TÓPICO DISCURSIVO E
DIGRESSÕES
Introdução aos Estudos de Língua Portuguesa II
Prof. Dr. Paulo Roberto Gonçalves Segundo
Conceito de Tópico Discursivo
Tópico Discursivo
“aquilo acerca do que se está
falando” (Brown & Yule, 1983: 73)
Ele é construído pelos interlocutores em um processo
colaborativo/cooperativo.
Propriedades do tópico:
a.
Centração:
propriedade
qualitativa
do
tópico.
Permite a identificação dos segmentos tópicos.
b.
Organicidade: propriedade organizacional do tópico.
Permite identificar as relações que se estabelecem
entre tópicos e dentro de um mesmo tópico.
Propriedades do Tópico
Centração
“um conjunto de referentes explícitos ou inferíveis
concernentes entre si e em relevância num determinado ponto da
mensagem” (Jubran et al., 1992: 361).
São traços da centração:
1.
concernência
– relação de interdependência entre elementos
textuais, firmada por mecanismos coesivos de sequenciação e
referenciação, que promovem a integração desses elementos em
um conjunto referencial, instaurado no texto como alvo da
interação verbal;
2.
relevância
– proeminência de elementos textuais na constituição
desse conjunto referencial, que são projetados como focais, tendo
em vista o processo interativo;
3.
pontualização
– localização desse conjunto em determinado
ponto do texto, fundamentada na integração (concernência) e na
proeminência (relevância) de seus elementos, instituídas com
finalidades interacionais.
Exemplo
Exemplo:
L1: meu pai é um cara muito trabalhador... sabe? acorda
cedo... faz o café da manhã pra todo mundo... chega no
trabalho antes das nove e fica lá até sei lá umas oi:::to...
agora minha tia é o oposto... totalmente folgada... não faz
nada só re-cla-ma e ainda gasta o dinheiro todo do marido
que fica todo endividado... só sabe comprar roupa sapato...
FALANDO NISSO... me-ni-na... você viu aquela promoção
da Lucy in the Sky?
L2: não... ainda não vi...
L1: precisamos de qualquer jeito passar lá... tem cada
vestido maravilhoso... e tem que aproveitar a promoção...
senão [...]
Propriedades do Tópico
Organicidade: diz respeito à estrutura linear e hierárquica de
desenvolvimento do tópico discursivo.
1.
Plano linear: envolve a articulação entre unidades ou
segmentos
tópicos.
Foco:
análise
das
estratégias
linguísticas utilizadas para a manutenção, movimentação,
expansão, mudança ou desvio tópico.
2.
Plano hierárquico: abrange as relações de subordinação e
superordenação entre unidades tópicas, tendo em vista seu
grau de abrangência.
Exemplo
Exemplo:
L1: meu pai é um cara muito trabalhador... sabe? acorda
cedo... faz o café da manhã pra todo mundo... chega no
trabalho antes das nove e fica lá até sei lá umas oi:::to...
minha tia é o oposto... totalmente folgada... não faz
nada só re-cla-ma e ainda gasta o dinheiro todo do marido
que fica todo endividado... só sabe comprar roupa sapato...
me-ni-na... você viu aquela promoção
da Lucy in the Sky?
L2: não... ainda não vi...
L1: precisamos de qualquer jeito passar lá... tem cada
vestido maravilhoso... e tem que aproveitar a promoção...
senão [...]
agora
Quadro Tópico (QT)
Comportamento
de parentes
(T: linhas 1-6)
Comportamento
do pai
(SbT: linhas 1-3)
Comportamento
da tia
(SbT: linhas 4-6)
Promoção de
roupas
(T: linhas 7-12)
Formas de articulação intertópica
1.
Alternância tópica: A
– B – A – B
2.
Expansão tópica: uma unidade tópica A é desenvolvida, e um dos
falantes da interação passa a enfocar um aspecto que se ajusta,
parcialmente, à centração do tópico anterior, levando-o a outra
direção. Geralmente, tal forma de articulação gera um novo
subtópico, subordinado a um mesmo tópico (ou supertópico).
3.
Movimentação tópica: uma unidade tópica A é desenvolvida, e
algum objeto-de-discurso ou referente nela construída recebe
ajuste focal, passando a ser
“tema” de uma nova unidade tópica.
Geralmente, a movimentação leva à formação de um novo tópico (e
não, subtópico).
4.
Digressão: A
– b – A: um segmento tópico b é inserido durante o
desenvolvimento de A, por razões ideacionais, interpessoais ou
textuais, que, após a inserção, é retomado do ponto em que havia
sido abandonado.
Quadro Tópico (QT)
Comportamento
de parentes
(T: linhas 1-6)
Comportamento
do pai
(SbT: linhas 1-3)
Comportamento
da tia
(SbT: linhas 4-6)
Promoção de
roupas
(T: linhas 7-12)
Expansão tópica
Movimentação tópica
Digressões
Dascal e Katriel Digressão baseada 1. no enunciado e 2. na interação.
Andrade (2001)
Motivos ideacionais (representacionais)
digressão lógico-experencial: semelhante à movimentação tópica,
mas com retomada do tópico inicial.
Motivos interpessoais (relações/ações)
digressão interpessoal incidental: instaurada por uma mudança
no ajuste da ação, causada pela intervenção de algum ator social, ou pela
necessidade de seguir alguma regra social (ex.: entrada de uma pessoa,
oferecimento de bebida, etc.).
digressão interpessoal imediata: instaurada quando um elemento
do contexto material sofre ajuste focal em um ponto da interação (ex.: falar do
mosquito que acabou de entrar)
Motivos textuais (elucidação)
digressão retórica didática: instaurada quando o desenvolvimento
do tópico é interrompido para esclarecimentos metalinguísticos.
digressão retórica persuasiva: o desenvolvimento do tópico é
interrompido
para
reenquadrar
(ou
“distorcer”) aspectos de alguma
representação ou pergunta. Comum no discurso político.
Digressões
Andrade (2002)
Motivos ideacionais (representacionais)
digressão lógico-experencial: semelhante à movimentação tópica,
mas com retomada do tópico inicial.
(1)
Inf: ... bom o comércio... é... falando assim sob um aspecto muito::: simples a respeito do
comércio de de nós que vamos LÁ quem vamos ver vitrines coisa que eu deTESto fazer aqui... em São Paulo e que lá eu acompanhei minha mulher em... todas as::... a::as vitrines ou todas as lojas onde ela quis ir né?... e::: vitrines são muito... bonitas... muito bem arrumadas prin-cipalmente... ah em Londres e em Paris... e mesmo em Roma... também em Madri... em
Portugal...( ) aliás Portugal de uma certa forma eu tenho origem... portuguesa eu me
decepcionei um pouco... todo mundo que vai à:: à Europa e diz que:: Portugal é o::jardim... é um jardim dentro da Europa né?... mas eu fui numa época de frio e já havia visitado a Europa inteirinha... quando eu fui a Portugal então eu me decepcionei um pouco com o que eu julguei assim uma pobreza... meio ostenSIva que a gente não vê na Europa... então em Portugal em Lisboa... encontra-se muita gente muito pedinte na rua muito aleijado... muita gente venDENdo coisa na rua... e:: coisa que eu não vi no resto do país... no resto da Europa...
mas de maneira geral... geral as lojas são muito bem::: ornamentadas... eu quando estive em Paris foi próximo à época de Natal então:: os enfeites de rua eram maravilhosos os das lojas também... isso me chamou muito a atenção PRINcipalmente em Paris e:: Madri...
Digressões
Andrade (2002)
Motivos interpessoais (relações/ações)
digressão interpessoal incidental: instaurada por uma mudança no ajuste
da ação, causada pela intervenção de algum ator social, ou pela necessidade de
respeitar alguma norma social.
(2)
e a Sharon Stone... que é um personagem novo... a Sharon Stone... né? [
L2: a Sharon Stone é...
L1: o que que ela faz... a Sharon Stone?
L2: ela dá uma cruzada de perna... assim... ((cruza as pernas)) L1: só isso?
L2: é... e a gente... (“blonf”) cai... eu posso fumar um cigarro aqui? L1: po/claro... evidente...
[
L2: daqueles?
L1: daqueles? pode... (problema seu)... polícia tá aí na porta... ((risos)) pronto... cê não pode é vender... não vai vender aqui...
[
L2: não... não eu só... só fumo...
L1 só fuma... então tá bom... olha só... o... o... você já pensaram... ahn... falando com esse espanhol impecável que tá escrito aqui os três amigos... em distribuir isso no Mercosul... ou não?
Digressões
Andrade (2002)
Motivos interpessoais (relações/ações)
digressão interpessoal imediata: instaurada quando um elemento do
contexto material sofre ajuste focal em um ponto da interação (ex.: falar do
mosquito que acabou de entrar)
(3)
L1: você também tem seu repertório...
[
L2:
eu tenho o meu repertório... eu vou mudando as cenas...
posso dar o telefone de contato?
L1: pode... claro...
[
L2:
cê botou a mãozinha aqui já ( )estivemos falando com Luís Fernando ((risos))
coloca a mão já falou... ih... vou ter que ir embora...
L1: cê fica... quer ficar?
[
L2:
ah... eu adoro você...
[
L1:
ah:: ora... imagina... a gente hoje tem a noite toda...
((risos))
telefone de contato pro Fernando Luís...
Digressões
Andrade (2002)
Motivos textuais (elucidação)
digressão retórica didática: instaurada quando o desenvolvimento do
tópico é interrompido para esclarecimentos metalinguísticos.
(4)
L1: ... o Pedro Paulo que mora aqui em São Paulo... nos telefonou pra fazer a seguinte pergunta... como cientista político o senhor tem divergências com Fernando Henrique Cardoso... se tem... quais são essas divergências...
L2: como cientista político?
L1: é... pode ser até mais sob o ponto de vista de política partidária... de origem... talvez...
[
L2: não... olha... olha...a...
aqui...
[
L(?): ou
talvez... seria bom lembrar que o senhor foi assistente... do Fernando Henrique... [
L2: não... aqui... eu acho que aqui... aqui
reconhecer um fato que é... que é... importante... quer dizer... do ponto de vista cultural também... o... o... o... eu trabalhei... eu fui aluno do Fernando Henrique Cardoso... trabalhei com Fernando Henrique Cardoso... é na Universidade de São Paulo... trabalhei com ele no Chile... depois trabalhamos no CEBRAP... não é?
Digressões
Andrade (2002)
Motivos textuais (elucidação)
digressão retórica persuasiva: o desenvolvimento do tópico é
interrompido
para
reenquadrar
(ou
“distorcer”) aspectos de alguma
representação ou pergunta. Comum no discurso político.
(5)
L7: mas há hospitais por exemplo... com... com obras paradas... eu citaria aqui o maior deles que é o Hospital da Mulher... mas há outros hospitais já em fase até de... de utilização...
faltam os equipamentos... como é que o senhor vai fazer... vai deixar um ano parado tudo isso... [
L2: mas se tiver que ficar
um ano parado... vai ficar um ano parado mesmo... a não ser que eu diga... bem eu não pago o pessoal e cont/e termino de fazer a obra... se terminar a obra... for um fator mais importante do que pagar o pessoal... eu termino essa obra...
[
L7: agora o senhor confirma esse... [
L2: agora eu pergunto... do ponto de vista da sociedade... da sociedade... onde é que tá a importância maior? do ponto de vista de quem trabalha onde tá a importância maior? ah...eu acho que você tem que tentar viabilizar as duas coisas... você tem que tentar o máximo... por exemplo...