• Nenhum resultado encontrado

UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE"

Copied!
121
0
0

Texto

(1)

INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO RIO GRANDE DO NORTE - IFRN

JONATHAN DIÓGENES COSTA

DESENHOS QUE ENSINAM SOBRE O PASSADO: A APLICABILIDADE DAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS (HQs) NO ENSINO DE HISTÓRIA

MOSSORÓ

2019

(2)

DESENHOS QUE ENSINAM SOBRE O PASSADO: A APLICABILIDADE DAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS (HQs) NO ENSINO DE HISTÓRIA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós- graduação em Ensino – POSENSINO – ampla associação entre a Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), Universidade Federal Rural do Semiárido (UFERSA) e Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (IFRN), como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Ensino.

Orientador: Prof. Dr. Paulo Augusto Tamanini

MOSSORÓ

2019

(3)

FICHA CATALOGRÁFICA Biblioteca IFRN – Campus Mossoró

Ficha catalográfica elaborada pela bibliotecária Elvira Fernandes de Araújo Oliveira CRB15/294 C837 Costa, Jonathan Diógenes.

Desenhos que ensinam sobre o passado : aplicabilidade das histórias em quadrinhos (HQs) no ensino de história / Jonathan Diógenes Costa – Mossoró, RN, 2019.

117 f.

Dissertação (Mestrado em Ensino) – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte, Universidade Estadual do Rio Grande do Norte, Universidade Federal Rural do Semi-Árido, 2019.

Orientador: Prof. Dr. Paulo Augusto Tamanini.

1. Ensino de História 2. História em Quadrinhos 3. Canudos – História 4. Independência do Brasil I. Título.

CDU: 37.02:930.1

(4)
(5)

Dedico este trabalho a você, meu filho Samuel. Um dos maiores presentes que recebi na vida. A primeira vez que olhei os seus olhos e o tive em meus braços, imediatamente o meu mundo se transformou.

De repente, senti como se a minha vida já não me pertencesse. Senti a

alma cheia de amor e o meu coração fora de mim. Entendi,

finalmente, o que é o amor incondicional. Esta vitória é a primeira de

muitas que iremos conquistar e partilhar juntos.

(6)

A presente dissertação de Mestrado não poderia chegar a bom porto sem o precioso apoio de várias pessoas.

Começo por agradecer a Deus todas as dádivas a mim concedidas e todas as conquistas alcançadas.

Em seguida, quero agradecer a minha família, em especial minha esposa Fernanda Minnely Batista Fernandes Costa, pela dedicação e apoio incondicionais, e ao meu filho, Samuel Diógenes Fernandes, a maior benção que já conquistei. Também a meus amados pais, Edivaldo Rodrigues da Costa e Vera Nilce Diógenes Costa, que possibilitaram a abertura do caminho trilhado por mim até aqui.

Desejo igualmente agradecer ao meu orientador, Professor Dr. Paulo Augusto Tamanini, por toda a paciência, zelo, empenho e sentido prático com que me orientou nesta Dissertação e em todos os trabalhos realizados durante o Mestrado. Muito obrigado por me corrigir quando necessário e por me incentivar a prosseguir com coragem e ânimo.

Agradeço também a todos os meus amigos do Mestrado em Ensino, especialmente aos outros orientandos de Tamanini: Socorro, Ana Meyre e Wagner. E a Francinaldo, Helyab e Rusiane de outros orientadores. Abraços a todos, cujo apoio e amizade estiveram presentes em todos os momentos desta jornada.

A essas pessoas minha gratidão pela força que recebi durante o período de iniciação

à conclusão da Dissertação.

(7)

A História tem sido escrita e ressignificada, sobretudo, após a eclosão da influência dos Annales. A problematização das mais diversas fontes suscitou o levantamento de novos olhares sobre o campo da pesquisa historiográfica e do Ensino de História. Dentre o universo da cultura visual que se desponta, a História em Quadrinhos (HQ) representa uma fonte engenhosa para a tessitura da História ensinada. Diante desse panorama, este trabalho se propõe a investigar a aplicabilidade das HQs no Ensino de História, tendo como base teórica os estudos de Eisner, Vergueiro, Palhares, Vilela, Circe Bittencourt e Maria Auxiliadora Schmitt. O texto está estruturado em duas grandes vertentes: primeiramente, aborda-se a evolução das HQs para depois analisar sua aplicabilidade no Ensino, em sala de aula.

Contempla-se igualmente um percurso historiográfico da disciplina de História e o surgimento das novas fontes de pesquisa e de Ensino, onde a HQ encontra seu lugar cativo.

Em seguida, através da análise das imagens de três HQs - D. João Carioca: A corte portuguesa no Brasil (1808-1821); História do Brasil em Quadrinhos e A luta contra Canudos – aborda-se a aplicabilidade da cultura visual no Ensino, sem se esquecer das reflexões que aguçam o senso crítico dos discentes, em sala de aula, para formar alunos-cidadãos comprometidos com as realidades que os cercam.

Palavras-chave: Ensino de História. Histórias em Quadrinhos. A Luta Contra Canudos. Vinda

da Família Real. Independência do Brasil.

(8)

History has been written and reframed, especially after the outbreak of the Annales influence.

The problematization of the most diverse sources led to the raising of new perspectives on the field of historiographical research and the teaching of history. Among the emerging universe of visual culture, Comics (Comic Book) represents an ingenious source for the fabric of history taught. Given this scenario, this paper aims to investigate the applicability of comic books in History Teaching, based on the theoretical studies of Eisner, Vergueiro, Palhares, Vilela, Circe Bittencourt and Maria Auxiliadora Schmitt. The text is structured in two broad strands: firstly, it deals with the evolution of comic books and then their applicability in teaching in the classroom. It also contemplates a historiographical course of the discipline of History and the emergence of new sources of research and teaching, where the comic finds its captive place. Then, by analyzing the images of three comic books - D. João Carioca: The Portuguese Court in Brazil (1808-1821); Brazilian History in Comics and The Fight against Canudos - addresses the applicability of visual culture in teaching, without forgetting the reflections that sharpen the critical sense of students in the classroom, to form student-citizens committed to the realities that surround them.

Keywords: History teaching. Comics. The Fight Against Straws. Coming from the Royal

Family. Independence of Brazil.

(9)

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Tira de “Liz”, Daniel Brandão ... 10

Figura 2 – Detective Comics #572 – Batman encontra Sherlock Holmes ... 19

Figura 3 - Ensino através das HQs ... 31

Figura 4 – Edição nº 1 da Action Comics, o aparecimento do ... 35

Figura 5 – Edição nº 27 da Detetive Comics, o Batman ... 36

Figura 6 – Capitain America Comics #1 ... 39

Figura 7 – All Star Comics # ... 40

Figura 8 – Os Peanuts, de Charles M. Chulz ... 41

Figura 9 – Mafalda, de Quino ... 43

Figura 10 – Capa da revista Pererê ... 45

Figura 11 – Calha ou sarjeta ... 50

Figura 12 – Maus, de Art Spiegelman ... 52

Figura 13 – Onomatopeias e metáforas visuais, por Lene Chaves ... 53

Figura 14 – Arte híbrida ... 54

Figura 15 – Capa da HQ Luta contra Canudos ... 69

Figura 16 – Os caminhos do peregrino ... 70

Figura 17 – Enfoque nos rostos sofridos das mulheres ... 71

Figura 18 – Estabelecendo-se em Canudos e o simbolismo da terra ... 73

Figura 19 – O descontentamento da igreja e dos fazendeiros ... 75

Figura 20 – Emboscada na Serra do Cambaio à 2ª expedição do governo ... 77

Figura 21 – Comparação da HQ a foto real de Antônio Conselheiro... 79

Figura 22 – A capa da HQ ... 81

Figura 23 – Napoleão Bonaparte ... 83

Figura 24 – “Napoleão em seu estúdio”, de Jacques Louis David ... 84

Figura 25 – A chegada da corte e suas consequências ... 86

Figura 26 – Os ganhos do Brasil com a vinda da família real ... 88

Figura 27 – O dia do fico ... 90

Figura 28 – A independência do Brasil ... 91

Figura 29 – Quadro “Independência ou Morte” de Pedro Américo – 1888 ... 92

Figura 30 – Quadro de Ernest Meissonier - 1807, Friedland ... 93

Figura 31 – A capa da HQ D. João Carioca: a corte portuguesa no Brasil (1808 – 1821) ... 96

Figura 32 – Da contradição ao humor ... 97

(10)

Figura 33 – Recordatórios e quadros de interlocutor ... 98

Figura 34 – Diversidade cultural ... 99

Figura 35 – Uso de mapa cartográfico para explicar como as tropas napoleônicas invadiram

Portugal ... 100

Figura 36 – Comparação da HQ com o Quadro de Debret ... 102

Figura 37 – Quadro “Barbeiros ambulantes”, de Jean Baptiste Debret, de 1826 ... 103

(11)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 10

2 A EVOLUÇÃO DAS HQs E SEU USO COMO POSSIBILIDADE METODOLÓGICA

PARA A MEDIAÇÃO DO CONHECIMENTO ... 19

2.1 O PERCURSO DA HISTÓRIA ENQUANTO DISCIPLINA E AS HQs ... 20

2.2 O CONCEITO DE FONTE HISTÓRICA E SUA RELAÇÃO COM O ENSINO DE

HISTÓRIA. ... 23

2.3 DIALOGANDO COM A INTERDISCIPLINARIDADE ... 26

2.4 OS QUADRINHOS COMO FONTE HISTÓRICA ... 28

3 A LINGUAGEM VISUAL NO ENSINO DA HISTÓRIA: A METÁFORA ENTRE A

PALAVRA E A IMAGEM ... 31

3.1 AS METAMORFOSES SOCIAIS E COMUNICATIVAS: OBSERVANDO AS

PERSPECTIVAS DAS HQs AO LONGO DOS ANOS ... 33

3.2 CULTURA VISUAL E O USO DO GÊNERO HISTÓRIAS EM QUADRINHOS (HQs)

NA SALA DE AULA ... 47

4 LUTA CONTRA CANUDOS, D. JOÃO CARIOCA E HISTÓRIA DO BRASIL EM

QUADRINHOS: VENDO E LENDO AS IMAGENS ... 65

4.1 A LUTA CONTRA CANUDOS: ENTRE TEXTOS E IMAGENS ... 68

4.2 HISTÓRIA DO BRASIL EM QUADRINHOS ... 80

4.3 D. JOÃO CARIOCA: A CORTE PORTUGUESA CHEGA AO BRASIL (1808-1821) .. 94

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 105

REFERÊNCIAS ... 112

(12)

1 INTRODUÇÃO

Figura 1 – Tira de “Liz”, Daniel Brandão

Fonte: VERGUEIRO et al. (2018)

Para que se possa compreender melhor o intuito da presente pesquisa, falarei brevemente do meu envolvimento e interesse pelos quadrinhos

1

, os quais entraram em minha vida durante a infância. Porém, foi na adolescência que o gosto por ler e colecionar estas revistas tornou-se uma paixão que carrego até os dias atuais. Eis, pois, a escolha bastante óbvia para meu objeto de pesquisa.

Lembro-me de folhear quadrinhos por horas, atraído pelos desenhos, as narrativas empolgantes, o clímax dos momentos cruciais nas histórias. Foi assim que me tornei um leitor assíduo das histórias em quadrinhos. Inicialmente, por aquelas que traziam as personagens icônicas da “Turma da Mônica” de Maurício de Souza e as de Walt Disney. Depois mergulhei na leitura de outros gêneros de quadrinhos como super-heróis, humor, terror, ficção, História, além dos Mangás

2

.

No colégio, fui aquele garoto considerado o “desenhista da sala”, que caricaturava professores, colegas e desenhava as personagens dos quadrinhos e dos desenhos animados que

1 Embora prevalece nos manuais de redação científica o emprego da impessoalização do discurso, é utilizada aqui a pessoalização a fim de destacar o interesse na temática do pesquisador do trabalho.

2 Termo que designa as histórias em quadrinhos japonesas. Essas HQs são muito populares no mundo. No ocidente, o uso desse termo foi ampliado para além dos quadrinhos em si, sendo aplicado para definir o estilo do traço baseado nos mangás, devido a características estéticas marcantes: olhos grandes e expressivos, estrutura anatômica cartunizada, cabelos espetados com cores vibrantes etc.

(13)

passavam na TV. Criava histórias em quadrinhos nas aulas vagas, cujos personagens se inseriam em novas narrativas projetadas por mim (fanfic)

3

. Mais tarde, prestei vestibular para o curso de licenciatura em História da UERN onde me graduei em 2011. E lá, outra vez, os quadrinhos continuavam a fazer parte de minha vida acadêmica: viraram o objeto de pesquisa para o meu TCC. Assim, em minha vida profissional docente me utilizei no Ensino de História das Histórias em Quadrinhos (HQs) como recurso didático em sala de aula.

Da trajetória profissional, nasceu uma inquietação: por que não usar HQs para ensinar? Por que não fazer daquilo que se dá satisfação, uma forma atual de ensinar? As HQs são, dentre tantas formas de arte, um gênero que se desponta na cultura visual e têm na mídia grande aceitação entre os estudantes. Trata-se, pois, de uma fonte de comunicação única que carrega em si informações, contextos, ideologias, visões, tanto de quem as produz como de quem as lê.

Por seu baixo custo, é possível produzir as próprias histórias, o que estimula a elaboração de pequenos contos, arte figurativa, design, quadrinização, perspectiva, além da interação entre os alunos na divisão de tarefas, dentro da construção de desenhos e textos.

Essa arte híbrida mescla e adapta textos a imagens de maneira sequencial, proporcionando ludicidade a um momento de lazer. E apesar de ser pensada para um público maior, sua leitura precisa ser feita de maneira individual.

Como argumenta McCloud (2005, p. 197), “hoje, eles (os quadrinhos) são uma das poucas formas de comunicação de massa na qual vozes individuais ainda têm chance de serem ouvidas”. Haja vista as tecnologias atuais e as pessoas estarem sempre conectadas, a imagem está sempre presente no dia a dia, ante uma enxurrada de informações de toda sorte.

Salienta Vergueiro (2007, p. 8): “as histórias em quadrinhos vão ao encontro das necessidades do ser humano, na medida em que utilizam fartamente um elemento de comunicação que esteve presente na história da humanidade desde os primórdios: a imagem gráfica”.

Tanto Eisner (2010) quanto McCloud (2005) relatam que as HQs já eram ensaiadas nas paredes das cavernas pré-históricas ou nos hieróglifos egípcios. Contudo, ainda que houvesse a tentativa de representar, narrar, fatos do cotidiano por meio de imagens pictóricas de maneira “sequencial”, ainda não se configurava uma “linguagem escrita” para a constituição de narrativas (NUNES, 2015, p. 2).

3 Fanfic é a abreviação de “Fan fiction” (em português, ficção de fã), ou seja, constitui-se como uma narrativa ficcional escrita, desenhada e divulgada por fãs. Na minha época, por meio de revistas (fanzines). Atualmente, além das fanzines, blogs, sites e outras plataformas do ciberespaço, que se apropria de personagens e enredos provenientes de produtos midiáticos como filmes, séries, quadrinhos, videogames etc.

(14)

As HQs como são conhecidas hoje, só vieram a ganhar a conotação que lhes é característica com associação de imagens e símbolos gráficos aos textos, de maneira sequenciada e no formato impresso, a partir do crescimento da imprensa tipográfica americana.

Conforme relata Moya (1977), as Histórias em Quadrinhos foram inicialmente pensadas como anexos ou suplementos dominicais do jornal para só então passar por várias evoluções técnicas, e de lá para cá, sofreram várias mudanças e influências que as transformaram de maneira significativa nesta fonte fascinante que é hoje. Tão fascinante que, por sua vez, o alunado consegue assimilar com riqueza de detalhes a mensagem transmitida por este meio, muito próximo daquilo que eles imaginaram.

E o ensino de História? Este, por sua vez, se utiliza dos quadrinhos como estratégia para a construção dos saberes historiográficos, debate e propagação de conhecimentos. Afinal a História tem sido escrita e ressignificada após a eclosão da Escola dos Annales. Nesse contexto, as perspectivas mudaram, pluralizaram e problematizaram os sentidos e as mais diversas fontes, inaugurando caminhos para outras interpretações e possibilitando uma nova dimensão ao cenário desta ciência.

Dentre as mais diversas fontes históricas, o uso de imagens no ensino de História passa a ganhar bastante expressão, devido a sua relevância no ensino. Enquanto recurso didático, mostrou-se indispensável para a compreensão dos conhecimentos desenvolvidos em sala de aula, possibilitando o amadurecimento da reflexão, o desenvolvimento da interpretação e a criticidade dos alunos.

Entenda-se que cada vez mais a cultura do visual está presente em nossa rotina de forma dinâmica, multissemiótica e inovadora. Desse modo, compreender essa cultura e fazer uso e aplicação de imagens na disciplina de História deve ir além. Algumas problematizações são levantadas pelos historiadores que se debruçam a interpelar esse recurso: como compreender esses signos visuais? O que elas comunicam visual e textualmente? Para quem comunicam? Quais as intencionalidades destas fontes? Em que contexto foram produzidos?

Por quem foram produzidos? As imagens que contemplam o ensino de história auxiliam na aprendizagem do aluno? Como as imagens podem melhor ser depreendidas a partir dos reflexivos expressos pela sociedade? (LITZ, 2009, p. 5).

Diante dessa abordagem metodológica e dos questionamentos levantados, justifica-se

o intuito da pesquisa, já que a imagem desponta como possibilidade de fonte para a escrita da

História. Nesse universo da cultura visual, constata-se que as HQs representam fontes

(15)

significativamente expressivas na tessitura do conhecimento histórico, além de oferecer subsídio para o debate interdisciplinar entre os mais variados temas.

Afinal, por muito tempo as HQs foram alvo de preconceitos por grande parte de professores mais tradicionais, especialmente nas décadas de 1940, 1950 e 1960, tanto no Brasil quanto em outras partes do mundo. Somente com o passar do tempo essa visão fixa e carregada de preconceitos foi sendo deixada de lado, uma vez que as HQs passaram a ser cada vez mais tema de pesquisas nas mais diversas áreas (Artes, História, Língua Portuguesa, Sociologia, Filosofia, Física, Biologia... etc.). E sua importância como forma de comunicação e de expressão passou a ser reconhecida.

As HQs também são formas narrativas de se escrever sobre um passado. Afinal narrar uma história na aula de História evoca imagens, ruas, roupas, pessoas, personalidades, experiências, sugestões de um passado que pode nos significar algo. A narrativa é mais do que um instrumento neste universo, é o formato por excelência do processo de (re)construção do conhecimento histórico. Também ensinam sobre o passado, falam dele, o representam; as HQs criam e recriam um pretérito que é trazido à sala de aula de maneira mais leve, sedutora, atraente e, por vezes, lúdica.

Desta forma, a História e a representação de um passado se aproximam num fazer pedagógico que não pode ser menosprezado. “É sob tal fazer que se opera nossa constituição enquanto sujeitos, buscando referências seja em um paradigma vinculado à noção de

‘verdade’, ou em outro, mais livre de compromissos, a fim de atribuirmos sentido às nossas ações”. (RICOEUR, 2014, p. 156-157). Pensar a importância deste processo que, através do discurso narrativo, nos forma, e na aula de História como um espaço em que, seja estudante ou professor, se vive esta experiência, é uma tarefa das mais importantes e justamente por isso, necessita ser mais bem pormenorizada.

Desta maneira, respalda-se a inovação da pesquisa na área, através da realização de um mapeamento, no formato estado do conhecimento, realizado no banco de dados do catálogo de teses e dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) tendo em vista sua constante atualização, o apoio na excelência dos trabalhos e o volume de publicações anuais feitas. Foi realizada uma busca sistemática por informações sobre o tema “Histórias em Quadrinhos no Ensino de História”, entre os meses de maio e junho de 2018. Dentre os quais, 17 trabalhos foram selecionados.

A respeito dos resultados levantados, algumas análises foram possíveis. Apesar do

filtro temporal ter sido realizado de 2002 a 2018 (16 anos), época em que os heróis das HQs

ganharam as telas do cinema e as editoras brasileiras abriram mais espaço para divulgação de

(16)

material em quadrinhos, as publicações que foram mapeadas tratam do tema “Histórias em Quadrinhos” concentrando-se nos anos 2013, 2014, 2015, 2016, 2017 e 2018. Infere-se que os estudos voltados à temática das HQs, a partir das pesquisas realizadas na plataforma CAPES, ainda são poucos e inovadores no segmento, principalmente na área da História, que só possui 3 trabalhos catalogados. Outro fator curioso que se verifica é com relação às localidades das Instituições de Ensino dos trabalhos levantados que em sua maioria concentram-se nas regiões Sul e Sudeste, com apenas uma publicação pelo Nordeste, notabilizando-se, então, a carência de produções relativas ao tema nesta região.

Através da análise de conteúdo das HQs, esta pesquisa fornecerá sugestões para a aplicabilidade das HQs em sala de aula, de maneira que tanto possam ser utilizadas como fonte documental para o estudo de determinada época quanto possam servir de material para promover reflexões e debates sobre os conceitos históricos encontrados nas representações de culturas do passado. Dentro desse quadro de possibilidades, apresenta-se a seguinte questão norteadora para a pesquisa: qual a contribuição das Histórias em Quadrinhos (HQs) como método de Ensino na disciplina de História?

As HQs, como já mencionado, representam uma mídia de grande aceitação popular.

Transmitem conceitos, modos de vida, visões de mundo e até informações científicas. Trazem também temáticas facilmente compreendidas pelos estudantes. Utilizá-las na perspectiva do ensino possibilita alguns indicadores de aprendizagem, quais sejam: identificação, descrição, contextualização e interpretação – fundamentais para a construção de um senso crítico, permitindo ao educando compreender os diversos elementos em que a imagem apresenta.

Outro ponto a ser considerado consiste em que a produção das HQs é facilmente associada à ludicidade, sendo um desafio prazeroso e que requer poucos recursos. Tamanha facilidade viabiliza e dá suporte às novas modalidades pedagógicas, podem ser aproveitadas em diversas aulas de maneira interdisciplinar e transdisciplinar, fazendo com que o aprendizado se torne mais reflexivo e motivador nos espaços das escola. Assim, as HQs devem ser entendidas como um meio de comunicação que reflete a cultura e a sociedade em que estão inseridas. Elas agregam sentidos a reflexão.

Tomando-se os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), a disciplina de História

busca adequar a realidade pós-moderna aos objetivos voltados à construção da identidade do

indivíduo. Desse modo, a inserção da História cultural nas escolas, que aborda temas antes

desprezados pelos historiadores – tais como mulheres, crianças, idosos, memórias,

homossexuais, negros, índios e uma série de excluídos sociais – passaram a fazer parte de um

conjunto de objetos inovadores.

(17)

Dessa maneira, conjectura-se o motivo pelo qual foi escolhida esta temática, uma vez que “deve ter utilidade para o pesquisador, o pesquisado e a sociedade propriamente dita”, fazendo com que não fique restrito somente a um mero olhar diferenciado sobre essa fonte inovadora (KAHLMEYER-MERTENS et al., 2007, p. 97).

A partir desse breve panorama que se apresenta para a Educação Básica, este trabalho está norteados pelos seguintes objetivos: I Objetivo Geral: Investigar como as HQs podem ser aplicadas como material de ensino na disciplina de História. II Objetivos específicos: a) Historicizar a evolução das HQs e seu uso como possibilidade metodológica para a mediação do conhecimento; b) Apontar possibilidades interdisciplinares quando do uso das HQS; c) Analisar os conteúdos das HQs (D. João Carioca; História do Brasil em quadrinhos; A luta contra Canudos) dentro de uma proposta para o ensino de História do Brasil).

Como o foco da pesquisa está na reflexão acerca da aplicabilidade das HQs como uma das formas inovadoras de ensino de História, busca-se em Leandro Karnal, Circe Bittencourt, Marcos Napolitano, Túlio Vilela (todos historiadores ligados à reflexão voltada para o ensino) que oferecem aportes teóricos e metodológicos para esta investigação. De igual modo, propõe-se o pensamento de Schaff (1987) quando a pesquisa aborda o conhecimento histórico em que o sujeito e o objeto constituem uma totalidade orgânica. Compreende-se, dessa forma, que as HQs e os sujeitos que as utilizam no Ensino formam um todo comprometido para um conhecimento sobre o passado.

Conhecer é ter capacidade de estruturar, relacionar, organizar, sistematizar as informações que se tem, e por meio delas perceber como as relações estruturam a realidade.

As atividades de aprendizagem no Ensino de História, não podem se resumir a reproduzir conhecimentos para apenas memorizar e depois repeti-los. Todo conhecimento deve ser pensado no sentido de sua redescoberta ou redefinição. Para isso, faz-se necessário trabalhar dialeticamente, problematizando e construindo o conhecimento numa relação entre professor, aluno, objeto e realidade. E para este propósito as HQs se mostram como uma realidade favorável à capacitação dos envolvidos nesse processo.

Le Goff (1993, p. 107-108) afirma que a História se vale de uma miríade de fontes para ser escrita. Dentre elas apresentam-se desde os documentos oficiais até notícias de jornal;

da história oral até o uso de imagens; de artefatos pré-históricos até as mídias mais avançadas

da atualidade. Estas inúmeras fontes são utilizadas por historiadores para escrever a História,

sendo manuseadas para obter informações e, por intermédio destas, compreender um

determinado contexto histórico ou o que dele pode ser depreendido.

(18)

Dentre as diversas fontes que se abrem a possibilidades de utilização, as HQs podem ser “incorporadas como documento sócio histórico, como fonte de aprendizado e como catalizadora de debates” (NAPOLITANO, 2009, p. 9). Aqui, faz-se necessário apreender a definição de HQ (evitando a sua confusão para com outras modalidades de manifestação artística que utilizam da escrita e das imagens, tipo: tirinha, charge etc.), bem como desenvolver habilidades a sua análise crítica, segundo o contexto histórico, cultural, político e socioeconômico em que cada obra foi produzida.

Por vezes, as HQs são abordadas nos livros didáticos – um recurso ilustrativo e pedagógico. A imagem apresentada ao aluno faz com que ele associe a imagem vista ao seu contexto social, levando-o a considerar seu conhecimento prévio. Enfim, como toda imagem é histórica, o aluno pode perceber a marca e o momento de sua produção.

Um dos questionamentos que se faz é justamente sobre a forma como as HQs são abordadas nos livros didáticos? E o que elas trazem de ensinamento para o aluno? Qual o aproveitamento das HQs no Ensino, quando estas aparecem também no livro didático?

Ainda que o bom emprego delas deva ser dado pelo professor em sala de aula, os alunos ao interagir com as imagens refletem um novo modo de aprendizagem porque se utilizam de meios mais atraentes para se falar do passado. Tanto o livro quanto as HQs são artifícios como quaisquer outros dos meios de comunicação que ligam didaticamente o presente ao pretérito.

Na parte analítica das HQs, há a caracterização que margeou os últimos séculos, quando se deu uma reorganização do conhecimento. As culturas, as mentalidades e as expectativas de qualquer indivíduo são fruto de uma construção histórica, resultado da influência ou da sua participação ativa dentro de grupos sociais, étnicos, de gênero, regionais, entre outros.

A realidade fraciona-se em diversas dimensões e o conhecimento interdisciplinar vem ao encontro de um novo jeito de ensinar que aposta na possibilidade de integração e relações sociais respeitosas. Diante da abordagem interdisciplinar, pontuamos que as HQs por se tratar de uma arte híbrida – que alia linguagem verbo-visual à diversidade de temas – facilita as interações e trocas de saberes. A composição delas revela o conjunto de temas interdisciplinares, ou seja, integra os saberes de História, Artes, Língua Portuguesa, Geografia etc. Logo, as HQs são potencialmente agregadoras de um tipo de ensino moldado pela forma lúdica de mediar conhecimentos, sem se esquecer da criticidade e reflexão.

Na pesquisa acadêmica, a paixão por determinado assunto pode revelar uma um

aspecto dicotômico: por um lado, ela é benéfica porque é um fator de motivação, o que pode

(19)

levar o pesquisador a realizar um trabalho melhor. Por outro, corre-se o risco de se entusiasmar excessivamente e perder a objetividade e o senso crítico. Haja vista um professor de ensino básico que enfrenta no dia a dia desafios e dificuldades inerentes à profissão e, mesmo assim, tenta utilizar-se das HQs como recurso pedagógico. Logo, essa pesquisa, se por um lado exprime um desafio, por outro, academicamente envereda por caminhos que possam mostrar as muitas possibilidades de aperfeiçoamento do Ensino de História.

A metodologia utilizada desse trabalho consiste num estudo de natureza de pesquisa aplicada, pois “tem como objetivo gerar conhecimentos para aplicação prática, focados em solucionar problemas específicos” (SILVA; MENEZES, 2005, p. 12). A partir dos objetivos elencados, trata-se também de uma pesquisa exploratória, já que “tem a intenção de ampliar a familiaridade com o problema abordado, tornando-o explicito ou constrói-se hipóteses”

(KAUARK, 2010, p. 26).

Do ponto de vista da abordagem do problema, o projeto tem caráter qualitativo, por se tratar de uma situação que considera “uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, isto é, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito que não pode ser traduzido em números” (KAUARK, 2010, p. 26). A interpretação dos fenômenos e a atribuição de significados são básicas no processo da pesquisa qualitativa não permitindo generalizações.

De modo a atingir os objetivos propostos, serão utilizados os procedimentos metodológicos: a) pesquisa bibliográfica (busca teórica e reflexão investigativa sobre a temática em livros, periódicos, artigos científicos, trabalhos acadêmicos e internet); b) Análise de conteúdo: diz respeito à mensuração das imagens como componentes de dizeres, como artefatos de saberes (semiótica greimasiana, circular e dialética).

Abordar as HQs na perspectiva das Iconografia é ir um pouco além do lúdico; é refletir e aguçar o senso crítico, potencializar a observação e a percepção, e reconhecer os simbolismos, as técnicas artísticas, as ideologias, as linguagens (visuais/ escritas) e os contextos. Eis uma forma de narrar o passado, e sobre ele ensinar, em sala de aula. Para tanto, três HQs foram selecionadas: A luta contra Canudos – publicado pela editora Nemo; História do Brasil em Quadrinhos – publicada pela editora Europa; e D. João Carioca: a vinda da corte ao Brasil (1808-1821) – publicada pela editora Companhia das Letras.

A partir da análise empreitada, dar-se-á a verificação dos progressos e as resistências

dos alunos em relação a aplicabilidade dessa fonte histórica (HQs) como recurso de

aprendizagem nas aulas de História, pois para se trabalhar com a análise de histórias em

quadrinhos alguns procedimentos são necessários no processo de ensino-aprendizagem para

(20)

que não se perca o propósito, ou seja, “usar imagens sempre como forma de aprendizado e

conhecimento” (LITZ, 2009, p. 6). Portanto, qualquer imagem precisa ser bem utilizada e

bem explorada e, quando necessário, articulada a um texto, passível de ser interpretada. Os

métodos que integram as questões pedagógicas e historiográficas, o uso de imagens

possibilitam a interpretação da história, em determinados períodos ou épocas, com uma

riqueza de informações e detalhes. Ademais, as fontes imagéticas podem também colaborar

no desenvolvimento do imaginário popular sobre história, uma vez que esta fonte trabalha

também o ficcional como recurso para motivar o aluno habituado com uma infinidade de

imagens e sons do mundo contemporâneo.

(21)

2 A EVOLUÇÃO DAS HQs E SEU USO COMO POSSIBILIDADE METODOLÓGICA PARA A MEDIAÇÃO DO CONHECIMENTO

Figura 2 – Detective Comics #572 – Batman encontra Sherlock Holmes

4

Fonte: HQVINTAGE (2016)

Na busca por mudanças e reflexões acerca do Ensino de História, pesquisadores vêm se debruçando e apresentando novas perspectivas metodológicas, o que envolve o uso de fontes novas e métodos de ensino adequados. O debate sobre as fontes históricas remete a um dos fatores centrais que constitui a História enquanto campo do conhecimento. Segundo Bloch (2001, p. 55), a História tem por objeto o homem e, por isso, ela é “a ciência que estuda

4 Como a função do historiador se assemelha muito a de um detetive, a epígrafe desse capítulo foi escolhida por trazer os dois maiores ícones: Batman (HQs) e Sherlock Holmes (literatura), dada a investigação da História.

(22)

os homens no tempo”. O uso das fontes pelo historiador é o único meio de se atingir diretamente este homem que se inscreve no tempo. E o fator cronológico, aliado à utilização de fontes históricas, é o que torna a História distinta dos outros campos do saber.

Na frase célebre de Charles Seignobos (1901 apud BARROS, 2010, p. 72) “sem documentos não há história”, conclui-se que o saber histórico é construído essencialmente através de suas fontes. Se a fonte documental é a pedra angular que constitui o saber historiográfico, resta alguns questionamentos a serem feitos: sociedades das quais não tivessem nenhum vestígio arqueológico encontrado, fossem textos, pinturas, referências da oralidade de seus povos, ou mesmo se todos esses documentos existissem, porém fossem destruídos, como o foi no caso do Museu Nacional do Rio de Janeiro

5

, o que poderia ser dito por um profissional da História? Que a história inexiste? Ou que sua versão, sem as fontes, se pautaria como definitiva e verdadeira? Estas e outras discussões estão no âmago do que é uma fonte ou documento histórico e como se dá sua concepção, ampliação e utilização por historiadores ou profissionais da educação e estudantes.

2.1 O PERCURSO DA HISTÓRIA ENQUANTO DISCIPLINA E AS HQs

A História, enquanto disciplina escolar no Brasil, passou a ser obrigatória em 1837 com a criação do Colégio Pedro II. Desde então, os objetivos e métodos de ensino vêm passando por diversas influências e concepções, afastando-se daqueles conteúdos prescritos pelo positivismo que privilegiavam a história da Europa e a valoração dos grandes nomes e feitos.

A História por muito tempo contribuiu para a legitimação dos valores da classe aristocrática vigente, sendo mera reprodutora de datas, fatos e heróis, sem nenhuma análise crítico reflexiva dos mesmos. Com isso, era uma história “vista de cima”, contada de um ângulo apenas, excluindo e esquecendo-se de todos aqueles que estavam à margem, tais como os negros, os índios, as mulheres, os mendigos etc.

Mesmo de maneira restrita, apenas em 1901, implantou-se o Ensino da História do Brasil, uma proposta que se consolidou no governo Vargas. Tendo por base as leis e diretrizes educacionais de 1931, junto aos programas utilizados nas escolas, o ensino era de vertente

5 Incidente ocorrido no dia 2 de setembro de 2018, ocasionado por um incêndio que destruiu a maior parte de seu acervo, que continha cerca de 20 mil itens, dentre eles: fósseis, múmias, registros históricos, obras de arte que foram perdidos.

(23)

tradicional, voltado à construção da nacionalidade e da identidade dos cidadãos, em que se destacavam, principalmente, os marcos históricos, datas comemorativas e aos grandes heróis nacionais.

Os métodos do Ensino de História empregados pela pedagogia da Escola Nova visavam dar mais autonomia ao aluno, vislumbravam que trechos do passado viessem ao conhecimento do aluno através dos textos escritos. Estes, por sua vez, forneciam as informações, enquanto os professores eram responsáveis por transmitir os conteúdos desses textos. Contudo, permaneceu o mesmo olhar, o mesmo trato metodológico tradicional da linearidade dos acontecimentos, dos fatos antecedidos pelas causas e feitos, das datas e dos nomes dos personagens considerados os mais significativos.

Mais tarde, na década de 1960, a formação intelectual e científica dos alunos como cidadãos políticos passou a integrar os objetivos da disciplina. No caso, a produção didática da chamada História Nova, teve seus estudos baseados nos modos de produção, sob a influência da historiografia marxista, que enfatizava transformações econômicas e conflitos entre as classes sociais. Essa tendência deu ênfase aos agentes das transformações históricas, às classes sociais e proporcionou uma abordagem estruturalista na qual a História era estudada como consequência de estágios sucessivos e evolutivos.

Durante o período da Ditadura Militar, entre 1964 e 1985, os conteúdos próprios e característicos da História, ainda de vertente tradicional e estruturalista, ficaram relegados ao chamado Segundo Grau, e diluídos nas disciplinas de Estudos Sociais e de Educação Moral e Cívica. Firmava-se em tais disciplinas a finalidade de solidificarem “a obediência, a exaltação e o não questionamento aos ditames do governo” (SCHMIDT; CAINELLI, 2004, p. 10-11).

A ênfase dada às noções e conceitos gerais das Ciências Humanas levou ao esvaziamento da dimensão histórica do ensino. Conceitos como “trabalho” e “sociedade”

passaram a ser tratados como categorias abstratas e universalizantes, perdendo suas dimensões temporais e espaciais. O agente histórico das mudanças passava a ser o Estado, corporificado abstratamente no conceito de humanidade, e sendo ele responsável pela

“transformação da natureza, pelo bem-estar de todos e pela construção dos caminhos do progresso, sinônimo da época de conquistas tecnológicas” (BRASIL, 1998, p. 27).

Com o fim do Regime Militar e com a reabertura política, ocorrida na década de

1980, a disciplina de História reestruturava-se em um currículo escolar próprio, nos Ensino

Fundamental e Ensino Médio. O ensino de História voltava-se à formação do indivíduo

crítico, inacabado, que soubesse interpretar os mais variados tipos de fontes e ferramentas

para compreender-se e situar-se na sociedade da qual faz parte.

(24)

A presença de novas tecnologias de comunicação, especialmente o rádio e a televisão, que se expandiam como importantes canais de informação e de formação cultural, entrava pelas portas das escolas como uma nova realidade que não poderia mais ser ignorada.

O currículo esboçado pela prática forçava mudanças no currículo formal. Logo, os historiadores se voltaram para novas problemáticas e temáticas de estudo, sensibilizados por questões ligadas à História Social e Cultural e ao cotidiano. Tal reviravolta sugeria possibilidades de revisão do Ensino de História, no ensino fundamental e reconsideração do formalismo das abordagens históricas sustentadas nos eventos políticos e administrativos dos estados ou exclusivamente nas análises econômicas estruturais.

Como a década de 1990 trouxe consigo um movimento de transformação profunda da sociedade, marcada pela aceleração de mudanças tecnológicas, sociais e culturais, o Ensino de História também foi influenciado por essas alterações. A renovação historiográfica, trazida pelos Annales, no século XX, conheceu uma extraordinária expansão na possibilidade de utilização de diversos tipos de fontes históricas, disponíveis ao historiador para o ensino e para a pesquisa da História. Diante deste fenômeno, tornaram-se prementes os questionamentos diante da função do que era ser um historiador e quais poderiam ser as suas relações com as fontes.

Compreendia-se que as ações e relações humanas tornaram-se os objetos prioritários da História e que por causa delas que o homem situa-se no tempo e espaço, agindo, pensando, imaginando, representando e relacionando seu contexto social, político e econômico. A produção de conhecimento historiográfico decorrente dessa forma de apreensão do pretérito se dava graças à inauguração de novas fontes que a própria Historiografia credenciava para suas pesquisas. Tinha como meta a formação do cidadão crítico, capaz de entender seu mundo e as relações que o permeava, que repercutiu no aparecimento de outros métodos de ensino de História que fossem eficazes: discussão de textos, mediado pelo professor, crítica às postagens prontas e acabadas, exame criterioso dos documentos escritos.

Da concepção crítica da História, sobrevieram teóricos tais como Jörn Rusen, Maria Auxiliadora Schmidt, Peter Lee e Isabel Barca, que defendiam a História como algo em construção e que se dava através das relações e contextos sociais (OLIVEIRA; COSTA, 2016, p. 3). Tal concepção em relação ao ensino-aprendizagem da História, como disciplina escolar,

“busca conhecer as ideias históricas de alunos e professores, centrando a atenção nos

princípios, fontes, tipologias e estratégias de aprendizagem em história” (CAIMI, 2009, p. 70,

grifo nosso). A partir dessa premissa norteadora, enfatiza-se o trabalho com fontes e vestígios

(25)

em sala de aula, dentre os quais torna-se indispensável o uso de documentos contemporâneos aos alunos e, dentre estes, listam-se os quadrinhos.

Assim, a fonte histórica se faz um dos pontos altos da concepção do saber historiográfico. A fonte considerada ideal para o estudo da história, só “comunica” se o pesquisador (historiador) souber lhe fazer as perguntas adequadas. Para tanto, ressaltam-se alguns questionamentos a fim de se extrair o máximo de informações possíveis desta fonte, como: Quem a produziu? Quando? Em que contexto? Com qual finalidade? A quem se destinava? Com isso, tanto o docente pesquisador, como o historiador, tem a tarefa árdua de estar continuamente pensando, refazendo e aprendendo com sua práxis, procurar sempre novas alternativas e novos caminhos para ensinar, avaliando e experimentando novos recursos é o que torna seu fazer profissional indispensável para a sociedade. Para tanto, as HQs despontam como uma probabilidade para a escrita da história. As HQs, como qualquer outra produção cultural, possuem sua historicidade e podem ser consideradas uma fonte riquíssima em recursos para a sala de aula. Logo, tomando-a por objeto de estudo da historiografia, analisam-se suas características enquanto objeto físico (o papel em que foi impresso, se tem a lombada quadrada, se é grampeada ou colada, colorida ou não) e quanto ao seu conteúdo (informações, ideologia, ficção, verossimilhança).

2.2 O CONCEITO DE FONTE HISTÓRICA E SUA RELAÇÃO COM O ENSINO DE HISTÓRIA.

Principiando pela ideia mais propagada desde a metade do séc. XIX, quando a História se estabeleceu como disciplina acadêmica e seus métodos rigorosos de análise foram impostos por historiadores tradicionais/positivistas, o documento histórico foi definido como:

“uma folha (ou várias folhas) de papel escrito por alguém importante”. (KARNAL; TATSCH, 2009, p. 10)

O primado da fonte documental escrita (oficial) era privilegiado por pautar-se na creditada autenticidade do mesmo. Este assumia a condição de fundamento do fato histórico, tomado como verdade absoluta e irrefutável, revelador do passado. Na afirmação das autoras Schimidt e Cainelli (2004, p. 112): “O trabalho do historiador seria extrair do documento a informação que nele estava contida, sem lhe acrescentar nada de seu. O objetivo era, então, mostrar os acontecimentos tal como tinham sucedido”.

Tanto historiadores e professores, quanto alunos passaram a ser meros reprodutores e

receptores passivos da memorização desta história tradicional, que visava explicar “as

(26)

genealogias das nações, os grandes nomes, as datas mais relevantes, os grandes acontecimentos, desde sua origem até a atualidade” (SCHIMIDT; CAINELLI, 2004, p. 112).

Essa concepção está intimamente ligada à escola metódica de preceitos positivistas, crente de que a comparação de documentos permitia reconstituir os acontecimentos do passado, desde que encadeados numa correlação explicativa de causas e consequências (JANOTTI, 2005, p.

11).

O sentido dado às fontes passou a ampliar-se a partir do final do séc. XIX, graças às teorias estabelecidas por Karl Marx e Friedrich Engels sobre a pretensa “objetividade imparcial da história” e o “materialismo histórico”, assim como da difusão dos princípios e métodos da “Pedagogia da Escola Nova”, quando houve algumas modificações na utilização das fontes históricas. Segundo Schmidt e Cainelli (2004, p. 115):

Essa pedagogia deslocou para o aluno o centro do processo ensino-aprendizagem.

Assim, passou a ser recomendado ao professor que se tornasse, principalmente, orientador do aluno. No caso do ensino da História, a utilização de documentos tornou-se uma forma de o professor motivar o aluno para o conhecimento histórico, de estimular suas lembranças e referências sobre o passado e, dessa maneira, tornar o ensino menos livresco e dinâmico.

Os métodos de Ensino de História empregados pela pedagogia da Escola Nova visavam dar mais autonomia para o aluno. A ideia era que o aluno entrasse em contato direto com as realidades passadas através dos textos, vislumbrando um novo arcabouço de informações. Já para os professores, “o documento servia como um suporte didático que possivelmente tiraria o aluno da passividade e reduziria as distâncias entre suas experiências de mundo para a de outros mundos” (SCHMIDT; CAINELLI, 2004, p. 10-11).

A mudança do tratamento didático, isto é, o lugar do documento na relação ensino- aprendizagem fez incluir e ampliar o entendimento de fonte histórica. Começavam a ser utilizadas em sala de aula os mapas geográficos, os filmes e as gravuras. Contudo, apesar da inserção destas novas ferramentas didáticas para o Ensino, permanecia sobre elas o mesmo olhar, o mesmo trato metodológico tradicional da linearidade de acontecimentos, mesma enfoque sobre os feitos heroicos. A fonte continuou sendo tomada como uma prova irrefutável do passado por não desenvolver um olhar crítico e não problematizar as fontes abordadas.

A renovação historiográfica, trazida pelos Annales no século XX, conheceu uma

extraordinária expansão na possibilidade de utilização de diversos tipos de fontes históricas

disponíveis ao historiador, para o Ensino e à pesquisa da História. Essa expansão documental

foi bastante significativa por começar com a gradual multiplicação de possibilidades do uso

(27)

de fontes textuais – fontes tradicionalmente registradas pela escrita –, avançando para outros tipos de fontes e outros campos do saber, abrindo ao “historiador a possibilidade de também trabalhar com fontes não-textuais: as fontes orais, as fontes iconográficas, as fontes materiais, ou mesmo as fontes naturais” (BARROS, 2010, p. 75).

Com a percepção dos Annales, a História se unia interdisciplinarmente a outras áreas de saber que investigavam as diversas estruturas sociais, a política, a economia, a cultura, a religião. Ao primar pelo trabalho conjunto com outras disciplinas, os Annales deu um im- portante passo para um melhor entendimento da História e ao historiador exigia-se uma melhor capacitação e domínio dos métodos de interpretação, entendendo que as fontes deveriam ser criticadas e historicizadas.

A este respeito, Febvre (1965, p. 98) alertava que “sem problema não há história”.

Ao problematizar os documentos, as fontes passavam a ser os elementos pelos quais

“historiadores se apropriavam, por meio de abordagens específicas, métodos diferentes, técnicas variadas, dos discursos históricos” (PINSK; LUCA, 2009, p. 7). Cercando as fontes, o historiador dos Annales ampliava a sua práxis historiográfica quando da formulação de um problema; e a problematização questionava a natureza e a tipologia da fonte. Ascendendo a História Quantitativa, do Cotidiano, da Sexualidade, do Gênero e de tantos outros novos campos de investigação e das perspectivas, ao longo do século XX, ampliava-se igualmente o entendimento do termo “documento histórico”. Sobre isso, Ragazzini (2001, p. 14) afirma que:

A fonte é uma construção do pesquisador, isto é, um reconhecimento que se constitui em uma denominação e em uma atribuição de sentido; é uma parte da operação historiográfica. Por outro lado, a fonte é o único contato possível com o passado que permite formas de verificação.

Por um lado, a fonte não fala por si, são vestígios deixados, representações, testemunhos de uma realidade passada que respondem aos questionamentos feitos no sentido de extrair, confirmar, contestar ou acumular conhecimento histórico. Em outras palavras, pode-se dizer que, na operação historiográfica, o sujeito produz o conhecimento e os meios, de que ele se utiliza, interagem um sobre o outro (fontes), de modo que se o “Historiador sempre escreve seu texto de um lugar no mundo social e no tempo, ao mesmo tempo ele mesmo pode se transformar a partir da sua própria experiência com as fontes” (BARROS, 2010, p. 73, grifo nosso).

Os caminhos percorridos e os embates travados entre a “Nova História” e a “História

Positivista” guiaram inovações sobre a compreensão acerca das fontes históricas. Esta nova

(28)

visão e conceituação ensejaram um visível aumento das possibilidades de o professor traba- lhar em sala de aula com variados temas. Percebia-se que quando as fontes eram adequadamente utilizadas e arguidas na pesquisa refletia-se no ensino de História uma compreensão mais adequada, contextualizada e interdisciplinar do passado na educação escolar.

Propagar a História ou conhecimento histórico de maneira contextualizada, relacionando o sujeito, o objeto, a fonte, o tempo e o espaço tornava-se uma perspectiva de ensino igualmente mais aberto e condizente com as demandas locais. Nessa percepção de História ensinada, busca-se desenvolver o aluno-cidadão-crítico, aberto à História e consciente de sua participação nos acontecimentos atuais e que, em certo tempo, virará passado. (BITTENCOURT, 2005, p. 57). Este aluno deve perceber-se como sujeito histórico,

“partícipe no processo de ensino e aprendizagem, inserido num âmbito dialógico crítico onde se aproprie dos saberes singulares desenvolvidos em sala de aula e adapte-se ao contexto de sua vida” (TAMANINI, 2017). Trata-se, então, de reafirmar nos professores e alunos a percepção das relações constitutivas entre o mundo acadêmico e o escolar no Ensino de História.

2.3 DIALOGANDO COM A INTERDISCIPLINARIDADE

Uma das características que margeou os últimos séculos foi a frequente reorganização do conhecimento. Para a Historiografia atual, as culturas, as mentalidades e as expectativas de qualquer indivíduo são fruto de um entendimento do passado, resultado da influência ou da sua participação ativa dentro de grupos sociais, étnicos, de gênero, regionais, no decurso do tempo. Em virtude de se ter uma percepção diversa da vida, constata-se a interligação entre as diferentes esferas, macro e micro do conhecimento. Assim, se a realidade é multidimensional, decorre disso que o conhecimento interdisciplinar vem ao encontro dessa sociedade e de quem acredita na possibilidade de integração, defendendo um novo olhar sobre si e sobre o mundo.

Autoras como Klein (1998) e Fazenda (1999) trabalham o conceito de interdisciplinaridade. Em Klein, a interdisciplinaridade se fundamenta na unificação da ciência, na síntese e na integração do conhecimento. Já o conceito interdisciplinar em Fazenda (1999) não possui um sentido único, estável, mas caracteriza-se mais pela intensidade das trocas entre os especialistas e pela integração das disciplinas num mesmo campo.

Trabalhar a interdisciplinaridade nesta perspectiva não é um modismo, mas sim um

confronto direto e constante aos desafios que exigem um repensar das práticas docentes e a

(29)

compreensão da sua concepção. É desenvolver uma visão articulada e integrada do agir humano em determinado tempo e que repercute em diversos segmentos dos grupos organizados: igreja, associações, coletividades, grupos étnicos, escola etc. Tal repercussão integra também os conteúdos das diferentes disciplinas em outras áreas de conhecimento, tal como propõe os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). A este respeito, Fazenda (1999, p.

35) ressalta que:

A tentativa de formular um novo discurso sobre o homem é de todo válida, desde que a consciência pedagógica esteja suficientemente esclarecida sobre as implicações dessa mudança, as limitações a serem superadas e o ônus de trabalho e envolvimento que a interdisciplinaridade impõe.

Entretanto, faz-se uma ressalva quanto ao perigo de que as práticas interdisciplinares firmem práticas vazias, sem aprofundamentos quanto as reais, profundas e efetivas integrações de saberes. Essa interdisciplinaridade dita vazia é a que mais tem sido criticada na prática educacional porque se observa uma mecânica e suave troca sem a devida compreensão dialógica entre as especificidades. Troca de saberes significa, portanto, um movimento de ida e vinda, de construção, desconstrução e de reconstrução do conhecimento, entre o novo e o velho, sem incorrer no risco de se perder uma das coisas que é tão cara à pesquisa: às vozes daqueles que ficaram pelo caminho – os excluídos, os esquecidos, os silenciados.

Por sua vez, Santomé (1998, p. 80) trata de uma interdisciplinaridade crítica que

“obrigaria a uma deliberação coletiva de problemas públicos e a presença das memórias reprimidas e silenciadas na análise das experiências de caráter sócio histórico”. Essa perspectiva crítica implica o repensar, o redescobrir e o reconceituar as vozes daqueles que ficaram “esquecidos”. Afinal para o autor, a interdisciplinaridade se constrói de maneira não linear, sendo construída de tempos em tempos e que é demarcada por espaços. Não existirá uma receita para se agir interdisciplinarmente.

Conforme Santomé (1998, p. 45):

Também é preciso frisar que apostar na interdisciplinaridade significa defender um novo tipo de pessoa, mais aberta, mais flexível, solidária, democrática. O mundo atual precisa de pessoas com uma formação cada vez mais polivalente para enfrentar uma sociedade na qual a palavra mudança é um dos vocábulos mais frequentes e onde o futuro tem um grau de imprevisibilidade como nunca em outra época da história da humanidade.

Nesse sentido, o papel e a postura do profissional do ensino que se preocupa com a

construção de uma didática transformadora e interdisciplinar são a possibilidade de trocas

intermitentes entre saberes, o estímulo de autoconhecimento sobre a prática de cada um e a

(30)

soma das especificidades para o bem comum. Decorrente disso, o conhecimento interdisciplinar resulta da necessidade de integração e interação capaz de transformar o conhecimento formal em um modo se saber integralizante e em continuidade.

Dito isto, é prudente para esta pesquisa abordar as HQs em uma perspectiva interdisciplinar, já que se trata de um gênero documental híbrido de ensino que alia a expressão artística da linguagem verbo-visual à diversidade de temas da historiografia. Aliar o conhecimento formal da História Ensinada aos saberes da Arte dos Quadrinhos implica em buscar artefatos e fundamento teórico em outras áreas de conhecimento para uma producente pesquisa acerca do Ensino de História, sem correr o risco de se perder pelos meandros de uma investigação vazia ou confusa. As HQs são uma forma de expressão artística de fácil acesso aos alunos, capaz de interligar temas, temporalidades, discussões etc., propiciando o diálogo e a integração entre os saberes específicos das disciplinas de História, das Artes, da Língua Portuguesa, da Geografia, da Moda, da Biologia, da Filosofia.

Outro ponto relevante e que facilita a integração dos saberes se dá por conta dos textos enxutos, de suas imagens dinâmicas, cores encantadoras e símbolos atraentes e sinestésicos. A forma sinóptica das HQs de informar atrai a atenção dos alunos de qualquer idade, crianças, adolescentes, jovens e adultos. Portanto, quando aplicadas ao Ensino, as HQs têm grande potencialidade de oferecer ao aluno conhecimentos de História através da interlocução de frases e textos sintéticos, cores e formas capazes de informar o discente sobre o passado, pela visualidade. O Ensino de História deixa então de ser enfadonho, pesado, somente textual, para transmutar-se em algo mais dinâmico, em uma disciplina viva e fascinante propensa a contribuir com a formação integral de alunos-sujeitos senhores de seu tempo e espaços.

2.4 OS QUADRINHOS COMO FONTE HISTÓRICA

Pensar qual o método mais apropriado para se trabalhar as HQs como fonte de pesquisa e Ensino, é antes de tudo percebê-las como um documento. No caso particular das HQs, os historiadores deparam com a necessidade de se pensar uma metodologia específica para utilizá-las na medida em que são empregadas enquanto fontes explicativas, calcadas em leituras sobre a realidade. Em decorrência disso, tem-se também uma percepção mais precisa sobre a metodologia de Ensino de História quando do uso das imagens em uma aula.

O debate em torno das HQs e sua utilização no Ensino vem sendo defendido e

ampliado por vários pesquisadores das áreas de Ciências Humanas. Dentre eles, destaca-se a

Luyten, pesquisadora da Linguagem dos Quadrinhos no Brasil: “Em todas as áreas temos,

(31)

portanto, a possibilidades de encontrar os quadrinhos. O que importa, porém, é de onde vêm essas histórias e quem as escreve, pois elas são excelentes veículos de mensagens ideológicas e de crítica social” (LUYTEN, 1993, p. 7).

A compreensão das HQs enquanto uma linguagem híbrida, que mescla imagem e texto de maneira sequencial, conjuga elementos necessários a formação de um discurso coerente para quem as utiliza, pois traz em seu íntimo “possibilidades de uma nova forma de expressão estética fortalecida e secundada pela imagética que acompanha o texto” (LIMA, 2011, p. 3). No tocante a isso, Nildo Viana em sua obra “o que os quadrinhos dizem?”, afirma:

Uma das grandes questões dos quadrinhos está nas mensagens que eles repassam.

As HQs, desde o seu nascimento, são uma forma de comunicação e, portanto, uma forma de enviar mensagem. Por meio das imagens desenhadas, das palavras e diálogos, da representação pictórica, os quadrinhos manifestam valores, sentimentos, concepções, etc. Neste processo, o papel proeminente dos quadrinhos é repassar as ideias e valores dominantes. (VIANA, 2008, p. 2).

A opinião de ambos os autores nos permite pressupor que os quadrinhos, enquanto fontes para o estudo da História, estão permeados, implícita ou explicitamente de ideias, valores, práticas e ideologias do mundo vivido do autor e compartilhado pelos grupos que a ressignificam. Dessa perspectiva, cabe destacar a importância da leitura e problematização dos quadrinhos a partir de sua natureza, já que nem todas as HQs tratam diretamente de acontecimentos históricos e são apenas produtos para um tipo de consumidor de entretenimento.

Por essas razões, as HQs devem antes de tudo ser catalogadas como material didático ou não, para depois serem analisadas em suas construções conteudistas, conforme seu alcance e potencial de expressão. Elas não são um mero conjunto imagético que sempre servirá para o ensino. Segundo Lima (2011, p. 5):

É chegado o momento em que podemos admitir, com certa segurança, que estas fascinantes peças culturais podem servir na formação do conhecimento histórico, trabalhando com a ideia de agenciamento/subjetividade, tanto como fontes, ou como ferramentas pedagógicas.

Por isso, ao analisarmos as HQs, deve-se verificar seu propósito e função.

Entendendo o contexto em que foram construídas, se entenderá o conjunto de seus signos,

símbolos, normas, códigos, expectativas” (ROMANI, 2016, p. 5). Desse modo, se a HQ,

enquanto fonte historiográfica privilegia pesquisadores que estejam interessados no passado,

dependendo de sua proposta editorial, falará para outros públicos que estão mais interessados

(32)

em seu presente e futuro do que naquilo que já se foi. Portanto, neste caso, não servem, como fonte historiográfica.

2.5 AS IMAGENS QUE SE IMPÕEM AO ESPECTADOR

Interpretar signos visuais, bem como suas especificidades, tornou-se pontual entre as necessidades de discentes e docentes do Ensino de História e, por isso, o estudo associado às imagens tornou-se uma das ferramentas mais utilizadas por professores para efetuar seu trabalho, tanto em pesquisas como no cotidiano da sala de aula.

O professor que deseja trabalhar com imagens em sala de aula precisa compreender as mesmas dentro de alguns parâmetros teóricos, que por vezes são de origens diversas, mas que fazem parte integrante de um universo visual muito maior, que abarca cinema, fotografia, pintura, HQs, charges etc. Para que elas, as imagens, não sejam tomadas simplesmente como ilustrações ou apêndices devem ser lidas como uma forma de linguagem capaz de manipular, dirigir ações e fazer compreender. Se os textos verbais manipulam, as imagens também o fazem pelo olhar. Será preciso então esmiuçar as imagens para retirar delas os conteúdos, a textualidade, os signos que o olhar tende a captar. Segundo o crítico de arte e historiador John Berger, o olhar chega antes da palavra, ou seja, os seres humanos antes de aprender a falar se comunicam pela visão. Assim, a acuidade de qualquer imagem é afetada por aquilo que entendemos ou acreditamos, demonstrando que toda imagem incorpora uma forma de ver e ser vista. Afinal, “olhar é um ato de escolha” (LITZ, 2009, p. 5).

Deve-se avaliar, portanto, os conteúdos das HQs, as influências ideológicas, as

informações implícitas, as intenções, as apologias e incentivos que estão à margem de um

processo ensino-aprendizagem que prime pela integridade humana, pelo respeito ao diferente

e pela liberdade de consciência. Isso posto que o próprio processo de cognição e codificação

da História ensinada compreende o aluno como um ator social capaz de decidir e de atuar no

meio em que vive. As HQs fortemente marcadas por ideologias ou por posicionamentos

políticos, por exemplo, devem ser estudadas como uma fonte de História. Eis, pois, a

importância do professor mediador em sala de aula ser capaz de treinar o olhar do aluno e

captar as armadilhas das linguagens implícitas das imagens.

(33)

3 A LINGUAGEM VISUAL NO ENSINO DA HISTÓRIA: A METÁFORA ENTRE A PALAVRA E A IMAGEM

Figura 3 - Ensino através das HQs

Fonte: PESSOA (2006)

O uso de imagens no Ensino de História é relativamente recente, sobretudo no Brasil.

A influência metodológica que dominou o saber historiográfico no país até 1980 suprimia significativamente a iconografia e outros recursos imagéticos do processo de ensino, transformando-o em uma atividade voltada à memorização sobretudo de narrativas e datas.

Atualmente, no Ensino de História se compreende a relevância das imagens como recurso didático indispensável para uma melhor compreensão do passado. Isso porque historiadores e professores de História atentaram para a força cada vez mais palpável da cultura visual, permeando não apenas a rotina de vida de determinados sujeitos, mas dominando toda a conjuntura social.

Cada vez mais a cultura visual se torna uma expressão de linguagem dinâmica e

interagente com outras formas de homens e mulheres se comunicar. Isto significa que a

cultura visual se desenvolve pela dialogia com outras linguagens. Nessa nova forma de

Referências

Documentos relacionados

Na Figura 4.7 está representado 5 segundos dos testes realizados à amostra 4, que tem os elétrodos aplicados na parte inferior do tórax (anterior) e à amostra 2 com elétrodos

The objectives of this article are as follows: (1) to describe the assessment protocol used to outline people with probable dementia in Primary Health Care; (2) to show the

Na população estudada, distúrbios de vias aéreas e hábito de falar muito (fatores decorrentes de alterações relacionadas à saúde), presença de ruído ao telefone (fator

Por meio destes jogos, o professor ainda pode diagnosticar melhor suas fragilidades (ou potencialidades). E, ainda, o próprio aluno pode aumentar a sua percepção quanto

O presente artigo discute o tema do Feminicídio, especificamente, na cidade de Campina Grande. A metodologia utilizada foi de natureza qualitativa e do tipo

Não podemos deixar de dizer que o sujeito pode não se importar com a distância do estabelecimento, dependendo do motivo pelo qual ingressa na academia, como

arbitrário para conseguir implantar com sucesso uma retórica opressiva e atrair seguidores (STENNER; HAIDT, 2018). Ao analisarmos a sociedade, portanto, entendemos

Muito embora, no que diz respeito à visão global da evasão do sistema de ensino superior, o reingresso dos evadidos do BACH em graduações, dentro e fora da