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DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA E O DIREITO DO TRABALHO

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FAMIG – FACULDADE MINAS GERAIS CURSO DE DIREITO

AARON FERRAREZ BOUZADA RODRIGUES

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA E O DIREITO DO TRABALHO

Belo Horizonte 2021

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AARON FERRAREZ BOUZADA RODRIGUES

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA E O DIREITO DO TRABALHO

Monografia apresentada à FAMIG – Faculdade Minas Gerais, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Carlos Henrique passos Mairink

Belo Horizonte

2021

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AARON FERRAREZ BOUZADA RODRIGUES

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURDICA E O DIREITO DO TRABALHO

Monografia apresentada à FAMIG – Faculdade Minas Gerais, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito.

BANCA EXAMINADORA

Orientador da instituição FAMIG

Membro da instituição FAMIG

Membro da instituição FAMIG

Belo Horizonte, 16 de junho de 2021

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RESUMO

A pessoa jurídica iniciou um período de crise motivado por abusos perpetrados em seu nome. A solução para os questionamentos acerca da consideração, havido fundamentalmente no campo jurisprudencial, motivou soluções casuísticas, adotadas normalmente com o objetivo de punir aqueles que se aproveitavam da personalidade jurídica. Iniciaram-se, então, ações tendentes a, quando necessário, superar a forma externa da entidade jurídica, para, penetrando nela, alcançar as pessoas e bens que, debaixo de seu véu, estivessem escondidas. A teoria da desconsideração da personalidade jurídica conseguiu situar-se definitivamente na teoria jurídica geral.

Trata-se de um remédio jurídico mediante o qual resulta possível prescindir da forma de sociedade com que se ache revestido um grupo de pessoas e bens, negando a sua existência autônoma como sujeito de direito diante de uma situação jurídica particular. O Novo Código de Processo Civil introduziu ao ordenamento jurídico nacional o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, previsto nos artigos 133 a 137. Com fincas nos artigos 769 da CLT e 15 do CPC, aplica-se o direito processual comum ao processo do trabalho.

Palavras-chaves: Desconsideração da personalidade jurídica; Direito do Trabalho;

Pessoa jurídica.

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ABSTRACT

The legal entity began a period of crisis, motivated by abuses perpetrated in its name.

The solution to the questions about the consideration, which occurred fundamentally in the jurisprudential field, motivated casuistry solutions, normally adopted with the objective of punishing those who took advantage of the legal personality. Actions were then initiated, tending, when necessary, to overcome the external form of the legal entity, in order to, by penetrating it, reach the people and goods that were hidden under its veil. The theory of disregarding the legal personality managed to place itself definitively in the general legal theory. It is a legal remedy through which it is possible to dispense with the form of society with which a group of people and goods is covered, denying its autonomous existence as a subject of law in the face of a particular legal situation. The New Code of Civil Procedure introduced to the national legal system the incident of disregard of the legal personality, provided for in articles 133 to 137. Based on articles 769 of the CLT and 15 of the CPC, common procedural law applies to the labor process.

Keywords: Disregard of legal personality; Labor law; Legal person.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 7

2 ACEPÇÃO CONCEDIDA AO TERMO “PESSOA JURÍDICA” ... 10

2.1 Direitos da pessoa jurídica ... 13

3 DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA ... 18

4 DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO DIREITO DO TRABALHO ... 25

5 CONCLUSÃO ... 32

REFERÊNCIAS ... 34

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1 INTRODUÇÃO

Doutrina da Desconsideração possibilita retirar, ainda que temporariamente, o véu da autonomia patrimonial e buscar o patrimônio dos sócios. É certo, portanto, que a teoria da desconsideração da personalidade jurídica pressupõe a existência de uma sociedade constituída de acordo com a legislação aplicável à

espécie. Em um primeiro momento, a importância da personalidade jurídica com os efeitos que lhe são inerentes era considerada insuscetível de afastamento, configurando-se, pois, em um verdadeiro dogma. Porém, a partir do século XIX começarão a surgir certas preocupações relativas à má utilização da autonomia patrimonial.

De qualquer modo, historicamente já́ se encontrava consagrado que o pressuposto para a desconsideração da personalidade jurídica reside na existência da entidade personalizada que, episodicamente, é ignorada em benefício dos credores de boa-fé, em razão de decisão judicial, a título de exceção do princípio da separação patrimonial. Trata-se, portanto, do instituto do disregard of legal entity, ou simplesmente, desconsideração da personalidade jurídica. Desta forma o problema de pesquisa foi: como se apresenta a desconsideração da pessoa jurídica frente às demandas do Direito do Trabalho?

O presente trabalho tem como objetivo discorrer sobre a desconsideração da pessoa jurídica no Direito do Trabalho. Serão ainda objetivos específicos desse estudo considerações sobre: (i) Diferenciar pessoa física de pessoa jurídica; (ii) discorrer sobre o incidente de desconsideração da personalidade jurídica; (ii) compreender a importância da aplicação do incidente de desconsideração da personalidade jurídica com parcimônia e em total observância às normas do Direito do Trabalho.

O presente artigo torna-se importante uma vez que pretende discutir essa

regulamentação do procedimento de desconsideração da personalidade jurídica,

demonstrando que a mesma era extremamente necessária, já que cada

ramificação do direito aplicava tal instituto de uma maneira, e os Tribunais

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Estaduais, bem como os Superiores, jamais lograram êxito em encontrar e adotar uma jurisprudência pacífica acerca da matéria no Direito do Trabalho.

Para responder aos questionamentos, foi realizada uma pesquisa descritiva bibliográfica de abordagem qualitativa. Pesquisa é definida por Gil (2008) como um procedimento racional, estruturado e sistêmico para investigar problemas científicos. Para este estudo, foi considerada a pesquisa descritiva, as quais são classificadas tendo como objetivo a descrição de um evento ou fato.

Quanto aos objetivos da pesquisa, esta foi classificada como descritiva. As pesquisas descritivas têm como finalidade principal a descrição das características de determinada população ou fenômeno, ou o estabelecimento de relações entre variáveis. São inúmeros os estudos que podem ser classificados sob este título e uma de suas características mais significativas aparece na utilização de técnicas padronizadas de coleta de dados. A pesquisa descritiva expõe as características de determinada população ou fenômeno, estabelece correlações entre variáveis e define sua natureza.

A pesquisa bibliográfica, considerada uma fonte de coleta de dados secundária, pode ser definida como: contribuições culturais ou científicas realizadas no passado sobre um determinado assunto, tema ou problema que possa ser estudado. A pesquisa bibliográfica é desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído, principalmente, de livros e artigos científicos e é importante para o levantamento de informações básicas sobre os aspectos direta e indiretamente ligados à nossa temática.

A abordagem de cunho qualitativo trabalha os dados buscando seu significado,

tendo como base a percepção do fenômeno dentro do seu contexto. O uso da

descrição qualitativa procura captar não só a aparência do fenômeno como

também suas essências, procurando explicar sua origem, relações e mudanças,

e tentando intuir as consequências. O uso dessa abordagem propicia o

aprofundamento da investigação das questões relacionadas ao fenômeno em

estudo e das suas relações, mediante a máxima valorização do contato direto

com a situação estudada.

(9)

Quanto aos métodos de pesquisa, por ser uma pesquisa bibliográfica, foi utilizada a coleta documental, empregando a estratégia de pesquisas em revistas acadêmicas de Direito, assim como livros e pesquisas cientificas que tenham como foco no tema ‘desconsideração da pessoa jurídica no Direito do Trabalho’. Para este estudo bibliográfico, artigos científicos, dissertações e teses referentes ao tema foram retirados de bases de dados, tais como Scielo e Google acadêmico utilizando as seguintes palavras chaves em português:

desconsideração da pessoa jurídica e Direito do Trabalho. Além dos artigos, autores consagrados na área do Direito também foram utilizados.

O modelo de análise representa a lógica usada neste estudo para se fazer a ligação entre os dados e as conclusões oferecidas após a execução da pesquisa.

Para a sistematização desta pesquisa, o autor se baseou no referencial teórico, adequando-o conforme prosseguimento da investigação. Após esta etapa, seguiu-se para a análise dos dados. A fase do tratamento do material incluiu uma teorização sobre os dados, produzindo o confronto na abordagem teórica anterior (Referencial Teórico) e as contribuições dos diferentes autores citados nesta pesquisa.

Foi, portanto, adotada a técnica de análise de conteúdo, que é uma técnica de investigação que, através de uma descrição objetiva do conteúdo obtido em dados de pesquisa. É destacada neste campo, a importância da semântica, ou seja, o significado das palavras, frases e textos para o desenvolvimento das análises, e posteriores interpretações para o entendimento da desconsideração da personalidade jurídica à luz do direito do trabalho.

O estudo conta de cinco capítulos. O primeiro é essa introdução na qual consta

o problema e os objetivos do estudo. O segundo capítulo descreve a descrição

e caracterização da pessoa jurídica. O terceiro capítulo mostra a base da

desconsideração da personalidade jurídica; o quarto capítulo apresenta o uso da

desconsideração da personalidade jurídica no Direito do Trabalho, e por fim as

conclusões do estudo.

(10)

2 ACEPÇÃO CONCEDIDA AO TERMO “PESSOA JURÍDICA”

Preliminarmente, é impositivo conhecer qual é a acepção jurídica concedida ao termo ‘pessoa’. No direito romano, somente se considerava pessoa o homem.

Posteriormente, o conceito evoluiu, e passou a abarcar o sujeito de direitos, não incluindo os escravos que eram objetos de direito (BORGES; NASCIMENTO, 2019). Disso deflui que para ser considerado sujeito de direitos era necessário ser livre e ser cidadão. Segundo Fidelis e Reis (2016):

No que diz respeito à personalidade, o final do século XIX marcou o início dos registros de alguns direitos já existentes. Considera-se personalidade aqueles direitos reconhecidos à pessoa humana frente à exigente sociedade, que está prescrita no ordenamento jurídico com o fito de defesa dos valores do homem, por exemplo: a vida, intimidade, imagem, nome, etc. Oportuno entabular que no Brasil a proteção aos direitos da personalidade está afixada nas normas constitucionais.

(FIDELIS; REIS, 2016, p. 4).

Com efeito, pessoa é, em princípio, o ser humano. Todavia, o direito permite a criação de abstrações, de ficções jurídicas denominadas de pessoas jurídicas.

Desse modo a personalidade civil à luz do ordenamento legal é: “Art. 1º Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil. Art. 2o A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro” (BRASIL, 2011). Ainda com relação a esse assunto tão importante para esta pesquisa, os autores Farias e Rosenvald (2015, p. 133) dizem que o conceito de pessoa - enquanto sujeito de direito abrangendo, a um só tempo, as pessoas naturais assim como as pessoas jurídicas.

Para Lotufo (2016), a partir da visão doutrinária e legislação vigente nota-se que

a imposição de personalidade civil em relação à pessoa natural surge a partir do

nascimento com vida, diferentemente da pessoa jurídica que, para a sua

constituição, necessita a inscrição no ato constitutivo. Além das pessoas

naturais, existem certos entes abstratos, visto que criados pela inteligência como

realidade jurídica, que se denominam pessoas jurídicas (pessoas morais, em

outras legislações), decorrentes do irrefreável espírito associativo dos seres

humanos, entes que atuam como sujeitos de direito.

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De acordo com Marques e Passos (2019, p.6) “o sujeito de direito é o titular de direitos e deveres em uma determinada relação jurídica. São sujeitos de direito as pessoas naturais e as pessoas jurídicas, às quais o ordenamento jurídico atribui titularidade jurídica”. São as pessoas jurídicas. Pessoa jurídica é uma entidade própria e inconfundível com as pessoas naturais que a compõem; seu patrimônio, igualmente, é distinto e inconfundível. Além das pessoas humanas, que são, em última análise, a razão de ser do Direito, das relações jurídicas, criam-se certos grupos sociais, de diversa finalidade, e até mesmo massas de bens constituídas para alcançar determinada finalidade, a que se atribuem direitos próprios.

Lotufo (2015), ainda aponta que são unidades abstratas, como referimos, a que denominamos pessoas jurídicas, as quais passam a ter direitos subjetivos e obrigações, no contexto social, regido pelo Direito. As limitações inerentes às pessoas humanas fizeram-lhes ver a necessidade da união de esforços para o atingimento de determinados fins, superação de dificuldades, que exigem maiores recursos.

De acordo com Rodrigues (2002), com esse ato surge a autonomia empresarial que visa resguardar os atos e atividades empresariais, contudo, o que deveria ser empregado em favor da empresa por demasiadas vezes é aplicada em desfavor de credores ou terceiros, o que não é o objetivo principal da autonomia.

Dessa forma, a pessoa jurídica nasce em razão da deficiência humana, tendo em vista que, por vezes, o homem não se encontra provido dos recursos necessários para atingir determinada finalidade, sendo necessário associar-se a outros, de modo a constituir um organismo capaz de atingir o objetivo colimado.

Quanto ao nosso direito positivo, o art. 40 do Código Civil Brasileiro estabelece a existência de pessoas jurídicas de direito público, interno e externo, e pessoas jurídicas de direito privado.

Nesta esteira, Borges e Nascimento (2019), afirmam que a personalidade

jurídica é compreendida como uma entidade incorpórea de cunho empresarial

que garante autonomia na vida jurídica e que tem o objetivo de resguardar e

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distinguir os atos e obrigações da sociedade empresária com os da pessoa natural.

Para Martinez (2020), o art. 45 do Código Civil é bastante claro ao estabelecer que a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado começa com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo. Já para Gonçalves (2013), a personalização tem por escopo estabelecer centro de interesses autônomos, distintos dos interesses das pessoas que compõem a pessoa jurídica.

É de se concluir que a pessoa jurídica possui personalidade jurídica diversa daqueles que integram a sociedade. Para Lotufo (2016), no Direito contemporâneo, predomina a aceitação da teoria da realidade técnica, porque se admite que não só a pessoa jurídica tem existência diversa da de seus membros como sua vontade é diversa da de seus componentes, além do que, a capacidade que lhe é atribuída pelo direito positivo não é a de seus integrantes, mas a que lhe foi atribuída no ato constitutivo, ou modificativo, portanto, por meio do exercício da autonomia privada.

O conceito de pessoa utilizado pelos ordenamentos jurídicos é um conceito técnico-jurídico, mas isso não quer dizer que ele não encontre limites metafísicos. A personalidade das pessoas naturais e das pessoas jurídicas assemelha-se operacionalmente, mas difere-se no plano das essências. A personalidade do ser humano, em decorrência da dignidade que lhe é imanente, é uma realidade que antecede ao direito. Desse modo, impõe-se ao legislador o reconhecimento da personalidade de todos os seres humanos. Já as pessoas jurídicas são uma criação do legislador para atender às necessidades do homem, assim, o ordenamento lhes concede a personalidade (COSTA, 2013, p. 77).

Pires (2014), afirma que insistir que a autonomia patrimonial é uma das mais

sobranceiras consequências da personalização, de forma a permitir que não só

os sócios, como também seus administradores sejam considerados como

pessoas distintas, pelos que são isentos de responsabilidade pelos atos sociais.

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Para Costa (2013), na hipótese de a sociedade

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contrair dívidas, por essas responderá integralmente e, até o montante de seu patrimônio, como acontece com qualquer um de nós. A toda evidência, a personalidade jurídica e a autonomia patrimonial são os limitadores da possibilidade de perda dos bens dos sócios em decorrência de determinado negócio lícito mais arriscado.

2.1 Direitos da pessoa jurídica

Pires (2014), considera-se que, se os direitos da personalidade são de caráter intransmissível e irrenunciável, parece-nos bastante certo asseverar que suas obrigações, em regra, também o serão e, portanto, em princípio, as obrigações das pessoas jurídicas não poderão ser cobradas das pessoas físicas que a constituem. Impende considerar, ainda, que a personalização da pessoa jurídica é de caráter instrumental, tendo por objetivo alcançar as finalidades a que ela se propõe e que, necessariamente, devem ser lícitos e em consonância com a ordem jurídica em vigor.

Assim, conforme afirma o Lotufo (2016), o direito positivo, para o reconhecimento da pessoa jurídica, exige forma. Sem a satisfação das formalidades prescritas, não existirá pessoa jurídica de direito, portanto com capacidade para a prática dos atos jurídicos. Outros requisitos existem, que vão muito além dos formais, como os fins legais, que também se denominam objeto lícito.

Para Madaleno (2009), diferente da pessoa física, que tem existência biológica e sua personalidade jurídica se dá com o seu nascimento com vida, a formação da personalidade da pessoa jurídica decorre da sua inscrição na Junta Comercial. Existem as organizações econômicas dotadas de personalidade jurídica e patrimônio próprio, constituídas, de ordinário, por mais de uma pessoa física ou mesmo jurídica, denominadas de sociedades empresárias, com o objetivo de produzir ou trocar bens ou serviços com fins lucrativos. A personalidade jurídica é uma ficção criada pela lei, com o único propósito de

1 No tocante às sociedades, tem-se que a finalidade é basicamente econômica, razão pela qual são divididas em civis e mercantis. Essa classificação acabou por levar parte da doutrina, na elaboração dos manuais, a restringir às mercantis o fim econômico.

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conferir trânsito à associação humana em sua atividade empresarial, é produto da vontade humana criado para a consecução de determinados fins. Com a formação da pessoa jurídica também foi possível limitar a responsabilidade e mitigar os riscos experimentados pelo comerciante. A pessoa jurídica, como criação da lei, atua à semelhança da pessoa natural, até onde isto seja viável e factível e, uma vez constituída, adquire capacidade para se tornar sujeito de direito e para exercer direitos e contrair obrigações.

A finalidade prática da personificação da sociedade é a de estabelecer a separação do patrimônio dos sócios em relação ao da sociedade, porque, não obstante os sócios ingressem na sociedade, de regra com o aporte de bens ou recursos financeiros pessoais, transferem para ela bens e valores que passam para a sua titularidade, restando os sócios com o direito à participação nos lucros sociais, quando houver, e a uma parcela do acervo social líquido quando da eventual extinção da sociedade (MADALENO, 2009, p. 14).

De igual forma, Gonçalves (2013, p. 216), preceitua que a sociedade também possui patrimônio distinto daqueles que integram o seu quadro societário. Logo, ao se personalizar a sociedade empresária, e a ela conferir o título de “pessoa”, cria-se, por corolário, a autonomia patrimonial, na medida em que os sócios usam seu dinheiro ou bens para constituir a empresa e, a partir daí, esses passam a pertencer à Sociedade.

A pessoa jurídica consiste num conjunto de pessoas ou de bens, dotado de personalidade jurídica própria e constituído na forma da lei, para a consecução de fins comuns. Pode-se afirmar, pois, que as pessoas jurídicas são entidades a que a lei confere personalidade, capacitando-as a serem sujeitos de direito e obrigações (Gonçalves, 2013, p. 216).

Pires (2014), afirma que insistir que a autonomia patrimonial é uma das mais sobranceiras consequências da personalização, de forma a permitir que não só os sócios, como também seus administradores sejam considerados como pessoas distintas, pelo que são isentos de responsabilidade pelos atos sociais.

Assim, na hipótese de a sociedade

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contrair dívidas, por essas responderá integralmente e, até o montante de seu patrimônio, como acontece com qualquer

2 No tocante às sociedades, tem-se que a finalidade é basicamente econômica, razão pela qual são divididas em civis e mercantis. Essa classificação acabou por levar parte da doutrina, na elaboração dos manuais, a restringir às mercantis o fim econômico.

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um de nós. A toda evidencia, a personalidade jurídica e a autonomia patrimonial são os limitadores da possibilidade de perda dos bens dos sócios em decorrência de determinado negócio lícito mais arriscado.

Segundo Fidelis e Reis (2016, p. 5), o Código Civil, em seu artigo 1o, estabelece que toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil. Em seu artigo 11, dispõe sobre a intransmissibilidade e irrenunciabilidade dos direitos de personalidade, “com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária”.

Desta forma, Pires (2014), considera que os direitos da personalidade são de caráter intransmissível e irrenunciável. Parece bastante certo asseverar que suas obrigações, em regra, também o serão e, portanto, em princípio, as obrigações das pessoas jurídicas não poderão ser cobradas das pessoas físicas que a constituem. Impende considerar, ainda, que a personalização da pessoa jurídica é de caráter instrumental, tendo por objetivo alcançar as finalidades a que ela se propõe e que, necessariamente, devem ser lícitos e em consonância com a ordem jurídica em vigor.

Sendo assim, considera-se a pessoa jurídica titular de “todos os direitos e obrigações oriundos do exercício de suas atividades econômicas, possuindo capacidade processual e patrimônio distinto dos seus componentes” (SILVA, 2015, p. 4). A doutrina da desconsideração possibilita retirar, ainda que temporariamente, dúvidas sobre a autonomia patrimonial e buscas ao patrimônio dos sócios. É certo, portanto, que a teoria da desconsideração da personalidade jurídica pressupõe a existência de uma sociedade constituída de acordo com a legislação aplicável à espécie (PIRES, 2014).

Em um primeiro momento, a importância da personalidade jurídica com os

efeitos que lhe são inerentes era considerada incapaz de afastamento,

configurando-se, pois, em um verdadeiro dogma. Porém, a partir do século XIX

começaram a surgir certas preocupações relativas à má utilização da autonomia

patrimonial. Verifica-se que o início da desconsideração da personalidade

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jurídica reside nos países que adotam o common law, a exemplo do Reino Unido e Estados Unidos.

A decisão judicial precursora da teoria da desconsideração da personalidade jurídica remonta ao ano de 1809, no caso Bank of United States × Deveaux, quando o juiz Marshall manteve a jurisdição das cortes federais sobre as corporations – a Constituição Americana (art.

3o, seção 2a) reserva a tais órgãos judiciais as lides entre cidadão de diferentes Estados. Ao fixar a competência acabou por desconsiderar a personalidade jurídica, sob o fundamento de que não se tratava de sociedade, mas sim de sócios contendores (PIRES, 2014, p. 121).

Pires (2014), argumenta que de outra parte, caso a sociedade seja utilizada em desconformidade com os seus objetivos legais, impossível será invocar a questão da autonomia patrimonial, surgindo, assim, a teoria da desconsideração da personalidade jurídica. Latufo (2016), completa afirmando que diversa é a situação dos grupos de pessoas e coisas de personificados, já́ que o sistema lhes confere a condição de sujeitos de direito, como temos com a massa falimentar, o espólio, os condomínios de edifícios etc.

De acordo com Martinez (2020, p.286), “tão logo adquiriu o status de ente capaz de direitos e obrigações, a pessoa jurídica iniciou um período de crise, motivado por abusos perpetrados em seu nome”. A solução para os questionamentos acerca da consideração, havido fundamentalmente no campo jurisprudencial, motivou soluções casuísticas, adotadas normalmente com o objetivo de punir aqueles que se aproveitavam da personalidade jurídica. Inicia-se, então, ações tendentes a, quando necessário, superar a forma externa da entidade jurídica, para, penetrando nela, alcançar as pessoas e bens que debaixo de seu véu estivessem escondidas.

Como colocado por Madaleno (2009), em conformidade com o artigo 985 do

Código Civil a sociedade adquire personalidade jurídica com a inscrição no

registro próprio e na forma da lei, dos seus atos constitutivos, porquanto, sem o

registro, empresa e empresário existem tão somente no mundo abstrato,

contratual, só adquirindo regularidade e existência jurídica, vale dizer,

personalidade jurídica com sua inscrição no Registro Público de Empresas

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Mercantis a cargo da Junta Comercial da respectiva sede (artigos 45 e 1.150 do Código Civil).

Para Madaleno (2009, p. 19), enquanto ausente o registro, esta sociedade ainda

não personificada é denominada sociedade em comum, “cuja existência os

sócios só podem provar por instrumento escrito, mas os terceiros podem prová-

la de qualquer modo (artigo 987 do Código Civil)”. Inexistindo contrato escrito,

trata-se de uma sociedade despersonalizada, podendo ser uma sociedade

irregular ou uma sociedade de fato.

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3 DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

O artigo 50 do Código Civil brasileiro trouxe para a ordem jurídica positiva o fundamento da teoria da desconsideração da personalidade jurídica como ágil instrumento para restringir o absolutismo deste instituto, que constitui uma criação da lei, uma concessão do Estado para realização de um fim. De acordo com o que profere Madaleno (2009), deve o Estado, contudo, ter a faculdade de observar se o direito concedido está sendo adequadamente utilizado, e a unidade societária não vem sendo posta a serviço da fraude ou do abuso do direito com vistas à ilícita obtenção de vantagens. Isso porque a personalidade jurídica é unicamente um atributo conferido a certas organizações sociais, sendo a separação patrimonial, somente, uma consequência desta atribuição decorrente da desconsideração.

Desta ficção legal surge um conceito de pessoa jurídica como ente separado de seus membros e com um patrimônio social que não responde pelas dívidas de seus sócios. Assim, vista a pessoa jurídica como ente autônomo e com patrimônio próprio, deve atender as suas finalidades sociais, sem qualquer desvio malicioso de suas funções, porquanto, ultrapassando os limites de sua personalidade, a doutrina do levantamento do véu societário tem episódica atuação, porque não é dado aos sócios ou acionistas utilizar a pessoa jurídica como instrumento de seus interesses pessoais, estranhos à função da empresa (MADALENO, 2009, p. 71).

Como afirma Madaleno (2009), em um primeiro momento, a importância da personalidade jurídica com os efeitos que lhe são inerentes era considerada incapaz de afastamento, configurando-se, pois, em um verdadeiro dogma.

Porém, a partir do século XIX começaram a surgir certas preocupações relativas à má utilização da autonomia patrimonial. Verifica-se que o início da desconsideração da personalidade jurídica reside nos países que adotam o common law, a exemplo do Reino Unido e Estados Unidos.

Conforme Soares (2019, p. 123), inicialmente a desconsideração da

personalidade jurídica foi aceita pela promulgação do código de defesa do

consumidor, nos anos de 1990. O Instituto da pessoa jurídica é uma técnica de

separação patrimonial. Os membros dela não são os titulares dos direitos e

obrigações imputados à pessoa jurídica. “Todas as normas indicadas são de

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caráter material e possuem a finalidade de informar em quais hipóteses a pessoa jurídica pode ser desconsiderada para que a responsabilidade chegue até as pessoas dos seus sócios”.

Dessa forma, compreende-se a doutrina da disregard of legal entity – pelo menos da maneira como foi criada – de maneira positiva, com o intuito de proteger o instituto da pessoa jurídica e não de destruí-lo.

Como se argumentará e provará em detalhes no decorrer da presente pesquisa, percebe-se que no Brasil – e especialmente na Justiça do Trabalho – não é o instituto da pessoa jurídica que está sofrendo abuso, mas sim a própria aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica (ZONARY e CAVALCANTE, 2019, p. 108).

Soares (2019), afirma que as pessoas jurídicas não se confundem com as pessoas que a compõem. Daí, o patrimônio da pessoa jurídica é distinto dos sujeitos que a integram. Porém, tem interpretações distintas no campo do direito material e no direito processual.

A

intenção da desconsideração da pessoa jurídica é permitir a responsabilização dos sócios por atos que possam caracterizar o desafio de finalidade. Se no campo do Direito material a desconsideração da pessoa jurídica serve para coibir os desvios de finalidade, no direito processual a desconsideração da pessoa jurídica é forma de intervenção de terceiros no qual os sócios que a princípio figuravam no processo como parte, passam a ser responsáveis (bens) por atos praticados pela pessoa jurídica(...) A desconsideração da pessoa jurídica apresenta-se como um imprescindível mecanismo de coibição dos abusos cometidos pelos membros (sócios) de uma dada pessoa jurídica (sociedade empresária ou não empresária) que verifica pela utilização indevida de proteção da conferida pela personalidade jurídica (SOARES, 2019).

Para Soares (2019) existe o princípio da autonomia patrimonial, uma vez que as

pessoas jurídicas não se confundem com as pessoas que a compõem. Daí o

patrimônio da pessoa jurídica é distinto dos sujeitos que a integram. Porém tem

interpretações distintas no campo do direito material e no direito processual. A

intenção da desconsideração da pessoa jurídica é permitir a responsabilização

dos sócios por atos que possam caracterizar o desafio de finalidade. Se no

campo do Direito material a desconsideração da pessoa jurídica serve para coibir

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os desvios de finalidade, no direito processual a desconsideração da pessoa jurídica é forma de intervenção de terceiros no qual os sócios que a princípio figuravam no processo como parte, passam a ser responsáveis (bens) por atos praticados pela pessoa jurídica(...) A desconsideração da pessoa jurídica apresenta-se como um imprescindível mecanismo de coibição dos abusos cometidos pelos membros (sócios) de uma dada pessoa jurídica (sociedade empresária ou não empresária) que verifica pela utilização indevida de proteção da conferida pela personalidade jurídica (SOARES, 2019).

Conforme coloca Coelho (2012, p. 23), “em razão do princípio da autonomia patrimonial, as sociedades empresárias podem ser utilizadas como instrumento para a realização de fraude contra os credores ou mesmo abuso de direito”.

Na medida em que é a sociedade o sujeito titular dos direitos e devedor das obrigações, e não os seus sócios, muitas vezes os interesses dos credores ou terceiros são indevidamente frustrados por manipulações na constituição de pessoas jurídicas, celebração dos mais variados contratos empresariais, ou mesmo realização de operações societárias, como as de incorporação, fusão ou cisão (COELHO, 2012, p. 23).

Quanto às colocações do direito positivo, o primeiro diploma legal a tratar da questão foi a Lei 8.078/90 – Código de Defesa do Consumidor – que em seu art.

28 assim dispõe:

Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má́ administração.

[...]

§ 5o Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores

Logo em seguida sobreveio a Lei Antitruste – Lei 8.884/94, atualmente revoga- da pela Lei 12.529/11, que preservou a hipótese da desconsideração da personalidade jurídica, nos seguintes termos: Art. 34. A personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver da parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social (PIRES, 2014).

Por sua vez, a Lei 9.605/98 sobre a responsabilidade por danos ao meio

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ambiente, onde o legislador pátrio, mais uma vez, possibilitou a desconsideração da personalidade jurídica em seu art. 4º, conforme exemplos a seguir.

Parágrafo único. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má́ administração. Art. 4o Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente.

Entre outros exemplos, tem-se o Novo Código Civil que, em seu art. 50, dispõe sobre a desconsideração da personalidade jurídica nos seguintes termos:

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

É importante lembrar que a desconsideração da personalidade jurídica só deve acontecer a título excepcional, quando devidamente necessário. Para que não reste qualquer dúvida, releva enfatizar que a desconsideração da personalidade jurídica é uma medida excepcional e como tal deverá ser tratada (PIRES, 2014).

Segundo Soares (2019), a desconsideração da personalidade jurídica só pode acontecer quando da existência de dois pressupostos, quais sejam: (i) insuficiência patrimonial da pessoa jurídica (requisito objetivo); (ii) desvio de finalidade ou confusão patrimonial por meio de fraude ou de abuso de direito (requisito subjetivo). Ambos os requisitos são necessários para a evidência da desconsideração da pessoa jurídica.

Para Da Gama (2009), não é indicado utilizar do instituto desconsideração da

personalidade jurídica sem antes estar claro sua necessidade para o

cumprimento da obrigação que se busca com a desconsideração. Portanto, não

haveria motivo para desconsiderar a personalidade jurídica e buscar o

patrimônio dos sócios para fazer frente a eventuais débitos, se restar provado

que, embora seja possível a desconsideração, a sociedade tem condições de,

(22)

por si só, arcar com os pagamentos devidos, sem o socorro do patrimônio de seus sócios. Logo, a desconsideração da personalidade jurídica deve passar pelo crivo do princípio da necessidade, que não autoriza o afastamento do conceito de pessoa jurídica, caso não reste comprovado que essa é a única forma viável de se atingir o fim pretendido que se constitui na satisfação de eventuais débitos.

A Desconsideração da Personalidade Jurídica, tipificada nos artigos 133 a 137 da Lei nº 13.105/2015, regulamentando a forma instrumental e o procedimento desse instituto tão importante no processo democrático constitucionalizado, traz consigo a consagração do princípio da autonomia patrimonial. Esse princípio permite ao empresário ou a sociedade empresária, ao exercer o ato de arriscar-se na atividade empresarial exercida, sem se preocupar, em regra, com o seu patrimônio particular. Não obstante, é importante ressaltar que o princípio supramencionado possui presunção Iuris Tantum, admitindo sua mitigação em juízo (DA GAMA, 2009, p. 106).

Para Martinez (2020, p. 287), “a desconsideração da personalidade jurídica é um remédio jurídico por meio do qual se desestima a personalidade jurídica do empreendimento”, e desta forma, negando a existência autônoma como sujeito de direito, apreender o efetivo responsável pelo ato de violação, seu sócio ou diretor. Isso significa que qualquer desvio de finalidade perpetrado pelas pessoas naturais que materializam as ações das pessoas jurídicas, pode implicar a transferência de responsabilidade para os referidos agentes, pessoas naturais.

Parte da doutrina subdivide o incidente de desconsideração da personalidade jurídica em teoria menor e teoria maior. A teoria menor diz respeito à aplicação do art. 28, do CDC, para a proteção do vulnerável das relações jurídicas, visto que autoriza a desconsideração quando houver insolvência, sem a necessidade de comprovação de abuso de direito. A teoria maior defende que, para que ocorra o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, deve ser provado o "abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial", conforme disciplinado no art. 50, do CC/02

(PAIVA; DAINESE; CHESSA, 2019, p. 2).

Conforme coloca Leite (2020), antes da regulamentação pelo NNC da

desconsideração da personalidade jurídica, existiam diferentes análises do

instituto. Uma apreciação rápida sobre tais interpretações traz à luz alguns

equívocos sobre o tema. Além disso, o fenômeno da despersonalização do

empregador tem grande utilidade para a aplicação do instituto da

(23)

desconsideração da personalidade jurídica da empresa para fins de responsabilização subsidiária dos sócios da entidade societária, quando restar frustrada a execução trabalhista por ausência de bens da empresa executada (LEITE, 2020).

Como observa José Tavares Borba (1995, p. 33), a doutrina não tem o “alcance de anular a personalidade jurídica, mas tão só de afastá-la em certas situações, quando os sócios manipularam os interesses da sociedade para atenderem as suas pretensões pessoais”. O fundamento legal da desconsideração da personalidade jurídica enunciada pelo artigo 50 do Código Civil está em reprimir a manipulação da sociedade empresária nas hipóteses de abuso do direito, na confusão patrimonial e nas de fraudes cometidas sob a máscara societária, tutelando, assim, o princípio inerente da boa-fé nas relações obrigacionais, o qual não se compadece com o mau uso da forma jurídica.

A ideia da desconsideração da personalidade jurídica foi desenvolvida para proteger os credores de boa-fé contra fraudes e abusos cometidos com o instrumento da pessoa jurídica e será aplicável sempre que, por má-fé, dolo ou através de ato temerário, a sociedade estiver sendo empregada para dissimular escusos interesses. Desta forma, conforme salientam Zonary e Cavalcante (2019) a teoria da desconsideração se encontra concentrada na noção geral de abuso da personalidade jurídica, a qual poderá se realizar através do desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial. Conforme colocado por Redivo (2019), parte da doutrina entende que “o artigo 2°, § 2° da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) consagra a desconsideração da personalidade jurídica, uma vez que prevê a desconsideração de empresas de um grupo econômico”, sendo considerada por alguns como a primeira norma que positivou o referido instituto.

E ainda:

O artigo 10 da CLT, no mesmo sentido que elenca o artigo 488 da mesma legislação, prevê que “Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados”, quer dizer que qualquer mudança na estrutura jurídica da empresa, incluindo uma mudança no quadro societário, não atingirá seus empregados, pois estes possuem direito adquiridos (REDIVO, 2019, p.3).

(24)

Por fim, entende-se que a desconsideração da personalidade jurídica representa um avanço doutrinário e jurisprudencial de grande valia, notadamente como forma de se aceitar a responsabilidade patrimonial e particular dos sócios, em função dos débitos sociais das empresas em que são membros. Não se pode aceitar, por ser uma questão de justiça, o fato de os sócios recorrerem à ficção da pessoa jurídica para enganar credores, para fugir à incidência da lei ou para proteger um ato desonesto.

Pode e deve o Judiciário, como um todo, desconsiderar o véu da personalidade

jurídica, para que se possa imputar o patrimônio pessoal dos sócios, como forma

de se auferir elementos para a satisfação dos créditos, notadamente dos

empregados da sociedade. Essa temática jurídica deriva da concepção

desenvolvida pela doutrina americana e que se intitula nas expressões disregard

theory ou disregard of the legal entity, ou, ainda, lifting the corporate veil

(erguendo-se a cortina da pessoa jurídica). A solução, diante de casos concretos,

é o juiz desconsiderar o véu da personalidade jurídica para coibir as fraudes, os

jogos de interesses e os abusos de poder para se conseguir o resguardo dos

interesses de terceiros e do próprio fisco.

(25)

4 DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO DIREITO DO TRABALHO

O instituto da pessoa jurídica apresenta importantes funções para o desenvolvimento social, por meio da reunião de esforços, propiciando atingir ideais comuns de difícil realização individual. A pessoa jurídica, no entanto, não pode ser utilizada de forma a ser desviada de seus fins, encobrindo a prática de atos ilícitos, abusivos ou fraudulentos de seus membros. Garcia (2017) afirma que a pessoa jurídica apresenta, em princípio, existência distinta e autônoma das pessoas físicas que a compõem. Trata-se de mandamento que se encontrava previsto no art. 20 do Código Civil de 1916. Embora o dispositivo não tenha sido expressamente repetido pelo Código Civil em vigor (Lei 10.406/2002 – CC/2002), essa assertiva também se encontra nele implicitamente reconhecida, ao versar sobre a pessoa jurídica (cf. arts. 46, inciso VI, e 985, do CC/2002).

Para Silva (2012, p. 204), a característica básica do regime jurídico da pessoa jurídica é a separação entre o patrimônio da sociedade e do sócio, sendo que “a separação entre o patrimônio da sociedade e o do sócio era fundamental para o capitalista dispor-se a correr o risco de investir em qualquer atividade econômica”. Por consequência, os bens da pessoa jurídica, em princípio, não se confundem com aqueles de seus componentes. Essa diferenciação patrimonial, além de presente em diversas disposições legais, fica nítida na própria redação do art. 795 do CPC de 2015 e art. 596 do CPC de 1973 (“Os bens particulares dos sócios não respondem pelas dívidas da sociedade, senão nos casos previstos em lei”) (GARCIA, 2017, p. 201). Porém como coloca Bicalho (2004, p. 41), “o direito do trabalho não possuía norma específica que permitia a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica. Nem poderia ser diferente, uma vez que nos idos de 1943 pouco ou nada havia sido dito sobre o assunto”.

3

3 O parágrafo único do art. 8º da CLT autoriza, porém, a aplicação subsidiária das normas do direito comum desde que preenchidos dois requisitos: ausência da norma específica e compatibilidade com os princípios trabalhistas.

(26)

Borges e Nascimento (2019), observam que ocorrendo o referido desvio de finalidade ou a confusão entre o patrimônio da pessoa jurídica e o de seus componentes, por meio da técnica de superar a personalidade jurídica, alcança- se a responsabilização dos sócios envolvidos (tanto pessoas naturais como pessoas jurídicas), atingindo-se o patrimônio individual destes. A referida distinção quanto à personalidade jurídica e à composição patrimonial, no entanto, não é absoluta. Verificam-se situações em que os integrantes da pessoa jurídica são alcançados, mesmo tratando-se de relação jurídica pertinente à sociedade em si.

Conforme Borges e Nascimento (2019), nesse contexto de relativização da autonomia entre a pessoa jurídica e seus integrantes é que se situa a teoria da desconsideração da personalidade jurídica

.

A doutrina aponta no art. 2.º, § 2.º, da Consolidação das Leis do Trabalho hipótese que consagra a “disregard doctrine”, no âmbito específico do Direito do Trabalho, pois permite desconsiderar a personalidade jurídica de empresas integrantes de grupo econômico, havendo controle de uma sobre as demais, quando a realidade demonstra a existência de empregador único.

Observa-se que o Direito do trabalho se fundamenta na proteção dos trabalhadores face ao poder econômico do empregador. Sendo assim, de maneira geral a Teoria Menor tem sido empregada pela área do trabalho face ao disposto no § 5º artigo 28 do CDC, no sentido de que a simples criação de obstáculo pela pessoa jurídica é requisito suficiente para aplicação do referido instituto. Em contrapartida, como defendem Paiva; Dainese e Chesea (2019), a doutrina e jurisprudência jus trabalhista têm adotado a segunda teoria.

No direito do trabalho, caso sejam observados os critérios (subjetivo ou objetivo) para aplicação do referido incidente de desconsideração da personalidade jurídica, dada a identidade princípio lógico existente entre o diploma consumerista e o trabalhista, em especial no que tange ao princípio da proteção do hipossuficiente na relação jurídica, a doutrina e jurisprudência jus trabalhista têm adotado a segunda teoria em razão da dificuldade que tem o trabalhador para demonstrar a conduta culposa dos sócios (PAIVA; DAINESE e CHESEA, 2019, p. 3.)

(27)

Melhor explicando as duas teorias, verifica-se que existe, no direito brasileiro, duas formulações jurídicas acerca da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, sendo uma delas denominada de teoria maior da desconsideração, e a segunda a teoria menor. Ou conforme colocado por Silva (2012), a teoria maior seria mais consistente e melhor elaborada, por condicionar o afastamento episódico da autonomia patrimonial tão somente ocorrendo a manipulação fraudulenta ou abusiva da pessoa jurídica.

Nessa formulação maior da desconsideração da personalidade jurídica ou na denominada teoria subjetiva da desconsideração, o juiz é autorizado a afastar o princípio da autonomia patrimonial do ente jurídico para impedir fraudes e abusos praticados através da personalidade jurídica, sendo insuficiente a verificação e a constatação do prejuízo do credor. Conforme Fábio Ulhoa Coelho (2005), a teoria subjetiva é mais consistente e melhor elaborada, porquanto exige, para a aplicação episódica do afastamento da autonomia patrimonial da empresa, a caracterização da manipulação fraudulenta ou abusiva do ente moral.13 Na formulação maior ou subjetiva da desconsideração da personalidade jurídica, o prejuízo do credor não é suficiente, a fraude ou a manipulação abusiva não se presumem e precisam ser demonstrados.

Para os adeptos da formulação da teoria menor da desconsideração da

personalidade jurídica, Silva (2012), coloca que a mesma é também reconhecida

como aplicação objetiva do desvendamento, existindo desprezo à forma jurídica,

sendo suficiente, tão somente a demonstração da insolvência da empresa e a

não satisfação do crédito. Para Coelho (2005), nessa teoria, o juiz,

simplesmente, despacha, no corpo do processo de conhecimento ou de

execução, desconsiderando o ato fraudulento ou abusivo, ou mesmo ordenando

a penhora de bens de sócio ou de administrador e relegando, para eventuais

embargos de terceiro, o palco apropriado para a defesa daqueles terceiros e

cujos bens foram atingidos pela decisão judicial. Inverter o ônus da prova é a

formulação da teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica

adotada pelo artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor.

(28)

No Direito do Trabalho, tem sido aplicada nas hipóteses de abuso de direito, excesso de poder, como os casos de violação da lei ou do contrato, meios fraudulentos e insuficiência de bens da empresa, ou seja, em casos de desvio de função. Garcia (2015), saliente que na situação em que a lei nem mesmo exige fraude ou abuso de direito para a responsabilização de outras empresas, que não a empregadora formal. Como mencionado, a teoria da desconsideração da personalidade jurídica demonstra não ser absoluto o princípio de que a pessoa jurídica não se confunde com seus membros.

No processo do trabalho, quando comprovada a existência da relação de emprego, o juiz tem optado pela aplicação, por analogia, do artigo 28, § 5º do CDC, ou seja, da Teoria Menor da Desconsideração. O fundamento para essa opção consiste no Princípio da Igualdade Substancial, base, tanto da CLT, quanto do CDC, ou seja, aplica-se uma norma jurídica protetiva a uma parte, em função da sua hipossuficiência existente no plano dos fatos, uma vez que, a princípio, o empregado é hipossuficiente frente ao empregador, assim como o consumidor é hipossuficiente quanto ao fornecedor. Já quando não há relação de emprego, mas sim, relação de trabalho (ex.: trabalhador avulso ou autônomo), é mais aplicada a Teoria Maior da Desconsideração (art. 50, CC e 28, caput, CDC) (FARRACO, 2014, p. 1).

Batista (2018), coloca que em se tratando de Justiça do Trabalho, após a vigência da Lei 13.105 de 16/3/2015, que instituiu o novo Código de Processo Civil, restou disposto o incidente da desconsideração da personalidade jurídica nos artigos 133 a 137, trazendo inovações quanto ao procedimento a ser realizado.

Com o advento da nova lei, o Tribunal Superior do Trabalho editou a Instrução Normativa 39, que dispõe sobre as normas do Código de Processo Civil de 2015 aplicáveis e inaplicáveis ao processo do trabalho. A referida instrução normativa estabelece, em seu artigo 6º, que se aplica ao processo do trabalho o incidente de desconsideração da personalidade jurídica regulado no Código de Processo Civil (artigos 133 a 137), assegurada a iniciativa também do juiz do Trabalho na fase de execução (artigo 878, da CLT) (BATISTA, 2018, p. 1).

Assim, a “disregard doctrine” consiste em superar os efeitos da personalidade jurídica em casos concretos, impedindo desvios na utilização de sua finalidade, de forma a alcançar a responsabilidade de seus membros e bens pessoais.

Zonary e Cavalcante (2019), colocam que a teoria da desconsideração não cuida

(29)

de extinção ou dissolução da pessoa jurídica, nem se confunde com a anulação ou declaração de nulidade da personalidade jurídica. Esta é apenas desconsiderada no caso em concreto, deixando de produzir certos efeitos, como forma de evitar seu uso abusivo.

A ineficácia fica restrita ao ato em questão, permanecendo a autonomia da pessoa jurídica para os demais aspectos, sem atingir sua constituição, estrutura e existência, e sem implicar na extinção da entidade. Portanto, a natureza jurídica da desconsideração da pessoa jurídica é autônoma da teoria dos vícios do ato jurídico, referindo-se a uma técnica jurídica específica para a declaração de ineficácia especial da personalidade jurídica apenas para certos aspectos do caso em concreto (ZONARY; CAVALCANTE, 2019).

A doutrina tradicional aponta como fundamentos para a aplicação da teoria em estudo o abuso de direito e a fraude no uso da personalidade jurídica. O desvio de função, ou seja, a “utilização da pessoa jurídica, fora de sua função”, também é apontada, ao lado da “confusão patrimonial”, no critério objetivo, como fundamento para a referida desconsideração. Os direitos devem ser exercidos nos limites da ordem jurídica, ou seja, observando os fins sociais e econômicos e os preceitos de boa-fé e de bons costumes (GARCIA, 2017, p. 201).

No Processo do Trabalho, a partir da Lei 13.467/2017, passou a ser adotada a teoria direta da desconsideração da personalidade jurídica[3]. De fato, veja-se que a nova redação do art. 10-A da CLT[4]

prevê diretamente a responsabilidade subsidiária dos sócios atuais e retirantes, independentemente dos requisitos típicos das teorias maior (= fraude, confusão patrimonial etc.) e menor (= insolvência da pessoa jurídica, inexistência de bens ou obstáculos ao ressarcimento decorrentes de sua personalidade). De acordo com a teoria direta da desconsideração, os sócios, pelo mero fato de se enquadrarem em tal situação jurídica, são considerados responsáveis subsidiários pelos débitos trabalhistas da pessoa jurídica. O único requisito estabelecido pela legislação trabalhista é a observância da ordem de preferência, de modo que os atos executivos devem iniciar-se em face da empresa devedora; caso não se logre êxito na execução, passam-se aos atos de constrição contra os sócios atuais e, posteriormente, em face dos sócios retirantes, nos exatos termos do art. 10-A da CLT (BERNARDES, 2020, p. 1).

Agindo além desses parâmetros, o titular faz uso abusivo do direito, extrapolando

suas funções e causando prejuízo a terceiros. Um exemplo de como exegeses

(30)

equivocadas que se afastam do real objetivo da desconsideração da personalidade jurídica e a autonomia patrimonial, no qual foi considerada apenas a comprovação dos prejuízos causados aos credores para desconsiderar a personalidade jurídica (BERNARDES, 2020).

EMENTA: O agravo de petição interposto pelo executado foi devidamente apreciado e julgado, nos termos da legislação processual, estando o v. acórdão devidamente fundamentado. O Colegiado Recursal apreciou detidamente a matéria relativa à responsabilização do ex-sócio da empresa executada Brabo Indústria, Ari José Brandão, pelas verbas deferidas na sentença. Nesse sentido, decidiu-se que a Justiça do Trabalho, tendo em vista o caráter alimentar dos créditos trabalhistas, posiciona-se no sentido de que basta a comprovação dos prejuízos causados aos credores para a desconsideração da personalidade jurídica da empresa, sendo certo que, no entender da Relatora, presume-se a má-administração dos sócios em casos de insuficiência patrimonial da empresa, ainda mais em casos de insolvência da pessoa jurídica, como é a situação das empresas executadas, de notório conhecimento do Juízo de origem.

(Embargos de Declaração nº 0001825-86.2012.5.03.0086, Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região, Relatora Des. Maria Stela Álvares da S. Campos, publicado em 06/04/2016).

Neste próximo exemplo, citado por Zonary e Cavalcante (2019, p. 116), apresenta uma falha a Justiça do Trabalho em perceber que, ao desconsiderar a “personalidade jurídica das sociedades empresárias de maneira desenfreada e sem a observância dos preceitos legais adequados, está, de fato, descaracterizando o instituto da pessoa jurídica e a própria disregard doctrine”.

Essa ação tem como resultado a insegurança jurídica nas relações empresárias.

EMENTA: FIRMA INDIVIDUAL. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. Basta o inadimplemento da obrigação determinada ou a constatação da inexistência de bens da empresa, para se justificar a apreensão dos bens de seu sócio, ainda que este não figure como parte no processo. Nesta trilha, é a jurisprudência trabalhista, que, com especial acerto, invoca a teoria da disregard, quando verificada a condenação da empresa ao pagamento de créditos trabalhistas. Aliás, a responsabilidade do sócio culmina com a positivação da regra ínsita no artigo 28 do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, verbis: "o juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração". Assim, tendo os créditos trabalhistas nítida natureza alimentar, aplica-se, indiscutivelmente, por analogia, o citado dispositivo legal. Visa-se à proteção da parte hipossuficiente na relação

(31)

de emprego, cujo crédito não pode ficar descoberto. É possível, senão essencial, que o sócio seja chamado a responder pelas obrigações sociais contraídas pela sociedade. Esta responsabilização se torna possível em face da natureza do crédito, que é trabalhista e, portanto, privilegiado, inclusive em relação aos do fisco ou do consumidor. Se, para estes, existem preceitos legais expressos (artigo 134, VII, do CTN e o artigo 28 do CDC), com muito mais razão há que se estender garantia semelhante ao crédito do trabalhador. Conforme preceitua o art. 592, II, do CPC, conclui- se, serenamente, que o pedido de responsabilização dos sócios pode ser atendido em execução, ainda que estes não figurem como parte no processo. Processo TRT/BH 00860-2005-081-03-00-4.17 Tribunal Regional do Trabalho Região.

(ZONARY; CAVALCANTE, 2019, p. 116).

Por fim, entende-se que a aplicação de quaisquer das formas de interpretação

da desconsideração, (teoria maior ou teoria menor, não resulta em

desconstituição ou mesmo extinção da pessoa jurídica, mas em mera

desconsideração episódica da respectiva autonomia patrimonial no caso

concreto. Como coloca Bernardes (2020, p,1), “a rigor, em termos doutrinários,

a situação dos sócios, no Processo do Trabalho, passa a ser hipótese de

responsabilização subsidiária por força de lei”. Tal fato, conforme o autor,

acontece também em contratos típicos de fiança. Acrescente-se, ainda, que a

responsabilidade dos sócios não se limita apenas às suas cotas sociais, sendo

assente na doutrina e na jurisprudência circunstância de responsabilidade

solidária daqueles que se beneficiaram com a mão de obra alheia.

(32)

5 CONCLUSÃO

A atividade empresarial é exercida pelos empresários, portanto, não há nenhuma demasia em afirmar que pessoa física e pessoa jurídica estão interligadas, sendo dotada cada uma delas de sua personalidade individual e de patrimônio próprio.

Conforme visto no referencial desenvolvido no segundo capítulo sobre a pessoa jurídica, infere-se que as sociedades empresárias são constituídas, de ordinário, por mais de uma pessoa natural, que entre si celebram contrato de sociedade, e que se obrigam, reciprocamente, a contribuir com bens ou serviços para o exercício de atividade econômica e a partilhar, entre si, os resultados (artigo 981 do Código Civil).

As sociedades empresárias devem ter presente a licitude do objeto e a forma prescrita ou não defesa em lei (artigo 104 do Código Civil), assim entendido o desenvolvimento de uma atividade econômica idônea, compatível com sua finalidade contratual, evidentemente lícita, conciliada com o ordenamento jurídico. O direito brasileiro reconhece várias espécies de sociedade, sendo certo, entretanto, aduzir que a personalidade jurídica é inerente e relevante para o desenvolvimento da organização societária.

Tanto a pessoa física como a pessoa jurídica são titulares de direitos e obrigações e, embora a pessoa coletiva não possua existência tangível, e por isto dependa da intervenção do ser humano para a prática dos atos concretos, seu contato com o mundo é dotado de capacidade de direito e da capacidade de fato. A pessoa jurídica existe para a realização dos interesses dos homens, especialmente para aqueles empreendimentos, cuja união de pessoas e limitação de riscos e de recursos são imprescindíveis para a condução da empreitada.

Já no terceiro capítulo, verificou-se que no artigo 50 do Código Civil brasileiro

trouxe para a ordem jurídica positiva o fundamento da teoria da desconsideração

da personalidade jurídica como ágil instrumento para restringir as ações de

pessoas jurídicas verificando se a empresa é colocada a serviço da fraude ou do

abuso do direito com vistas à ilícita obtenção de vantagens. Isso porque a

personalidade jurídica é unicamente um atributo conferido a certas organizações

sociais, sendo a separação patrimonial, somente, uma consequência desta

(33)

atribuição decorrente da desconsideração. Ressalta-se que a intenção da desconsideração da pessoa jurídica é permitir a responsabilização dos sócios por atos que possam caracterizar o desafio de finalidade. A atribuição da personalidade para o exercício da atividade empresarial é um benefício ou privilégio outorgado pelo direito e cuja concessão reclama, em contrapartida, a adoção de uma conduta idônea, proba e condizente com a função social da empresa. Foge aos princípios da personificação da sociedade empresária qualquer forma de desvio de sua finalidade.

Desta forma, ao fim do todo exposto, no terceiro capítulo observou-se que, na seara trabalhista o objetivo principal é garantir a efetividade da jurisdição por meio da concretização do direito material do exequente, que na maioria das vezes é o trabalhador. A viabilidade do uso abusivo da sociedade empresária nos mais diferentes segmentos sociais tem alertado o legislador, da importância de limitar e coibir o uso indevido da personalidade jurídica sempre que ela se desvia da sua função, para desta forma burlar a lei, fraudar direitos e escapar de suas obrigações.

Resgatando a ideia central de discorrer sobre a desconsideração da pessoa

jurídica no Direito do trabalho, viu-se que a teoria da desconsideração da

personalidade jurídica conseguiu situar-se definitivamente na teoria jurídica

geral. Trata-se de um remédio jurídico mediante o qual resulta possível prescindir

da forma de sociedade com que se ache revestido um grupo de pessoas e bens,

negando a sua existência autônoma como sujeito de direito diante de uma

situação jurídica particular. O Novo Código de Processo Civil introduziu ao

ordenamento jurídico nacional o incidente de desconsideração da personalidade

jurídica, previsto nos artigos 133 a 137. Com fincas nos artigos 769 da CLT e 15

do NCPC, aplica-se o direito processual comum ao processo do trabalho. Para

isto, o instituto da desconsideração da personalidade jurídica é aplicado como

incidente processual na execução trabalhista, visando desconsiderar

temporariamente a separação patrimonial existente entre a empresa e seus

sócios, alcançando o patrimônio pessoal destes, para satisfação da execução.

(34)

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Referências

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