Robinson Crusoé
Daniel Defoe
16
DANIEL DEFOE
Finalmente, depois de ter nadado várias vezes à volta do barco, descobriu uma corda pendurada na proa e, gra- ças a ela, trepou a bordo.
À popa do navio estava tudo enxuto e a água não tinha danificado muito as provisões. Pegou nalguns biscoitos e comeu-os; bebeu um largo trago de aguardente e sentiu- -se melhor e com mais forças para começar a trabalhar.
Primeiro, apanhou alguns barrotes de madeira e um ou dois mastaréus suplentes que estavam no convés. Pas- sou-os pela borda, segurando-os com uma corda, para impedir que fossem arrastados para longe. Em seguida,
atou todos os barrotes, de maneira a fazer uma jangada, colocando por cima bocados de tábua grossa, atraves- sados. Foi preciso ainda muito tempo até que a jangada tivesse a robustez necessária para poder transportar as coisas que desejava levar para terra.
Por fim, depois de muito trabalho, conseguiu carregar
três arcas de marinheiro, que arrombara e esvaziara, en-
chendo-as de pão, de arroz, de queijo e de toda a comida
que conseguiu encontrar, além de toda a espécie de obje-
tos que pensou poder vir a necessitar. Descobriu também
a caixa da ferramenta do carpinteiro e pô-la na jangada,
pois, de tudo o que havia no navio, nada pode- ria vir a ser-lhe mais útil.
Em seguida, tratou de procurar roupas por- que, enquanto estava a bordo, a maré subira e levara-lhe o casaco, o colete e a camisa, que deixara ficar na areia.
Também acarretou espingardas, pistolas,
pólvora e balas, bem como dois sabres ferru-
gentos.
seu lado, um grande suspiro, como o de alguém a sofrer, seguido de um som parecido com um murmúrio, mas com umas palavras que ele não distinguia, e, a seguir, no- vamente um profundo suspiro. Um suor frio espalhou-se pelo seu corpo. Recuou novamente, a tremer, mas decidi- do a não fugir, desta vez.
Levantando o archote acima da cabeça, olhou em vol- ta e viu, deitado no chão da caverna, um enorme bode velho, a exalar o último suspiro, aparentemente a morrer de simples velhice.
Tocou-lhe com a ponta do pé, para ver se ele saía da gruta, mas o pobre animal não se conseguiu levantar e Robinson deixou-o onde estava.
Assim que se restabeleceu do susto, observou cuida- dosamente à sua volta. A gruta era pequena — não tinha mais de quatro metros na sua parte mais larga — mas ele notou, a um canto, outra abertura. Contudo, era tão rente ao chão que teve de se arrastar para passar por ela. Ape- nas com a luz do archote, não conseguia ver até onde esta o conduzia, por isso, resolveu voltar noutra ocasião.
Há muito tempo que aproveitava a gordura das cabras que matava para fazer velas e, no dia seguinte, voltou à caverna com seis delas e o isqueiro para as acender. Nes- sa época, não havia fósforos e costumava-se fazer lume com uma pedra, aço e um pedaço de pavio, que pegava fogo com muita facilidade.
Ao entrar na caverna, viu que o bode já tinha morrido.
Afastou-o para o lado e decidiu enterrá-lo mais tarde. Pôs
as mãos e os joelhos no chão e arrastou-se cerca de nove
metros através da estreita passagem, até chegar a um
grande compartimento, cujo teto estava a uma altura de
seis metros. Por todos os lados, as paredes refletiam a luz
da sua vela e cintilavam como oiro ou diamantes. O chão
apresentava-se perfeitamente enxuto e plano e nem se-
quer havia humidade nas paredes. Robinson estava satis-
feito com a sua descoberta.
76
DANIEL DEFOE