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Alfabetização e letramento: um estudo sobre as concepções que permeiam as práticas pedagógicas dos professores alfabetizadores

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Academic year: 2021

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Alfabetização e letramento: um estudo sobre as concepções 

que permeiam as práticas pedagógicas dos professores 

alfabetizadores 

 

 

 

  Resumo 

Este  artigo  é  o  resultado  da  investigação  realizada  junto  a  um  grupo  de  professores  alfabetizadores  em  processo  de  formação  continuada.  O  objeto  de  estudo  foi  a  concepção  de  alfabetização  presente  nas  práticas  alfabetizadoras  dos  professores  que  trabalham  nas  classes  de  alfabetização.  Buscou‐se  examinar  a  concepção  de  alfabetização  e  letramento  que  sustentam  as  práticas  dos  professores  alfabetizadores  e  o  que  de  fato  está  sendo  concebido  quando  se  ensina  a  leitura  e  a  escrita  na  alfabetização.  Metodologicamente,  foi  adotado  uma  abordagem  de  pesquisa  qualitativa,  enfatizando  a  condição  do  pesquisador  como  sujeito  e  destacando  a  importância  do  seu  diálogo  com  o  campo  empírico  no  processo  de  produção do conhecimento. Uma das características que se  destaca  na  pesquisa  qualitativa  é  a  interação  entre  pesquisadores  e  o  grupo/membros  das  situações  investigadas,  o  que  possibilita  uma  comunicação  efetiva  entre  os  mesmos.  Do  ponto  de  vista  teórico,  foram  utilizados os estudos desenvolvidos por Freire (1995, 1996,  1999,  2002);  Vygotsky  (1981  1988);  Luria  (1983,  1988);  Kleiman (1995), Soares (1998) e Tfouni (1995).     Palavras‐chave: alfabetização; letramento; prática  alfabetizadora; processos pedagógicos.      Marilane Maria Wolff Paim  UFFS  marilanewp@gmail.com             

 

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1 Introdução 

Neste  artigo,  apresentamos  e  problematizamos  os  resultados  de  uma  pesquisa  desenvolvida no projeto Alfabetização e letramento: um estudo sobre as concepções que  permeiam  as  práticas  pedagógicas  dos  professores  alfabetizadores.  Existem  várias  teorias  que  procuram  compreender  e  explicar  os  caminhos  da  alfabetização  e  que  no  processo  de  ensinar  a  leitura  e  a  escrita  num  contexto  efetivo  e  sistemático  de  ensino  diferentes  concepções  estão  presentes  nas  práticas  pedagógicas  sem  que  eles  necessariamente as percebam. Assim, o trabalho de alfabetização pode ser realizado com  o desconhecimento daquilo que o fundamenta. 

É  fundamental  destacar  que  o  modo  como  é  concebido  o  processo  de  alfabetização pode fazer a diferença de todo o encaminhamento metodológico em sala  de aula, pois a alfabetização, entendida como simples aquisição do código gráfico (letras,  sílabas,  palavras),  fica  dissociada  da  situação  real  vivida  pelo  aluno,  bem  como  de  seu  significado ao contrário, para que se ampliem as possibilidades de leitura e escrita basta  ultrapassar  esse  entendimento  restrito  e  limitado.  Aprender  a  língua  escrita  por  repetição,  cópia,  reprodução  de  letras,  palavras  e  frases  isoladas,  leitura  em  coro,  não  garantem que a criança aprenda a linguagem escrita, mas somente a escrita das letras.  

Neste  sentido,  a  pesquisa  procurou  investigar  as  práticas  pedagógicas  alfabetizadoras,  não  como  forma  de  ver  de  fora  a  realidade,  mas  de  inserir‐se  nela  e  percebê‐la em suas múltiplas relações, facetas e significados. E para compreender melhor  o cotidiano das classes de alfabetização, foi necessário investigar qual é a concepção de  alfabetização e letramento que sustentam as práticas dos professores alfabetizadores e o  que de fato está sendo concebido quando se ensina a leitura e a escrita na alfabetização?  

O  processo  de  alfabetização  tem,  ao  longo  de  sua  história,  apresentado  características  dicotômicas,  pois,  se  de  um  lado  ele  se  constitui  na  possibilidade  de  apropriação  de  todo  um  universo  antes  inatingível,  por  outro,  ele  pode  vir  a  ser  um  espaço de fracassos e frustrações onde o aluno é colocado frente a um saber com o qual  ele não consegue se relacionar e estabelecer sentido. 

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O trabalho de alfabetização ao mesmo tempo em que se constrói como um fator  de angústia entre os professores organiza‐se como elemento gerador de busca constante  de metodologias capazes de dar conta das questões que se apresentam no cotidiano da  sala de aula. 

As  dificuldades  inerentes  ao  processo  de  alfabetização  de  crianças,  o  qual  acontece de forma mecânica, com palavras soltas, sem sentido e significado e ancorado  numa  linguagem  artificial  diferente  da  linguagem  social  que  a  criança  usa  no  seu  cotidiano,  cria  no  professor  a  necessidade  de  buscar  outras  concepções,  outros  fundamentos  e  outras  metodologias  capazes  de  compreender  de  maneira  diferente  o  processo de aprendizagem trabalhado no interior das escolas. 

A  busca  de  novos  rumos  para  a  alfabetização  nem  sempre  tem  dado  resultados  positivos,  pois,  muitas vezes,  as  metodologias  têm  se  mostrado  ineficazes  na  resolução  dos problemas e acabam virando meros paliativos para as dificuldades que sobrevivem e  se cristalizam no interior da escola. Deste modo, o processo de alfabetização das crianças  passa  pelos  mais  variados  enfoques,  sendo  necessário  não  perder  de  vista  o  como  a  criança  se  apropria  da  escrita.  Nesse  contexto  encontram‐se  as  práticas  alfabetizadoras  que  foram  ao  mesmo  tempo  produto  e  produtoras  de  tais  paradigmas,  desde  uma  compreensão  de  linguagem  enquanto  dom,  hereditária,  imutável,  individual  a  de  como  prática social, coletiva, histórica, construída, etc. 

O processo de alfabetização não se restringe ao aprendizado da leitura e da escrita  mecânica  quando  se  adquire  uma  tecnologia  de  codificar  e  decodificar  a  escrita,  mais  ainda,  que  esta  conquista  superficial  não  é  suficiente  na  sociedade  de  hoje.  O  desafio,  portanto, se coloca aos professores alfabetizadores, que necessitam desenvolver práticas  de leitura e escrita na sala de aula na perspectiva do letramento. 

Soares  (1998)  em  suas  pesquisas  sobre  linguagem  e  alfabetização  tem  analisado  que a partir das transformações das sociais em torno do uso da escrita e de suas funções  na  sociedade,  surgiu  o  conceito  de  letramento.  Ou  seja,  não  basta  mais  os  sujeitos  aprenderem a codificar e decodificar e escrita, mas, é necessário fazer uso adequado da 

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leitura  e  da  escrita  na  sociedade,  sabendo  utilizar  o  material  escrito,  interpretando  e  posicionando‐se criticamente diante dela. 

As  atividades  de  pesquisa  desenvolvidas  foram  articuladas  com  o  projeto  de  extensão alfabetização e linguagem: possibilidades de intervenção em sala de aula. 

Para  efeito  desse  estudo  estabelecemos  como  objetivo,  investigar  qual  a  concepção  de  alfabetização  e  letramento  que  sustentam  as  práticas  dos  professores  alfabetizadores  e  o  que  de  fato  está  sendo  concebido  quando  se  ensina  a  leitura  e  a  escrita na alfabetização?  

Nunca  estudamos  um  objeto  neutro,  mas  sempre  um  objeto  implicado,  caracterizado pela teoria e pelo dispositivo que permite vê‐lo, observá‐lo e conhecê‐lo. É  valido  destacar  que  a  concepção  de  pesquisa  não  é  neutra,  portanto,  torna‐se  imprescindível  analisá‐la  numa  perspectiva  que  se  distancie  da  concepção  meramente  técnica,  afastando  qualquer  possibilidade  de  sua  neutralidade.  A  pesquisa  foi  realizada  numa  abordagem  qualitativa,  enfatizando  a  condição  do  pesquisador  como  sujeito  e  destacando  a  importância  do  seu  diálogo  com  o  campo  empírico,  no  processo  de  produção do conhecimento. 

Nesta  direção,  buscam‐se  os  princípios  da  pesquisa  qualitativa  nos  aportes  de  Ludke e André (1986, p 23), que destaca: 

 

A pesquisa qualitativa envolve a obtenção de dados descritivos, obtidos  no contato direto do pesquisador com a situação estudada, enfatiza mais  o  processo  do  que  o  produto  e  se  preocupa  em  retratar  a  perspectiva  dos  participantes.  Investiga  os  sujeitos  a  partir  de  sua  cultura,  de  sua  história,  de  suas  condições  de  trabalho,  seus  saberes  e  fazeres,  sua  subjetividade.  

 

Assim, a pesquisa qualitativa supõe o contato direto e prolongado do pesquisador  com  o  local/ambiente  e  a  situação  que  está  sendo  investigada,os  problemas  devem  ser  estudados no ambiente em que eles ocorrem, sem qualquer manipulação intencional do  pesquisador  pesquisadores  e  pesquisados  são  sujeitos  de  um  trabalho  comum,  mesmo  que cada um esteja em lugares e situações diferentes. A investigação aconteceu com os  docentes  alfabetizadores  que    participaram  do  curso  de  extensão  “Alfabetização  e 

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Linguagem:  Possibilidades  de  intervenção  em  sala  de  aula”.    Para  a  divulgação  dos  resultados  fizemos  o  uso  do  termo  de  consentimento  livre  e  esclarecido  e  também  mantivemos  o  sigilo  e  anonimato  dos  sujeitos  envolvidos.  Os  sujeitos  foram  nominados  como P 1, 2, ..., sucessivamente.  

No projeto inicial foi definido como instrumento de pesquisa uma entrevista, mas  no decorrer do processo não foi possível a realização das entrevistas e foi utilizado como  instrumento  de  pesquisa  os  documentos  desenvolvidos  durante  o  curso  e  também    os  diários de campo. Assim a metodologia seguiu a abordagem qualitativa de pesquisa em  educação  caracterizada como descritiva e documental, conforme Lüdke e André (1986),  com  a  produção  dos  resultados  obtida  através  da  análise  dos  Diários  de  campo  e  dos  trabalhos produzidos pelos professores durante o curso. 

A partir da análise dos diários de campo e dos trabalhos desenvolvidos foi possível  identificar    algumas  das  concepções  que  permeiam  as  práticas  pedagógicas  dos  professores alfabetizadores. 

Nesse  texto  vamos    discutir    as  temáticas  que  apresentaram  maior  destaque  na  análise  e  que  possibilitaram  perceber  como  os  professores    concebem  o  processo  de  alfabetização.  Após  a  análise,  os  dados    foram  organizados  em    três  categorias  que  melhor traduziam os  resultados obtidos: Alfabetização compreendida como à aquisição  do código escrito (codificação e decodificação) e a  aquisição de uma habilidade técnica;  Alfabetização  e  letramento  e  Alfabetização  como  desafio,    que  passo    a  discutir  na  sequência.   

2 Os diálogos possíveis 

  2.1 Alfabetização compreendida como à aquisição do código escrito (codificação e  decodificação) e a aquisição de uma habilidade técnica. 

Durante  muito  tempo  se  pensava  que  ser  alfabetizado  era  conhecer  o  código  linguístico, ou seja, conhecer a grafia das palavras. Atualmente, sabe‐se que embora seja 

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necessário,  o  conhecimento  das  letras  não  é  suficiente  para  ser  competente  no  uso  da  língua  escrita.  A  língua  não  é  um  mero  código  para  comunicação,  ela  é  um  fenômeno  social,  estruturado  de  forma  dinâmica  e  coletiva,  portanto,  a  escrita  também  deve  ser  concebida do ponto de vista cultural e social. “Para compreender o papel da escrita como  prática  social,  diferenciada  da  aquisição  da  tecnologia  de  aprender  a  ler  e  a  escrever,  considera‐se  o  domínio  do  código  como  alfabetização  e  as  práticas  de  escrita  como  letramento” (LEITE, 2001, p.53).  

A concepção de alfabetização compreendida como à aquisição do código escrito  (codificação  e  decodificação)  e  a  aquisição  de  uma  habilidade  técnica  permanece  presente  nos  discursos  dos  professores  alfabetizadores.Isso  fica  expresso  nas  falas:“É  quando  você  reconhece  os  símbolos  e  consegue  interpretá‐los.”(P  1)“Processo  de  codificação e decodificação”.(P2) “Alfabetização é ensinar a ler e a escrever”(P13). 

Compreender  a  língua  como  um  conjunto  de  formas  prontas  que  devem  ser  memorizadas,  compreendidas  como  um  sistema  abstrato  e  homogêneo  e  ainda  desvinculado  do  uso,  estabelece  uma  importância  ao  domínio  do  sistema  gráfico,  desconsiderando o trabalho da linguagem no seu sentido mais amplo. 

  Considerar  a  alfabetização  dessa  forma  impõe  exclusivamente  um 

treinamento perceptual e motor no período preparatório e ainda a repetição de palavras  e  padrões  silábicos  durante  todo  o  processo  de  alfabetização,  enfatizando  a  cópia  repetitiva  de  palavras  e  sílabas  descontextualizadas  para  a  simples  memorização  mecânica  da  correspondência  entre  grafema  e  fonema.  Esse  movimento  de  ensinar  a  mecânica da leitura e da escrita não é alfabetizar. 

O  domínio  do  gráfico  é  apenas  parte  de  um  processo  mais  amplo.  Aprender  a  língua não é apenas aprender estruturas, mas é, sobretudo, aprender formas de pensar o  mundo e agir sobre ele. 

É preciso entender que a alfabetização não se restringe ao aprendizado da leitura  e  da  escrita  mecânica  quando  se  adquire  uma  tecnologia  de  codificar  e  decodificar  a  escrita, mais ainda, que esta conquista superficial não é suficiente na sociedade de hoje.  Práticas  de  alfabetização  centradas  na  memorização,  repetição  e  cópia  de  conteúdos 

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alfabetizadores  de  cartilhas  com  a  lógica  do  simples  para  o  complexo,  das  famílias  silábicas entre outros que não levam em conta a linguagem social utilizada pela criança,  mas consideram uma linguagem artificial que só encontramos nas cartilhas como” O boi  baba”, “A vaca voa”, “Vivi viu a uva” O dado é de Dada” no processo de alfabetização,  causa muitas vezes o desinteresse e o fracasso escolar.   

2.2 Alfabetização e Letramento 

Outra  concepção  que  permeia  as  práticas  alfabetizadoras  dos  professores  sustenta que o processo de alfabetização deve compreender que relação de ensino tem  que  se  organizar  de  forma  que  o  aluno  possa  entender  a  leitura  e  a  escrita  como  atividades sociais significativas que envolvem o uso da língua em situações reais, através  de  textos  significativos  e  contextualizados.Podemos  corroborar  nossas  afirmações  os  registros  das  professoras  na  compreensão  da  alfabetização  no  cotidiano  do  contexto  escolar: 

 

Alfabetizar  é  bem  mais  do  que  ler  palavras  frases,  realizar  cálculos  simples, é preciso compreender, gostar, criar, opinar (P17). 

Alfabetizar  é  ensinar  ler,  escrever,  mas  acima  e  tudo  entender  o  que  é  lido e escrito, ter uma opinião crítica, são as práticas sociais de leitura e  escrita  (P19)  

Alfabetização  é  quando  criança,  escreve  e  entende  o  que  leu,  constrói  sua aprendizagem (P10). 

A  alfabetização  é  um  processo  de  aquisição  e  apropriação  da  leitura  e  escrita  onde,  cada  criança  tem  o  seu  tempo  para  iniciar  e  o  professor  deve ser um mediador nesse processo (P19).  Alfabetizar é iniciar com processos de leitura e escrita dos alunos a partir  do conhecimento que o aluno traz de casa (P12).    Para melhor compreender os conceitos de alfabetização e letramento, estes serão  registrados a seguir segundo a ótica de Kleiman (1995), Soares (1998) e Tfouni (1995). 

Kleiman  (1995,  p.19)  define  letramento  como  o  conjunto  de  práticas  sociais  que  usam  a  escrita,  enquanto  sistema  simbólico  e  enquanto  tecnologia,  em  contextos  específicos, para objetivos específicos. 

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Soares (1998, p.39) define letramento como: “o estado ou a condição que adquire  um grupo social ou um indivíduo como consequência de ter se apropriado da escrita e de  suas  práticas”,  e  ainda,  enfatiza  que  a  leitura  e  a  escrita  são  uma  condição  necessária,  muito embora não sendo a única para o pleno exercício da cidadania. 

De  outro  modo,  Tfouni  (1995,  p.16),  concebe  o  termo  letramento  em  confronto  com  o  conceito  de  alfabetização.  “Enquanto  a  alfabetização  ocupa‐se  da  aquisição  da  escrita por um indivíduo ou grupo de indivíduos, o letramento focaliza os aspectos sócio  históricos da aquisição de um sistema escrito por uma sociedade”. 

O  conceito  de  letramento  apresentado  por  Kleiman  enfatiza  a  noção  de  práticas  sócias  de  leitura  e  escrita  e  os  eventos  em  que  elas  são  colocadas  em  ação.  Já  Soares,  destaca a dimensão de letramento como produto dessas mesmas práticas, apontando as  condições  e  as  possibilidades  que  um  grupo  ou  indivíduo  adquirem  através  dos  usos  sociais  da  leitura  e  da  escrita.  Não  centra  o  enfoque  nas  práticas,  mas  sim,  nos  sujeitos  que fazem uso delas, ou seja, aquele que é usuário da tecnologia que as envolve. 

Para  Soares  (1998),  o  que  muda  no  indivíduo  que  apresenta  um  bom  nível  de  letramento é o seu lugar social, isto é sua forma de inserção cultural, à medida que passa  a usufruir outra condição social e cultural. Assim, as práticas sociais que envolvem leitura  e  escrita  podem  promover  algumas  alterações  tornando  então  mais  adequadas  às  relações que o indivíduo mantém com os outros, com os diversos contextos sociais, com  os bens culturais e porque não dizer, consigo mesmo. “O alfabetismo não se limita pura e  simplesmente  à  posse  individual  de  habilidades  e  conhecimentos;  implica  também  e  talvez  principalmente,  um  conjunto  de  práticas  sociais  associadas  com  a  leitura  e  a  escrita, efetivamente exercida por pessoas em um contexto social específico” (SOARES,  1998, p.10). 

Tfouni (1995) enfatiza o aspecto individual da alfabetização e registra, com ênfase,  o  aspecto  social  do  letramento.  Aponta  que  “a  alfabetização,  enquanto  processo  individual, não se completa nunca, visto que a sociedade está em contínuo processo de  mudança,  e  a  atualização  individual  para  acompanhar  essas  mudanças  é  constante”  (TFOUNI, 1995, p.15). 

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Desse modo, a prática de alfabetização, buscando o letramento, deve considerar  não  somente  o  processo  individual,  mas  também  o  social,  pois  este  não  se  refere  somente ao “estado” ou à “condição” do sujeito, mas a maneira como a leitura e a escrita  são praticadas nos diferentes contextos. 

Também  para  a  autora,  letrado  é  quem  se  apropria  da  escrita,  que  adquire  condições ou estado de apropriar‐se da leitura e escrita, incorporando as práticas sociais,  já que alfabetizado é aquele que apenas lê e escreve.  É um equívoco afirmar que todos os conceitos de letramento são iguais, contudo o  processo social do letramento é um ponto que ambas as autoras apontam.  Observando ainda, os conceitos de letramento, pode‐se dizer que o analfabetismo  pode ser designado aos que não sabem ler e escrever como também àqueles que leem e  escrevem, mas não sabem fazer uso da leitura e escrita, não respondem às exigências que  a sociedade faz continuamente. 

Para  que  o  professor  alfabetizador  possa  intervir  e  planejar  estratégias  que  permitam  avanços,  reestruturação  e  ampliação  do  conhecimento,  já  estabelecido  pelo  grupo,  é  necessário  que  conheça  o  nível  efetivo  das  crianças,  ou  seja,  as  suas  descobertas,  hipóteses,  informações,  crenças,  opiniões,  enfim,  suas  teorias  acerca  do  mundo em que vivem. Este deve ser o ponto de partida para uma relação de diálogo com  as crianças, através da qual elas expressarão aquilo que já sabem. Alfabetizar visando o  letramento  não  significa  considerar  somente  as  dimensões  técnicas  de  “leitura”  e  “escrita”,  mas  também  a  apropriação  das  representações  e  das  demandas  que  se  constituem em torno dessa leitura. 

 

2.3 Alfabetização como desafio 

O trabalho do professor alfabetizador requer conhecimento sobre os processos de  como  a  criança  aprende  a  ler  e  a  escrever  o  por  isso  essa  é  uma  temática  discutida,  problematizada e pesquisada pelos educadores, mas ainda tem questões especificas que  acontecem  no  contexto  da  sala  de  aula  que  não  tem  respostas  se  tornando  assim  um 

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Nos  dias  de  hoje  é  um  desafio  alfabetizar,  onde  a  mídia  traz  inúmeras  novidades e a escola não é tão atraente, Também há muita desestrutura  familiar e desrespeito com o educador (P11). 

Para  alfabetizar  nos  dias  de  hoje  se  torna  um  desafio,  fazer  com  que  a  criança aprenda é gratificante.Alfabetizar é poder envolver o aluno num  todo (P16). 

Tem momentos que acontecem coisas na minha sala de aula que eu não  sei  como  resolver,  converso  com  os  colegas,  procuro  ler,  mas  não  encontro solução (P9). 

 

Diante  dos  desafios  colocados  é  necessário  compreender  que  a  função  social  da  escola é trabalhar o conhecimento que foi historicamente produzido, e para aprender a  ler e escrever a criança precisa conhecer sobre funcionamento do sistema de escrita, e da  leitura, e para sua aquisição é preciso pensar sobre ela e compreendê‐la, eis um grande  desafio para o professor no processo de alfabetização.  

 Nesse  sentido  é  importante  ressaltar  a  importância  do  professor  organizar  o  trabalho  com  as  crianças  numa  perspectiva  de  trabalhar  a  linguagem  social,  real  que  tenha sentido e significado. Oliveira, acerca desta questão, reconhece que:  

 

É de fundamental importância que, desde o início, a alfabetização se dê  num contexto de interação pela escrita. Por razões idênticas, deveria ser  banido  da prática  alfabetizadora todo  e qualquer  discurso (texto,  frase,  palavra,      “exercício”)  que  não  esteja  relacionado  com  a  vida  real  ou  o  imaginário  das  crianças,  ou  em  outras  palavras,  que  não  esteja  por  elas  carregado de sentido (OLIVEIRA, 1998, pp. 70‐71). 

 

Ensinar e aprender a ler e escrever com métodos tradicionais utilizando cartilhas é  possível,  entretanto  percebe‐se  que  tal  encaminhamento  leva  à  mera  codificação  e  decodificação  reduzindo  o  processo  de  alfabetização  a  um  processo  mecânico  e  descontextualizado.  

Porém  a  necessidade  de  aprender  a  ler  e  a  escrever  não  é  igual  para  todas  as  crianças  que  chegam  a  escola,  pois  a  heterogeneidade  é  uma  categoria  que  precisa  ser  considerada,  as  diferenças  estão  presentes  no  contexto  da  sala  de  aula.  Rego  destaca  que: 

A heterogeneidade, característica presente em qualquer grupo humano,  passa a ser vista como um fator imprescindível para as interações na sala  de aula. Os diferentes ritmos, comportamentos, experiências, trajetórias 

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pessoais, contextos familiares, valores e níveis de conhecimento de cada  criança   (e do professor)   imprimem ao cotidiano escolar a possibilidade  de troca, de repertórios, de visão de mundo, confrontos, ajuda mútua e  consequente ampliação das capacidades individuais  (REGO, 1995,p 88).     No processo de aquisição da linguagem oral e escrita a criança não é um sujeito  vazio  ela  traz  conhecimentos  socialmente  construídos,  marcas  de  leitura  e  de  escrita  vivenciadas  anteriormente,  para  o  ambiente  escolar  que  devem  ser  ampliadas  e  não  rejeitadas.  A  criança,  quando  chega  à  escola,  é  um  sujeito  que  já  sabe  determinadas  coisas, pois faz parte de um grupo sociocultural que fornece situações de cultura, como  valores, ideias, conceitos e formas de agir. Pois como afirma Luria, 

 

se apenas pararmos para pensar na surpreendente rapidez com que uma  criança aprende esta técnica extremamente complexa, que tem milhares  de  anos  de  cultura  por  traz  de  si,  ficará  evidente  que  isto  só  pode  acontecer  porque  durante  os  primeiros  anos  de  seu  desenvolvimento,  antes  de  atingir  a  idade  escolar,  a  criança  já  aprendeu  e  assimilou  um  certo número de técnicas que prepara o caminho para a escrita, técnicas  que  a  capacitam  e  que  tornam  incomensuravelmente  mais  fácil    de  aprender o conceito e a técnica da escrita  (LURIA,  1988, p.143). 

 

O  processo  de  apropriação  da  escrita  não  acontece  da  mesma  forma,  tampouco  ao mesmo tempo para toda criança, pois algumas delas tem acesso à televisão, internet,  jornais revistas, livros, tem acesso à leitura e a escrita muito antes de chegar na escola,  mas é necessário registrar também que ainda tem crianças que o primeiro contato com a  leitura e a escrita acontece somente na escola.  Vygotsky enfatiza que o ensino deve ser organizado de tal forma, que a leitura e a  escrita se tornem necessárias às crianças.    

 [….]    a  escrita  deve  ter  significado  para  as  crianças,  de  que  uma  necessidade  intrínseca  deve  ser  despertada  nelas  e  a  escrita  deve  ser  incorporada  a  uma  tarefa  necessária  e  relevante  para  a  vida.  Só  então  poderemos estar certos de que ela se desenvolverá não como hábito de  mão e dedos, mas como uma forma nova e complexa de linguagem [….]  o  que  se  deve  fazer  é  ensinar  às  crianças  a  linguagem  escrita,  e  não  apenas a escrita de letras (VYGOTSKY, 1991, p. 133‐134). 

 

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3 Considerações finais 

As  concepções  que  permeiam  as  práticas  pedagógicas  dos  professores  alfabetizadores  apontam  para  diferentes  formas  de  compreender  como  acontece  o  processo de aquisição da linguagem oral e escrita. Ainda é muito presente a compreensão  da necessidade do aluno memorizar letras, sílabas e palavras soltas. Também aparece a  compreensão do processo da aquisição da linguagem oral e escrita como prática social. 

É  possível  perceber  que  existe  interesse  em  compreender  a  alfabetização  comprometida  com  uma  concepção  de  linguagem  que  leve  em  conta  não  apenas  o  aspecto  material  da  língua,  mas  também  todos  os  significados  resultantes  do  uso  da  linguagem em situações reais de interação social. 

 O  processo  de  aquisição  da  linguagem  oral  e  escrita,  dessa  forma,  resultará  das  relações sociais oportunizadas pelo professor e seus alunos no ambiente escolar. Desse  modo,  contemplar  a  dimensão  discursiva  da  linguagem  no  processo  de  alfabetização  implica o uso e a realização efetiva da linguagem em situações diversas do cotidiano. 

Trabalhar a alfabetização na perspectiva do letramento constitui um desafio para  o professor, pois requer mudanças significativas acerca das concepções que norteiam a  prática  pedagógica  e  por  isso  é  necessário  um  processo  de  formação  continuada  discutindo questões teórico‐metodológicas em torno da alfabetização e do letramento na  perspectiva de uma aprendizagem significativa, de modo que o professor explore, na sala  de aula, diferentes usos e funções sociais da leitura e da escrita, a fim de formar leitores e  escritores proficientes.    

 Referências  

FREIRE, Paulo. Política e educação. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 1995. (coleção questões de  nossa época; v.23).  

 ______.  A  importância  do  ato  de  ler:  em  três  artigos  que  se  completam.  32ª  ed.  São  Paulo: Cortez, 1996. 

______. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo; Paz  e Terra, 1999. 

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______.  Ação  cultural  para  a  liberdade  e  outros  escritos.  10ª  ed.  São  Paulo:  Paz  e  Terra,  2002. 

LEITE, Sérgio Antônio da Silva (Org.). Alfabetização e Letramento: contribuições para as  práticas pedagógicas. S. Campinas: Komedi: arte escrita., 2001. 

LURIA,  Alexander  Romanovich.  Pensamento  e  linguagem:  as  últimas  conferências  de  Luria. Porto Alegre: Artes Médicas, 1983. 

LURIA,  A.  R.  O  desenvolvimento  da  escrita  na  criança.  In:  VYGOTSKY,  L.  S.  et  al.  Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Ícone/EDUSP, 1988.  

LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli Elisa D. A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas.  São Paulo: EPU, 1986. 

KLEIMAN,  Ângela  (org.).  Os  Significados  de  Letramento:  uma  nova  perspectiva  sobre  a  prática social da escrita. Campinas – SP: Mercado de Letras, 1995. 

OLIVEIRA,  Anne  Marie  M.  :  “A  formação  de  professores  alfabetizadores:  lições  da  prática”. In: GARCIA, Regina L. Alfabetização dos alunos das classes populares. São Paulo:  Cortez, 1998. 

REGO,  Teresa  Cristina.  Vygotsky:  uma  perspectiva  histórico‐cultural  da  educação.   Petrópolis: Vozes, 1995. 

SOARES,  Magda  Becker.  Letramento:  um  tema  em  três  gêneros.  Belo  Horizonte:  Autêntica, 1998. 

TFOUNI,  Leda  Verdiani.  Letramento  e  Alfabetização.  São  Paulo:  Cortez.  Questões  da  nossa época; v. 47, 1995. 

VYGOTSKY,  L.  A  formação  social  da  mente:  o  desenvolvimento  dos  processos  psicológicos superiores. São Paulo: Martins Fontes, 1991. 

Referências

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