• Nenhum resultado encontrado

O PRINCÍPIO DA NÃO-DISCRIMINAÇÃO A PARTIR DA PERSPECTIVA DOS SOCIOEDUCADORES DO CENTRO DE ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO DE SANTA MARIA 1

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "O PRINCÍPIO DA NÃO-DISCRIMINAÇÃO A PARTIR DA PERSPECTIVA DOS SOCIOEDUCADORES DO CENTRO DE ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO DE SANTA MARIA 1"

Copied!
7
0
0

Texto

(1)

O PRINCÍPIO DA NÃO-DISCRIMINAÇÃO A PARTIR DA PERSPECTIVA DOS

SOCIOEDUCADORES DO CENTRO DE ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO DE

SANTA MARIA

1

FERRÃO, Iara da Silva

2

; ZAPPE, Jana Gonçalves

3

; SANTOS, Cristiane Rosa

dos

4

.

1 Trabalho de Pesquisa – Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)/Faculdade Integrada de

Santa Maria (FISMA) 2

Faculdade Integrada de Santa Maria (FISMA) 3

Faculdade Integrada de Santa Maria (FISMA)

4 Programa de Pós – Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)

E-mail: iaraferrao@hotmail.com; janazappe@hotmail.com; cristianerosapsi@hotmail.com

RESUMO

Este estudo propõe investigar em que medida tem sido possível respeitar o princípio da não-discriminação e não-estigmatização na prática da execução da medida de internação a partir do olhar dos socioeducadores. Realizamos uma pesquisa com delineamento quali-quantitativo, de modo que a coleta de dados foi feita através de um questionário a partir do qual investigamos o olhar dos socioeducadores a respeito da aplicação do princípio da não-discriminação e não-estigmatização. Os resultados mostraram que uma parcela de 67.6% dos socioeducadores acredita que a instituição sempre observa procedimentos para que o adolescente interno não sofra discriminação e

estigmatização. Em conclusão, salienta-se a necessidade de assegurar a “condição de sujeitos de

direito”, pois apenas assim é possível garantir um lugar a estes adolescentes que não apenas o lugar estigmatizado, de infrator e/ou abandonado, possibilitando um processo ressocializador.

Palavras-chave: Adolescente; Conflito com a lei; Discriminação; Estigmatização; Instituição.

1. INTRODUÇÃO

A associação entre juventude e violência tem sido bastante evidenciada na atualidade, especialmente nos meios de comunicação. Neste contexto, os adolescentes são vistos principalmente como autores de violência, embora na realidade eles sejam suas principais vítimas. Oliveira (2001) demonstra que, no Rio Grande do Sul, há um número

(2)

consideravelmente maior de crianças e adolescentes vítimas de violência do que jovens autores de atos infracionais.

Outros dados que corroboram esta idéia foram apresentados por Waiselfisz (2004), que demonstram que a mortalidade juvenil é bastante superior ao total da população: a morte por causas externas (acidentes de trânsito, homicídios e suicídios) na população jovem é de 72%, e destas 39,9% referem-se a homicídios praticados contra jovens. Já em relação à população não jovem, a taxa de óbitos por causas externas é de apenas 9,8%, e destes os homicídios representam 3,3%.

Ainda que a vitimização seja estatisticamente mais significativa, entende-se que os casos de adolescentes que se tornam autores de violência não diferem dos casos de adolescentes vítimas, à medida que se encontram sujeitos às mesmas situações de risco e vulnerabilidades. Uma particularidade dos casos de adolescentes autores de violência é o fato de que ainda não contamos com propostas realmente efetivas e eficazes para enfrentar este problema. As dificuldades do sistema sócio-educativo são numerosas e têm sido apontadas em estudos de diferentes áreas, como direito, psicologia, educação, etc. (BRASIL, 2006b; OLIVEIRA, 2001; SOARES, 2000; VOLPI, 1997). Neste sentido, trata-se de um tema de grande relevância.

O presente estudo foi construído para investigar sobre a execução da medida sócio-educativa de internação, que se constitui como um recorte do sistema sócio-educativo, o qual designa o conjunto de todas as medidas privativas de liberdade (internação e semiliberdade) até as não privativas de liberdade (liberdade assistida e prestação de serviço à comunidade) e ainda a internação provisória (BRASIL, 2006a).

Entendendo a adolescência como um momento do desenvolvimento caracterizado por turbulências tanto físicas quanto psíquicas (MARIN, 2009), o processo socioeducativo deve considerar que o adolescente encontra-se num momento de crise, em que se supõe a possibilidade de crescimento. Assim, trata-se de um momento favorável ao estímulo à crítica do ato infracional em todos os seus aspectos: sociais, históricos, jurídicos, políticos, culturais, abrindo-se a perspectiva de uma nova consciência no adolescente e despertando a possibilidade de ressignificação de sua história. O exercício desta liberdade coloca-se como um pressuposto da cidadania (OLIVEIRA, 2003).

Desta forma, a medida sócio-educativa deve ser planejada no sentido de oferecer novas oportunidades de desenvolvimento pessoal e social, visando à superação das dificuldades que levaram o jovem à prática do ato infracional (COSTA, 2006; VOLPI, 1997). Neste sentido, deve evitar todo procedimento que favoreça a discriminação e a

(3)

estigmatização dos jovens, devendo utilizar denominações adequadas, tanto para se referir aos jovens quanto à instituição. Nosso trabalho pretende contribuir com esta questão ao discutir em que medida tem sido possível na prática da execução da medida de internação, respeitar o princípio da não-discriminação e não-estigmatização, a partir do olhar dos socioeducadores.

2. DESENVOLVIMENTO

A pesquisa realizada seguiu um delineamento quali-quantitativo, pois utilizamos tanto dados objetivos e quantificáveis quanto dados subjetivos de natureza qualitativa. Ela foi desenvolvida em uma das Unidades de internação da FASE-RS, o Centro de Atendimento Socioeducativo Regional de Santa Maria (CASE-SM), instituição responsável pela execução da medida socioeducativa de internação na região central do Estado. O objetivo geral da pesquisa foi investigar o quanto a Doutrina da Proteção Integral está inserida no trabalho socioeducativo a partir da concepção dos trabalhadores desta Unidade.

Para realizar a coleta de dados, elaboramos um questionário a partir da caracterização das medidas sócio-educativas conforme sistematizada por Volpi (1997), visando obter respostas objetivas e também respostas descritivas. Participaram da pesquisa 37 funcionários da Instituição. Este trabalho apresenta os resultados relacionados aos princípios da não-discriminação e não-estigmatização, uma das características a serem observadas no que diz respeito às medidas socioeducativas previstas no Estatuto da Criança e do adolescente (ECA). Esta questão se refere à denominação da Unidade, dos adolescentes envolvidos e das demais formas de identificação das atividades a eles relacionadas. Respeitar os princípiso da não-discriminação e não-estigmatização significa evitar os rótulos que marcam os adolescentes e os expõe a situação vexatória, impedindo-os de superar suas dificuldades na inclusão social.

Os dados quantitativos foram analisados estatisticamente através do programa Stathistical Package for Social Sciences (SPSS), e os dados qualitativos foram analisados através da metodologia de análise de conteúdo tendo como referência principal a obra de Bardin (2002). Foram criadas categorias de análise de conteúdo para as respostas descritivas. A realização da pesquisa foi autorizada pela FASE-RS e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFSM (Processo 23081.004042/2011-23; CAAE: 0037.0.243.000-11).

Os resultados indicaram que a maioria dos socioeducadores acredita que a instituição a qual pertencem sempre (67.6%) observa critérios para que o adolescente

(4)

interno não sofra discriminação e estigmação, não sendo exposto a situações vexatórias e nem a rótulos que acabam por dificultar sua inclusão social. Estudos em nível nacional apontam para realidades diferentes do que a revelada nesta pesquisa: rótulos e estigmatizações têm sido apontados como um dos grandes responsáveis pela dificuldade de superação da medida por parte dos jovens (FEIJÓ; ASSIS, 2004, GOMIDE, 1998, OLIVEIRA; ASSIS, 1999). Alguns socioeducadores (13.5%) acreditam que na instituição às vezes estes princípios são respeitados, enquanto que outros (8,1%) afirmaram que nunca é observada esta previsão. Alguns entrevistados (5.4%) não souberam responder a esta questão e outros simplesmente não responderam (2.7%). Assinalando sempre e nunca simultaneamente tivemos também uma representação (2.7%).

As respostas analisadas qualitativamente foram agrupadas em três categorias: justificação, juízo de valor e explicação. Entre as respostas que apresentaram justificativas, que correspondem a 50% do total, citamos as seguintes:

Qualquer discriminação ou estigmação imposta ao adolescente do CASE, significa falta de disciplina do funcionário, sujeita às penalidades administrativas decorrentes (participante 16).

Alguns funcionários por não estarem capacitados, por nunca terem feito uma capacitação muitas vezes dão apelidos e denominações, ao meu ver, vexatório (participante 18).

Entre os funcionários que emitiram algum juízo de valor, que totalizam 37.5% dos casos, citamos os seguintes exemplos:

Ao meu ver, o que dificulta a inclusão dos adolescentes na sociedade são as reincidências dos atos dos próprios adolescentes nas suas próprias comunidades. Se todos os seres, independente do tipo, podem mudar, por que o ser vivo humano, principalmente adolescente não poderá? O que a maioria precisa é de uma “nova orientação responsável”. Tem muitos profissionais que não sabem lidar com seus próprios filhos, etc. Mas se acham doutores em reeducar adolescentes dos outros e com problemas muitas vezes sérios de conduta (participante 28).

Há sempre esse cuidado de não colocar o adolescente como autor de um crime, o que faz com que ELE MESMO CHEGUE A CONCLUSÃO DE QUE NADA COMETEU e que então, ELE É UM INJUSTIÇADO (participante10).

Alguns dos entrevistados explicaram (12.5%) sua resposta, como o seguinte:

Sempre as atividades externas à unidade são tratadas com maior discrição. (participante 37)

(5)

3. CONCLUSÕES

A estigmatização é um aspecto que merece destaque quando pensamos na ressocialização do adolescente, pois corre-se o risco de, além desta não acontecer, causar efeitos mais prejudiciais, como o de colocar este adolescente cada vez mais fixado no lugar de delinqüente. A infração tem um lugar reconhecido pela comunidade de origem dos adolescentes, o que acaba permitindo que eles possam desfrutar de respeito perante os jovens destas comunidades. O ato infracional passa a identificá-lo e marcá-lo criando através desta marca um estigma, que por vezes é reforçado pelas próprias instituições. Assim, a infração enquanto estigma pode ser associada a aspectos positivos e negativos enquanto marca identitária (BOCCO E LAZZAROTTO 2004).

Salienta-se que observar os princípios da estigmatização e da não-discriminação significa contribuir para a efetivação dos preceitos do ECA. Para que isto seja efetivado em nível amplo, outras práticas e políticas sociais são necessárias. Investimentos sociais em políticas de igualdade social, de erradicação da condição de pobreza, do alcoolismo e da drogadição, entre outros, podem representar alternativas para o enfrentamento dos casos de adolescentes que cometem atos infracionais a partir da oferta de proteção integral ao desenvolvimento infanto-juvenil. Os jovens de classes populares, por vezes, identificam-se com a criminalidade e com a prática de atos infracionais numa tentativa de tornar-se visível socialmente (SOARES 2005).

Por fim, entende-se que a adequação do sistema socioeducativo, no que diz respeito à efetivação da nova doutrina introduzida pelo ECA, a Doutrina da Proteção Integral, principalmente no aspecto do princípio da não-discriminação e não-estigmatização, é um processo ainda em curso, em algumas realidades lento e difícil, em outras com significativos avanços, mas infelizmente ainda com alguns retrocessos. Há mais que valores legais envolvidos nestas concepções, há valores humanos, históricos e sociais que precisam ser revistos. Dimenstein (2005) nos reporta à idéia de que entender a infância marginal implica entender por que uma criança vai para rua e não para a escola. Para ele, esta seria, em essência, a diferença de um garoto que está dentro do carro de vidros fechados, e aquele que chega até este carro para vender balas, doces ou pedir esmolas. O investimento na infância brasileira tem que vir muito antes da situação em que nos deparamos com um “menor infrator”, para que o adolescente não tenha que cometer um

(6)

REFERÊNCIAS

ARENDT, H. Da revolução. São Paulo: Ática/Universidade de Brasília. 1988.

BARDIN, L. Análise de conteúdo. Trad. Luís Antero Reto e Augusto Pinheiro. Lisboa: Edições 70, 2002.

BOCCO, F & LAZZAROTTO, G. D. R. (2004). (Infr)atores juvenis: artesãos da análise. Psicologia e Sociedade, 16 (2), 37-46.

BRASIL (1990). Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei nº 8069, de 13 de julho de 1990. Brasília - DF.

BRASIL. Presidência da República. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente. Sistema Nacional De Atendimento Socioeducativo – SINASE. Brasília-DF: CONANDA, 2006

BRASIL. Direitos Humanos: um retrato das unidades de internação de adolescentes em conflito com a lei. Brasília-DF: Conselho Federal de Psicologia, 2006b.

COSTA, A. C. G. Os regimes de atendimento no Estatuto da Criança e do Adolescente: perspectivas e desafios. Brasília/DF: Secretaria Especial de Direitos Humanos. 2006.

DIMENSTEIN, G. O cidadão de papel: a infância, a adolescência e os Direitos Humanos no Brasil. São Paulo, Atica 2005.

FEIJÓ, M. C.; ASSIS, S. G. O contexto de exclusão social e de vulnerabilidades de jovens infratores e de suas famílias. Estudos de Psicologia, Natal, v.9, n° 1, jan-abr, 2004.

GOMIDE, P. I. C. A instituição e a identidade do menor infrator. Psicologia Ciência e Profissão, v.8, nº1, 20-22. (1998).

GONCALVES, H. S.; GARCIA, J. Juventude e sistema de direitos no Brasil. Psicologia, ciência e profissão, Brasília, v. 27, n. 3, set. 2007.

MARIN, I. S. K. A clínica institucional da adolescência (Entre o aborrescente e o herói: quem é o adolescente na escuta psicanalítica? Rev. Bras. Adolescência e Conflitualidade, 1 (1): xxxii-xlii, 2009.

(7)

OLIVEIRA, E. R. Ensinando a não sonhar: a anti-pedagogia oficial destinada a adolescentes infratores no Rio de Janeiro. Katalysis, 6 (1), 85-95, Santa Catarina, 2003.

OLIVEIRA, C. S. Sobrevivendo no Inferno - A Violência Juvenil na Contemporaneidade. Porto Alegre: Sulina. 2001.

OLIVEIRA, M. B.; ASSIS, S. G. Os adolescentes infratores do Rio de Janeiro e as instituições que os “ressocializam”. A perpetuação do descaso. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 15, n. 4, 831-844, out-dez, 1999.

SOARES, L. E. Cabeça de Porco. Rio de Janeiro: Objetiva, 2005.

SOARES, J. J. B. S. O Sistema Socioeducativo no âmbito do estado do Rio de Janeiro: panorama atual e perspectivas. In: BRITO, L. M. T. (Coord.). Responsabilidades: ações socioeducativas e políticas públicas para a infância e juventude no Rio de Janeiro: EdUERJ, 2000.

VOLPI, M. O adolescente e o ato infracional. São Paulo: Cortez, 1997.

WAISELFISZ, J. J. Mapa da violência IV: os jovens do Brasil. Brasília: UNESCO, Instituto Ayrton Senna, SEDH, 2004.

Referências

Documentos relacionados

Declaro que fiz a correção linguística de Português da dissertação de Romualdo Portella Neto, intitulada A Percepção dos Gestores sobre a Gestão de Resíduos da Suinocultura:

To demonstrate that SeLFIES can cater to even the lowest income and least financially trained individuals in Brazil, consider the following SeLFIES design as first articulated

Acrescenta que “a ‘fonte do direito’ é o próprio direito em sua passagem de um estado de fluidez e invisibilidade subterrânea ao estado de segurança e clareza” (Montoro, 2016,

Realizar a manipulação, o armazenamento e o processamento dessa massa enorme de dados utilizando os bancos de dados relacionais se mostrou ineficiente, pois o

patula inibe a multiplicação do DENV-3 nas células, (Figura 4), além disso, nas análises microscópicas não foi observado efeito citotóxico do extrato sobre as

Por meio dos registros realizados no estudo de levantamento e identificação de Felinos em um remanescente de Mata atlântica, uma região de mata secundária

Estudos sobre privação de sono sugerem que neurônios da área pré-óptica lateral e do núcleo pré-óptico lateral se- jam também responsáveis pelos mecanismos que regulam o

Finally, initial growth index corresponds to individual condition of the 60 first days of life of individuals and, like recent growth’ index, there is probably