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PARECER. Relatório DIVULGAÇÃO DE PARECER DO CONSELHO CONSULTIVO N.º 26/ CC /2017

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N .Z 00 .0 7 • R ev is ão : 0 4 • D at a: 2 4-01 -2 01 7 PARECER Relatório

1. Através da AP. 7.. de 2017/01/25 foi peticionado, na Conservatória do Registo Predial de ...., um registo de aquisição a favor do Município de ...., a incidir sobre o prédio descrito na ficha n.º 4260/20160617, freguesia de .... (S…), concelho de ...

1.1. Trata-se de um prédio urbano composto de Parcela de terreno onde se encontra implantada a ETAR (Estação de Tratamento de Águas Residuais) da Quinta das …., que foi destacado do prédio n.º 1157/19921105 da freguesia de .... (S...), com inscrição de aquisição a favor de ...– Gestão e Investimentos Imobiliários, S.A. (AP. .. de 2002/09/16); inscrição de declaração de insolvência com trânsito de 2 de maio de 2012 (AP. 9.... de 2016/02/19); e inscrição de ónus de não fracionamento (AP. 33.. de 2016/06/17).

1.2. Para o registo de aquisição solicitado, para além da caderneta predial urbana, juntou-se uma escritura de doação em que: são intervenientes o Administrador Judicial do processo de insolvência de ...– Gestão e Investimentos Imobiliários, S.A., resultando do título que tem poderes para o ato, qualidade e poderes que se verificaram por duas certidões, sendo uma emitida pelo Tribunal da Comarca de … e outra pelo Tribunal do Comércio de …, e o Vereador da Câmara Municipal de ...., em representação do concernente Município, qualidade e poderes que se verificaram, respetivamente, por certidão da ata de instalação da Câmara Municipal e por certidão do despacho de delegação de competências; o primeiro faz doação ao segundo do prédio urbano supra identificado, onde se encontra implantada a ETAR; e o segundo aceita, para o seu representado, a doação, nos termos exarados.

DIVULGAÇÃO DE PARECER DO CONSELHO CONSULTIVO N.º 26/ CC /2017

N/Referência: P.º R. P. 28/2017 STJSR-CC Data de homologação: 07-06-2017

Recorrente: Município de …

Recorrido: Conservatória do Registo Predial de ....

Assunto: Escritura pública de doação efetuada por administrador da insolvência – Recusa por manifesta nulidade do facto – Admissibilidade do ato como provisório por dúvidas por a nulidade não ser manifesta.

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2. O registo de aquisição foi recusado por se entender que é manifesta a nulidade do facto [artigo 69.º, n.º 1, d) do Código do Registo Predial (CRP)]. A justificação para a recusa, que se retira do despacho de qualificação, é a seguinte: Determina o artigo 158.º do CIRE (Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas) [...] que o administrador da insolvência procede à venda de todos os bens apreendidos para a massa insolvente. A finalidade do processo de insolvência, nesta fase, é a liquidação do património do devedor insolvente e a repartição do produto obtido pelos credores. No que se refere à modalidade da alienação, o Sr. Administrador pode optar por qualquer das que são admitidas em processo executivo, como determina o artigo 164.º do mencionado Código e artigo 811.º e seguintes do Código de Processo Civil. No processo de insolvência em causa, o Sr. Administrador procedeu à venda, em escritura pública (posteriormente registada a coberto da Ap. … de 2012/12/04) de vários lotes de terreno, cuja área loteada também foi desanexada do prédio 1157/S....

3. Notificado, em 20/02/2017, do despacho de recusa, veio, o Município de ...., representado pelo respetivo Presidente da Câmara Municipal, interpor recurso hierárquico, em 17/03/2017, com os fundamentos que se dão aqui por integralmente reproduzidos, juntando uma série de documentos que não foram reunidos aquando do pedido de registo de aquisição.

3.1. Em resumo, alega que a Sr.ª Conservadora parece ter olvidado a natureza pública do requerente em causa e do bem cuja inscrição se requereu; que estamos perante um bem que deverá qualificar-se como um prédio onerado com uma obrigação de prestação de facto prevista e regulada pelo direito público, e que pela sua própria natureza não poderá deixar-se de considerar afeto a uma satisfação de interesses públicos; que o prédio cuja inscrição se requereu corresponde a uma Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) que se encontra em funcionamento desde 2008; que no Alvará de Loteamento n.º 12/2002 constava a obrigação do loteador de proceder à construção da ETAR e respetivo licenciamento junto das entidades competentes, tratando-se, portanto, de um prédio cedido ao abrigo do artigo 44.º do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação (RJUE); que (no Loteamento) não foram expressamente declaradas as áreas a integrar o domínio público do Município para esse efeito, pois a obrigação de construção decorreu de uma compensação ao abrigo do n.º 4 do artigo 44.º do RJUE; que, apesar de a ETAR se encontrar inscrita a favor de um ente privado, o prédio deve considerar-se como onerado com uma obrigação de natureza pública que o coloca, naturalmente, fora do comércio jurídico; que o Auto de Apreensão junto pelo Sr. Administrador da insolvência considerou que a verba 228, por corresponder a uma ETAR, não era suscetível de apreensão, tendo-lhe sido atribuído o valor de 0,00€; que a comissão de credores decidiu que o Sr. Administrador da insolvência teria poderes bastantes para proceder à escritura de cedência da ETAR ao Município de ....; que não existem vendas por 0,00€; e que o preceito a aplicar do CIRE deveriam ser o artigo 172.º, n.º 1, conjugado com os artigos 46.º, n.º 1 e 51.º, n.º 1, alínea i);

3.2. Reconhece, no entanto, que da requisição de registo não é possível extrair o acervo factual que foi agora carreado no presente, não sendo possível descortinar qual a afetação que este Município pretendia atribuir ao prédio cuja inscrição se requeria, considerando que devem assim suprir-se as deficiências da requisição de registo ao abrigo do artigo 73.º, n.º 1, do CRP.

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3.3. Termina por requerer que se julgue o recurso hierárquico procedente, promovendo [i] a inscrição, nos termos já requeridos, do prédio 4260/S... a favor do Município de ...., de modo a permitir a sua posterior afetação ao domínio público nos termos da alínea q) do n.º 1 do artigo 25.º do anexo I da Lei n.º 75/2013, de 12 de Setembro, ou, em alternativa, [ii] inscrição do aludido prédio a favor do Município de ...., nos termos já peticionados, com averbamento à inscrição de que o mesmo, pela sua natureza e fim público, integrou automaticamente o domínio público municipal.

4. Perante o requerimento de recurso hierárquico, a Sr.ª Conservadora sustentou a decisão, em despacho, tal como previsto no artigo 142.º-A, n.º 1, do CRP, mas remetendo a fundamentação para o despacho de recusa. 5. O processo é o próprio, as partes têm legitimidade e o recurso é tempestivo, mas há uma questão processual que importa resolver previamente.

QUESTÃO PROCESSUAL

1. Com o requerimento de recurso hierárquico, o Recorrente juntou uma série de documentos, isto é, documentos que não foram apensados aquando do pedido de registo de aquisição, designadamente, o alvará de loteamento n.º 12/2002; o projeto de licenciamento da ETAR; a Declaração de Intenções da ...– Gestão e Investimentos Imobiliários, S.A. no que se refere à transferência do terreno, onde se encontra construída a ETAR, para o domínio da Câmara Municipal; a certidão do Processo de Insolvência da ...– Gestão e Investimentos Imobiliários, S.A., de onde consta o auto de apreensão dos imóveis; e a ata da reunião da Comissão de Credores onde se deliberou a cedência do lote da ETAR ao Município de ....;

1.1. Contudo, o recurso hierárquico previsto e regulado nos artigos 140.º e seguintes do CRP é de revisão ou de reponderação da decisão recorrida, e não de reanálise do pedido, pelo que a entidade ad quem só poderá utilizar na sua apreciação os documentos que foram apresentados com o pedido (escritura pública de doação e caderneta predial) acrescidos dos que à conservatória era possível aceder nos termos do artigo 73.º.

1.2. É esse um entendimento firmado no Conselho Consultivo (anterior Conselho Técnico), podendo ler-se no Processo R. P. 168/2008 SJC-CT (pp. 4 a 5): O que daqui decorre [do n.º 3, do artigo 142.º-A do CRP] é evidentemente a obrigatoriedade, para a entidade recorrida, de facultar à entidade ad quem a plenitude dos elementos documentais a cujo conteúdo efetivamente atendeu no processo de formação da decisão impugnada. Afora aqueles cuja “produção” se inscreve na sua própria esfera de competência – v.g., certidões ou cópias devidamente certificadas da situação registral relevante –, tais documentos não podem senão ser, tão-só e apenas, os que concretamente tenham sido apresentados pelo interessado em suporte da pretensão de acesso ao registo que deduziu, acrescidos dos que à conservatória era possível e lícito aceder nos termos do art. 73.º (cfr. arts. 60.º/1 e 43.º). O que significa estar vedado ao recorrente, em ordem a obter a substituição da decisão de que discorda por outra que julgue devida, adicionar aos autos elementos documentais a que a entidade recorrida não

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teve nem poderia ter tido em conta na elaboração da sua decisão. Se no momento próprio se omitiu a apresentação de determinado documento que, na perspetiva do interessado, não fora a omissão, permitiria fazer o registo nos termos pretendidos, pois bem, pelas consequências da omissão – seja a recusa propriamente dita, seja uma qualquer provisoriedade não peticionada e, por isso, não esperada – só a si mesmo, ou a quem para o efeito tenha mandatado, poderá esse interessado pedir responsabilidades. O que não pode é acusar-se a entidade recorrida de decidir mal por não ter tido em conta o conteúdo de documento que na altura própria lhe não foi presente. Em suma: é no âmbito e no tempo próprios do processo de registo que os interessados terão que cumprir o ónus de para ele carrear todos os documentos que reputem necessários à obtenção de um juízo de viabilidade de sinal positivo. Depois disso, será tarde de mais.1

1.3. Ora, o Recorrente, no requerimento de recurso hierárquico, peticiona que todo o acervo factual carreado para o recurso se utilize agora para suprir as deficiências da requisição de registo ao abrigo do artigo 73.º, n.º 1, do CRP. Mas, como vimos, no que concerne aos documentos novos, não podem ser considerados em sede de recurso, o que determina o seu desentranhamento dos autos.

1.4. Quanto ao documento que à conservatória, em princípio, seria possível e lícito aceder nos termos do artigo 73.º do CRP – a certidão judicial do processo de insolvência, arquivada junto à AP. 9.... de 2016/02/19, onde o prédio em questão é relacionada como verba 228, como sendo uma ETAR, não suscetível de apreensão, e identificada com o valor de 0,00€ – somente se da apreciação do processo se confirmar que a sua utilização poderia suprir a deficiência constante do processo, será este tido em conta em sede de recurso.

1.5. Com efeito, como já se disse, a aplicação do procedimento de suprimento de deficiências previsto e regulado no artigo 73.º do CRP só será aceitável se visar a qualificação positiva de um determinado registo.

APRECIAÇÃO

1. O administrador da insolvência é o primeiro dos órgãos da insolvência que surge indicado no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE)2-3, nos artigos 52.º e seguintes. Como resulta do artigo 2.º, n.º

2, do Estatuto do Administrador Judicial (EAJ)4, é um administrador judicial, sendo a pessoa incumbida da

1 No mesmo sentido o Processo R.P. 60/2014, STJ-CC. Todos os Processos a que fizermos referência estão disponíveis em http://www.irn.mj.pt/sections/irn/doutrina/pareceres/predial/.

2 Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março e que foi objeto de alteração pelos diplomas seguintes: Decreto-Lei n.º 76-A/2006,

de 29-03; Decreto-Lei n.º 282/2007, de 07-08; Decreto-Lei n.º 116/2008, de 04-07; Decreto-Lei n.º 185/2009, de 12-08; Lei n.º 16/2012, de 20-04; Lei n.º 66-B/2012, de 31-12 e o Decreto-Lei n.º 26/2015, de 06-02.

3 O normativo a que nos referirmos sem referência ao diploma legal respetivo, pertence ao CIRE. 4 Constante da Lei n.º 22/2013, de 26 de fevereiro.

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fiscalização e da orientação dos atos integrantes do processo especial de revitalização, bem como da gestão ou liquidação da massa insolvente no âmbito do processo de insolvência, sendo competente para a realização de todos os atos que lhe são cometidos pelo referido estatuto e pela lei.

1.1. O administrador da insolvência assume funções imediatamente depois de notificado da sua nomeação (artigo 54.º). As suas tarefas são numerosas, variando naturalmente segundo o curso do processo. Daí que seja um administrador “da insolvência” e não apenas um administrador “da massa” 5.

1.2. Em regra6, um dos efeitos da declaração de insolvência é o de passarem a competir ao administrador da

insolvência os poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente (artigo 81.º, nºs 1 e 2). O insolvente perde assim a posse material e as faculdades de administração e disposição, quer dos bens que possui aquando da declaração de insolvência, quer dos bens e rendimentos que de futuro lhe advenham (artigo 46.º).

1.2.1. Esta privação, salienta LUÍS MENEZES LEITÃO, só não se estende a bens excluídos da massa insolvente, como os bens impenhoráveis7 ou os abrangidos por uma separação de patrimónios, em relação aos quais o

devedor conserva a liberdade de disposição8. Logo, o insolvente pode praticar atos de administração e de

disposição dos seus bens que não tenham sido aprendidos para a massa insolvente.

1.2.2. Na verdade, PEDRO PAIS DE VASCONCELOS, encarando o administrador não apenas como um liquidador mas também como um administrador da massa insolvente, defende uma gestão da massa que ultrapasse as práticas defensivas e envolva uma atividade de prossecução ativa do fim lucrativo e da gestão empresarial e proactiva da

5 Cfr. ALEXANDRE DE SOVERAL MARTINS, Um curso de Direito da Insolvência, Coimbra: Livraria Almedina, 2016, 2.ª Ed. Revista e Atualizada,

p. 230.

6 Temos de ressalvar o disposto no Título X, isto é, nos artigos 223.º e seguintes, onde se estabelecem os termos em que a administração

da massa insolvente pode ser atribuída ao devedor, quando esteja em causa uma empresa. Para outros desvios ao regime comum previsto no artigo 81.º vide LUÍS A.CARVALHO FERNANDES e JOÃO LABAREDA, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 3.ª

Edição, Lisboa: Quid Juris, 2015, p. 411.

7 Cfr. artigo 17.º e 736.º a 738.º do Código de Processo Civil.

8 Cfr. LUÍS MANUEL TELES DE MENEZES LEITÃO, Direito da Insolvência Coimbra: Livraria Almedina, 2015, 6.ª Edição, pp. 152 e ss.

No mesmo sentido, LUÍS A.CARVALHO FERNANDES e JOÃO LABAREDA, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, cit., p.

412: “A contrario sensu”, quanto aos bens patrimoniais não incluídos na massa insolvente, o devedor mantém os seus poderes de administração e disposição.

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empresa. Entende que o administrador da insolvência deve adotar uma atitude e uma prática empresarial numa ótica de continuação do funcionamento da empresa, ainda que com substituição do empresário9.

1.2.3. De modo a que o administrador proceda à administração da massa insolvente e à liquidação e repartição pelos credores do respetivo produto final, a lei atribui-lhe especificamente diversas competências, para além das que estão identificadas nas alíneas a) e b) do artigo 55.º10. Somente a título de exemplo, vejam-se: o artigo 41.º,

n.º 2, que atribui ao administrador a possibilidade de contestar os embargos interpostos contra a sentença de declaração de insolvência; o artigo 55.º, n.º 8, que lhe confere poderes para desistir, confessar ou transigir, mediante concordância da comissão de credores, em qualquer processo judicial em que o insolvente, ou a massa insolvente, sejam partes; os artigos 102.º e seguintes, os quais dão competências ao administrador da insolvência, relativamente aos destinos dos negócios jurídicos celebrados pelo insolvente que ainda não estejam totalmente cumpridos aquando da declaração de insolvência, para optar pela sua execução ou pela recusa do cumprimento; os artigos 123.º e seguintes, podendo o administrador determinar a resolução em benefício da massa de certos negócios celebrados pelo insolvente; e os artigos 158.º, n.º 1 e 164.º, n.º 1, que conferem ao administrador da insolvência, no âmbito da liquidação, a competência para este proceder à venda dos bens, escolhendo a modalidade de venda mais conveniente.

1.2.4. Como quer que seja, por força do artigo 12.º, nºs 1 e 2 do EAJ, o administrador deve servir a justiça e o direito e atuar com absoluta independência e isenção, estando-lhe vedada a prática de quaisquer atos que, para seu benefício ou de terceiros, possam pôr em crise, consoante os casos, a recuperação do devedor, ou, não sendo esta viável, a sua liquidação, devendo orientar sempre a sua conduta para a maximização da satisfação dos interesses dos credores em cada um dos processos que lhes sejam confiados.

1.2.5. Com efeito, conforme decorre da primeira parte do n.º 1 do artigo 55.º, são muitas as tarefas que lhe são cometidas, as quais poderão ser diferentes de processo para processo, diferindo ainda consoante os bens integrem a massa insolvente ou estejam dela excluídos11.

1.3. No âmbito do poder de disposição não se aplicam ao administrador da insolvência as limitações do devedor estabelecidas por decisão judicial ou administrativa, ou impostas por lei apenas em favor de pessoas determinadas (81.º, n.º 3). A doutrina costuma exemplificar com a desnecessidade de intervenção do tutor ou curador se o

9 Cfr. PEDRO PAIS DE VASCONCELOS, “Responsabilidade civil do administrador da insolvência”, II Congresso do Direito da Insolvência (coord.

CATARINA SERRA), Coimbra: Livraria Almedina, 2014, pp. 192-193.

10 Sobre as funções do administrador da insolvência vide LUÍS MANUEL TELES DE MENEZES LEITÃO, op. cit., pp. 108-110.

11 Como se concluiu no C. P. 74/2013 STJ-CC, Os poderes do administrador da insolvência para liquidar os bens integrantes da massa

insolvente compreendem também todos os atos cuja prática se mostre indispensável para o sucesso da operação, entre os quais podem figurar, designadamente, os pedidos de averbamento à descrição dos prédios que componham a massa insolvente, visto que se traduzem, afinal, em atos instrumentais da liquidação em causa.

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insolvente tiver sido declarado interdito [artigos 138.º e ss. do Código Civil (CC)] ou inabilitado (artigos 152.º e ss. do CC) ou a dispensabilidade do consentimento para os atos de alienação de bens a filhos ou netos (artigo 877.º do CC) ou para a alienação de imóveis próprios ou comuns quando o insolvente é casado (1682.º-A, n.º 1, do CC). 1.4. Por conseguinte, o suprimento das limitações dos poderes de que o devedor é privado (por força dos nºs 1 e 2 do artigo 81.º) faz-se por via da representação12. O artigo 81.º, n.º 4, atribui, assim, ao administrador

da insolvência a representação do devedor para todos os efeitos de caráter patrimonial que interessem à insolvência, contudo, por força da ressalva constante do n.º 5 do artigo 81.º, a representação não abrange a intervenção do devedor no próprio processo de insolvência, seus incidentes e apensos.

1.4.1. LUÍS A. CARVALHO FERNANDES e JOÃO LABAREDA, expressam que a fórmula do n.º 4 tem um alcance que vai muito para além do que o suprimento das limitações dos poderes do insolvente exige. Daí o número seguinte. De todo o modo, está excluída a representação, pelo administrador, para efeitos de caráter pessoal13.

1.5. O administrador da insolvência exerce as suas funções sob a fiscalização da comissão de credores, se existir, da assembleia de credores e do juiz. Com base na informação que é prestada pelo próprio administrador (artigo 55.º, n.º 4) a comissão de credores fiscaliza a sua atividade (artigos 55.º, n.º 1, proémio, e 68.º). A fiscalização do juiz decorre do artigo 58.º e abrange toda a atividade do administrador da insolvência, podendo conduzir à destituição (artigo 56.º). Verificados determinados pressupostos pode o juiz decidir que certas alienações não poderão ter lugar (artigos 158.º, n.º 4 e 161.º, n.º 5; cfr., porém, o artigo 163.º). Por fim, o artigo 79.º prevê a possibilidade de a assembleia de credores solicitar informação sobre quaisquer assuntos compreendidos no âmbito das suas funções.

1.5.1. Mas, na verdade, o administrador da insolvência exerce os atos de administração e, essencialmente, os atos de liquidação da massa, sem necessidade permanente do consentimento dos outros órgãos, podendo, no entanto, ser responsabilizado pessoalmente perante os credores. Por um lado, a determinação da modalidade da venda é-lhe confiada em exclusivo (artigo 164.º, n.º 1) e, por outro lado, não depende, em regra, de ninguém mais para promover a liquidação nas suas diversas manifestações14.

12 Para MARIA DO ROSÁRIO EPIFÂNIO, estamos antes perante uma substituição do insolvente uma vez que constitui função do administrador

da insolvência a prossecução dos interesses da massa insolvente e não do próprio insolvente. In Manual de Direito da Insolvência, 5.ª Edição, Coimbra: Almedina, 2013, p. 105.

13 Cfr. LUÍS A.CARVALHO FERNANDES e JOÃO LABAREDA, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, cit., p. 413.

Também LUÍS MANUEL TELES DE MENEZES LEITÃO, op. cit., p. 153, acentua que o administrador da insolvência não pode pretender representar

o insolvente em relação a atos, que embora com incidência patrimonial, têm natureza pessoal, como o casamento, o divórcio ou o testamento. Contudo, para o Autor, essa representação deve abranger o ato de partilha ou a aceitação ou repúdio de heranças.

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1.5.2. Todavia, no âmbito da liquidação, o artigo 161.º estabelece os limites da autonomia do administrador da insolvência, ao relacionar uma série de atos cuja prática deve ser precedida do consentimento da comissão de credores, quando exista, ou de deliberação favorável da assembleia de credores. No que se refere à eficácia dos atos, determina o artigo 163.º que a falta de aquiescência não prejudica a eficácia dos atos do administrador da insolvência, exceto se as obrigações por ele assumidas excederem manifestamente as da contraparte.

2. Por força do artigo 2.º, n.º 1, alínea n), do CRP a declaração de insolvência é facto sujeito a registo predial, a efetuar com base nos documentos previstos no artigo 38.º, relativamente aos bens que integram a massa insolvente.

2.1. O que quer significar que o prédio cuja alienação está em causa no presente recurso hierárquico, em face do registo, integra a massa insolvente. O prédio descrito na ficha n.º 4260/20160617, freguesia de .... (S...), concelho de .... contém inscrição de declaração de insolvência com a AP. 9.... de 2016/02/1915.

2.2. Assim sendo, isto é, integrando o prédio a massa insolvente, por força do artigo 81.º, n.º 1, citado, competem ao administrador da insolvência os poderes de administração e disposição [artigos 55.º, n.º 1, a) e 158.º, n.º 1, e 164.º] sobre esse bem. Em consequência da privação daqueles poderes, o insolvente passa a ser representado pelo administrador da insolvência para todos os efeitos de caráter patrimonial que interessem à insolvência. 2.3. Sucede que o administrador da insolvência não procedeu à venda do bem, com escolha da modalidade da alienação, antes representou/substituiu a empresa insolvente numa doação do bem ao Município de ...

15 Por outro lado, a sua identificação como ETAR na descrição, não pode conduzir, de imediato, à sua assimilação como bem pertencente

ao domínio público e, logo, à sua insusceptibilidade para constituir objeto de relações jurídicas privadas e à sua absoluta impenhorabilidade. Como resulta do artigo 14.º do Regime Jurídico do Património Imobiliário Público (RJPIP), constante do Decreto-Lei n.º 280/2007, de 07-08, Os imóveis do domínio público são os classificados pela Constituição ou por lei, individualmente ou mediante a identificação por tipos. Para ANA RAQUEL GONÇALVES MONIZ, O Domínio Público, O Critério e o Regime Jurídico da Dominialidade, Coimbra: Almedina, 2006, pp.

114 e ss., para uma caracterização atual do regime da dominialidade e da definição do conjunto de bens a ele submetidos cumpre recorrer ao resultante da própria Constituição, ao Decreto-Lei n.º 477/80, de 15 de outubro [que criou o inventário geral do património do Estado, que compreende o domínio público, o domínio privado e o património financeiro do Estado] e a diversos diplomas avulsos.

A partir da revisão efetuada em 1989, a Constituição passou a definir no artigo 84.º quais os bens que integram o domínio público. Extrai-se também do preceito constitucional a existência de um domínio público que resulta da Constituição (ex constitutione) a par de um domínio público como tal classificado por lei (ex lege), podendo o legislador ordinário conformar certos bens não previstos constitucionalmente ao regime do domínio público.

Certo é que por força do artigo 16.º do RJPIP, sempre que o interesse público subjacente ao estatuto da dominialidade de um imóvel não decorra direta e imediatamente da sua natureza, compete ao respetivo titular afetá-lo às utilidades públicas correspondentes à classificação legal.

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2.4. Mas, de facto, conforme ressalta do artigo 1.º, o processo de insolvência tem como finalidade a satisfação dos credores pela forma prevista num processo de insolvência, baseado, nomeadamente, na recuperação da empresa compreendida na massa insolvente, ou, quando tal não se afigure possível, na liquidação do património do devedor insolvente e a repartição do produto obtido pelos credores;

2.5. E, apesar de a liquidação comportar a realização de atos de outro tipo, que não se reconduzem à venda de bens – como afirmam LUÍS A. CARVALHO FERNANDES e JOÃO LABAREDA16, quando se referem a atos como os que

respeitam à decisão sobre negócios não cumpridos e os de cobrança de créditos de que a massa é titular – o que é certo é que uma doação é uma liberalidade, um ato gratuito, que constitui fonte de empobrecimento para o património de um dos sujeitos, o doador, e de enriquecimento para o património de outro, o donatário17, pelo que

é evidente o seu caráter contrário à finalidade da insolvência.

2.6. Assim, perante uma escritura como a que foi apresentada a registo, com intervenção do administrador da insolvência, considerando que o ato poderá ser contrário à finalidade da insolvência, será adequado efetuar o registo como provisório por dúvidas até que se comprove, designadamente, que o ato resulta do cumprimento de um encargo a que se vinculou a sociedade insolvente, ao invés de se recusar por manifesta nulidade do facto18.

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Em conformidade, propomos o deferimento parcial do recurso e formulamos a seguinte,

CONCLUSÃO

Se no âmbito de um processo de insolvência, o administrador da insolvência, em representação/substituição da sociedade insolvente, intervém como doador numa escritura pública de doação a terceiro, por estar em causa uma liberalidade, um ato gratuito, é evidente o caráter contrário do ato à finalidade do processo de insolvência, pelo que o registo do facto deverá ser efetuado como provisório por dúvidas até que se comprove, designadamente, que o ato resulta do cumprimento de um

16 LUÍS A.CARVALHO FERNANDES e JOÃO LABAREDA, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, cit., p. 605. 17 Cfr. INOCÊNCIO GALVÃO TELLES, Manual dos Contratos em Geral, 4.ª Ed., Reimpressão, Coimbra: Coimbra Editora, p. 481.

18 É que a nulidade, a existir, perante o título apresentado, não é manifesta, como o exige o artigo 69.º, n.º 1, alínea d) do CRP. Sobre o

ponto, cfr. J.A.MOUTEIRA GUERREIRO, Noções de Direito Registral (Predial e Comercial), 2.ª Edição, Coimbra: Coimbra Editora, 1994, pp.

150-151.

Em face do alegado pelo recorrente, mas não comprovado para o registo, a superação das dúvidas dependerá, precisamente, da demonstração de que o ato, que se denominou de doação, afinal, e substantivamente, não é doação nenhuma.

(10)

N .Z 00 .0 7 • R ev is ão : 0 4 • D at a: 2 4-01 -2 01 7

encargo a que se vinculou a sociedade insolvente.

Parecer aprovado em sessão do Conselho Consultivo de 25 de maio de 2017.

Blandina Maria da Silva Soares, relatora, Luís Manuel Nunes Martins, António Manuel Fernandes Lopes, Maria Madalena Rodrigues Teixeira.

Referências

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