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ERICO VERISSIMO SUPLEMENTO DIDÁTICO. Elaborado por

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ERICO VERISSIMO

2 3 4

De Antonio Hohlfeldt

(Jornalista e professor universitário. Doutor em Letras, leciona na PUCRS e tem livros

de fi cção publicados para crianças e jovens, além de ensaios de crítica literária e de teoria da comunicação.)

SUPLEMENTO DIDÁTICO

Elaborado por

Jô Fortarel (Bacharel em Letras pela Universidade de São Paulo, professora de Literatura em escolas particulares e em cursinhos pré-vestibulares)

POR QUE TRABALHAR COM ERICO VERISSIMO

“Não sou um inovador, não trouxe nenhuma contribuição original para a arte do romance. Tenho dito, escrito repetidamente que me considero, antes de mais nada, um contador de histórias.”

Erico Verissimo

Erico Verissimo:

o contador de histórias

A segunda fase modernista (1930-1945) apro- veitou as conquistas da geração de 1922, acrescen- tando-lhe porém mais maturidade artística e mais compromisso social. Dessa forma, a literatura desse período trilhou diferentes caminhos, sendo o regio- nalismo o mais importante deles.

José Lins do Rego, escritor contemporâneo de Erico Verissimo e também representante da segunda fase modernista, escreveu:

Nós, no Brasil, queremos, acima de tudo, nos en- contrar com o povo que andava perdido. E podemos dizer que encontramos este povo fabuloso, espa- lhado nos mais distantes recantos de nossa terra.

O romance de nossos dias está todo batido nesta massa, está todo composto com a carne e o sangue de nossa gente. […] Hoje, podemos dizer, já po- demos afi rmar: o povo é em nossos dias herói de nossos livros. Isto equivale a dizer que temos uma literatura.

“Que penso de mim como escritor?

Ora, depende da ocasião. Nos momentos escuros, minha tendência é considerar tudo quanto produzi até hoje medíocre ou mesmo mau. Nas horas claras, porém, olho com mais indulgência para a minha própria obra e concluo que, dentre os vinte e poucos livros que até essa data escrevi, uns três ou quatro possuem alguma importância, e pelo menos um deles — creio que O continente — talvez me sobreviva por algum tempo.”

Erico Verissimo

Essas palavras evidenciam a importância do re- gionalismo durante essa fase. Não aquele regionalis- mo utópico e idealizado já cultivado no romantismo de José de Alencar, mas sim um regionalismo crítico, solidário, compromissado com o difícil momento pelo qual passava o Brasil e o mundo.

Erico Verissimo é o representante gaúcho do regionalismo modernista em sua segunda fase.

Apresentando um estilo simples e despojado, logo conquistou a simpatia dos leitores, tornando-se rapidamente, ao lado de Jorge Amado, um dos escri- tores mais populares de nossa literatura. Ele soube, como ninguém, trabalhar em sua obra o realismo, exigido pelo momento, sem desprezar totalmente certo tom romântico. Por lidar com temas tanto cotidianos como universais, oferece a diferentes tipos de leitor vasta escolha de títulos.

Considerado exímio criador de tipos humanos, apresenta-nos o gaúcho, o brasileiro, o ser humano, sempre a partir de uma visão psicológica que fatal- mente desemboca em uma análise ainda maior, a sociológica.

Conhecer algumas personagens de Erico Veris- simo amplia nossa compreensão de nós mesmos, ou, ainda, da própria condição humana, no que ela apresenta de melhor e de pior, de pessoal e de universal, de terreno e de espiritual.

O MOMENTO DA SENSIBILIZAÇÃO

Sensibilizar, motivar o aluno exige arte, talento, esforço e criatividade. Lendo tal afi rmação, logo percebemos que os dois primeiros quesitos depen- dem exclusivamente de você, mas em relação aos outros dois tentaremos, neste suplemento, sugerir ações, ampliações, relações, etc.

Nossa primeira dica, visando a despertar o interes- se do aluno para o autor e para o tipo de obra que temos aqui (biografi a), seria instigá-lo a uma rápida pesquisa informal (realizada com parentes, amigos ou mesmo professores). De imediato, você terá a chance de trabalhar com dois gêneros diferentes em sala: a entrevista e a biografi a.

Sem ser necessário se alongar muito em cada tipo de texto, uma vez que a intenção é a leitura do livro, e não o ensino dos gêneros, você poderia promover em sala de aula um diálogo dinâmico

para diagnosticar conhecimentos prévios dos alunos sobre entrevista e biografi a.

Sugestões de perguntas:

• Qual é a intenção de uma entrevista?

• Como se organiza a estrutura de uma entre- vista?

• Que procedimentos o entrevistador deverá ter antes do encontro com seu entrevistado?

• Qual é a intenção de uma biografi a?

• Que tipo de pessoa, geralmente, justifi ca uma biografi a?

• Em que a biografi a de um autor poderá nos ajudar para o melhor entendimento de sua obra?

Agora, seria interessante você discutir com os alunos se as entrevistas serão individuais ou em gru- po. Mais importante do que essa decisão é resolver se as questões que serão dirigidas aos entrevistados

devem fi car a critério de cada um (ou cada grupo) ou se elas serão formuladas em classe, a partir de uma discussão coletiva. Parece-nos que essa segunda alternativa tornaria o processo muito mais rico e diminuiria a chance de certos alunos realizarem um trabalho insatisfatório.

Depois que eles tiverem realizado as entrevistas, promova a socialização das respostas obtidas, fazendo, por exemplo, uma tabulação delas. Essa dinâmica de tabulação torna-se muito mais efi ciente se as questões forem comuns a todos.

Nesse rico momento de troca de repertórios os alunos já estão em pleno processo de conhecimento do autor. Daí para a leitura do livro é só mais um passo.

Observações: Caso você queira trabalhar também com o texto não-verbal, após a tabulação dos dados sugira a construção de um gráfi co, utilizando, por exemplo, os seguintes dados: quantos por cento dos entrevistados já conheciam o autor? e a obra dele?

Pode haver ainda uma discussão sobre qual tipo de gráfi co seria ideal para uma melhor visualização: o tipo pizza? O tipo coluna?

Outras linhas do tempo que também poderiam ser confeccionadas: as indicadoras do espaço, uma vez que Erico viajou por muitos lugares, dentro e fora do Brasil, e também as que indicam relação com o momento histórico, uma vez que os anos de maturidade literária desse escritor refl etem as fortes mudanças econômicas e políticas do Brasil e do mundo.

Por si só, o processo de construção dessas linhas já é bastante rico porque, além de exigir uma lei- tura atenta da obra, trabalha com outras inúmeras competências e habilidades.

Se você ainda desejar ampliar o trabalho, o pró- ximo passo seria contrapor uma linha do tempo a outra, ou seja, relacionar, lado a lado, os dados da vida pessoal com os referentes às publicações do autor, com o momento histórico, etc.

Proposta 2

Didaticamente os romances de Erico Verissimo geralmente são classifi cados da seguinte forma:

• primeira fase: romances urbanos, intimistas ou psicológicos (de 1933 a 1942);

• segunda fase: romances histórico-regionalistas (de 1948 a 1961);

• terceira fase: romances políticos (de 1965 em diante).

Além dessa vasta produção romanesca, o autor ainda escreveu contos, impressões de viagem, me- mórias e literatura infantil.

Nossa proposta é que você oriente seus alunos para que durante a leitura do livro grifem os títulos das obras produzidas por Erico para que eles possam ao término da leitura classifi cá-las de acordo com as fases do escritor.

Tal classifi cação, muito mais do que apenas indi- car uma seqüência temática ou ainda cronológica, ajuda-nos a perceber o amadurecimento do autor.

A distância temática entre Clarissa e Incidente em Antares, por exemplo, comprova que só o tempo pode amadurecer certas visões de mundo, e os bons escritores sabem disso!

Sempre que entramos em contato com um livro pela primeira vez, devemos folheá-lo à vontade...

Como é a capa? Quantas páginas? Há ilustrações?

É dividido por capítulos?

Essa primeira aproximação serve para quebrar o gelo, para que o aluno se aproprie mais desse material.

Após esse primeiro momento de exploração, realize a leitura dos cinco primeiros parágrafos do livro e peça que os alunos os comentem livremente ou a partir de algumas questões:

• Por que o entrevistador estava tenso no mo- mento da entrevista?

• Logo no primeiro parágrafo o autor dessa bio- grafi a já nos passa importantes informações sobre Erico Verissimo. Quais são elas?

• No terceiro parágrafo, encontramos o trecho

“Havíamos contatado gente de todo o Brasil, e até do exterior, para escrever sobre Erico”. O que essa informação antecipa sobre o escritor biografado?

• No quarto parágrafo, somos surpreendidos, juntamente com o autor, com a morte de Erico. Qual

trecho desse parágrafo enaltece a fi gura humana do biografado?

Caso você deseje, nesse momento, acrescentar para os alunos um dizer do Erico sobre ele mesmo, sugerimos o seguinte trecho de Solo de clarineta:

Sempre senti em mim todas as possibilidades, tanto para o bem como para o mal. Cometi todos os pecados da imaginação, bem como muitos outros que não foram apenas de fantasia.

[…]

Se me perguntarem que constantes de meu temperamento sinto com mais freqüência, eu diria que é uma curiosa combinação de preguiça — fí- sica e mental — e timidez. Tenho passado a vida a combater ambas, muitas vezes com o mais positivo sucesso.

Sou de raro em raro assaltado pelo tédio, mas reajo com a maior energia, repelindo-o, pois me parece que entregar-se a gente a esse inimigo cin- zento é uma prova de falta de imaginação e senso comum. [...]

O MOMENTO DA LEITURA DO LIVRO APROXIMAÇÃO COM A OBRA

Proposta 1

O autor desse volume, Antonio Hohlfeldt, imprime em seu texto um tom mais próximo da conversa do que de uma biografia isenta de paixão. Fica claro que ele admira Erico Ve- rissimo e que, sendo também gaúcho, se sente extremamente orgulhoso de poder falar de seu ilustre conterrâneo. Porém, como em todas as conversas, seu relato não se apresenta rigida- mente cronológico, devido ao grande número de informações que ele deseja relatar.

Para quem já conhece Erico e sua produção literária, tal recurso agrada bastante, mas, ao jovem que ora principia seus estudos sobre ele, a ordem não-linear dos acontecimentos e principalmente a da publicação literária podem confundir, embora o texto também agrade pela leveza e simpatia dos relatos.

Sendo assim, nossa sugestão seria a construção de uma linha do tempo para a vida de Erico e outra para a sua produção artística. Os alunos deveriam confeccioná-las à medida que lêem a obra.

O MOMENTO POSTERIOR À LEITURA DO LIVRO

Proposta 1

Após os alunos terem classifi cado os romances de Erico, seria bastante interessante que cada grupo se responsabilizasse por uma dessas classifi cações e fosse pesquisar, em alguns dos romances nela elen- cados, dados que justifi quem a inclusão de cada um deles nessa ou naquela fase. Pode ser, por exemplo, questionado: por que podemos classifi car o romance Olhai os lírios do campo como “intimista” ou como

“psicológico”? Como uma situação fantástica como a criada em Incidente em Antares transforma-se em crítica social?

Para o cumprimento desta última tarefa, não é necessário — a não ser que vocês queiram — que os alunos leiam os romances integralmente porque, a partir de leituras de alguns trechos, facilmente os alunos conseguirão encaixá-los em suas deter- minadas fases.

Tal trabalho é interessante, pois coloca o aluno em contato direto com a obra do autor de maneira crítica e investigativa. Não são raras as experiências nesse sentido que trazem como resultado a leitura integral, pelos alunos, dos romances pesquisados.

Se você considerar importante uma visão geral da obra do autor, além das três fases de produção dos romances, algum grupo poderia fi car responsável pelas outras produções já citadas (contos, impressões de viagem, memórias e literatura infantil).

Proposta 2

Se você optar pela leitura integral de algumas obras do autor, dependendo da faixa etária, suge- rimos alguns títulos:

• Ensino Fundamental: Olhai os lírios do campo, Ana Terra, Um certo capitão Rodrigo;

• Ensino Médio: O prisioneiro, Incidente em An- tares.

Caso você opte por que sejam feitas apenas leituras parciais das obras, indicamos na antologia de apoio, a seguir, alguns trechos extraídos de dois romances que julgamos importante serem conhe- cidos pelos alunos.

Proposta 3

Durante as leituras, os alunos se depararam com diferentes expressões utilizadas por Erico Verissimo.

Realmente, esse autor faz questão de apresentar a todo o Brasil o falar gauchesco. Aproveitando esse rico material, sugerimos que haja em sala um debate acerca dos diferentes falares brasileiros.

Importante salientar que todas as variedades lingüísticas são corretas, desde que cumpram com efi ciência o papel fundamental de uma língua — o de permitir a comunicação verbal entre as pessoas.

Estamos tratando aqui de um tipo específi co de variação lingüística: o regionalismo. Observe,

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ERICO VERISSIMO

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De Antonio Hohlfeldt

(Jornalista e professor universitário. Doutor em Letras, leciona na PUCRS e tem livros

de fi cção publicados para crianças e jovens, além de ensaios de crítica literária e de teoria da comunicação.)

SUPLEMENTO DIDÁTICO

Elaborado por

Jô Fortarel (Bacharel em Letras pela Universidade de São Paulo, professora de Literatura em escolas particulares e em cursinhos pré-vestibulares)

POR QUE TRABALHAR COM ERICO VERISSIMO

“Não sou um inovador, não trouxe nenhuma contribuição original para a arte do romance. Tenho dito, escrito repetidamente que me considero, antes de mais nada, um contador de histórias.”

Erico Verissimo

Erico Verissimo:

o contador de histórias

A segunda fase modernista (1930-1945) apro- veitou as conquistas da geração de 1922, acrescen- tando-lhe porém mais maturidade artística e mais compromisso social. Dessa forma, a literatura desse período trilhou diferentes caminhos, sendo o regio- nalismo o mais importante deles.

José Lins do Rego, escritor contemporâneo de Erico Verissimo e também representante da segunda fase modernista, escreveu:

Nós, no Brasil, queremos, acima de tudo, nos en- contrar com o povo que andava perdido. E podemos dizer que encontramos este povo fabuloso, espa- lhado nos mais distantes recantos de nossa terra.

O romance de nossos dias está todo batido nesta massa, está todo composto com a carne e o sangue de nossa gente. […] Hoje, podemos dizer, já po- demos afi rmar: o povo é em nossos dias herói de nossos livros. Isto equivale a dizer que temos uma literatura.

“Que penso de mim como escritor?

Ora, depende da ocasião. Nos momentos escuros, minha tendência é considerar tudo quanto produzi até hoje medíocre ou mesmo mau. Nas horas claras, porém, olho com mais indulgência para a minha própria obra e concluo que, dentre os vinte e poucos livros que até essa data escrevi, uns três ou quatro possuem alguma importância, e pelo menos um deles — creio que O continente — talvez me sobreviva por algum tempo.”

Erico Verissimo

Essas palavras evidenciam a importância do re- gionalismo durante essa fase. Não aquele regionalis- mo utópico e idealizado já cultivado no romantismo de José de Alencar, mas sim um regionalismo crítico, solidário, compromissado com o difícil momento pelo qual passava o Brasil e o mundo.

Erico Verissimo é o representante gaúcho do regionalismo modernista em sua segunda fase.

Apresentando um estilo simples e despojado, logo conquistou a simpatia dos leitores, tornando-se rapidamente, ao lado de Jorge Amado, um dos escri- tores mais populares de nossa literatura. Ele soube, como ninguém, trabalhar em sua obra o realismo, exigido pelo momento, sem desprezar totalmente certo tom romântico. Por lidar com temas tanto cotidianos como universais, oferece a diferentes tipos de leitor vasta escolha de títulos.

Considerado exímio criador de tipos humanos, apresenta-nos o gaúcho, o brasileiro, o ser humano, sempre a partir de uma visão psicológica que fatal- mente desemboca em uma análise ainda maior, a sociológica.

Conhecer algumas personagens de Erico Veris- simo amplia nossa compreensão de nós mesmos, ou, ainda, da própria condição humana, no que ela apresenta de melhor e de pior, de pessoal e de universal, de terreno e de espiritual.

O MOMENTO DA SENSIBILIZAÇÃO

Sensibilizar, motivar o aluno exige arte, talento, esforço e criatividade. Lendo tal afi rmação, logo percebemos que os dois primeiros quesitos depen- dem exclusivamente de você, mas em relação aos outros dois tentaremos, neste suplemento, sugerir ações, ampliações, relações, etc.

Nossa primeira dica, visando a despertar o interes- se do aluno para o autor e para o tipo de obra que temos aqui (biografi a), seria instigá-lo a uma rápida pesquisa informal (realizada com parentes, amigos ou mesmo professores). De imediato, você terá a chance de trabalhar com dois gêneros diferentes em sala: a entrevista e a biografi a.

Sem ser necessário se alongar muito em cada tipo de texto, uma vez que a intenção é a leitura do livro, e não o ensino dos gêneros, você poderia promover em sala de aula um diálogo dinâmico

para diagnosticar conhecimentos prévios dos alunos sobre entrevista e biografi a.

Sugestões de perguntas:

• Qual é a intenção de uma entrevista?

• Como se organiza a estrutura de uma entre- vista?

• Que procedimentos o entrevistador deverá ter antes do encontro com seu entrevistado?

• Qual é a intenção de uma biografi a?

• Que tipo de pessoa, geralmente, justifi ca uma biografi a?

• Em que a biografi a de um autor poderá nos ajudar para o melhor entendimento de sua obra?

Agora, seria interessante você discutir com os alunos se as entrevistas serão individuais ou em gru- po. Mais importante do que essa decisão é resolver se as questões que serão dirigidas aos entrevistados

devem fi car a critério de cada um (ou cada grupo) ou se elas serão formuladas em classe, a partir de uma discussão coletiva. Parece-nos que essa segunda alternativa tornaria o processo muito mais rico e diminuiria a chance de certos alunos realizarem um trabalho insatisfatório.

Depois que eles tiverem realizado as entrevistas, promova a socialização das respostas obtidas, fazendo, por exemplo, uma tabulação delas. Essa dinâmica de tabulação torna-se muito mais efi ciente se as questões forem comuns a todos.

Nesse rico momento de troca de repertórios os alunos já estão em pleno processo de conhecimento do autor. Daí para a leitura do livro é só mais um passo.

Observações: Caso você queira trabalhar também com o texto não-verbal, após a tabulação dos dados sugira a construção de um gráfi co, utilizando, por exemplo, os seguintes dados: quantos por cento dos entrevistados já conheciam o autor? e a obra dele?

Pode haver ainda uma discussão sobre qual tipo de gráfi co seria ideal para uma melhor visualização: o tipo pizza? O tipo coluna?

Outras linhas do tempo que também poderiam ser confeccionadas: as indicadoras do espaço, uma vez que Erico viajou por muitos lugares, dentro e fora do Brasil, e também as que indicam relação com o momento histórico, uma vez que os anos de maturidade literária desse escritor refl etem as fortes mudanças econômicas e políticas do Brasil e do mundo.

Por si só, o processo de construção dessas linhas já é bastante rico porque, além de exigir uma lei- tura atenta da obra, trabalha com outras inúmeras competências e habilidades.

Se você ainda desejar ampliar o trabalho, o pró- ximo passo seria contrapor uma linha do tempo a outra, ou seja, relacionar, lado a lado, os dados da vida pessoal com os referentes às publicações do autor, com o momento histórico, etc.

Proposta 2

Didaticamente os romances de Erico Verissimo geralmente são classifi cados da seguinte forma:

• primeira fase: romances urbanos, intimistas ou psicológicos (de 1933 a 1942);

• segunda fase: romances histórico-regionalistas (de 1948 a 1961);

• terceira fase: romances políticos (de 1965 em diante).

Além dessa vasta produção romanesca, o autor ainda escreveu contos, impressões de viagem, me- mórias e literatura infantil.

Nossa proposta é que você oriente seus alunos para que durante a leitura do livro grifem os títulos das obras produzidas por Erico para que eles possam ao término da leitura classifi cá-las de acordo com as fases do escritor.

Tal classifi cação, muito mais do que apenas indi- car uma seqüência temática ou ainda cronológica, ajuda-nos a perceber o amadurecimento do autor.

A distância temática entre Clarissa e Incidente em Antares, por exemplo, comprova que só o tempo pode amadurecer certas visões de mundo, e os bons escritores sabem disso!

Sempre que entramos em contato com um livro pela primeira vez, devemos folheá-lo à vontade...

Como é a capa? Quantas páginas? Há ilustrações?

É dividido por capítulos?

Essa primeira aproximação serve para quebrar o gelo, para que o aluno se aproprie mais desse material.

Após esse primeiro momento de exploração, realize a leitura dos cinco primeiros parágrafos do livro e peça que os alunos os comentem livremente ou a partir de algumas questões:

• Por que o entrevistador estava tenso no mo- mento da entrevista?

• Logo no primeiro parágrafo o autor dessa bio- grafi a já nos passa importantes informações sobre Erico Verissimo. Quais são elas?

• No terceiro parágrafo, encontramos o trecho

“Havíamos contatado gente de todo o Brasil, e até do exterior, para escrever sobre Erico”. O que essa informação antecipa sobre o escritor biografado?

• No quarto parágrafo, somos surpreendidos, juntamente com o autor, com a morte de Erico. Qual

trecho desse parágrafo enaltece a fi gura humana do biografado?

Caso você deseje, nesse momento, acrescentar para os alunos um dizer do Erico sobre ele mesmo, sugerimos o seguinte trecho de Solo de clarineta:

Sempre senti em mim todas as possibilidades, tanto para o bem como para o mal. Cometi todos os pecados da imaginação, bem como muitos outros que não foram apenas de fantasia.

[…]

Se me perguntarem que constantes de meu temperamento sinto com mais freqüência, eu diria que é uma curiosa combinação de preguiça — fí- sica e mental — e timidez. Tenho passado a vida a combater ambas, muitas vezes com o mais positivo sucesso.

Sou de raro em raro assaltado pelo tédio, mas reajo com a maior energia, repelindo-o, pois me parece que entregar-se a gente a esse inimigo cin- zento é uma prova de falta de imaginação e senso comum. [...]

O MOMENTO DA LEITURA DO LIVRO APROXIMAÇÃO COM A OBRA

Proposta 1

O autor desse volume, Antonio Hohlfeldt, imprime em seu texto um tom mais próximo da conversa do que de uma biografia isenta de paixão. Fica claro que ele admira Erico Ve- rissimo e que, sendo também gaúcho, se sente extremamente orgulhoso de poder falar de seu ilustre conterrâneo. Porém, como em todas as conversas, seu relato não se apresenta rigida- mente cronológico, devido ao grande número de informações que ele deseja relatar.

Para quem já conhece Erico e sua produção literária, tal recurso agrada bastante, mas, ao jovem que ora principia seus estudos sobre ele, a ordem não-linear dos acontecimentos e principalmente a da publicação literária podem confundir, embora o texto também agrade pela leveza e simpatia dos relatos.

Sendo assim, nossa sugestão seria a construção de uma linha do tempo para a vida de Erico e outra para a sua produção artística. Os alunos deveriam confeccioná-las à medida que lêem a obra.

O MOMENTO POSTERIOR À LEITURA DO LIVRO

Proposta 1

Após os alunos terem classifi cado os romances de Erico, seria bastante interessante que cada grupo se responsabilizasse por uma dessas classifi cações e fosse pesquisar, em alguns dos romances nela elen- cados, dados que justifi quem a inclusão de cada um deles nessa ou naquela fase. Pode ser, por exemplo, questionado: por que podemos classifi car o romance Olhai os lírios do campo como “intimista” ou como

“psicológico”? Como uma situação fantástica como a criada em Incidente em Antares transforma-se em crítica social?

Para o cumprimento desta última tarefa, não é necessário — a não ser que vocês queiram — que os alunos leiam os romances integralmente porque, a partir de leituras de alguns trechos, facilmente os alunos conseguirão encaixá-los em suas deter- minadas fases.

Tal trabalho é interessante, pois coloca o aluno em contato direto com a obra do autor de maneira crítica e investigativa. Não são raras as experiências nesse sentido que trazem como resultado a leitura integral, pelos alunos, dos romances pesquisados.

Se você considerar importante uma visão geral da obra do autor, além das três fases de produção dos romances, algum grupo poderia fi car responsável pelas outras produções já citadas (contos, impressões de viagem, memórias e literatura infantil).

Proposta 2

Se você optar pela leitura integral de algumas obras do autor, dependendo da faixa etária, suge- rimos alguns títulos:

• Ensino Fundamental: Olhai os lírios do campo, Ana Terra, Um certo capitão Rodrigo;

• Ensino Médio: O prisioneiro, Incidente em An- tares.

Caso você opte por que sejam feitas apenas leituras parciais das obras, indicamos na antologia de apoio, a seguir, alguns trechos extraídos de dois romances que julgamos importante serem conhe- cidos pelos alunos.

Proposta 3

Durante as leituras, os alunos se depararam com diferentes expressões utilizadas por Erico Verissimo.

Realmente, esse autor faz questão de apresentar a todo o Brasil o falar gauchesco. Aproveitando esse rico material, sugerimos que haja em sala um debate acerca dos diferentes falares brasileiros.

Importante salientar que todas as variedades lingüísticas são corretas, desde que cumpram com efi ciência o papel fundamental de uma língua — o de permitir a comunicação verbal entre as pessoas.

Estamos tratando aqui de um tipo específi co de variação lingüística: o regionalismo. Observe,

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ERICO VERISSIMO

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De Antonio Hohlfeldt

(Jornalista e professor universitário. Doutor em Letras, leciona na PUCRS e tem livros

de fi cção publicados para crianças e jovens, além de ensaios de crítica literária e de teoria da comunicação.)

SUPLEMENTO DIDÁTICO

Elaborado por

Jô Fortarel (Bacharel em Letras pela Universidade de São Paulo, professora de Literatura em escolas particulares e em cursinhos pré-vestibulares)

POR QUE TRABALHAR COM ERICO VERISSIMO

“Não sou um inovador, não trouxe nenhuma contribuição original para a arte do romance. Tenho dito, escrito repetidamente que me considero, antes de mais nada, um contador de histórias.”

Erico Verissimo

Erico Verissimo:

o contador de histórias

A segunda fase modernista (1930-1945) apro- veitou as conquistas da geração de 1922, acrescen- tando-lhe porém mais maturidade artística e mais compromisso social. Dessa forma, a literatura desse período trilhou diferentes caminhos, sendo o regio- nalismo o mais importante deles.

José Lins do Rego, escritor contemporâneo de Erico Verissimo e também representante da segunda fase modernista, escreveu:

Nós, no Brasil, queremos, acima de tudo, nos en- contrar com o povo que andava perdido. E podemos dizer que encontramos este povo fabuloso, espa- lhado nos mais distantes recantos de nossa terra.

O romance de nossos dias está todo batido nesta massa, está todo composto com a carne e o sangue de nossa gente. […] Hoje, podemos dizer, já po- demos afi rmar: o povo é em nossos dias herói de nossos livros. Isto equivale a dizer que temos uma literatura.

“Que penso de mim como escritor?

Ora, depende da ocasião. Nos momentos escuros, minha tendência é considerar tudo quanto produzi até hoje medíocre ou mesmo mau. Nas horas claras, porém, olho com mais indulgência para a minha própria obra e concluo que, dentre os vinte e poucos livros que até essa data escrevi, uns três ou quatro possuem alguma importância, e pelo menos um deles — creio que O continente — talvez me sobreviva por algum tempo.”

Erico Verissimo

Essas palavras evidenciam a importância do re- gionalismo durante essa fase. Não aquele regionalis- mo utópico e idealizado já cultivado no romantismo de José de Alencar, mas sim um regionalismo crítico, solidário, compromissado com o difícil momento pelo qual passava o Brasil e o mundo.

Erico Verissimo é o representante gaúcho do regionalismo modernista em sua segunda fase.

Apresentando um estilo simples e despojado, logo conquistou a simpatia dos leitores, tornando-se rapidamente, ao lado de Jorge Amado, um dos escri- tores mais populares de nossa literatura. Ele soube, como ninguém, trabalhar em sua obra o realismo, exigido pelo momento, sem desprezar totalmente certo tom romântico. Por lidar com temas tanto cotidianos como universais, oferece a diferentes tipos de leitor vasta escolha de títulos.

Considerado exímio criador de tipos humanos, apresenta-nos o gaúcho, o brasileiro, o ser humano, sempre a partir de uma visão psicológica que fatal- mente desemboca em uma análise ainda maior, a sociológica.

Conhecer algumas personagens de Erico Veris- simo amplia nossa compreensão de nós mesmos, ou, ainda, da própria condição humana, no que ela apresenta de melhor e de pior, de pessoal e de universal, de terreno e de espiritual.

O MOMENTO DA SENSIBILIZAÇÃO

Sensibilizar, motivar o aluno exige arte, talento, esforço e criatividade. Lendo tal afi rmação, logo percebemos que os dois primeiros quesitos depen- dem exclusivamente de você, mas em relação aos outros dois tentaremos, neste suplemento, sugerir ações, ampliações, relações, etc.

Nossa primeira dica, visando a despertar o interes- se do aluno para o autor e para o tipo de obra que temos aqui (biografi a), seria instigá-lo a uma rápida pesquisa informal (realizada com parentes, amigos ou mesmo professores). De imediato, você terá a chance de trabalhar com dois gêneros diferentes em sala: a entrevista e a biografi a.

Sem ser necessário se alongar muito em cada tipo de texto, uma vez que a intenção é a leitura do livro, e não o ensino dos gêneros, você poderia promover em sala de aula um diálogo dinâmico

para diagnosticar conhecimentos prévios dos alunos sobre entrevista e biografi a.

Sugestões de perguntas:

• Qual é a intenção de uma entrevista?

• Como se organiza a estrutura de uma entre- vista?

• Que procedimentos o entrevistador deverá ter antes do encontro com seu entrevistado?

• Qual é a intenção de uma biografi a?

• Que tipo de pessoa, geralmente, justifi ca uma biografi a?

• Em que a biografi a de um autor poderá nos ajudar para o melhor entendimento de sua obra?

Agora, seria interessante você discutir com os alunos se as entrevistas serão individuais ou em gru- po. Mais importante do que essa decisão é resolver se as questões que serão dirigidas aos entrevistados

devem fi car a critério de cada um (ou cada grupo) ou se elas serão formuladas em classe, a partir de uma discussão coletiva. Parece-nos que essa segunda alternativa tornaria o processo muito mais rico e diminuiria a chance de certos alunos realizarem um trabalho insatisfatório.

Depois que eles tiverem realizado as entrevistas, promova a socialização das respostas obtidas, fazendo, por exemplo, uma tabulação delas. Essa dinâmica de tabulação torna-se muito mais efi ciente se as questões forem comuns a todos.

Nesse rico momento de troca de repertórios os alunos já estão em pleno processo de conhecimento do autor. Daí para a leitura do livro é só mais um passo.

Observações: Caso você queira trabalhar também com o texto não-verbal, após a tabulação dos dados sugira a construção de um gráfi co, utilizando, por exemplo, os seguintes dados: quantos por cento dos entrevistados já conheciam o autor? e a obra dele?

Pode haver ainda uma discussão sobre qual tipo de gráfi co seria ideal para uma melhor visualização: o tipo pizza? O tipo coluna?

Outras linhas do tempo que também poderiam ser confeccionadas: as indicadoras do espaço, uma vez que Erico viajou por muitos lugares, dentro e fora do Brasil, e também as que indicam relação com o momento histórico, uma vez que os anos de maturidade literária desse escritor refl etem as fortes mudanças econômicas e políticas do Brasil e do mundo.

Por si só, o processo de construção dessas linhas já é bastante rico porque, além de exigir uma lei- tura atenta da obra, trabalha com outras inúmeras competências e habilidades.

Se você ainda desejar ampliar o trabalho, o pró- ximo passo seria contrapor uma linha do tempo a outra, ou seja, relacionar, lado a lado, os dados da vida pessoal com os referentes às publicações do autor, com o momento histórico, etc.

Proposta 2

Didaticamente os romances de Erico Verissimo geralmente são classifi cados da seguinte forma:

• primeira fase: romances urbanos, intimistas ou psicológicos (de 1933 a 1942);

• segunda fase: romances histórico-regionalistas (de 1948 a 1961);

• terceira fase: romances políticos (de 1965 em diante).

Além dessa vasta produção romanesca, o autor ainda escreveu contos, impressões de viagem, me- mórias e literatura infantil.

Nossa proposta é que você oriente seus alunos para que durante a leitura do livro grifem os títulos das obras produzidas por Erico para que eles possam ao término da leitura classifi cá-las de acordo com as fases do escritor.

Tal classifi cação, muito mais do que apenas indi- car uma seqüência temática ou ainda cronológica, ajuda-nos a perceber o amadurecimento do autor.

A distância temática entre Clarissa e Incidente em Antares, por exemplo, comprova que só o tempo pode amadurecer certas visões de mundo, e os bons escritores sabem disso!

Sempre que entramos em contato com um livro pela primeira vez, devemos folheá-lo à vontade...

Como é a capa? Quantas páginas? Há ilustrações?

É dividido por capítulos?

Essa primeira aproximação serve para quebrar o gelo, para que o aluno se aproprie mais desse material.

Após esse primeiro momento de exploração, realize a leitura dos cinco primeiros parágrafos do livro e peça que os alunos os comentem livremente ou a partir de algumas questões:

• Por que o entrevistador estava tenso no mo- mento da entrevista?

• Logo no primeiro parágrafo o autor dessa bio- grafi a já nos passa importantes informações sobre Erico Verissimo. Quais são elas?

• No terceiro parágrafo, encontramos o trecho

“Havíamos contatado gente de todo o Brasil, e até do exterior, para escrever sobre Erico”. O que essa informação antecipa sobre o escritor biografado?

• No quarto parágrafo, somos surpreendidos, juntamente com o autor, com a morte de Erico. Qual

trecho desse parágrafo enaltece a fi gura humana do biografado?

Caso você deseje, nesse momento, acrescentar para os alunos um dizer do Erico sobre ele mesmo, sugerimos o seguinte trecho de Solo de clarineta:

Sempre senti em mim todas as possibilidades, tanto para o bem como para o mal. Cometi todos os pecados da imaginação, bem como muitos outros que não foram apenas de fantasia.

[…]

Se me perguntarem que constantes de meu temperamento sinto com mais freqüência, eu diria que é uma curiosa combinação de preguiça — fí- sica e mental — e timidez. Tenho passado a vida a combater ambas, muitas vezes com o mais positivo sucesso.

Sou de raro em raro assaltado pelo tédio, mas reajo com a maior energia, repelindo-o, pois me parece que entregar-se a gente a esse inimigo cin- zento é uma prova de falta de imaginação e senso comum. [...]

O MOMENTO DA LEITURA DO LIVRO APROXIMAÇÃO COM A OBRA

Proposta 1

O autor desse volume, Antonio Hohlfeldt, imprime em seu texto um tom mais próximo da conversa do que de uma biografia isenta de paixão. Fica claro que ele admira Erico Ve- rissimo e que, sendo também gaúcho, se sente extremamente orgulhoso de poder falar de seu ilustre conterrâneo. Porém, como em todas as conversas, seu relato não se apresenta rigida- mente cronológico, devido ao grande número de informações que ele deseja relatar.

Para quem já conhece Erico e sua produção literária, tal recurso agrada bastante, mas, ao jovem que ora principia seus estudos sobre ele, a ordem não-linear dos acontecimentos e principalmente a da publicação literária podem confundir, embora o texto também agrade pela leveza e simpatia dos relatos.

Sendo assim, nossa sugestão seria a construção de uma linha do tempo para a vida de Erico e outra para a sua produção artística. Os alunos deveriam confeccioná-las à medida que lêem a obra.

O MOMENTO POSTERIOR À LEITURA DO LIVRO

Proposta 1

Após os alunos terem classifi cado os romances de Erico, seria bastante interessante que cada grupo se responsabilizasse por uma dessas classifi cações e fosse pesquisar, em alguns dos romances nela elen- cados, dados que justifi quem a inclusão de cada um deles nessa ou naquela fase. Pode ser, por exemplo, questionado: por que podemos classifi car o romance Olhai os lírios do campo como “intimista” ou como

“psicológico”? Como uma situação fantástica como a criada em Incidente em Antares transforma-se em crítica social?

Para o cumprimento desta última tarefa, não é necessário — a não ser que vocês queiram — que os alunos leiam os romances integralmente porque, a partir de leituras de alguns trechos, facilmente os alunos conseguirão encaixá-los em suas deter- minadas fases.

Tal trabalho é interessante, pois coloca o aluno em contato direto com a obra do autor de maneira crítica e investigativa. Não são raras as experiências nesse sentido que trazem como resultado a leitura integral, pelos alunos, dos romances pesquisados.

Se você considerar importante uma visão geral da obra do autor, além das três fases de produção dos romances, algum grupo poderia fi car responsável pelas outras produções já citadas (contos, impressões de viagem, memórias e literatura infantil).

Proposta 2

Se você optar pela leitura integral de algumas obras do autor, dependendo da faixa etária, suge- rimos alguns títulos:

• Ensino Fundamental: Olhai os lírios do campo, Ana Terra, Um certo capitão Rodrigo;

• Ensino Médio: O prisioneiro, Incidente em An- tares.

Caso você opte por que sejam feitas apenas leituras parciais das obras, indicamos na antologia de apoio, a seguir, alguns trechos extraídos de dois romances que julgamos importante serem conhe- cidos pelos alunos.

Proposta 3

Durante as leituras, os alunos se depararam com diferentes expressões utilizadas por Erico Verissimo.

Realmente, esse autor faz questão de apresentar a todo o Brasil o falar gauchesco. Aproveitando esse rico material, sugerimos que haja em sala um debate acerca dos diferentes falares brasileiros.

Importante salientar que todas as variedades lingüísticas são corretas, desde que cumpram com efi ciência o papel fundamental de uma língua — o de permitir a comunicação verbal entre as pessoas.

Estamos tratando aqui de um tipo específi co de variação lingüística: o regionalismo. Observe,

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ERICO VERISSIMO

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De Antonio Hohlfeldt

(Jornalista e professor universitário. Doutor em Letras, leciona na PUCRS e tem livros

de fi cção publicados para crianças e jovens, além de ensaios de crítica literária e de teoria da comunicação.)

SUPLEMENTO DIDÁTICO

Elaborado por

Jô Fortarel (Bacharel em Letras pela Universidade de São Paulo, professora de Literatura em escolas particulares e em cursinhos pré-vestibulares)

POR QUE TRABALHAR COM ERICO VERISSIMO

“Não sou um inovador, não trouxe nenhuma contribuição original para a arte do romance. Tenho dito, escrito repetidamente que me considero, antes de mais nada, um contador de histórias.”

Erico Verissimo

Erico Verissimo:

o contador de histórias

A segunda fase modernista (1930-1945) apro- veitou as conquistas da geração de 1922, acrescen- tando-lhe porém mais maturidade artística e mais compromisso social. Dessa forma, a literatura desse período trilhou diferentes caminhos, sendo o regio- nalismo o mais importante deles.

José Lins do Rego, escritor contemporâneo de Erico Verissimo e também representante da segunda fase modernista, escreveu:

Nós, no Brasil, queremos, acima de tudo, nos en- contrar com o povo que andava perdido. E podemos dizer que encontramos este povo fabuloso, espa- lhado nos mais distantes recantos de nossa terra.

O romance de nossos dias está todo batido nesta massa, está todo composto com a carne e o sangue de nossa gente. […] Hoje, podemos dizer, já po- demos afi rmar: o povo é em nossos dias herói de nossos livros. Isto equivale a dizer que temos uma literatura.

“Que penso de mim como escritor?

Ora, depende da ocasião. Nos momentos escuros, minha tendência é considerar tudo quanto produzi até hoje medíocre ou mesmo mau. Nas horas claras, porém, olho com mais indulgência para a minha própria obra e concluo que, dentre os vinte e poucos livros que até essa data escrevi, uns três ou quatro possuem alguma importância, e pelo menos um deles — creio que O continente — talvez me sobreviva por algum tempo.”

Erico Verissimo

Essas palavras evidenciam a importância do re- gionalismo durante essa fase. Não aquele regionalis- mo utópico e idealizado já cultivado no romantismo de José de Alencar, mas sim um regionalismo crítico, solidário, compromissado com o difícil momento pelo qual passava o Brasil e o mundo.

Erico Verissimo é o representante gaúcho do regionalismo modernista em sua segunda fase.

Apresentando um estilo simples e despojado, logo conquistou a simpatia dos leitores, tornando-se rapidamente, ao lado de Jorge Amado, um dos escri- tores mais populares de nossa literatura. Ele soube, como ninguém, trabalhar em sua obra o realismo, exigido pelo momento, sem desprezar totalmente certo tom romântico. Por lidar com temas tanto cotidianos como universais, oferece a diferentes tipos de leitor vasta escolha de títulos.

Considerado exímio criador de tipos humanos, apresenta-nos o gaúcho, o brasileiro, o ser humano, sempre a partir de uma visão psicológica que fatal- mente desemboca em uma análise ainda maior, a sociológica.

Conhecer algumas personagens de Erico Veris- simo amplia nossa compreensão de nós mesmos, ou, ainda, da própria condição humana, no que ela apresenta de melhor e de pior, de pessoal e de universal, de terreno e de espiritual.

O MOMENTO DA SENSIBILIZAÇÃO

Sensibilizar, motivar o aluno exige arte, talento, esforço e criatividade. Lendo tal afi rmação, logo percebemos que os dois primeiros quesitos depen- dem exclusivamente de você, mas em relação aos outros dois tentaremos, neste suplemento, sugerir ações, ampliações, relações, etc.

Nossa primeira dica, visando a despertar o interes- se do aluno para o autor e para o tipo de obra que temos aqui (biografi a), seria instigá-lo a uma rápida pesquisa informal (realizada com parentes, amigos ou mesmo professores). De imediato, você terá a chance de trabalhar com dois gêneros diferentes em sala: a entrevista e a biografi a.

Sem ser necessário se alongar muito em cada tipo de texto, uma vez que a intenção é a leitura do livro, e não o ensino dos gêneros, você poderia promover em sala de aula um diálogo dinâmico

para diagnosticar conhecimentos prévios dos alunos sobre entrevista e biografi a.

Sugestões de perguntas:

• Qual é a intenção de uma entrevista?

• Como se organiza a estrutura de uma entre- vista?

• Que procedimentos o entrevistador deverá ter antes do encontro com seu entrevistado?

• Qual é a intenção de uma biografi a?

• Que tipo de pessoa, geralmente, justifi ca uma biografi a?

• Em que a biografi a de um autor poderá nos ajudar para o melhor entendimento de sua obra?

Agora, seria interessante você discutir com os alunos se as entrevistas serão individuais ou em gru- po. Mais importante do que essa decisão é resolver se as questões que serão dirigidas aos entrevistados

devem fi car a critério de cada um (ou cada grupo) ou se elas serão formuladas em classe, a partir de uma discussão coletiva. Parece-nos que essa segunda alternativa tornaria o processo muito mais rico e diminuiria a chance de certos alunos realizarem um trabalho insatisfatório.

Depois que eles tiverem realizado as entrevistas, promova a socialização das respostas obtidas, fazendo, por exemplo, uma tabulação delas. Essa dinâmica de tabulação torna-se muito mais efi ciente se as questões forem comuns a todos.

Nesse rico momento de troca de repertórios os alunos já estão em pleno processo de conhecimento do autor. Daí para a leitura do livro é só mais um passo.

Observações: Caso você queira trabalhar também com o texto não-verbal, após a tabulação dos dados sugira a construção de um gráfi co, utilizando, por exemplo, os seguintes dados: quantos por cento dos entrevistados já conheciam o autor? e a obra dele?

Pode haver ainda uma discussão sobre qual tipo de gráfi co seria ideal para uma melhor visualização: o tipo pizza? O tipo coluna?

Outras linhas do tempo que também poderiam ser confeccionadas: as indicadoras do espaço, uma vez que Erico viajou por muitos lugares, dentro e fora do Brasil, e também as que indicam relação com o momento histórico, uma vez que os anos de maturidade literária desse escritor refl etem as fortes mudanças econômicas e políticas do Brasil e do mundo.

Por si só, o processo de construção dessas linhas já é bastante rico porque, além de exigir uma lei- tura atenta da obra, trabalha com outras inúmeras competências e habilidades.

Se você ainda desejar ampliar o trabalho, o pró- ximo passo seria contrapor uma linha do tempo a outra, ou seja, relacionar, lado a lado, os dados da vida pessoal com os referentes às publicações do autor, com o momento histórico, etc.

Proposta 2

Didaticamente os romances de Erico Verissimo geralmente são classifi cados da seguinte forma:

• primeira fase: romances urbanos, intimistas ou psicológicos (de 1933 a 1942);

• segunda fase: romances histórico-regionalistas (de 1948 a 1961);

• terceira fase: romances políticos (de 1965 em diante).

Além dessa vasta produção romanesca, o autor ainda escreveu contos, impressões de viagem, me- mórias e literatura infantil.

Nossa proposta é que você oriente seus alunos para que durante a leitura do livro grifem os títulos das obras produzidas por Erico para que eles possam ao término da leitura classifi cá-las de acordo com as fases do escritor.

Tal classifi cação, muito mais do que apenas indi- car uma seqüência temática ou ainda cronológica, ajuda-nos a perceber o amadurecimento do autor.

A distância temática entre Clarissa e Incidente em Antares, por exemplo, comprova que só o tempo pode amadurecer certas visões de mundo, e os bons escritores sabem disso!

Sempre que entramos em contato com um livro pela primeira vez, devemos folheá-lo à vontade...

Como é a capa? Quantas páginas? Há ilustrações?

É dividido por capítulos?

Essa primeira aproximação serve para quebrar o gelo, para que o aluno se aproprie mais desse material.

Após esse primeiro momento de exploração, realize a leitura dos cinco primeiros parágrafos do livro e peça que os alunos os comentem livremente ou a partir de algumas questões:

• Por que o entrevistador estava tenso no mo- mento da entrevista?

• Logo no primeiro parágrafo o autor dessa bio- grafi a já nos passa importantes informações sobre Erico Verissimo. Quais são elas?

• No terceiro parágrafo, encontramos o trecho

“Havíamos contatado gente de todo o Brasil, e até do exterior, para escrever sobre Erico”. O que essa informação antecipa sobre o escritor biografado?

• No quarto parágrafo, somos surpreendidos, juntamente com o autor, com a morte de Erico. Qual

trecho desse parágrafo enaltece a fi gura humana do biografado?

Caso você deseje, nesse momento, acrescentar para os alunos um dizer do Erico sobre ele mesmo, sugerimos o seguinte trecho de Solo de clarineta:

Sempre senti em mim todas as possibilidades, tanto para o bem como para o mal. Cometi todos os pecados da imaginação, bem como muitos outros que não foram apenas de fantasia.

[…]

Se me perguntarem que constantes de meu temperamento sinto com mais freqüência, eu diria que é uma curiosa combinação de preguiça — fí- sica e mental — e timidez. Tenho passado a vida a combater ambas, muitas vezes com o mais positivo sucesso.

Sou de raro em raro assaltado pelo tédio, mas reajo com a maior energia, repelindo-o, pois me parece que entregar-se a gente a esse inimigo cin- zento é uma prova de falta de imaginação e senso comum. [...]

O MOMENTO DA LEITURA DO LIVRO APROXIMAÇÃO COM A OBRA

Proposta 1

O autor desse volume, Antonio Hohlfeldt, imprime em seu texto um tom mais próximo da conversa do que de uma biografia isenta de paixão. Fica claro que ele admira Erico Ve- rissimo e que, sendo também gaúcho, se sente extremamente orgulhoso de poder falar de seu ilustre conterrâneo. Porém, como em todas as conversas, seu relato não se apresenta rigida- mente cronológico, devido ao grande número de informações que ele deseja relatar.

Para quem já conhece Erico e sua produção literária, tal recurso agrada bastante, mas, ao jovem que ora principia seus estudos sobre ele, a ordem não-linear dos acontecimentos e principalmente a da publicação literária podem confundir, embora o texto também agrade pela leveza e simpatia dos relatos.

Sendo assim, nossa sugestão seria a construção de uma linha do tempo para a vida de Erico e outra para a sua produção artística. Os alunos deveriam confeccioná-las à medida que lêem a obra.

O MOMENTO POSTERIOR À LEITURA DO LIVRO

Proposta 1

Após os alunos terem classifi cado os romances de Erico, seria bastante interessante que cada grupo se responsabilizasse por uma dessas classifi cações e fosse pesquisar, em alguns dos romances nela elen- cados, dados que justifi quem a inclusão de cada um deles nessa ou naquela fase. Pode ser, por exemplo, questionado: por que podemos classifi car o romance Olhai os lírios do campo como “intimista” ou como

“psicológico”? Como uma situação fantástica como a criada em Incidente em Antares transforma-se em crítica social?

Para o cumprimento desta última tarefa, não é necessário — a não ser que vocês queiram — que os alunos leiam os romances integralmente porque, a partir de leituras de alguns trechos, facilmente os alunos conseguirão encaixá-los em suas deter- minadas fases.

Tal trabalho é interessante, pois coloca o aluno em contato direto com a obra do autor de maneira crítica e investigativa. Não são raras as experiências nesse sentido que trazem como resultado a leitura integral, pelos alunos, dos romances pesquisados.

Se você considerar importante uma visão geral da obra do autor, além das três fases de produção dos romances, algum grupo poderia fi car responsável pelas outras produções já citadas (contos, impressões de viagem, memórias e literatura infantil).

Proposta 2

Se você optar pela leitura integral de algumas obras do autor, dependendo da faixa etária, suge- rimos alguns títulos:

• Ensino Fundamental: Olhai os lírios do campo, Ana Terra, Um certo capitão Rodrigo;

• Ensino Médio: O prisioneiro, Incidente em An- tares.

Caso você opte por que sejam feitas apenas leituras parciais das obras, indicamos na antologia de apoio, a seguir, alguns trechos extraídos de dois romances que julgamos importante serem conhe- cidos pelos alunos.

Proposta 3

Durante as leituras, os alunos se depararam com diferentes expressões utilizadas por Erico Verissimo.

Realmente, esse autor faz questão de apresentar a todo o Brasil o falar gauchesco. Aproveitando esse rico material, sugerimos que haja em sala um debate acerca dos diferentes falares brasileiros.

Importante salientar que todas as variedades lingüísticas são corretas, desde que cumpram com efi ciência o papel fundamental de uma língua — o de permitir a comunicação verbal entre as pessoas.

Estamos tratando aqui de um tipo específi co de variação lingüística: o regionalismo. Observe,

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5 6 7 por exemplo, os seguintes trechos de falares re-

gionais:

• Falar gaúcho:

Eu bem sei que qualquer guasca, bem pilchado, de faca, rebenque e esporas, não se afi rma nos arreios da vida, se não se estriba na proteção do Céu. […] Perdoa-me, Senhor, porque rengueando pelas canhadas da fraqueza humana, de quando em vez, quase sem querer, eu me solto porteira afora... (Trecho da Oração do gaúcho, de D. Felipe de Nadal, bispo de Uruguaiana.)

• Falar goiano:

Às vezes, o serviço era dentro de roças novas, de primeira derrubada, cheias de tocos, tranqueirada de pau-lama, mal-encoiravadas, ainda mais com seus muitos buracos de tatu.

O carreador, mal-amanhado, só dava o tanti- nho das rodas. Os bois agüentavam o repuxado, e o menino, esse ninguém reparava nele. (Cora Coralina, “O boi de guia”. Estórias da casa velha da ponte.)

• Falar mineiro (do sertão):

Pai não ralhava, não estava agravado, não vinha descompor. Pai chorava estramontado, demordia de morder os beiços. Miguilim sorriu. Pai chorou mais forte: — “Nem Deus não pode achar isto justo direito, de adoecer meus fi lhinhos todos um depois do outro, parece que é a gente só quem tem de purgar padecer!?” (Guimarães Rosa, Manuelzão e Miguilim.)

Atividade

• dividir a sala em grupos;

• cada um deles deve pesquisar em obras lite- rárias os diferentes falares regionais;

• registrar, observar marcas características da região, etc.;

• socializar os trabalhos.

O momento da socialização dos trabalhos pro- voca uma troca extremamente rica, ampliando de maneira signifi cativa o repertório lingüístico dos alunos.

Atenção, nem sempre é fácil o acesso à “tra- dução” do termo regional. A internet ou os dicio- nários específi cos podem ajudar. De qualquer ma- neira, o importante é que os alunos depreendam o sentido da expressão de acordo com o contexto em que ela está inserida.

Sugestão de autores que apresentam um bom material nesse sentido:

• Erico Verissimo, falar gaúcho;

• Jorge Amado, falar baiano;

• Guimarães Rosa, falar mineiro (sertão);

• Antonio de Alcântara Machado, falar ítalo- brasileiro;

• Manoel de Barros, falar mato-grossense.

ANTOLOGIA DE APOIO

ANA TERRA

“Mal raiou o dia, Ana ouviu um longo mugido.

Teve um estremecimento, voltou a cabeça para todos os lados, procurando, e fi nalmente avistou uma das vacas leiteiras da estância, que subia a coxilha na direção do rancho. A Mimosa! — reconheceu. Correu ao encontro da vaca, enlaçou-lhe o pescoço com os braços, fi cou por algum tempo a sentir contra o rosto o calor bom do animal e a acariciar-lhe o pêlo do pescoço. Leite pras crianças — pensou. O dia afi nal de contas começava bem. Apanhou do meio dos destroços do rancho um balde amassado, acocorou- se ao pé da vaca e começou a ordenhá-la. E assim, quando Eulália, Pedrinho e Rosa acordaram, Ana pôde oferecer a cada um deles um caneco de leite.

— Sabe quem voltou, meu fi lho? A Mimosa.

O menino olhou para o animal com olhos ale- gres. — Fugiu dos bandidos! — exclamou ele.

Bebeu o leite morno, aproximou-se da vaca e passou-lhe a mão pelo lombo, dizendo: — Mimosa velha... Mimosa valente...

O animal parecia olhar com seus olhos reme- lentos e tristonhos para as sepulturas. Pedro então perguntou:

— E as cruzes, mãe?

— É verdade. Precisamos fazer umas cruzes.

Com pedaços de taquara amarrados com cipós, mãe e fi lho fi zeram quatro cruzes, que cravaram nas quatro sepulturas. Enquanto faziam isso, Eulá- lia, que desde o despertar não dissera uma única palavra, continuava sentada no chão a embalar a fi lha nos braços, os olhos voltados fi xamente para as bandas do Rio Pardo.

No momento em que cravara a última cruz, Ana teve uma dúvida que a deixou apreensiva. Só agora lhe ocorria que não tinha escutado o coração dum dos escravos. O mais magro deles estava com a cabeça decepada — isso ela não podia esquecer...

Mas e o outro? Ela estava tão cansada, tão tonta e confusa que nem tivera a idéia de verifi car se o pobre do negro estava morto ou não. Tinham em- purrado o corpo para dentro da cova e atirado terra em cima... Ana olhava, sombria, para as sepulturas.

Fosse como fosse, agora era tarde demais. “Deus me perdoe” — murmurou ela. E não se preocupou mais com aquilo, pois tinha muitas outras coisas em que pensar.

Começou a catar em meio dos destroços do ran- cho as coisas que os castelhanos haviam deixado in- tatas: a roca, o crucifi xo, a tesoura grande de podar

— que servira para cortar o umbigo de Pedrinho e de Rosa —, algumas roupas e dois pratos de pedra.

Amontoou tudo isso e mais o cofre em cima dum cobertor e fez uma trouxa.

Naquele dia alimentaram-se de pêssegos e dos lambaris que Pedrinho pescou no poço. E mais uma noite desceu — clara, morna, pontilhada de vaga- lumes e dos gemidos dos urutaus.

Pela madrugada Ana acordou e ouviu o choro da cunhada. Aproximou-se dela e tocou-lhe o ombro com a ponta dos dedos.

— Não há de ser nada, Eulália...

Parada junto de Pedro e Rosa, como um vaga- lume pousado a luciluzir entre os chifres, a vaca parecia velar o sono das crianças, como um anjo da guarda.

— Que vai ser de nós agora? — choramingou Eulália.

— Vamos embora daqui.

— Mas pra onde?

— Pra qualquer lugar. O mundo é grande.

Ana sentia-se animada, com vontade de viver.

Sabia que, por piores que fossem as coisas que es- tavam por vir, não podiam ser tão horríveis como as que já tinha sofrido. Esse pensamento dava-lhe uma grande coragem. E ali deitada no chão a olhar para as estrelas, ela se sentia agora tomada por uma resignação que chegava quase a ser indiferença.

Tinha dentro de si uma espécie de vazio: sabia que nunca mais teria vontade de rir nem de chorar. Que- ria viver, isso queria, e em grande parte por causa de Pedrinho, que afi nal de contas não tinha pedido a ninguém para vir ao mundo. Mas queria viver também de raiva, de birra. A sorte andava sempre virada contra ela. Pois Ana estava agora decidida a contrariar o destino. Ficara louca de pesar no dia em que deixara Sorocaba para vir morar no Conti- nente. Vezes sem conta tinha chorado de tristeza e de saudade naqueles cafundós. Vivia com medo no coração, sem nenhuma esperança de dias melhores, sem a menor alegria, trabalhando como uma negra, e passando frio e desconforto... Tudo isso por quê?

Porque era a sua sina. Mas uma pessoa pode lutar contra a sorte que tem. Pode e deve. E agora ela ti- nha enterrado o pai e o irmão e ali estava, sem casa, sem amigos, sem ilusões, sem nada, mas teimando em viver. Sim, era pura teimosia. Chamava-se Ana Terra. Tinha herdado do pai o gênio de mula.”

(O continente. São Paulo, Cia. das Letras, 2004.)

UM CERTO CAPITÃO RODRIGO

“Toda gente tinha achado estranha a maneira como o Cap. Rodrigo Cambará entrara na vida de Santa Fé. Um dia chegou a cavalo, vindo ninguém sabia de onde, com o chapéu de barbicacho puxado para a nuca, a bela cabeça de macho altivamente erguida e aquele seu olhar de gavião que irritava e ao mesmo tempo fascinava as pessoas. Devia andar lá pelo meio da casa dos trinta, montava um alazão, vestia calças de riscado, botas com chilenas de prata e o busto musculoso apertado num dólmã militar azul, com gola vermelha e botões de metal. Tinha um violão a tiracolo; sua espada, apresilhada aos arreios, rebrilhava ao sol daquela tarde de outubro de 1828 e o lenço encarnado que trazia ao pescoço esvoaçava no ar como uma bandeira. Apeou na frente da venda do Nicolau, amarrou o alazão no tronco dum cinamomo, entrou arrastando as espo- ras, batendo na coxa direita com o rebenque, e foi logo gritando, assim com ar de velho conhecido:

— Buenas e me espalho! Nos pequenos dou de prancha e nos grandes dou de talho!

Havia por ali uns dois ou três homens, que o mi- raram de soslaio sem dizer palavra. Mas dum canto da sala ergueu-se um moço moreno, que puxou a faca, olhou para Rodrigo e exclamou:

— Pois dê!

Os outros homens afastaram-se como para deixar a arena livre, e Nicolau, atrás do balcão, começou a gritar:

—Aqui dentro não! Lá fora! Lá fora!

Rodrigo, porém, sorria, imóvel, de pernas aber- tas, rebenque pendente do pulso, mãos na cintura, olhando para o outro com um ar que era ao mesmo tempo de desafi o e simpatia.

— Incomodou-se, amigo? — perguntou, jovial, examinando o rapaz de alto a baixo.

— Não sou de briga, mas não costumo agüentar desaforo.

— Oôi bicho bom!

Os olhos de Rodrigo tinham uma expressão cômica.

— Essa sai ou não sai? — perguntou alguém do lado de fora, vendo que Rodrigo não desembai- nhava a adaga. O recém-chegado voltou a cabeça e respondeu calmo:

— Não sai. Estou cansado de pelear. Não quero puxar arma pelo menos por um mês. — Voltou-se para o homem moreno e, num tom sério e conci- liador, disse:

— Guarde a arma, amigo.

O outro, entretanto, continuou de cenho fe- chado e faca em punho. Era um tipo indiático, de grossas sobrancelhas negras e zigomas salientes.

— Vamos, companheiro — insistiu Rodrigo. — Um homem não briga debalde. Eu não quis ofender ninguém. Foi uma maneira de falar...

Depois de alguma relutância o outro guardou a arma, meio desajeitado, e Rodrigo estendeu-lhe a mão, dizendo:

— Aperte os ossos.

O caboclo teve uma breve hesitação, mas por fi m, sempre sério, apertou a mão que Rodrigo lhe oferecia.

— Agora vamos tomar um trago — convidou este último.

— Mas eu pago — disse o outro.

Tinha lábios grossos, dum pardo avermelhado ressequido.

— O convite é meu.

— Mas eu pago — repetiu o caboclo.

— Está bem. Não vamos brigar por isso.

Aproximaram-se do balcão.

— Duas caninhas! — pediu Rodrigo.

Nicolau olhava para os dois homens com um sor- riso desdentado na cara de lua cheia, onde apontava uma barba grossa e falha.

— É da boa — disse ele, abrindo uma garrafa de cachaça e enchendo dois copinhos.

Houve um silêncio durante o qual ambos bebe- ram: o moço em pequenos goles, e Rodrigo dum sorvo só, fazendo muito barulho e por fi m estra- lando os lábios.

Tornou a pôr o copo sobre o balcão, voltou-se para o homem moreno e disse:

— Meu nome é Rodrigo Cambará. Como é a sua graça?

— Juvenal Terra.

— Mora aqui no povo?

— Moro.

— Criador?

O outro sacudiu a cabeça negativamente.

— Faço carreteadas daqui pro Rio Pardo e de lá pra cá.

— Mais um trago?

— Não. Sou de pouca bebida.

Rodrigo tornou a encher o copo, dizendo:

— Pois comigo, companheiro, a coisa é diferente.

Não tenho meias medidas. Ou é oito ou oitenta.

— Hai gente de todo o jeito — limitou-se a dizer Juvenal.

[…]

Chegaram quase ao mesmo tempo ao ponto mar- cado para o encontro. Apearam em silêncio e amar- raram seus cavalos. Rodrigo viu quando Bento, a uns vinte passos de distância, tirava o chapéu, o casaco e começava a arregaçar as mangas. Fez o mesmo. Da lagoa próxima vinha um coaxar de sapos. O crescente

no céu parecia uma talhada fi na de melancia. Se eu mato esse homem, não posso fi car em Santa Fé e perco Bibiana — refl etiu Rodrigo. — Se ele me mata, perco tudo. É uma situação dos diabos.

Viu a adaga lampejar nas mãos do outro. Um vento morno batia-lhe no rosto, entrava-lhe pelas narinas com um cheiro de água. No campo, vaga- lumes pingavam de fogo o corpo da noite.

— Pronto? — gritou Bento.

— Pronto!

E aproximaram-se um do outro, lentos, meio encurvados. Pararam quando a distância que os separava era pouco mais de cinco passos e fi caram a se mirar, negaceantes. Rodrigo ouvia a respiração arquejante do inimigo.

— Vou te mostrar o que acontece quando se bate na cara dum homem, patife — rosnou ele. E sentiu que a raiva o fazia feliz.

— Quem vai te mostrar sou eu, canalha.

E dizendo isto Bento avançou brandindo a ada- ga. Os ferros se encontraram no ar com violência e tiniram. No primeiro momento Rodrigo teve de recuar alguns passos. Mas logo fi rmou pé no chão e desviou todos os pranchaços do outro. Bento quis atingir-lhe a cabeça com o lado da adaga, mas o capitão aparou o golpe no ar com tal fi rmeza que a arma do adversário se lhe escapou da mão e caiu ao solo. Rápido, Rodrigo deu-lhe um pontapé e atirou-a longe, fora do alcance de Bento, que começou a recuar devagarinho, arquejando como um animal acuado.

— Pode pegar a adaga! — gritou-lhe Rodrigo.

— Não brigo com homem desarmado.

Bento correu, apanhou a arma e tornou a arre- meter. Por alguns instantes os dois inimigos terça- ram armas, disseram-se palavrões, enquanto suas camisas se empapavam de suor. Por fi m se atracaram num corpo-a-corpo furioso, cabeça contra cabeça, peito contra peito. O braço direito de Rodrigo esta- va no ar, seguro à altura do pulso pela mão esquerda de Bento, cuja direita tentava aproximar a ponta da adaga do baixo-ventre do adversário.

— Vou te botar minha marca na cara, pústula!

— Vou te tirar as tripas pra fora, corno!

Empregando toda a sua força, que o ódio aumentava, o capitão conseguiu prender a mão direita do outro entre suas coxas; e depois, imobi- lizando com a sinistra o braço que Bento Amaral tinha livre, com a destra segurou a adaga e apro- ximou-lhe a ponta da cara do inimigo, que atirou a cabeça para trás, num pânico, e começou a bufar e a cuspir.

— Te prepara, porco! — gritou Rodrigo. — É agora.

E riscou-lhe verticalmente a face. O sangue brotou do talho. Bento gemia, sacudia a cabeça e houve um momento em que seu sangue respingou o rosto de Rodrigo e uma gota lhe entrou no olho direito, cegando-o por um breve segundo.

— Falta a volta do R!

E num golpe rápido fez uma pequena meia-lua, às cegas. Bento cuspiu-lhe no rosto, frenético, e num repelão safou-se e tombou de costas, deixando cair a adaga.

Rodrigo imaginou que ele ia levantar-se, apa- nhar de novo a arma e voltar ao ataque. Mas Bento, sentado no chão, com a mão no rosto, fi cou a olhar atarantadamente para todos os lados. Os sapos continuavam a coaxar. Vaga-lumes passavam entre os dois inimigos. Uma ave noturna saiu de dentro do cemitério e sobrevoou a coxilha, num seco rufl ar de asas.

— Não vou te matar, miserável — disse Rodrigo.

— Mas não costumo deixar serviço incompleto.

Quero terminar esse R. Falta só a perninha...

E caminhou para o adversário, devagarinho, antegozando a operação, e lamentando que não fosse noite de lua cheia para ele poder ver bem a cara odiosa de Bento Amaral.”

(O continente. São Paulo, Cia. das Letras, 2004.) GLOSSÁRIO

Modernismo Calcado no clima nacionalista de mudanças sociais e no projeto estético das Vanguar- das Européias, o Modernismo brasileiro surgiu, em 1922, devido ao esforço de um grupo de intelectuais brasileiros que idealizou e realizou a Semana de Arte Moderna, evento que tornou pública esta nova maneira {uma nova maneira} de pensar o passado, o presente e o futuro da política, da sociedade, da economia e, sobretudo, da cultura brasileira.

Modernismo, primeira fase (1922 a 1930) Cha- mada fase heróica, caracterizada como um “período de destruição” preocupado em difundir as novas idéias e criticar de forma violenta a literatura tra- dicionalista. Principais representantes: Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Manuel Bandeira e Antonio de Alcântara Machado.

Modernismo, segunda fase (1930 a 1945) “Pe- ríodo de construção” em que se consolidam os ideais modernistas da fase anterior. Os escritores dessa fase apresentam em suas obras uma gran-

de preocupação com os problemas sociais de seu tempo. Principais representantes: Jorge Amado, Graciliano Ramos, Rachel de Queiroz, José Lins do Rego e Erico Verissimo.

INDICAÇÕES PARA APROFUNDAR OS TEMAS TRABALHADOS

AGUIAR, Flávio; CHIAPPINI, Ligia; PESAVENTO, Sandra Jatahy. Erico Verissimo: o romance da his- tória. São Paulo: Nova Alexandria, 2001.

ASSIS BRASIL, Luiz Antônio de. Eça de Queirós e Erico Verissimo. Cadernos do Centro de Pesquisas Literárias da PUCRS, Porto Alegre, v. 2, n. 3, p. 72- 77, nov. 1996.

______; MOREIRA, Maria Eunice; ZILBERMAN, Re- gina (Org.). Pequeno dicionário da literatura do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Novo Século, 1999.

BORDINI, Maria da Glória. Criação literária em Erico Verissimo. Porto Alegre: L&PM, 1995.

CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA, Erico Verissimo. São Paulo, Instituto Moreira Salles, 2005.

CANDIDO, Antonio. Formação da literatura brasileira. Belo Horizonte: Itatiaia, 1981.

CHAVES, Flávio Loureiro. Erico Verissimo: o escritor e seu tempo. Porto Alegre: Ed. da UFRGS, 2001.

______. Erico Verissimo: realismo e sociedade.

Porto Alegre: IEL, 2001.

______ (Org.). O contador de histórias: 40 anos de vida literária de Erico Verissimo. Porto Alegre:

Globo, 1981.

GONZAGA, Sergius. Erico Verissimo. Porto Ale- gre: IEL, 1990.

HOHLFELDT, Antonio. Erico Verissimo. Porto Alegre: Tchê! Editora.

LEITE, Ligia Chiappini Moraes. Regionalismo e modernismo, o caso gaúcho. São Paulo: Ática, 1978.

p. 242-243.

ZILBERMAN, Regina. Do mito ao romance: tipo- logia da fi cção brasileira contemporânea. Caxias do Sul: Universidade de Caxias do Sul; Porto Alegre:

Escola Superior de Teologia São Lourenço de Brin- des, 1977. p. 47-89.

______. O tempo e o vento: história, mito, lite- ratura. Letras de hoje, Porto Alegre, n. 65, p. 63-90.

1989.

______. O tempo e o vento: história, mito, lite- ratura. Nova Renascença, Porto Alegre, n. 57/58, p.

341-364. 1995.

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