pensar. Ora, diante do que foi erguido até aqui, cabe sugerir que estamos (século XVIII) diante de uma transição acerca do conceito de ciência: em uma face um conhecimento oriundo desde Platão denominado ciência clássica, noutra face tem-se um aspecto já evoluído das

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ciências clássicas à luz de Platão, nesse caso, por Descartes, chamada de ciência mecânica e, ainda, numa terceira face, a mecânica Newtoniana. Nesse mesmo instante, paralelo a esses conceitos, Kant ainda se ocupava na tentativa de dar para a metafísica um cenário justo. No caso da metafísica Kant chega a responder em 1791 a pergunta da Academia Real de Ciências de Berlim sobre quais seriam os verdadeiros progressos que a metafísica realizou na Alemanha, desde os tempos de Leibniz e Wolff (KANT, 1985).

Por assim dizer, é possível que Kant estivesse numa amalgama de conceitos. A ciência e a metafísica caminhariam, até a intervenção kantiana, juntas. As teorias sobre espaço absoluto, tempo absoluto e causalidade eram vistos por Descartes e Leibniz como partículas de uma metafísica, enquanto, do ponto de vista da mecânica newtoniana, eram pressupostos universais. O que Kant faz é se posicionar diante as todas essas querelas, consagrando assim o conceito sobre ciência contido em suas obras, sobretudo, na Critica da Razão Pura.

Dessa forma, para que possamos analisar como Kant separa o conheci-mento da ciência da metafísica, recorramos inicialmente ao fragconheci-mento:

O mundo intelectual alemão – relativamente isolado – prote-gido do fluxo oriundo da Inglaterra e da prosperidade vinda da França e da Holanda. Não era normal que um pesquisador de temas acerca da física renunciasse a qualquer um dos métodos originais de solução de problemas. Por isso, não devemos estra-nhar encontrarmos na obra sobre as Força Vivas uma condição de possibilidade nos campos no nível de termos um conceito sólido para nossos tempos, acostumado e conformado com que a física [ciência] e a metafísica estão irrevogavelmente separados. Em suma, o que acontece é que não havia um abismo intransponível entre a forma como ele é gerado e do espírito de leitores, desde o triunfo da concepção crítica, se aproximou dela, e talvez esta seja a razão que foi esquecida. (ARANA, 1982, p. 41).2

Esse recorte indica que Kant, em sua primeira tese (1747), já deixa claro o que entende por ciência e qual o caminho ele, a partir disso, toma em suas obras. Assim, Kant assume a busca por uma nova forma de percepção da física dentro de uma conotação meramente epistemológica. A Alemanha permite a Kant que ele imagine de forma ontológica sobre as demandas específicas da relação entre o mundo e principalmente se exponha claramente sobre o que é e como é a ciência na base newtoniana.

Assim, para a descrição Kantiana a ciência teria sua base na mecânica newtoniana, onde o filosofo de Königsberg tenta provar, por meio da física, a universalidade e necessidade de todas as coisas. É prudente retomarmos que a descrição dessa possibilidade de ciência é mantida por meio de pressuposições: espaço e tempo absoluto e o princípio de causalidade.

Desse modo, Kant ao tentar provar a universalidade e necessidade dos pressupostos de Newton, recorre sempre a sua base ontológica, ou seja, ao ele-mento cartesiano fator que nem mesmo Descartes ou Leibniz realizavam. Aliás, o

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elemento de fundamentação da física se mostra como fator de diferenciação entre Kant, Descartes e Leibniz.

Ainda na tentativa de aclarar ainda mais a relação entre Kant e a ciência, a partir da física Newtoniana, se faz necessário à observação da seguinte descrição:

[. . . ] Eu reduzo a nada esta dificuldade demonstrando claramente que por entre todas as pesquisas que podem ser empreendidas na ciência da natureza é precisamente nesta última que se pode mais facilmente e mais certamente atingir a origem [...] Da mesma forma que dentre todas as tarefas da ciência da natureza, ne-nhuma foi resolvida com maior exatidão e certeza que a da ver-dadeira constituição do universo no seu conjunto das leis do movimento e do mecanismo interno das revoluções de todos os planetas. Na medida em que a filosofia newtoniana pode propor-cionar perspectivas tais que se não encontram em qualquer outra parte da filosofia; do mesmo modo afirmo que por entre todas as coisas da natureza das quais se procura a causa primeira a origem do sistema do mundo e dos corpos celestes assim como as causas dos seus movimentos são aquilo que se pode esperar entrever em primeiro lugar com profundidade e com certeza. (KANT, 1984, p. 72-73).3

Assim, a ciência para Kant está intimamente relacionada com a disposição da mecânica newtoniana, pressupondo as noções de espaço e tempo absoluto e causalidade. Mesmo assim, se faz necessário dizer que Kant interpreta a mecânica newtoniana à luz da ciência clássica, o que permite a ele um trânsito efetivo pela geometria euclidiana. Por meio da descrição acima, compete ainda dizer que a mecânica newtoniana possui certo âmbito fenomênico, dito de outra forma, certo empirismo em busca de uma construção científica específica.

Atingir a origem de todas as coisas, de forma racional poderia ter sido um dos caminhos que Kant optou demonstrar a partir da leitura da mecânica newtoniana, se aproximando dela e a assumindo como condição de possibilidade para uma analítica. É percebido, então, que Newton possibilitou uma redução das dificuldades fenomenológicas de percepção do mundo a partir de sua origem, dito de outra forma, a ciência da natureza pode ser um mecanismo de resposta aos princípios existências de todas as coisas.

A possibilidade de ter na ciência natural (mecânica de Newton) um aporte que demonstre as relações de movimento, espaço, tempo e causalidade só é possí-vel (diferentemente da forma percebida por Descartes) por meio de pressupostos. Essas perspectivas, então, seriam únicas, aparentemente, em todas as demonstra-ções da história da filosofia até então.

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A forma em que Kant descreve a ciência no Prefácio da segunda

edição da Crica da Razão Pura

Antes de traçarmos quaisquer descrições sobre a forma em que Kant des-creve a ciência, isso no decorrer da Crítica da Razão Pura (1781), se faz necessário que seja reiterado o fato de que todo o conceito de ciência, dessa obra, é tido e descrito enquanto pressuposto da razão.

Em 1781, Kant, possivelmente, estaria preocupado com questões que esta-riam além do conceito de ciência, como por exemplo, responder a pergunta sobre a possibilidade de existência de juízos sintéticos a priori.

Nesse sentido, Kant admite o conceito de ciência no campo da pressuposi-ção, ou seja, o filósofo ao descrever a resposta na Crítica da Razão Pura acerca dos juízos sintéticos a priori,4parte da ideia de que seu leitor já admite, assim como ele, a ciência como algo universal e necessário a partir da mecânica newtoniana. Desse modo, cabe reiterar que Kant já tinha seu conceito de ciência definido no ano de 1755. A escrita da Crítica da Razão Pura vem consolidar esse conceito.

Assim, no decorrer do prefácio da segunda edição da referida obra, Kant vai fazer certa descrição do status que a ciência assume. Para apresentarmos essa descrição elegemos fragmentos da obra, a seguir:

Só o resultado permite imediatamente julgar se a elaboração dos conhecimentos pertencentes aos domínios próprios da razão se-gue ou não a via segura da ciência. Se, após largos preparativos e prévias disposições, se cai em dificuldades ao chegar à meta, ou se, para a atingir, se volta atrás com frequência, tentando outros caminhos, ou ainda se não é possível alcançar unanimidade entre os diversos colaboradores, quanto ao modo como deverá prosse-guir o trabalho comum, então poderemos ter a certeza que esse estudo está longe ainda de ter seguido a via segura da ciência. É apenas mero tateio, sendo já grande o mérito da razão em ter descoberto, de qualquer modo, esse caminho, mesmo à custa de renunciar a muito do que continha a finalidade proposta de início irrefletidamente. (KANT, 2010, p. 41).

Essa descrição tem por objetivo mostrar a proximidade entre o conceito de ciência, implícito no texto, e o desenvolvimento empírico assumido por Kant no decorrer de sua obra. Esses fatores fazem como que Kant, de certa forma, tenha suas ações mediadas por certa alteridade na busca pela interpretação do mundo à luz da mecânica de Newton.

Assim, cabe demonstrar a existência de certo determinismo na alusão kan-tiana sobre a ciência. Verifica-se certa perseguição pelo melhor caminho que possa conduzir a um resultado, a uma forma que determine certa legislação de caráter universal. Nesse aspecto, a possibilidade de ciência como agente de observação dos fenômenos do universo, em sua estrutura mecânica, pode sistematizar na

4 Perguntar “’como são possíveis juízos sintéticos a priori?’ É perguntar como são possíveis

juízos sintéticos que, enquanto a priori são necessários, ainda que, enquanto sintéticos, não são logicamente necessários.“ (PORTA, 2002, p. 115)

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escrita da Crítica da Razão Pura uma analítica da razão, dito de outra forma, uma teoria do conhecimento. A apresentação dessa analítica é vista de forma clara em toda a descrição da Critica da Razão Pura.

A demonstração do segundo prefácio da obra em epígrafe vem, além de definir a forma de condução da ciência em função do objetivo maior de Kant,5 apresentar a singularidade científica e seu contexto na busca da razão. Dessa forma, Kant apresenta ainda a possibilidade de ação a priori da razão por meio da matemática e da física, o que reitera aquilo já demonstrado acerca da possibilidade de transformação da física em conceitos matemáticos. Nas palavras do filósofo: ”A matemática e a física são os dois conhecimentos teóricos da razão que devem determinar a priori o seu objeto, a primeira de uma maneira totalmente pura e a segunda, pelo menos, parcialmente pura.“ (KANT, 2010, p. 42).

Dessa forma, o caminho que Kant opta é, aparentemente, o de trazer a ciência para o campo da razão, não dando continuidade ao processo metafísico que culmine no campo dogmático, conforme a descrição de outros filósofos lidos ou contemporâneos a Kant.

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Notas conclusivas

Conforme apresentamos em todo o texto, a proposta de Kant de concepção de ciência é plenamente ligada à proposta newtoniana da mecânica. Pensar a ciência, então, é redescobrir o caráter mecânico e imanente em que as relações entre os conceitos da razão se estabelecem.

O pensamento sobre a ciência, na proposta kantiana, descreve a sua pers-pectiva histórica. Por assim dizer, a estrutura textual apresentada teve por objetivo mostrar como o conceito de ciência de Kant foi construído e como esse conceito dialogou na descrição da Critica da Razão Pura.

Diante disso, cabe dizer que Kant foi um filósofo capaz de dialogar com vá-rios conceitos, várias formas de pensamento e capaz de construir uma identidade filosófica. Mesmo assim, a analítica kantiana é desenvolvida de forma a sustentar a existência de seres humanos regidos sobre a forma natural de ação.

Nesse aspecto, o conhecimento científico pode fazer com que os seres humanos sejam conduzidos, naturalmente, pelo aspecto mais sublime da razão, nesse caso, a priori, ou quiçá, por algum outro tipo de razão.

Neste contexto, os conceitos que envolvem a ciência são, em geral, pres-suposições para construção da experiência racional. Nesse sentido, a construção do pensamento devera ocorrer com certo pragmatismo, às descrições poderão ocorrer sob uma lógica em que os indivíduos teriam suas ações pontuadas por uma espécie de ”doutrina da razão.“

5 Partir da ciência como algo universal e necessário a partir da mecânica newtoniana e responder

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Referências

ARANA, J. Ciencia y metafísica en el Kant pré-crítico (1746-1764). Sevilla: Universidad de Sevilla, 1982.

BURTT, E. A. As bases metafísicas da ciência moderna. Tradução de José Viegas Filho e Orlando Araújo Henrique. Brasília: UNB, 1991.

DESCARTES, R. Traité de la mechanique. Paris: Charles Angot, 1968.

KANT, I. Histoire Générale de la Nature et Théorie du Ciel. Paris: Librairie Philosophique J. Vrin, 1984.

. Os progressos da metafísica. Lisboa: Edições 70, 1985.

. Critica da razão pura. Tradução de Manuela Pinto dos Santos e Alexandre Fradique Morujão. 7. ed. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 2010.

Referências

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