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DECISÃO JUDICIAL E SUA INFLUÊNCIA SOBRE A LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA PAULISTA: UMA PERSPECTIVA NEOPOSITIVISTA

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VALÉRIO PIMENTA DE MORAIS

DECISÃO JUDICIAL E SUA INFLUÊNCIA SOBRE A LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA PAULISTA: UMA PERSPECTIVA NEOPOSITIVISTA

Mestrado em direito tributário

PUC-SP SÃO PAULO

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VALÉRIO PIMENTA DE MORAIS

DECISÃO JUDICIAL E SUA INFLUÊNCIA SOBRE A LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA PAULISTA: UMA PERSPECTIVA NEOPOSITIVISTA

Dissertação apresentada à banca examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito Tributário, sob orientação do Prof. Dr. Renato Lopes Becho.

PUC-SP SÃO PAULO

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Banca Examinadora

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______________________________________________

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RESUMO

Esta dissertação tem por finalidade o estudo da influência das decisões judiciais sobre a legislação tributária paulista, tomando como referência o momento exacional de atuação da sua Administração Tributária, notadamente com o lançamento de ofício e sua revisão, que são tidos como marcadamente positivistas, sobretudo ao se levar em consideração a interpretação do Código Tributário Nacional, em seus artigos 142 e 149.

A premissa neopositivista - diga-se de plano - norteou o desenvolvimento do trabalho, uma vez que suas características sempre estiveram presentes na análise que foi promovida, podendo mesmo ser reduzida a uma ideia de complementaridade, não só das atividades dos Poderes de Estado, mas, antes mesmo, das correntes filosóficas do direito. Neste passo, suas notas essenciais, tomadas em consideração, estabeleceram-se pela ambientação na Constituição da República de 1988, com pauta em forte medida principiológica, que, por sua vez, ingressa amplificada pela multiplicidade dos intérpretes, trazendo preenchimento semântico à equação concebida de que a norma jurídica é encontrada como o resultado da interação entre lei (obra dos Poderes Legislativo e Executivo, ao atuar na sua sanção e iniciativa), interpretação (resultado de multíplices atores sociais), e, por fim, jurisprudência (decorrente da atuação do Poder Judiciário).

Nessa medida, foi também objeto de nossa investigação a consideração da teoria dos sistemas de Niklas Luhmann, que serviu de suporte para a apreciação, segundo a concepção de sistema jurídico adotada, da posição ocupada pelos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário em relação ao mesmo sistema, a par da apreciação formulada, ainda, da principiologia e das correntes filosóficas do direito e da tributação, concebendo-se, assim, em decorrência, a norma jurídica (resultado da interação dos elementos, antes apontados, fundamentadas no neopositivismo) e no novo papel assumido pela jurisprudência como fonte do direito, viabilizado pela atuação do modelo típico-ideal de juiz, na forma do juiz-guardião.

Nesse contexto, com base no quanto se sacou das análises empreendidas ao longo do presente trabalho, em resposta às indagações lançadas durante a formulação da introdução deste, apreendemos que as decisões judiciais irradiam normatividade, num caminho de norma individual e concreta até a geral e abstrata, seja por meio do cumprimento de expectativas normativas contrafáticas, seja mesmo no caso da objetivação das lides submetidas ao Poder Judiciário, sendo responsáveis pela irritação suficiente para que, sobretudo dentro da consideração empreendida, o legislador estadual ou distrital, produza o novo direito positivado.

A aproximação efetuada entre a ética e o direito, dessa forma, construída, originariamente, pelas decisões judiciais do Poder Judiciário, tende a perpassar todo o sistema jurídico, servindo de base, ainda, para os momentos pré-exacionais e exacionais, que passam também a reproduzir, de sua parte, esta mencionada aproximação, representando uma tradução final dos princípios da segurança jurídica e da isonomia.

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ABSTRACT

This essay analyses the influence of judicial decisions over São Paulo’s tax law, taking as reference the moment of taxation by Public Administration, notedly the moment of tax assessment and its revision, which are markedly positivist, over all when taking into consideration the interpretation of the articles 142 and 149 of Brazilian Tax Code. 

The neopositivist premise has guided the development of the present essay, since its features have always been present at the analysis promoted, which can be reduced to an idea of complementarity, not only the activities of the government (Legislative, Executive and Judiciary), but also of a philosophical currents of Law. Note that the present analysis focus on Brazilian Federal Constitution, mainly on its principles, which join amplified by the multiplicity of interpreters, bringing semantic fill to the equation that assumes that rule of law is the result of interaction between law (work of Legislative and Executive, acting on its sanction and initiative), interpretation (a result of multiple social actors), and, finally, case law (deriving from the action of Judiciary). 

In this respect, this essay also examines the systems theory of Niklas Luhmann, that, considering the concept of legal system adopted, served as a support for the analysis of the position occupied by Executive, Legislative and Judiciary relatively to the same system, as well as the analysis of the principles and of the philosophical currents of law and the taxation, conceiving, as a result, the rule of law (which derives from the interaction of the elements which were mentioned above, within the neopositivist idea) and the new role played by case law as a source of law, made possible by the performance of the ideal model of a judge as a guardian-judge. 

In this context, in response to the questions thrown during the formulation of the introduction of this essay, we apprehend that judgments irradiate normativity, through individual and concrete rule up to general and abstract rule, either through compliance with regulatory expectations contrary to facts or even in case of objectification of judicial proceedings, being responsible for enough irritation that, over all taken into consideration, stimulate legislators create new laws.

Thus, the approach between ethics and law, originally built by judicial decisions, tend to pervade the entire the legal system, also serving as a base for taxation moments as well as the moments before taxation, which begin to reproduce the aforementioned approach, representing a final translation of the principles of legal certainty and of equality.

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AGRADECIMENTOS

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 1

Capítulo I. DO SISTEMA JURÍDICO ... 7

1.1. Das considerações gerais ... 7

1.2. Da teoria dos sistemas ... 10

1.3. Das posições dos Poderes de Estado a partir da teoria dos sistemas luhmanniana ... 13

1.4. Dos princípios ... 18

1.5. Do direito natural ao neopositivismo ou “o novo direito tributário” ... 25

1.5.1. Do direito natural e a tributação ... 28

1.5.2. Do direito positivo e do realismo jurídico e a tributação 36 1.5.3. Do neopositivismo ou do neoconstitucionalismo e a tributação ... 40

1.6. Dos momentos exacionais e das correntes filosóficas: uma ideia de complementaridade ... 45

Capítulo II. DA NORMA JURÍDICA DENTRO DA PERSPECTIVA NEOPOSITIVISTA 50 2.1. Dos processos legislativos e das decisões judiciais ... 50

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2.2.1. Do juiz-executor ... 57

2.2.2. Do juiz-delegado ... 59

2.2.3. Do juiz-guardião ... 60

2.2.4. Do juiz-político ... 63

2.2.5. Dos modelos típico-ideais do juiz: o neopositivismo e o espaço de atuação do juiz-guardião ... 65

2.3. Da jurisprudência como fonte do Direito: o novo papel da jurisprudência dentro da perspectiva neopositivista ... 69

Capítulo III. DOS EFEITOS DAS DECISÕES JUDICIAIS SOBRE O SISTEMA JURÍDICO TRIBUTÁRIO DO ESTADO DE SÃO PAULO ... 80

3.1. Notas gerais ... 80

3.2. Da “guerra fiscal” e da glosa unilateral pelo Estado de São Paulo, uma leitura neopositivista legitimadora ... 83

3.2.1. Notas do ICMS, do federalismo brasileiro e da “guerra fiscal” ... 83

3.2.2. Da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do momento exacional da Administração Tributária Paulista ... 94

3.3. Do processo administrativo tributário paulista e do “limitado” diálogo das fontes no momento pré-exacional ... 101

3.3.1. Das recentes reformas processuais civis – breves notas ... 106

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tributário paulista ... 110 3.3.3. Da aferição de alguns princípios atuantes na relação

entre as reformas de direito processual civil e o processo administrativo

tributário paulista ... 114 3.3.4. Da casuística – a apreciação pelo Tribunal de

Impostos e Taxas – TIT - sobre a aplicação da decadência para a

constituição do crédito tributário pela Fazenda Pública ... 121

CONCLUSÃO ... 125

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1

INTRODUÇÃO

O presente trabalho volta-se para a aferição do papel assumido pelas decisões judiciais como fonte do direito, à vista da sua inegável importância para a formação da norma jurídica e, aqui, em específico, por suas relações com o direito tributário posto pela legislação paulista.

Esse conjunto de decisões judiciais, inegavelmente, age sobre o sistema jurídico dos entes federativos dos Estados e do Distrito Federal, na configuração mesma de geração de expectativas normativas, conforme a apreciação luhmanniana. E, ainda, podem ser traduzidas de modo imediato, com a estruturação de uma nova disposição normativa da legislação ordinária estadual e distrital (que podem ser concebidas, em nosso entendimento último, como expressão da moderna teoria do diálogo das fontes, na justa medida em que uma norma positivada pelo Poder Legislativo remete a uma norma jurídica introduzida pelo Poder Judiciário) e, de modo mediato, com a decorrente atuação da Administração Tributária, à vista da sua pauta no princípio da estrita legalidade.

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2

Em conformidade com a doutrina1, o que se tem como fundante e um dos pontos de maior relevo para a presente investigação é a consideração de que o momento exacional, que circunstancia a atuação da Administração Tributária, é marcadamente pautado pelo positivismo, bem como os atos relacionados ao lançamento tributário e sua revisão (que se revelam como a seara própria do processo administrativo tributário, na conformidade com as disposições dos artigos 142 e 149 do Código Tributário Nacional - CTN), alimentam-se, por atividade pública vinculada, dos comandos encontrados no direito positivo.

Outro referencial teórico que se faz objeto de nossa verificação é o neopositivismo, ou os chamados direitos humanos na tributação, resultado da denominada “virada kantiana”, com a aproximação da ética e do direito. Ademais será tratada neste estudo a conjunção do que se pode entender por norma, como sendo o resultado da “equação algébrica” de “soma das variáveis” (ao menos na medida em que podemos atribuir), na consideração dos dois tipos de normas – geral e abstrata e individual e concreta –, norma esta traduzida em: lei + jurisprudência + interpretação2, em que ganha relevo a atuação principiológica.

“Equação” esta, portanto, que vai convergir para o papel assumido pelo legislador infraconstitucional, do momento pré-exacional, na tessitura dos comandos normativos que instrumentam a atuação da Administração Tributária.

1 No escólio de Renato Lopes Becho, a conclusão: “Eis o momento de forte atuação positivista no

direito tributário”. (Filosofia do direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p.340).

2 BECHO, Renato Lopes.

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3

O que se põe como premissa, portanto, é que a formação do direito é um resultado que passa pelo esforço, não só do legislador, como também do julgador3, ambos, portanto, dotados de atividade jurídica criativa, sendo inegável sua concepção como fonte do direito4.

Vai se ter, então, que a complementaridade entre lei, jurisprudência e interpretação, segundo a concepção neopositivista, não leva só em conta os limites do positivismo, ou a sua expressão do realismo jurídico, mas também se encontra de acordo com nossa concepção, na atuação complementar dos Poderes de Estado, nas suas linhas de atuação, e que será evidenciada quando da análise dos três momentos exacionais.

Ambientado nesse cenário de amplitude normativa, vamos promover a análise da atuação da Administração Tributária do Estado de São Paulo, como já antecipado, basicamente levando em conta dois momentos marcadamente distintos: o primeiro, de lançamento do crédito tributário, quando da autuação promovida pela Fazenda paulista na glosa unilateral de créditos do ICMS, decorrentes da chamada “guerra fiscal”, situação em que não há, portanto, o prévio acesso ao Poder Judiciário; o segundo, de revisão do lançamento tributário, momento pautado pela

3 Nesta medida é do nosso interesse o fato de que o âmbito de atuação material do Poder Judiciário

não se revela uniforme, tão só limitado na sua função típica de aplicar e definir o direito no caso de conflitos intersubjetivos ou de confronto entre as normas infraconstitucionais e constitucionais (cf. ÁVILA, Humberto. Ativismo judicial e direito tributário, in Grandes questões atuais do direito tributário, Valdir de Oliveira Rocha (Coord.). São Paulo: Dialética, 2011, p. 150).

4 Eros Roberto Grau bem pontua o problema, numa medida em que se verifica, de maneira inegável,

a multiplicidade dos intérpretes normativos, na configuração precisa da norma jurídica, dentro de uma premissa neopositivista. São suas estas palavras: “Quem produz uma norma exerce um ato de poder. Também o fazem os advogados, os juristas, o administrador público e os cidadãos, até o momento anterior ao da definição da norma de decisão. Ora, se as normas nascem da interpretação, também esses intérpretes não-autênticos, produzem normas.”(GRAU, Eros Roberto. Ensaio e discurso sobre

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4

normatividade do processo administrativo tributário paulista, quando, então, nos deteremos no exame da figura procedimental da “reforma de julgado administrativo”, em sua natureza jurídica, delineado especificamente nas disposições dos artigos 50 e 51 da Lei Estadual nº 13.457/09.

Levaremos em consideração, ainda, que é amplo o reconhecimento do atual estágio do que se pode chamar de novo direito tributário, que são fundamentados em elementos do neopositivismo, carregados de características próprias, como a discussão dos direitos humanos no fenômeno da tributação e da própria aplicabilidade principiológica na formação da cadeia de positivação da norma individual e concreta5. Assim, nessa perspectiva atual, emanam cargas de influência, de maneira inequívoca, no momento pré-exacional de lançamento ou de revisão, a cargo do legislador, diga-se, por sua atuação como recebedor das influências sistêmicas.

Procuraremos, enfim, na análise do sistema jurídico, apontar razões decorrentes de algumas indagações, tais como: Existiria normatividade nas decisões judiciais (interessando-nos, de modo mais específico, no âmbito do direito tributário6)? Qual o modelo típico-ideal de juiz que desempenharia melhor a sua

5 Por nós, adiantando-nos, a diferença que pode ser concebida entre o neopositivismo e o realismo

jurídico moderado é que aquele se ambienta na Constituição, pautado em forte medida principiológica, que ingressa nos veios da interpretação, em que esta, por sua vez, amplificada pela multiplicidade dos intérpretes, fazendo todo sentido semântico à equação montada, dispondo que a norma é o resultado da lei (obra do Legislativo e do Executivo, na medida da sua sanção e iniciativa), da interpretação (resultado de multíplices atores sociais), e, por fim, da jurisprudência (obra do Judiciário); já, este, o realismo jurídico moderado, cuida da jurisprudência, que é tão fonte do direito quanto a legislação, sendo um equívoco pensar que o legislador cria o direito, criando, antes, uma parte do direito e não todo o direito (conforme pontua Renato Lopes Becho, in Lições de direito

tributário: teoria geral e constitucional. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 126).

6 A importância do Poder Judiciário no sistema jurídico brasileiro, referente sobretudo ao direito

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5

atividade nesse sistema jurídico? Qual a relação que poderia ser aferida entre o legislador infraconstitucional dos Estados-membros e do Distrito Federal e as decisões dos tribunais superiores nacionais? Que ordem de princípios estaria presente nessa mesma relação considerada? E, ao fim, de que modo o momento exacional, marcadamente positivista, como dito anteriormente, poderia trazer em seu conteúdo elementos de aproximação entre o direito e a ética, denotadores da “virada kantiana”?

E, em resposta a tal fato, adiantando-nos, ao menos num eixo condutor, em relação à teoria dos sistemas de Luhmann - que permite a identificação do posicionamento dos Poderes de Estado no sistema jurídico, e da correlação entre os momentos exacionais e as correntes filosóficas do direito - notaremos que o papel assumido pelo Poder Judiciário, de acordo com uma premissa pautada no neopositivismo, em suas decisões judiciais, é maior do que a produção de coisa julgada entre as partes, ou da sua estabilização social, como, primeiramente, representa uma realidade7, revelando-se, mais, na consideração da sua atual fase, como fonte mesma do direito, diante da sua objetivação da lide.

vinculantes. Assim, de um total de 31 súmulas vinculantes publicadas pelo Supremo Tribunal Federal, 7 estão relacionadas, de modo direto ou indireto, com o direito tributário (representando, então, 22,58% do total de súmulas vinculantes já publicadas). (Supremo Tribunal Federal. Súmulas

vinculantes. Disponível em <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/jurisprudenciaSumulaVinculante/anexo/ Enunciados_Sumula_Vinculante_STF_1_a_29_31_e_32.pdf >. Acesso em: 29 abr. 2013.

7 Neste ponto, apreendemos a observação, impressa por Niklas Luhmann, à interpretação

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6

Desse modo, para cumprimento do presente estudo, estruturamos a seguinte divisão: no capítulo primeiro cuidamos de uma conceituação geral de sistema jurídico, com maior ênfase na aferição da sua ocupação pelos Poderes de Estado na consideração da teoria dos sistemas luhmanniana, bem como na apresentação analítica dos momentos exacionais em compasso com as correntes filosóficas do direito tributário.

No segundo capítulo, por sua vez, cuidamos da norma jurídica com a perspectiva neopositivista, aferindo, ainda, dentre os modelos típico-ideais de juiz, aquele que melhor responde a essa corrente filosófica, chegando-se, assim, ao modelo típico-ideal do juiz-guardião. Além disso, tratamos de cuidar, como um ponto central de atividade, o papel assumido pela jurisprudência como fonte do direito.

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7

CAPÍTULO I

DO SISTEMA JURÍDICO

1.1. Das considerações gerais

No que tange ao tema proposto, o sistema jurídico – diga-se, por enquanto, restrito a esta consideração, não se adentrando, portanto, em atributos de estaticidade ou dinamicidade8 – há que ser analisado segundo a perspectiva neopositivista, com evidentes notas de principiologia, bem como, a par do quanto será extraído, a seu tempo, com base em Niklas Luhmann, no que diz respeito à atuação do legislador na sua periferia, alimentando-se, daí, das influências exteriores para a construção do direito positivo – o que, para os limites de nossa investigação, restringir-se-á à legislação tributária paulista.

No nosso entendimento, metodologicamente, o direito não pode ser concebido tendo como pauta única uma norma jurídica determinada. Por consequência, qualquer estudo do direito, seja em qualquer plano semiótico que se considere – sintático, semântico ou pragmático -, só se torna possível, gnosiologicamente, com o conceito de sistema jurídico.

8 Adianta-se que é certo, contudo, na linha de nosso trabalho, o aspecto dinâmico, uma vez que o que

nos norteia é declaradamente a normatividade, aferida em sua criação e na relação entre norma fundada e fundante. Assim, a consideração de sistema e ordenamento jurídico, nos moldes do quanto cuidado por Paulo de Barros Carvalho, não se revelam distintos e, como sistema, também, consideramos um estrato de linguagem tal como se apresenta com um mínimo de racionalidade inerente às entidades lógicas, sendo claro que, ainda, a Constituição da República exerce um papel fundamental na regulação e transformação das normas jurídicas (cf. CARVALHO, Paulo de Barros.

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8

O sistema jurídico vem representar, nessa medida, a unidade fundamental da matéria do direito, ou, por outras palavras, o sistema jurídico fornece ao direito o seu caráter de unidade. Há que ser dito, nesse passo, que entendemos por distintos, sistema jurídico e sistema normativo. Nestes termos, é certo que ao se cuidar da unidade do direito, somos alcançados pela indagação da completude do sistema normativo, com a presença ou não de lacunas, sendo tal como decorrência de um ideal racional ou como ficção de manifesta finalidade prática. Esta indagação, diga-se, será melhor cuidada quando nos detivermos no ponto do neopositivismo. Mas, em breve adiantar, situamo-nos dentre aqueles que entendem o direito como uma realidade dinâmica, em que a unidade do direito não pode se confundir com a unidade do sistema normativo, na medida em que as normas, por mais completas, precisas e determinadas que se apresentem, são, ao fim, parte integrante do direito, não podendo, de modo algum, identificar-se com ele9.

Há que se ter em conta, por sua parte, que, para os puristas, cuja expressão maior se encontra em Hans Kelsen, a unicidade do direito não se encontra na norma posta do sistema, mas, antes, na chamada norma hipotética fundamental, que se revelaria - como pressuposto e fundamento último de validade das constituições dos países - em verdadeiro dogma, na sua consideração de ápice da pirâmide hierárquica das normas de direito positivo. Nessa medida, Hans Kelsen pontua:

9 No ponto, alinhamos o escólio de Maria Helena Diniz, suportando-se na doutrina de Lourival

(18)

9

A norma fundamental é a fonte comum da validade de todas as normas

pertencentes a uma mesma ordem normativa, o seu fundamento de

validade comum. O fato de uma norma pertencer a uma determinada ordem

normativa baseia-se em que o seu último fundamento de validade é a

norma fundamental desta ordem10.

Portanto, o sistema jurídico, além de traduzir-se em unidade para o direito, revela-se, por si mesmo, como um sistema, na medida em que se revela como um conjunto ordenado de normas jurídicas (não consideradas na limitação das leis, ou melhor, do produto do Legislativo), que guardam entre si uma série de relações. Assim, em nossa concepção, sistema jurídico pressupõe uma construção de sentido, que percorre elementos não só de lei, mas, também, carrega – segundo o neopositivismo - interpretação e jurisprudência, e sua harmonia só se tem presente e aferível quando do arranjo e formação da norma individual e concreta.

Na medida, portanto, do que se propõe, resta presente, tomando como referência os temas da principiologia e do papel assumido pela jurisprudência no ordenamento jurídico, na própria consideração do neopositivismo, a necessidade de se cuidar, ao menos de modo tangencial, do conceito de sistema jurídico11, de acordo com a doutrina de Niklas Luhmann.

10 KELSEN, Hans.

Teoria pura do direito. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 217.

11 Apesar do entendimento doutrinário da distinção entre sistema e ordenamento, à vista da

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10

1.2. Da teoria dos sistemas

Numa primeira medida, vai se colher o conceito de seleção, com o seu pressuposto depositado na redução da complexidade e na diferenciação funcional, na consideração, portanto, do sistema pela teoria autopoiética12, que substituiu a teoria dos sistemas abertos, apontando, como sua característica essencial, não para a distinção possível entre o ambiente e o sistema, mas para a definição do sistema social – que o jurídico o integra -, e seus subsistemas, como fechados e autorreferenciados, a partir da construção teórica formulada por Niklas Luhmann13.

Nesses termos, a nota que caracteriza o sistema social é a presença da comunicação, de modo exclusivo, em sua estrutura, que se autorreplica, com a comunicação produzindo comunicação em outra direção, pautada na diferenciação funcional nas sociedades modernas que, com o intuito certo de redução de complexidades, exigem a estipulação de comunicações especializadas, como a comunicação jurídica, que culmina com o direito positivo (convergindo para a varável “lei”, da “equação” neopositivista).

É certo que resta o esclarecimento do modelo teórico luhmanniano, que é passível de crítica no que se refere à caracterização do sistema social na presença

12 Pode-se sintetizar, na consideração de “autopoiese”, como o princípio segundo o qual um sistema

(biológico ou social) reproduz os processos pelos quais foi gerado, desenvolvendo atividades de autorregulamentação e auto-organização (in ABBAGNO, Nicola. Dicionário de filosofia. 5 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 111-113).

13 Em Osvaldo Santos de Carvalho colhe-se o registro preciso da teoria luhmanniana de sistema,

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11

exclusiva da comunicação. De plano, emergiria a indagação da presença do próprio ser humano nessa concepção de sistema social. É que Luhmann coloca o ser humano como ambiente da sociedade, como uma premissa fundante para o equacionamento do fechamento operacional do sistema, conferindo à comunicação, com esse deslocamento do ser humano para o ambiente da sociedade, da operação que dota de unidade o sistema. Nessa medida, de fato, a comunicação é operação interna ao sistema, não se apresentando entre o sistema e o ambiente.

Por sua parte, a comunicação é a síntese da seleção, em suas três modalidades: emissão, entendida como ato de comunicar; informação e compreensão, e o processo de comunicação, em consideração ampla, o que define não só a unidade do próprio sistema social, como também promove a sua reprodução14.

De volta à concepção luhmanniana, a diferenciação funcional própria do direito, enquanto sistema jurídico, reside, não propriamente em dar conformação comportamental, mas, antes, em assegurar as expectativas normativas contrafáticas, não se adaptando aos fatos, portanto protegendo quem espera um comportamento conforme a norma15 - situação contrária, então, da expectativa cognitiva, que se revela dotada de adaptação.

Essa expectativa normativa, própria do sistema jurídico, pauta-se na generalidade – que traz a includência e, portanto, por decorrência, a igualdade – e

14 É o quanto se extrai em Celso Fernandes Campilongo, na sua aferição teórica da teoria dos

sistemas de Luhmann, prendendo-se na colocação do homem na sociedade e no papel assumido pela comunicação dentro do sistema social (cf. Política, sistema jurídico e decisão judicial. – 2. ed. São Paulo : Saraiva, 2011, p. 68-69).

15 Justamente na consideração de proteção das expectativas de comportamento, na conformidade

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12

na congruência, seja na sua consideração temporal – que ao utilizar-se da sanção, mantém a integridade da expectativa normativa -; seja a social – na medida da presença do consenso mínimo em que devem se encontrar os interessados ou partes -; ou, por fim, seja material – ao oferecer segurança contra as contradições.

Por fim, na medida do pressuposto autopoiético do sistema jurídico, este recebe dos demais sistemas, ou do próprio ambiente, uma série de informações, que são selecionadas, processadas e construídas internamente, permitindo-se, por essa atuação, a própria transformação evolutiva do mencionado sistema jurídico. Assim, o que se tem presente é uma interação permissiva da abertura cognitiva desse sistema jurídico, que, por sua parte, apresenta-se intangível sua nota de operacionalidade fechada16.

Em nota simplificadora, com esse pressuposto autopoiético de sistema jurídico, a partir de sua leitura interna, esse sistema pode ser reduzido a um conjunto de unidades que se relacionam entre si, aglutinando-se em determinada referência17. Assim, o sistema jurídico teria em sua composição o conjunto de normas jurídicas. Estas são consideradas como porções de linguagem com estrutura hipotético-condicional, sendo o resultado da interação entre lei, jurisprudência e interpretação, as quais se relacionam entre si por força de uma referência

16 Há que ser apontado, em conformidade com a concepção de sistema luhmanniana, o fechamento

operacional e a abertura cognitiva, em alinhamento, a lição de Edgar Morin, destacada por Clarice von Oertzen de Araújo: “Assim, se impõe o paradoxo: um sistema é aberto para se fechar outra vez, mas é fechado para se abrir e se fecha novamente abrindo”. (ARAÚJO, Clarice von Oertzen de.

Incidência jurídica: teoria e crítica. São Paulo: Noeses, 2011, p. 58)

17 O que traduz a lição de Tercio Sampaio Ferraz Junior sobre repertório, apontando para o conjunto

de unidades, e de estrutura, para o complexo de relações, que contém regras que nos permitem identificar certos fenômenos sociais como fontes de normas. Nesta medida, a noção de fonte guarda relação com a estrutura e não com o repertório. (v. FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao

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13

unificadora, geralmente, revelando-se por estrutura hierarquizada, em convergência. Esses pontos de convergência tomam a constituição dos princípios jurídicos, daí, mais um dos aspectos de destaque do neopositivismo, na consideração da “virada kantiana”.

1.3. Das posições dos Poderes de Estado a partir da teoria

dos sistemas luhmanniana

Para os limites de nosso trabalho, daquilo que podemos nominar como dinâmica comunicativa, faz-se necessário delinear as posições de atuação institucional18, destinadas ao Legislativo, ao Judiciário e mesmo à Administração Tributária, segundo a teoria dos sistemas de Luhmann. E isso porque, na consideração do sistema jurídico, a norma jurídica pode ser entendida como o resultado da atuação concomitante, pautada necessariamente na comunicação, dos Poderes de Estado, que, ao fim, ocupariam espaço certo e determinado no mencionado sistema.

Nesse passo, o legislador executaria sua atividade funcional no campo periférico do sistema jurídico, em razão de ser a posição de maior proximidade com os demais sistemas, mostrando-se como o ponto de maior permissividade em

18 Por instituição, nos limites da expressão “atuação institucional”, vamos ter a compreensão de uma

ação determinada, própria e recorrente do sistema social. Sendo, na concepção de Hariou, como uma organização social, cuja permanência é garantida por um equilíbrio de forças internas, sendo a chamada “separação dos poderes” marca exterior das instituições. Em Abbagnamo, vamos extrair, nesta linha: “[por instituição] em sentido mais geral, como “qualquer atitude suficientemente recorrente num grupo social” (v. verbete “instituição”, in ALLAND, Denis e RIALS, Stéphane; tradução Ivone Castilho Benedetti; revisão técnica Márcia Villares de Freitas. Dicionário da cultura jurídica. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012, p. 974-976; e verbete “instituição”, in ABBAGNAMO, Nicola.

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relação às perturbações ou irritações ambientais19. Nessa medida, desempenharia o legislador a função do primeiro filtro do sistema, voltando-se, sobremaneira, para o futuro com a promoção da enunciação de expectativas normativas, pautando-se em conceitos abstratos, dotados de alguma determinação, dotados ainda de alguma tipificação, com alguma abertura principiológica e com cláusulas gerais sempre abertas, resumindo-se, essa atividade, em pouca compreensão, com abrangência e generalidades máximas.

De sua parte, o Poder Executivo, por meio específico da sua Administração Tributária, e o Poder Judiciário não podem ocupar a região periférica do sistema jurídico, em regra20, não podendo apresentar a mesma posição antes apontada da atuação do legislador, não podendo, enfim, atuar na filtragem direta dos fatos puros, econômicos, políticos e sociais, de modo direto como se apresentam no ambiente.

Assim, o que se tem é que tanto o Executivo, como o Judiciário, promovem a leitura do ambiente externo por intermédio da atuação primeira do Legislativo. Portanto, são tidos como um segundo filtro, voltados, dessa vez, para o passado, uma vez que se debruçam sobre o resultado da atividade normativa legislativa

19 Insta destacar a classificação empreendida dos fatos legislativos em fatos históricos; fatos atuais e

eventos futuros, conforme proposto por Klaus Jürgen Philippi, em que a de maior importância para o presente trabalho relaciona-se à primeira categoria. Assim, os “fatos históricos” referem-se à analise dos fatos legislativos históricos que ensejaram a criação de determinadas decisões legislativas, como no caso das decisões dos tribunais superiores nacionais influenciando, de modo determinante, o Legislativo estadual ou distrital, sendo nessa medida concebidas como verdadeiro fato histórico. Tudo isso a justificar, então, a concepção doutrinária de que não há como negar a comunicação entre fato e norma (cf. MENDES, Gilmar Ferreira.Controle de constitucionalidade hermenêutica constitucional e revisão de fatos e prognoses legislativos pelo órgão judicial. Revista dos Tribunais. São Paulo: Editora RT, n. 766, ago. 1999, p. 20-21).

20 Diz-se “em regra” justamente à vista do quanto se visualizará ao se promover a análise do novo

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15

inaugural, seja do Poder Executivo, com a execução do comando legislativo de ofício, seja do Poder Judiciário, por meio de provocação.

Uma vez tratado da ocupação dos Poderes do Estado na produção do direito, a lição de Misabel Abreu Machado Derzi, ao aferir que o tempo da lei e o tempo da sentença são distintos, debruçando-se nas lições de Niklas Luhmann, tece esta consideração:

Como aprendemos com Niklas Luhmann, em especial na Teoria da

Constituição como Aquisição Evolutiva, o legislador trabalha na periferia do

sistema, onde está mais perto dos demais sistemas, de modo poroso em

relação ao ambiente, no presente voltado precipuamente para o futuro [...]

[O Poder Executivo e o Poder Legislativo] Não podem se localizar na linha

fronteiriça do sistema jurídico, não podem, ambos, trabalhar porosamente,

em relação ao ambiente, não podem filtrar primária e primeiramente os fatos

puros, econômicos, políticos e sociais, como se dão no ambiente. Lêem o

ambiente externo pelos olhos do legislador, e, pois, de modo impermeável.

[...] estão voltados para o passado, para o input do sistema, para o que pôs

o legislador, atuando em estrita vinculação à lei, à Constituição, ao Direito21.

Em regra, portanto, podemos, em breve síntese, apreender a teoria dos sistemas, enquanto atuação dos Poderes de Estado, na conformação do sistema jurídico, considerando as suas relações e as suas unidades identificadas – lei, decisão e ato administrativo, respectivamente relacionados, em regra, ao produto do Legislativo, do Judiciário e do Executivo. E isso, com vistas inegáveis ao atendimento do princípio da segurança jurídica, já que na linha temporal do passado,

21 DERZI, Misabel Abreu Machado.

Modificações da jurisprudência : proteção da confiança, boa-fé

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16

presente e futuro, a um mesmo fato jurídico será subsumida uma mesma norma jurídica.

Assim, digamos, por hipótese, que em sua missão constitucional, o Supremo Tribunal Federal (ou mesmo, para os fins da nossa investigação, o Superior Tribunal de Justiça), ao enfrentar uma questão jurídica determinada, entenda por adoção de uma solução jurídica, que se revela notadamente pacífica, por uma série de outras decisões (caso, por exemplo, do exame da “guerra fiscal” do ICMS, que num sem número de vezes foi repelida pelo Supremo Tribunal Federal, como inconstitucional; ou mesmo, na ordem de trabalhos do Superior Tribunal de Justiça, eventual decisão em sede de recursos especiais repetitivos, cuidando de matéria tributária), isso seja a comunicação suficiente para que o legislador ordinário estadual ou distrital promova, em primeiro filtro, a partir deste mencionado estímulo jurisprudencial, vertendo-o na forma de lei ordinária que disponha sobre a matéria, então, cuidada e decidida, com operatividade voltada para os comportamentos futuros.

Por sua vez, ainda dentro desta hipótese montada, é importante ressaltar que as mencionadas decisões do Poder Judiciário, cuidando da matéria tributária, mostram-se voltadas para o passado.

Em suma, da conjugação das expectativas normativas, no passado e no futuro, revelam o pleno atendimento ao princípio da segurança jurídica, pois ao longo do tempo deverá emergir a igualdade no tratamento tributário.

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17

sentir entre as expectativas normativas22, fruto, pois, da conjunção que vê da atuação do legislador estadual e distrital e do julgador do Tribunal Superior, este estimulando a inovação promovida por aquele.

Assim, mostra-se relevante a lição de Luís Roberto Barroso, com expressivo amparo no escólio de Peter Häberle, apontando pela comunhão dos atores sociais na interpretação do mandamento constitucional - e, em nossa concepção, na interpretação do mandamento do sistema jurídico, e, necessariamente, na formação de normas jurídicas. Nas considerações desse autor:

No desenvolvimento de suas idéias, assentou Häberle que a interpretação

constitucional é um processo aberto [...] Não há, assim, um elenco cerrado,

numerus clausus, de intérpretes da Constituição. [...] Nas palavras textuais

do autor alemão:

Todo aquele que vive no contexto regulado por uma norma e que vive com

este contexto é, indireta ou, até mesmo, diretamente, um intérprete dessa

norma. O destinatário da norma é participante ativo, muito mais ativo do que

se pode supor tradicionalmente, do processo hermenêutico. Como não são

apenas os intérpretes jurídicos da Constituição que vivem a norma, não

detêm eles o monopólio da interpretação da Constituição 23.

22 Celso Fernandes Campilongo faz a precisa conceituação de expectativas normativas, com pauta

em Luhmann, são as suas considerações: “Para Luhmann, o direito promove a ‘generalização congruente das expectativas normativas’. [...] ‘Generalização’ equivale a dizer que o critério para a compreensão do sistema não pode ser individual ou subjetivo. [...] ‘Congruente’ significa a generalização da segurança do sistema em três dimensões: temporal [...]; social [...]; material. [...] ‘Expectativas normativas’ são aquelas que resistem aos fatos, não se adaptam às frustrações ou, na linguagem de Luhmann, não estão dispostas à aprendizagem.” (CAMPILONGO, Celso Fernandes.

Política, sistema jurídico e decisão judicial. 2. ed. São Paulo : Saraiva, 2011, p. 19).

23 BARROSO, Luís Roberto.

Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma

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18

Logo, a interpretação implica, necessariamente, a pluralidade dos intérpretes24, na consideração mesma levada a termo, anteriormente, dentro da nossa premissa neopositivista, em que a norma é o resultado da sua atuação, em conjunto com a lei e a jurisprudência.

1.4. Dos

princípios

Alcançando-se, então, estruturalmente, os princípios, como pontos de convergência e referenciadores do sistema jurídico - aponta-se para o cumprimento da condição suficiente para o ingresso de isolamento das peças normativas mais relevantes para qualquer porção do conhecimento do direito.

Somos remetidos, neste momento do exame, à importância dos princípios, podendo, por sua parte, ser descritos como funcionalmente organizadores do

24 Encontramos, também, em Cassio Scarpinella Bueno, alinhamento com a concepção de norma

(28)

19

sistema jurídico, atuando como elo responsável por demonstrar os resultados escolhidos pela nação25, sendo inegável, portanto, sua característica axiológica.

No que tange aos princípios, à vista de maior precisão, ganha nítida importância este questionamento formulado por Renato Lopes Becho26: se diante da distinção que se pode fazer entre texto e norma, a classificação entre regra e princípio se manteria? Em resposta, adianta-se que sim. O que se tem, nessa medida, na conformidade da apreensão que fazemos do entendimento do próprio autor, é que a norma traz os comandos de obrigatório, permitido ou proibido, nos quais se inserem princípios e regras, normalmente diluídos dentro do seu campo de significação.

Concebe-se, então, que os princípios e as regras não são normas, mas antes, são veículos normativos, componentes ou partes das normas, sendo que ambos são imprescindíveis para o alcance da norma, com a compreensão suficiente do comando jurídico.

E, nesse sentido, Renato Lopes Becho, conclui que regras e princípios se revelam pela mesma estrutura, contudo, na ordem interna, são diferentes:

Pelo exposto, entendemos que a classificação das normas jurídicas em

regras e princípios deve ser mantida.

25 Esta é a medida sumarizante empreendida por Paulo Henrique dos Santos Lucon, para quem os

princípios retratam, por fim, “os valores atuais de uma nação”.(cf. Devido processo legal substancial. Disponível em: <http://direitoprocessual.org.br/content/blocos/103/1>. Acesso em: 20 set. 2011).

26 Ver BECHO, Renato Lopes.

(29)

20

Valendo-nos dos conhecimentos de lógica formal, podemos dizer que,

formalmente, regras e princípios têm a mesma natureza, são todos

componentes textuais de normas jurídicas. Entretanto, internamente, há

diferenciações, como veremos27.

Em passo coincidente, contudo utilizando como premissa a ordem constitucional, com Roque Antonio Carrazza, vamos colher noções introdutórias de princípios, em específico os jurídico-constitucionais, e sua diferenciação das regras. Assim, após se aferir, na sua doutrina, a Constituição e o seu papel no ordenamento jurídico, alcança-se, por fim, que ao longo da estrutura constitucional, há normas mais e menos importantes, uma vez que aquelas veiculam verdadeiros princípios, ao passo que estas, regras.

Chega-se à noção de princípio, na linha condutora de Roque Antonio Carrazza, após um breve percurso histórico que nos remete à filosofia de Anaximandro e Platão, bem como à Kant, e conclui-se que, para qualquer ciência, princípio é qualquer começo, alicerce, ponto de partida, ou patamar privilegiado, que permite a facilidade na compreensão ou demonstração de algo, ou, em resumo, é a pedra angular de qualquer sistema. A partir da seara jurídico-constitucional, aponta-se que o princípio jurídico é concebido como um enunciado lógico, dotado, em sua nota característica, de grande generalidade, ocupando posição de destaque no direito, estabelecendo vínculos não só para o entendimento, como também para a aplicação das normas jurídicas, que com ele se ligam28 (ou, na anterior concepção doutrinária apresentada por Renato Lopes Becho, por ele veiculada).

27 BECHO, Renato Lopes.

Lições de direito tributário: teoria geral e constitucional. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 348.

28 Para Roque Antonio Carrazza, a sua concepção de princípio é de toda semelhante ao enunciado

(30)

21

Ademais a doutrina de Carrazza, acrescenta que não importa, por fim, se o princípio se apresenta de modo explícito ou implícito, mas antes, e este é o ponto, a importância de sua existência. Restando, portanto, ao jurista - ou melhor, como mesmo cuidado por nós29, aos múltiplos intérpretes do sistema jurídico - o necessário papel da identificação dos limites próprios de atuação dos princípios e sua hierarquização.

A ideia de princípio, portanto, e de maneira precocemente já lançada, deita raiz na derivação da geometria, designando as verdades primeiras e objetivas, nem sempre pertencentes ao mundo do ser, senão do dever-ser, uma vez estar voltada para a especificação da modalidade de normas jurídicas.

O fato é que um ponto de destaque merece ser cuidado, qual seja, como se deu, mesmo que em termos históricos, a marcha dos princípios ao longo do caminho da normatividade. E justamente, com esse passo, que vamos ao encontro da pesquisa doutrinária de Paulo Bonavides30, que apresenta outros aspectos referentes aos princípios e sua normatividade, que merecem exposição:

encontrado em Jorge Bacelar Nogueira, que coloca a Constituição, em linhas gerais, como destinada a esclarecer a presença de uma hierarquia na ordem jurídica, com a subordinação de todas as outras fontes e atos que não sejam constitucionais à mesma, ingressando, ainda, pela presença no sistema de mecanismos eficazes de verificação e expulsão das incompatibilidades de atos com a própria Constituição (cf.CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 46-47).

29 Retomamos, para alinhamento, as notas de rodapé 4 e 23, com suporte nas doutrinas

apresentadas de Eros Roberto Grau, Luís Roberto Barroso e Peter Häberle.

30 Paulo Bonavides apresenta uma consistente abordagem histórica do percurso percorrido pelos

princípios na sua transição do jusprivativismo (próprio dos Códigos) para o juspublicismo (próprio da Constituição), transformando-se na “chave” de todo o sistema normativo (v. BONAVIDES, Paulo.

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22

i.) como pensamento diretivo: em F. de Clemente, a partir de uma imersão civilista e da aferição de equivalência com a equidade dos romanos, princípio para o direito pode ser tido como:

[...] o pensamento diretivo que domina e serve de base à formação das

disposições singulares de Direito de uma instituição jurídica, de um Código

ou de todo um Direito Positivo31.

ii.) como orientações e diretivas de caráter geral e fundamental: da enunciação da Corte Constitucional italiana, em 1956, os princípios são:

[...] aquelas orientações e aquelas diretivas de caráter geral e fundamental

que se possam deduzir da conexão sistemática, da coordenação e da

íntima racionalidade das normas, que concorrem para formar assim, num

dado momento histórico, o tecido do ordenamento jurídico32.

iii.) por fim, identificando-se um “defeito capital” das conceituações anteriores, diante da ausência do traço de normatividade, que vem só a a ser formulada em Crisafulli, em 1952, na medida:

[...] é, com efeito, toda norma jurídica, enquanto considerada como

determinante de uma ou de muitas outras subordinadas, que a pressupõem,

desenvolvendo e especificando ulteriormente o preceito em direções mais

particulares (menos gerais), das quais determinam, e portanto resumem,

potencialmente o conteúdo: sejam, pois, estas efetivamente postas, sejam,

ao contrário, apenas dedutíveis do respectivo princípio geral que as

contém33.

Apontam-se, ainda em Paulo Bonavides, com amparo na lição de Ricardo Guastini, seis conceituações vinculadas às disposições normativas dos princípios,

31 v. BONAVIDES, Paulo.

Curso de direito constitucional. 18 ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 256.

32 Ibidem, p. 256. 33 BONAVIDES, Paulo.

(32)

23

sendo relacionados: i.) como normas providas de alto grau de generalidade; ii.) como normas providas de um alto grau de indeterminação e que, por isso, requerem concretização, por via interpretativa, sem a qual não seriam suscetíveis de aplicação ao caso concreto; iii.) como normas de caráter programático, apresentando, nessa medida, baixa densidade normativa; iv.) como normas, hierarquicamente, elevadas na referência às fontes do Direito; v.) como, ainda, normas que desempenham uma função importante e fundamental no sistema jurídico ou político unitariamente considerado, ou num ou noutro subsistema do sistema jurídico conjunto; vi.) por fim, como normas direcionadas aos órgãos de aplicação, cuja específica função é fazer a escolha dos dispositivos ou das normas aplicáveis nos diversos casos.

Na condição de normas, na conformidade com Paulo Bonavides, ou, de veículos normativos, conforme Renato Lopes Becho, então, os princípios orientam a correta aplicação das regras hierarquicamente inferiores, exercendo, ainda, função criativa ao apontar para o legislador a necessidade de completude do sistema, sendo esta uma nota de interesse maior para o presente trabalho, em específico do legislador estadual ou distrital, na geração de normas que deem resposta às expectativas normativas originadas de decisões já emanadas pelos tribunais superiores.

(33)

24

então, uma norma vale ou não. Já que com os princípios, no conflito há o recuo, que não significa que o princípio de que se abdicou seja declarado nulo, nem que uma cláusula de exceção nele se introduza, uma vez que, para caso concreto determinado, os princípios têm peso diferente, preponderando o de maior peso, para o caso referido34.

Diversamente das regras, portanto, em que o conflito se dá na dimensão da validade, o conflito de princípios dá-se na dimensão dos pesos ou dos valores35. Podemos sumarizar valor, por sua parte, na conformidade com Paulo de Barros Carvalho36, apesar da concepção de Johannes Hessen por sua indefinibilidade, como o vínculo que se institui entre o agente do conhecimento e o objeto, tal que o sujeito, movido por uma necessidade, não se comporta com indiferença, atribuindo-lhe qualidades positivas ou negativas, sendo que não apresenta qualquer dimensão ôntica, ou seja, os valores não são, valem. Aponta, Paulo de Barros Carvalho, que valores são preferências por núcleos de significação, ou melhor, são centros significativos que expressam preferibilidade por certos conteúdos de expectativas.

Por sua parte, a faceta valorativa está sempre em toda a configuração jurídica, desde seus aspectos formais (lógicos), como nos planos semântico e

34 A concepção de distinção entre princípios e regras apresentada, por suas linhas gerais, pode ser

melhor referida em Robert Alexy, sobretudo ao cuidar da colidência entre princípios, estabelecendo a chamada lei da colisão, que pode ser expressa, da seguinte forma: se o princípio P1 tem precedência em face do princípio P2 sob as condições C: (P1 P P2) C, e se do princípio P1, sob as condições C, decorre a consequência jurídica R, então vale uma regra que tem C como suporte fático e R como consequência jurídica: C => R (Teoria dos direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 99).

35 A concepção apresentada, segundo trazido por Paulo Bonavides, deve-se ao trabalho empreendido

por Robert Alexy, que aponta, ainda, que no conflito entre princípios, a solução reside na contiguidade da teoria dos princípios com a teoria dos valores (BONAVIDES, Paulo. Curso de direito

constitucional. 18 ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 285).

36 CARVALHO, Paulo de Barros.

(34)

25

pragmático, ou seja, onde houver direito, conforme mesmo apontado em Paulo de Barros Carvalho, haverá, certamente, o elemento axiológico (valor jurídico). Alinhamos, neste passo, uma conclusão, que nos parece toda a sintetizar o quanto se apreendeu:

Em outras palavras, ali onde houver direito, haverá, certamente, o elemento

axiológico. A demonstração deste asserto não é difícil e pode ser feita com

singelas lembranças das manifestações jurídicas, em pontos diversos da

existência desse fenômeno. [...] Vê-se que o valor está na raiz mesma do

dever-ser, isto é, na sua configuração lógico-formal37.

Por outro lado, ao se cuidar da aferição da prevalência possível entre princípios, destaca-se a relação entre norma e valor, que não depende propriamente da norma ou dos seus atributos. Tal relação depende, antes, das razões utilizadas pelo intérprete, bem como das circunstâncias fáticas da aplicação – a dimensão axiológica não decorre propriamente da norma, mas do exame feito pelo intérprete do caso concreto, situação reveladora da inevitabilidade da subjetividade, passível de modificação com a alteração das coordenadas da situação hermenêutica, diante da evidência de uma dinâmica da unidade dialética, vertida em compreensão, interpretação e aplicação38.

1.5. Do direito natural ao neopositivismo ou “o novo direito

tributário”

37 CARVALHO, Paulo de Barros.

Direito tributário: linguagem e método. 4. ed. São Paulo: Noeses, 2011, p. 175.

38 Uma vez mais remetemo-nos à consideração da lei da colisão de Alexy, na conformidade com a

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26

De tudo o quanto se expôs, a nota que salta é a expressão característica do neopositivismo – na pauta da principiologia e da interpretação, para a constituição da norma jurídica. Então, nesse sentido, faz-se necessário adentrar em suas especificidades, relacionando-o com as demais correntes filosóficas, para a sua melhor apreensão.

Nesses termos, com Renato Lopes Becho39, que se propôs a promover a análise das diversas expressões que pode tomar o direito, na aferição do relacionamento entre as correntes filosóficas e as posturas dogmáticas do direito tributário, vamos percorrer os passos de afirmação do neopositivismo, ou como preferido por esse doutrinador, em sinonímia, dos direitos humanos na tributação, na concretização de um novo direito tributário.

É certo, neste passo, que se faça, mesmo que em breves linhas, a conceituação da filosofia do direito. Assim, tal locução toma utilização para significar o conjunto de ponderações construídas, feitas de maneira externa, com relação a um corpo jurídico, na consideração que se pode ter dos textos do direito, positivado ou não, contudo, com referenciamento histórico, produzindo, ao final, avaliações críticas40. Cuida-se, portanto, de uma organização dos questionamentos fundamentais do mundo jurídico (valores jurídicos41).

39 Em

Filosofia do direito tributário, Renato Lopes Becho determina que seu argumento central, ao cuidar da obra em questão, revela-se no exame de como as correntes filosóficas podem explicar os limites dogmáticos e interpretativos com relação ao direito tributário. E, com esta pauta, ingressamos na exposição das correntes filosóficas que culminam com o surgimento e apropriação do neopositivismo. Aponta-se, portanto, que toda a construção do item, que se cuida, encontra franco suporte na mencionada doutrina (Filosofia do direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 149-205 e 228-263).

40 No ponto, ainda, há que se apontar a distinção que se estabelece entre filosofia do direito e filosofia

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27

Dessa forma, vem-se a conceber, na mesma forma que Renato Lopes Becho, que todos os temas que compõem o direito tributário podem ser desenvolvidos com referência aos pressupostos filosóficos, tais como: o núcleo disciplinar acadêmico, a finalidade, a interpretação e as fontes do direito tributário (temas que se revelam de maior interesse às nossas investigações), bem como a classificação dos tributos.

Há que ser dito, mesmo que em retrocesso à abordagem anterior, quando cuidamos dos princípios e dos valores, que, pela teoria dos valores há espaço, inegável, para uma postura objetiva e consequente expurgo da subjetividade dos princípios e valores. Assim, dessa objetividade da postura dos valores, afere-se a sua composição por meio de princípios – considerados portadores de carga axiológica fundamentalmente objetiva, o que lhes permite uma ampla discussão teórica em bases científicas, bem como o almejado alcance do consenso intersubjetivo ou consenso social42, ponto este de interesse ao aferirmos o espaço conferido às decisões judiciais, e sua criação normativa.

inseridas na dogmática jurídica, numa construção, portanto, interna (CARVALHO, Paulo de Barros.

Derivação e positivação no direito tributário. São Paulo: Noeses, 2011, p. 6-7).

41 Diga-se que, no trabalho empreendido na aferição da existência de uma filosofia do direito

tributário, Renato Lopes Becho promove abordagem objetiva das áreas filosóficas aplicadas à tributação, caminhando dentro da teoria dos valores, ingressando de maneira ocasional sobre a teoria do conhecimento e, concluindo, pela remoticidade de estudo da metafísica na seara da tributação, sendo esta reduzida ao tema da classificação dos tributos, quando se é levada pela consideração de coisas sem a existência física (v. Filosofia do direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, pp. 280/1).

42 Nesse sentido, comungamos com a doutrina de Inocêncio Mártires Coelho ao apontar que assiste

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28

Ponto que merece destaque, portanto, é que, para a conformação dos valores, ganha importância o mencionado conceito de “consenso social ou intersubjetivo”, que, por nós, verte-se em “consenso universal”, que se revela, na conformidade com Abbagnano43, como a tentativa de colocar ao abrigo da crítica conhecimento ou prejulgamentos considerados absolutamente válidos, mas cuja efetiva universalidade seria muito difícil provar (o que ocorre com as decisões judiciais e sua jurisprudência, que seria uma resposta institucional ao consenso universal ou intersubjetivo, denotando um acordo entre os membros de uma determinada unidade social em relação a princípios, valores e normas, bem como quanto aos objetivos almejados pela comunidade e aos meios para os alcançar)44.

Iniciamos, então, o breve cotejo, entre as escolas filosóficas e o direito tributário, nos subitens que se seguem.

1.5.1. Do direito natural e a tributação

A primeira indagação que surge se encontra embasada na discussão se o direito é meramente posto, alinhando-se com a positivação, ou se é o justo, apresentando-se valorado, seja com a moral, seja com outro valor. Assim, o direito

Inocêncio Mártires. Interpretação constitucional. 2. ed. rev. e aum. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2003, p. 25-26, nota de rodapé nº 11).

43 ABBAGNAMO, Nicola.

Dicionário de Filosofia. São Paulo, Martins Fontes, 2007, p. 228.

44 De importância para o presente trabalho, é a aferição empreendida por Renato Lopes Becho do

consenso intersubjetivo na tributação, apoiando-se, de modo inequívoco, em dois pontos: o da Assembléia Nacional Constituinte, momento em que vários valores constitucional-tributários foram constitucionalizados, bem como na jurisprudência, que vem retratar, juridicamente, o consenso intersubjetivo ético aplicado ao direito, na mesma linha dos legisladores (v. Filosofia do direito

(38)

29

justo é função de controle valorativo, submetido a critérios axiológicos, como o conceito de justiça.

Deste encontro, então, entre os elementos direito e justiça vai se ter a discussão entre o direito positivo e o direito natural ou jusnaturalismo. Nesse sentido, se tem que o direito, como dado cultural, não será encontrado na natureza ou se revelará alcançado pelos sentidos típicos.

Com relação à tensão aferível entre o direito natural e o positivo, três versões mais consistentes do direito natural hão que se verificar:

i.) Direito natural de origem divina

Estabelecem-se alguns elementos de relevância para a discussão entre direito positivo e direito natural, percorrendo: a) o problema da fonte, retratando a multiplicidade dos ejetores de normas e a decorrente instabilidade; b) a dificuldade presente no veículo ou suporte, na estrita referência às leis escritas ou não; c) referência temporal, na medida da existência de um direito atemporal ou imemorial. Nesses termos, afere-se que uma parcela do direito transcende a vontade do soberano, governante ou autoridade, apresentando como fonte aquilo que é divino e sobrenatural.

(39)

30

do direito de origem divina dos reis. É certo, contudo, que o direito natural de origem divina ainda hoje pode ser visualizado, como, por exemplo, ao se verificar dispositivos da Constituição do Irã45.

Pode-se, ainda, ter uma breve imagem da tensão entre o direito positivo, originado numa noção de autoridade, e as leis de um senso superior, distinto da autoridade, ao se percorrer a obra de Sófocles, Antígona. Nela, onde esta protagonista contrapõe um direito natural, de origem divina, presente no direito de enterrar o seu irmão morto, contra uma determinação posta pelo governante Creonte, de que o corpo do seu irmão, considerado um traidor da cidade, não poderia merecer os cuidados fúnebres46.

ii.) Direito natural de origem racional

45 Para o ponto, interessante aspecto pode ser aferido diretamente no artigo 1º da Constituição do Irã,

na consideração do direito natural de origem divina, na explícita menção ao Alcorão, como base mesma da República Islâmica do Irã: A forma de governo do Irã é de uma República Islâmica, apoiada pelo povo do Irã, com base em sua crença de longa data na soberania da verdade e da justiça do Alcorão, no referendo de Farwardin 9 e 10 no ano de 1358 do calendário solar islâmico, correspondente a Jamadi al-Awwal 1 e 2 no ano de 1399 do calendário lunar islâmico (29 de março e 30 de 1979), através do voto favorável de uma maioria de 98,2% dos eleitores, realizada após a Revolução Islâmica vitoriosa liderada pelo eminente Marji al-taqlid Ayatullah al-Iman Uzma Khumayni (Disponível em: <http://www.iranonline.com/iran/iraninfo/government/constitution-1.html>. Acesso em: 11 fev. 2013.).

46 Merece nota trecho do diálogo estabelecido entre Antígona e Creonte, no qual aquela sinaliza para

(40)

31

Expõe Renato Lopes Becho47 que na tentativa de superar a explicação divina, ainda na Grécia, alguns, dentre eles Platão, trilhavam caminhos científicos, com o uso mesmo da dialética como método de verificação e alcance da realidade, na tradução do conhecimento por meio da razão. Em Platão, então, vai se ter que, em atendimento à visão vulgar de que é justo a prevalência do melhor sobre o pior, do mais forte sobre o mais fraco, o mais forte será a coletividade, que, de sua parte, deve prevalecer sobre o mais fraco, que são os interesses individuais.

Em Platão, ainda, tem-se que o direito natural é conhecido por meio da razão. Por sua vez, já em Aristóteles, aponta-se para a concepção dualista, com a coexistência do direito natural, a par do positivo, ao invés da monista, com o predomínio do direito positivo, em momento pós-aristotélico. Por sua vez, agora segundo Bobbio, é que se apresenta uma vinculação entre o objetivismo da teoria dos valores e o direito natural48, razão, ainda, para a promoção da divisão em direito natural em graus, com a nota certa de se apontar a importância maior ou não de vários temas: em primeiro grau – voltado, por exemplo, para a tutela da vida -; e em segundo grau – voltado para as demais instituições humanas49.

Importante e conclusivo aspecto é levantado, na obra de Renato Lopes Becho, na medida em que a razão tanto pode levar ao cumprimento do dever

47

Filosofia do direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 157.

48 Bobbio apresenta, com base em Aristóteles, dois critérios para distinção entre o direito natural e o

positivo: o primeiro, relacionado com a eficácia, em que o direito natural se apresentaria em toda parte com a mesma medida de eficácia; e o segundo, inaugurando o objetivismo da teoria dos valores para o direito natural, na medida em que este prescreveria ações cujo valor independeria do juízo subjetivo do agente – as chamadas “ações cuja bondade é objetiva” -, ao passo que o direito positivo estebeleceria ações que antes de serem executadas poderiam ser executadas, indistintamente de um modo ou de outro, mas, uma vez reguladas, só poderiam ser desenvolvidas da maneira prescrita. (O

positivismo jurídico: lições de filosofia do direito. São Paulo: Ícone, 1995, p. 17).

49 BECHO, Renato Lopes.

(41)

32

estabelecido conforme o direito natural, quanto conforme o direito positivo, assim, a razão é tida como um elemento neutro, seja na teoria dos valores, seja na teoria do conhecimento50.

iii.) Direito natural valorado

Tem-se que a influência da valoração é o elemento distintivo entre as principais correntes da jusfilosofia, que modernamente, ainda, defendem a vitalidade do direito natural, com tal versão, em que se confrontam as leis postas pelas autoridades instaladas no poder com o senso de justiça, ou de outro valor moral, estudado pela ética. Indicam-se, então, duas versões para o jusnaturalismo: a definitória, na qual o direito injusto contrastante com a moral não é autêntico direito; e a justificatória, na qual independentemente de chamar-se ou não direito, o direito posto contrastante com a moral não deve ser obedecido.

Ainda segundo o jusnaturalismo valorativo, há a distinção entre a versão forte, na qual qualquer violação da moral implica a perda do caráter de jurídico; e a versão tênue, na qual não seria qualquer violação da moral que diminuiria a obrigação de obediência ao direito. Um ponto de destaque é que, para essa versão, o direito é de acordo com os valores supremos de uma sociedade, identificado por meio do consenso social (justiça, liberdade, igualdade, ou outro).51

50 Diga-se, ainda, que a razão, na condição de elemento neutro, suportando tanto o direito natural,

como o positivo, habilita Kant a romper com a visão clássica do direito natural, que trazia a razão como seu fundamento. (BECHO, Renato Lopes. Filosofia do direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 161).

51 O que se tem, mais uma vez em evidência, é que a relação entre o direito e a moral se revela como

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Relembra Renato Lopes Becho52, cuidando da terminologia, que em Goffredo Telles Junior53 vai se ter o conceito de ancilosamento das estruturas jurídicas, na qual o direito posto passa a ser discordante dos ideais apontados pela coletividade, e o direito natural, vem ser conceituado pela negativa, como aquele que não é artificial.

Compartilhamos, ainda, a premissa de que as fontes do direito são entendidas como os locais em que os julgadores, e mesmo os operadores do direito, numa consideração de multiplicidade de intérpretes, extrairão o fundamento para decidir um caso concreto. Esse fato, em remetimento ao direito natural de origem divina, vai ter fundamento na concepção divina, já o direito natural de origem racional vai ter fundamento nos usos e costumes, na doutrina, na legislação e nas decisões dos tribunais, que se mostram como as fontes clássicas de direito.

Mas qual seria a exata dimensão do direito natural? Em resposta, colhe-se que o direito natural, desde Aristóteles, deve ser visto como uma estrutura dual,

direito positivo que viesse a contrariar disposição de direito natural poderia até ser considerada direito, contudo, poderia ser descumprida, uma vez que não atenderia aspecto determinado de justiça, suficiente para aferição da moral das normas jurídicas. Emerge, por certo, inspiração na posição naturalista de São Tomás de Aquino que afere que pode haver discordância entre o direito natural e o direito positivo, sem que este perca seu caráter jurídico, o que seria aceitável até certa medida, pois, ultrapassado este limite de injustiça, o direito positivo perde sua juridicidade. (v. verbete “Moral e Direito”, in ALLAND, Denis e RIALS, Stéphane; tradução Ivone Castilho Benedetti; revisão técnica Márcia Villares de Freitas. Dicionário da cultura jurídica. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012, p. 1027).

52

Filosofia do direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p.163.

53 Goffredo da Silva Telles Jr., neste ponto, cuida do direito natural, definindo-o pela negativa, na

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existindo suas normas locais e temporais (próprias, portanto, do direito positivo) e uma determinação ou conjunto de disposições superiores (próprias, por sua vez, do direito natural), não sendo, pois, absolutas. Assim, o resultado final da indagação é que o direito natural não subsiste às regras particulares dos diversos ordenamentos jurídicos nacionais, regionais, culturais ou jurídico-religiosos.

Contudo, há que ser dito que o direito natural não ficou imune à crise. Apontando-se, de início, que o direito positivo, por sua parte, acabou promovendo a alteração do núcleo do direito, enquanto fenômeno cultural, modernizando-o, em razão mesmo de fatores tecnológicos decorrentes, sobretudo, da Revolução Industrial, momento em que os homens passaram a demandar respostas objetivas e previsíveis. Então, o que se colhe, conclusivamente, é que não é na natureza que se vai localizar o fundamento sociológico e filosófico para o direito, mas, antes, na detenção do poder.

O que se tem, de fato, da relação entre o direito natural e o direito tributário, num primeiro momento, é que a raiz valorativa do direito sustenta a supremacia dos princípios, considerados como veículos normativos dos valores, sobre as regras, região em que podem ser situados uma série de tributaristas. Para tal, não se faz necessária a eleição de um valor supremo, bastando que destaque e explore a superioridade dos princípios, tomados como valores normatizados, com força decisiva e eficácia legal, o que dá ensejo aos cultores dos direitos humanos (lastreados em valores humanísticos, e não autoritários). Portanto, o que se afere é que entre a dimensão de direitos humanos e direitos naturais, o que emerge, de fato, é a complementaridade.

Imagem

Figura ilustrativa 1: relação entre os sistemas jurídicos, nacional e subnacionais, a partir da influência  das decisões dos tribunais superiores
Figura ilustrativa 2: efeito das decisões judiciais sobre normas específicas tributárias paulistas
Figura ilustrativa 3: Fluxo representativo da teoria do diálogo das fontes &#34;limitada&#34;: unidirecionalidade  da complementação da decisão judicial sobre a decisão administrativa, diante da determinação da Lei  do Processo Administrativo Tributário Pa

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