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RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL DO ESTADO POR ATOS JURISDICIONAIS

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

FACULDADE DE DIREITO

MONOGRAFIA JURÍDICA

RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL

DO ESTADO POR ATOS JURISDICIONAIS

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CRISTIANE PESSANHA BARRETO

RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL DO

ESTADO POR ATOS JURISDICIONAIS

Monografia apresentada como exigência parcial para a obtenção do grau de bacharel em Direito, sob a orientação de conteúdo do Professor Sérgio Rebouças.

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CRISTIANE PESSANHA BARRETO

RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL DO

ESTADO POR ATOS JURISDICIONAIS

Monografia apresentada à banca examinadora e à Coordenação do Curso de Direito da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, adequada e aprovada para suprir exigência parcial inerente à obtenção do grau de bacharel em Direito, em conformidade com os normativos do MEC.

Fortaleza (CE), 25 de junho de 2007.

Sérgio Rebouças.

Prof. Orientador da Universidade Federal do Ceará.

Patrícia Oliveira Barros.

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AGRADECIMENTOS

À Deus, pelo amor incondicional.

Ao meu pai, Humberto de Araújo Barreto, um exemplo de caráter e retidão, por sempre me incentivar e acreditar em todos os meus sonhos, fazendo-me prosseguir quaisquer que fossem os obstáculos.

A minha mãe, Beatriz Dias Pessanha Barreto, uma pessoa honesta, batalhadora, cujo exemplo irei sempre seguir.

Aos familiares e amigos por compreenderem minhas limitações diante do tempo dedicado aos estudos.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...8

1 RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL DO ESTADO...10

1.1 Teorias acerca da Responsabilidade do Estado...12

2 RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL DO ESTADO NO BRASIL...21

2.1 Cartas Imperial e Republicana...21

2.2 Código Civil de 1916, art. 15...22

2.3 Cartas de 1934 e 1937...22

2.4 Constituições de 1946, 1967 e 1969...23

2.5 Constituição Federal de 1988...24

3 RESPONSABILIDADE ESTATAL POR ATOS JURISDICIONAIS...27

3.1 Base normativa da responsabilidade do Estado por atos jurisdicionais...29

3.2 Argumentos a favor da irresponsabilidade estatal pela atividade judicial danosa...31

3.3 Teoria da responsabilidade do Estado-juiz...38

4 DANOS DECORRENTES DA ATIVIDADE JUDICIÁRIA...41

4.1 Erro judiciário...42

4.2 Dolo ou culpa do magistrado...45

4.3 Denegação da justiça...46

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INTRODUÇÃO

Trata o presente trabalho de monografia, cujo título é a “A responsabilidade extracontratual do Estado por atos jurisdicionais”, que foi escolhido em razão da grande relevância do tema e do embate jurisprudencial e doutrinário existente quanto à responsabilização ou não do Estado pela prática de atos danosos ao jurisdicionado.

A metodologia utilizada no trabalho monográfico é caracterizada como um estudo descritivo analítico, desenvolvido através de pesquisas bibliográfica e documental. Quanto à utilização de resultados, a pesquisa é pura; segundo a abordagem, é qualitativa.

Através deste trabalho, procurar-se-á estabelecer, no primeiro capítulo, os conceitos dados à responsabilidade estatal e as teorias acerca do tema, que vai desde a teoria da irresponsabilidade até a adoção da responsabilidade, seja pela teoria subjetiva ou objetiva.

O segundo capítulo tratará da responsabilidade extracontratual no Brasil, abordando a responsabilidade estatal dentro das Constituições Federais do Brasil, bem como do Código Civil Brasileiro de 1916 e de 2002. Com a Carta Cidadã de 5 de outubro de 1988, consagra-se a regra geral da responsabilidade no ordenamento jurídico em consagra-seu artigo § 6º do artigo 37 da Carta Magna de 1988.

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dispositivos que a recepcionam. Neste capítulo, serão expostos, analisados e refutados os argumentos utilizados pelos defensores da irresponsabilidade estatal por atos jurisdicionais.

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1 RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL DO ESTADO

A Responsabilidade Civil representa a situação jurídica em que alguém se encontra de ter de indenizar outrem quanto à própria obrigação decorrente dessa situação, tendo por finalidade precípua o restabelecimento do equilíbrio violado pelo dano.

Como assevera José Cretella Júnior (1970, p.15) “se o Estado, direta ou indiretamente, é causa eficiente do dano, estamos diante de responsabilidade pública, regida por princípios publicísticos. E não interessa, para efeito de responsabilização pública, se o poder público é o Executivo, o Judiciário ou o Legislativo”.

O ilustríssimo doutrinador Celso Antônio Bandeira de Mello (2001, p. 25/55) diz ser construído o Direito Administrativo sobre duas bases bastante sólidas, quais sejam, o Estado, com todas as suas prerrogativas, competências e funções, e as garantias dos administrados sopesando e limitando os poderes atribuídos ao primeiro. É justamente a esse sistema de freios e contrapesos que o autor intitula de “Regime Jurídico-Administrativo”.

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Maria Sylvia Zanella Di Pietro (1999, p. 419) assim conceituou a responsabilidade extracontratual do Estado: “a responsabilidade extracontratual do Estado corresponde à obrigação de reparar danos causados a terceiros em decorrência de comportamentos comissivos ou omissivos, materiais ou jurídicos, lícitos ou ilícitos, imputáveis aos agentes públicos”.

Ressalte-se que a ilustre doutrinadora (2006, p. 617) afirma que é errado falar em responsabilidade da Administração Pública, vez que esta não é titular de direitos e obrigações. O certo é falar em responsabilidade do Estado, este, sim, apto a adquirir direitos e contrair obrigações.

Por sua vez, Hely Lopes Meirelles (1999, p. 581) define a responsabilidade estatal como sendo “a que impõe à Fazenda Pública a obrigação de compor o dano causado a terceiros por agentes públicos, no desempenho de suas atribuições ou a pretexto de exercê-las”.

É importante distinguir a responsabilidade contratual do estado da extracontratual. A primeira refere-se à responsabilidade decorrente dos contratos celebrados pela Administração Pública, regendo-se por princípios próprios. Já a segunda deriva das atividades estatais sem qualquer conotação pactual.

Nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello (1999, p. 654),

Entende-se por responsabilidade patrimonial extracontratual a obrigação que lhe incumbe de reparar economicamente os danos lesivos à esfera juridicamente garantida de outrem e que lhe sejam imputáveis em decorrência de comportamentos unilaterais, lícitos ou ilícitos, comissivos ou omissivos, materiais ou jurídicos.

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1.1 Teorias acerca da Responsabilidade do Estado

A evolução do tema da responsabilidade do Estado ocorreu paulatinamente. Primeiramente, adotou-se a teoria da irresponsabilidade. Depois, evolui-se para a responsabilidade subjetiva, que era vinculada à culpa. No estágio atual, encontramo-nos sob a égide responsabilidade objetiva.

1.1.1 Teoria da irresponsabilidade

Nesta fase histórica, inexistia a questão da responsabilidade civil do Estado. Esta teoria vigeu na época do Estado despótico e absolutista. Algumas expressões retratam muito bem essa época, como: “O rei não erra” (The King can do no wrong), “O Estado sou eu”, “O que agrada ao príncipe tem força de lei”, etc.

Yussef Said Cahali (1996, p. 17) preleciona diversos argumentos que procuram sustentar a teoria geral da irresponsabilidade do Estado:

a) quando o Estado exige obediência de seus súditos, não o faz para fins próprios, mas, justamente, para o bem dos mesmos; logo, de semelhante ato não pode advir qualquer responsabilidade; b) não se justifica a ficção de que os funcionários administrativos sejam órgãos imediatos do Estado e que, em conseqüência, os atos destes devem ser tidos como atos do Estado; este só é representado por Chefe de Governo; c) as relações jurídicas do mandato não podem ser aplicadas por analogia aos servidores do Estado como se tem pretendido; d) a obrigação de indenizar tira, em regra, a razão de ser de uma culpa; e) o funcionário, seja agindo fora dos limites de seus poderes, ou sem a forma legal imposta à sua ação, ou mesmo abusando dela, não obriga o Estado, porque não o representa; f) o Estado não pode prestar contra sua própria autoridade.

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não pode parecer como violador do direito; 3) Daí, e como corolário, os atos contrários à lei praticados pelos funcionários jamais podem ser considerados atos do Estado, devendo ser atribuídos pessoalmente àqueles, como praticados não em representação do ente público, mas

nomine próprio.

Assim, conforme aduziu José Cretella Júnior (1999, p. 607),

Sendo o Estado o próprio direito, se o agente seu (preposto) causa dano ao administrado, por dolo ou culpa, o príncipe nada tem a ver com isso, porque a pessoa física – o agente público – teria agido por conta própria, como se operasse na qualidade de particular desvinculado do serviço, agindo no próprio nome, não representando, pois, o Estado, cuja finalidade é a de guardião do direito.

A teoria da irresponsabilidade encontra-se superada, não resistindo aos seus contraditores. A Inglaterra e os Estados Unidos da América, que por muito tempo mantiveram-se fiéis aos seus postulados, acabaram por abandoná-la, respectivamente, pelo

Crown Proceedings Act (1947) e pelo Federal Tort Claims Act (1946), ingressando no regime da responsabilidade do Poder Público.

1.1.2 Teorias civilistas

Não se deve negar o mérito da concepção civilista do Estado, vez que esta foi a grande contestadora inicial da teoria da irresponsabilidade absoluta, que ficou superada no século XIX.

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1.1.2.1 Teoria dos atos de império e de gestão

A doutrina civilista fazia distinção para fins de responsabilidade entre os atos de império e os atos de gestão.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2006, p. 620) assim distingue os atos de império dos atos de gestão:

Os primeiros seriam os praticados pela Administração com todas as prerrogativas e privilégios de autoridade e impostos unilateral e coercitivamente ao particular independentemente de autorização judicial, sendo regidos por um direito especial, exorbitante do direito comum, porque os particulares não podem praticar atos semelhantes; os segundos seriam praticados pela Administração em situação de igualdade com os particulares, para a conservação e desenvolvimento do patrimônio público e para a gestão de seus serviços.

No caso dos atos de gestão, não haveria distinção entre o comportamento estatal e o do particular, uma vez que ambos se encontram em situação de igualdade. Em tal hipótese, o Estado seria passível de responsabilidade, desde que houvesse a culpa – latu sensu – do agente deflagrador do dano.

Tal teoria, entretanto, sofreu severas críticas, perdendo sua sustentabilidade ante a grande dificuldade de distinguir os atos de império dos atos de gestão, uma vez que, pela grande dificuldade de se enquadrar como atos de gestão todos aqueles promovidos pelo Estado com a finalidade de administrar o patrimônio público ou quando estiver a prestar serviços, é impossível dividir a responsabilidade do Estado.

Hely Lopes Meireles (1978, p. 562) assim dispõe:

pela atual teoria da responsabilidade objetiva, não há mais fundamento para esta sibilina distinção. Todo ato ou omissão do agente administrativo, desde que lesivo

ou injusto, é reparável pela Fazenda Pública, sem se indagar se provém do jus

imperi ou do jus gestionis, uma vez que ambos são formas de atuação

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1.1.2.2 Teoria da culpa civil ou responsabilidade subjetiva

Esta teoria versa sobre a necessidade de se enquadrar a Responsabilidade Extracontratual do Estado sob o prisma puramente civilista da questão. Assim, para que fosse imputada responsabilidade pelos atos da pessoa política bastava a mera noção de culpa – latu sensu – no atuar da Administração através de seus agentes ou prepostos.

Neste ponto, interessante assinalar as palavras de Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2005, p. 564) que assim elucida a questão:

Embora abandonada a distinção entre atos de império e de gestão, muitos autores continuaram apegados à doutrina civilista, aceitando a responsabilidade do Estado desde que demonstrada a culpa. Procurava-se equiparar a responsabilidade do Estado à do patrão, ou comitente, pelos atos de empregados ou prepostos.

Tornando explícita essa responsabilidade, o Código Civil Brasileiro de 1916 expôs no artigo 15:

As pessoas jurídicas de Direito Público são civilmente responsáveis por atos de seus representantes que nessa qualidade causem danos a terceiros, procedendo de modo contrário ao direito ou faltando a dever prescrito por lei, salvo o direito regressivo contra os causadores do dano.

E para Hely Lopes Meireles (1976, p.559) “neste dispositivo ficou consagrada, embora de maneira inequívoca, a teoria da culpa como fundamento da responsabilidade civil do Estado”.

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1.1.3 Teorias publicistas

Nesta fase de evolução do instituto, a questão se desenvolve no âmbito do Direito Público, promovendo a separação das regras e princípios do direito privado para se apurar a Responsabilidade do Estado.

Um marco importante foi o caso Arrêt Blanco1. A partir daqui, a responsabilidade do Poder Público torna-se autônoma, como matéria específica do Direito Público.

Deste modo, propondo resolver a questão da responsabilidade do Estado por princípios de Direito Público, surgiram as teorias da “culpa do serviço” (culpa administrativa, acidente administrativo ou falta do serviço) e do “risco”, desdobrando-se esta em teoria do “risco administrativo” e do “risco integral”. A primeira passa a idéia de responsabilidade baseada na culpa do serviço, enquanto as segundas remontam a teoria do risco, baseada na mera relação de causa e efeito entre o ato estatal e o evento danoso.

1.1.3.1 Teoria da culpa administrativa ou culpa do serviço

Superada a noção civilista de culpa, começou-se a falar em culpa do serviço ou falta do serviço, que ocorre quando o serviço não funciona, funciona mal ou funciona tardiamente.

1 O caso Arrêt Blanco é um divisor de águas na questão da responsabilidade estatal, pois é justamente

pelas conseqüências de sua decisão que se deu o primeiro passo rumo à desvinculação das teorias civilistas para fins de se apurar a responsabilidade do Estado, utilizando-se, a partir daí, as teorias publicistas para tais questões.

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Sergio Cavalieri Filho (2007, p. 221) assim dispõe sobre o tema:

De acordo com essa nova concepção, a culpa anônima ou falta do serviço público, geradora de responsabilidade do Estado, não está necessariamente ligada à idéia de falta de algum agente determinado, sendo dispensável a prova de que funcionários nominalmente teriam incorrido em culpa. Basta que fique constatado um mau gerenciamento geral, anônimo, impessoal, na defeituosa condução do serviço, à qual o dano possa ser imputado.

A culpa do serviço, conforme ensina Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2006, p. 621) “distinguia a culpa individual do funcionário, pelo qual ele mesmo respondia, e, de outro, a culpa anônima do serviço público; nesse caso, o funcionário não é identificável e se considera que o serviço funcionou mal; incide, então, a responsabilidade do Estado”.

Em qualquer das hipóteses, cabia ao lesado o ônus de provar que o fato danoso se originava do mau funcionamento do serviço e que, conseqüentemente, teria o Estado atuado culposamente.

É por isso que defendemos que a responsabilidade por culpa do serviço é subjetiva, e não objetiva, como defende Hely Lopes Meirelles. Não basta haver a mera relação causal entre o ato relacionado ao serviço estatal e o dano produzido ao administrado. Necessário o elemento subjetivo da culpa – latu sensu – para que se verifique o dever de indenizar ou não, incumbido ao Estado.

1.1.3.2 Teoria do risco administrativo ou da responsabilidade objetiva

A Teoria da Responsabilidade Extracontratual do Estado evoluiu, não sendo mais de ordem subjetiva, como predomina no campo do direito privado, sendo de ordem objetiva.

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todos representa, suportar os ônus de sua atividade, independentemente de culpa de seus agentes.

Sergio Cavalieri Filho assim preleciona (2007 p. 223):

Em apertada síntese, a teoria do risco administrativo importa atribuir ao Estado a responsabilidade pelo risco criado pela sua atividade administrativa. Esta teoria, como se vê, surge como expressão concreta do princípio da igualdade dos indivíduos diante dos encargos públicos. É a forma democrática de repartir os ônus e os encargos sociais por todos aqueles que são beneficiados pela atividade da Administração Pública. Toda lesão sofrida pelo particular deve ser ressarcida, independentemente de culpa do agente público que a causou. O que se tem que verificar é, apenas, a relação de causalidade entre a ação administrativa e o dano sofrido pelo administrado.

Conforme salienta Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2006, p. 621), “Essa doutrina baseia-se no princípio da igualdade dos ônus e encargos sociais: assim como os benefícios decorrentes da atuação estatal repartem-se por todos, também os prejuízos sofridos por alguns membros da sociedade devem ser repartidos”.

A teoria objetiva da responsabilidade do Estado prescinde da idéia de culpa ou dolo (elementos subjetivos). Os elementos subjetivos dão lugar à idéia de nexo de causalidade. Presente o nexo de causalidade entre o comportamento comissivo ou omissivo do Estado – seja este lícito ou ilícito – e a efetiva lesão na esfera juridicamente protegida do administrado, o Estado deverá indenizar.

É indiferente que o serviço tenha funcionado bem ou mal, regular ou irregularmente, basta que o dano imputável ao Estado rompa a igualdade dos cidadãos quanto aos ônus e encargos públicos.

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Como preleciona Yussef Said Cahali (1996, p. 44),

a teoria do risco administrativo não leva à responsabilidade objetiva integral do Poder Público, para indenizar em todo e qualquer caso, mas sim dispensa a vítima prova de culpa do agente da Administração, cabendo a esta a demonstração da culpa total ou parcial do lesado, para que então fique ela total ou parcialmente livre de indenização.

Segundo Hely Lopes Meirelles (2001, p. 611), “a teoria do risco administrativo faz surgir a obrigação de indenizar o dano do só ato lesivo e injusto causado à vítima pela Administração. Não se exige qualquer falta do serviço público, nem culpa de seus agentes. Basta a lesão, sem o concurso do lesado”.

Como se viu acima, a teoria do Risco Administrativo gera o dever de indenizar para o Estado pelos riscos de sua atividade administrativa e não pela atividade de terceiro, da própria vítima ou ainda de fenômenos da natureza. Inexistindo relação de causa e efeito entre a atividade administrativa e a lesão, não subsiste o dever de indenizar, não podendo o Poder Público, portanto, ser responsabilizado.

1.1.3.3 Teoria do risco integral

Pela teoria do risco integral, a Administração deve indenizar sempre e em qualquer caso o dano suportado pelo particular, ainda que não decorrente de sua atividade.

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2 RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL DO ESTADO

NO BRASIL

No Brasil, a maioria dos autores, defende a tese de que não passamos pela fase da irresponsabilidade do Estado Após a independência do Brasil, em 1822, passa a ser gradativamente admitida essa responsabilidade do Estado pelos atos de seus agentes, demonstrando nossos doutrinadores contínua evolução.

2.1 Cartas Imperial e Republicana

A Constituição do Império em seu artigo 178, nº 29 estabelecia que: “Os empregados públicos são estritamente responsáveis pelos abusos e omissões praticados no exercício de suas funções, e por não fazerem efetivamente responsáveis seus subalternos”.

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2.2 Código Civil de 1916, artigo 15.

O artigo 15 do Código Civil de 1916 adota a teoria da culpa como fundamento da responsabilidade estatal no direito positivo brasileiro. Dispunha o artigo 15 do citado diploma:

As pessoas jurídicas de Direito Público são civilmente responsáveis por atos de seus representantes que nessa qualidade causem danos a terceiros, procedendo de modo contrário ao direito ou faltando a dever prescrito em lei, salvo o direito regressivo contra os causadores do dano.

Em que pese a ambigüidade do dispositivo, acabou-se firmando o entendimento no sentido de ter ele consagrado a Teoria da Culpa como fundamento da Teoria da Responsabilidade Civil do Estado.

É valido ressaltar que na vigência do artigo 15 do Código Civil de 1916, alguns autores começaram a sustentar a tese da responsabilidade objetiva do Estado. Tal se deu devido as idéias vigentes em países europeus, especialmente a França, esboçando-se a Teoria do risco administrativo.

2.3 Cartas de 1934 e 1937

A Constituição de 1934, em seu art. 171, bem como a Carta de 1937, no art. 158, assim trataram a questão da responsabilidade do Estado: “Os funcionários públicos são responsáveis solidariamente com a Fazenda Nacional, Estadual ou Municipal, por quaisquer prejuízos decorrentes de negligência, omissão ou abuso no exercício dos seus cargos”.

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2.4 Constituições de 1946, 1967 e 1969

A Constituição de 1946, em seu art. 194, dispunha que “As pessoas jurídicas de Direito Público Interno são civilmente responsáveis pelos danos que os seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros”. No parágrafo único do mesmo artigo, lia-se: “Caber-lhes-á ação regressiva contra os funcionários causadores do dano, quando tiver havido culpa destes”.

Assim, como se observa da análise do dispositivo, a responsabilidade do Estado foi expressamente acolhida, não fazendo nenhuma referência à culpa do funcionário como condição ensejadora da responsabilidade do Estado. Apenas no seu parágrafo único refere-se à culpa, para que o ente público possa ingressar com ação regressiva contra seu servidor.

Sérgio Cavalieri Filho (2007, p. 225) extrai o seguinte raciocínio do artigo acima exposto: “se somente para a ação regressiva do Estado contra funcionário se exige a prova de culpa e dolo, é porque para a ação da vítima contra o Estado se prescinde desses elementos subjetivos”.

Nesse sentido, a conhecida lição de Hely Lopes (2001, p. 534):

“O exame desse artigo (o artigo 194 da Constituição Federal de 1946) revela que o constituinte de 1946 estabeleceu para todas as entidades estatais e seus desmembramentos autárquicos a obrigação de indenizar o dano causado a terceiros, por seus servidores, independentemente da prova de culpa no cometimento da lesão”.

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O Diploma de 1967, bem como a Emenda nº 1 de 1969, seguiram a mesma orientação da norma da Carta de 1946 ampliando apenas o conceito de regresso contra o funcionário público, acrescendo ao mesmo, o fator dolo.

Assim dispunha o artigo 107, parágrafo único, da Constituição de 1967: “As pessoas jurídicas de direito público responderão pelos danos que seus funcionários, nessa qualidade, causarem a terceiros. Caberá ação regressiva contra funcionário responsável, nos casos de dolo ou culpa”.

2.5 Constituição Federal de 1988

A filosofia jurídica da responsabilidade patrimonial do Estado atinge na Constituição Federal de 1988 uma etapa, que poderíamos qualificar como madura.

A vigente Constituição da República de 1988 dispõe, em seu art. 37, § 6°, que “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiro, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”. O dispositivo consagra, portanto, a teoria da responsabilidade objetiva do Estado, caracterizada pela desnecessidade de o lesado provar a existência da culpa do agente ou do serviço.

Assim dispõem os tribunais do país em sintonia com a consagração da Teoria do Risco Administrativo pela Constituição Brasileira:

Responsabilidade Civil do Estado – Dano causado a terceiro por empreiteira de

obra pública – É jure et de jure a presunção de culpa do Estado por atos da

empreiteira que para ela executa obra pública, por isso mesmo é que deve ver nos próprios atos ilícitos praticados pelo preposto prova suficiente da culpa do preponente (STJ, REsp 106.485-AM, 4ª T. Rel. Min. Asfor Rocha, j.13/06/2000, RSTJ, 137: 414).

Danos causados à lavoura por obra pública. Responsabilidade objetiva da Administração. Departamento de Estradas e Rodagens. Responsabilidade solidária da firma empreiteira e construtora (RJTJSP, 40:96, 87:1220)

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José da Silva Pacheco, em parecer publicado na RT, 635:103 apresentou as seguintes e corretas digressões:

3.1. Houve, pelo artigo 37, parágrafo 6º, da CF de 1988, alteração no concernente à responsabilidade civil, inspirada no princípio basilar do novo Direito Constitucional de sujeição de todas as pessoas, públicas ou privadas, aos ditames da ordem jurídica, de modo que a lesão aos bens jurídicos de terceiros traz como conseqüência para o causador do dano a obrigação de repará-la.

3.2.Seguindo a evolução, que se observa como tendência universal, atingiu-se, com o parágrafo 6° do artigo 37 da CF de 1988, novo patamar para envolver a responsabilidade das pessoas jurídicas de Direito Público e de Direito Privado pelos danos causados, diretamente, pela execução do serviço público.

3.3. Tendo sido usada a expressão ‘serviço público’, há que concebê-la como gênero, de que o serviço administrativo seria mesma espécie, compreendendo a atividade ou função jurisdicional e também a legislativa, e não somente a administrativa do Poder Executivo; e, no que se refere a ‘agente’, deve ser entendido no sentido de quem, no momento do dano, exercia atribuição ligada à sua atividade ou função. Desse modo, abrange o parágrafo 6º do artigo 37 da Contituição Federal a responsabilidade da União, Estados, Distrito Federal, Municípios e autarquias; dos Poderes Legislativo, Judiciário e Executivo; das empresas públicas, sociedades de economia mista e sociedades privadas, quando no exercício de serviço público e por dano diretamente causado pela execução desse serviço, para cuja caracterização exclui-se o critério orgânico ou subjetivo.”

O Estado responde, portanto, sempre que do seu funcionamento regular ou irregular decorrer prejuízo para o administrado, independentemente de se questionar sobre a existência de culpa do serviço, bastando o fato do serviço. Contudo, haverá exoneração total ou parcial se o órgão público demonstrar culpa exclusiva da vítima, força maior, caso fortuito ou fatos inevitáveis da natureza. Assim:

“Danos causados em estabelecimento comercial em razão de enchente ocorrida por transbordamento do Rio Tamamnduateí – Local notoriamente sujeito a tais fatos – Exposição deliberada a riscos-Incúria da Municipalidade não demonstrada – Embargos rejeitados” ( RJTJSP, 70:213,88:144).

Danos resultantes de enchentes ocasionadas por forte chuva – Ocorrência de força maior, a qual, conjugada com as situações fáticas emergentes da prova, afastam a responsabilidade do Município. (STF, RTJ, 78:243)

A Teoria do Risco Administrativo, embora dispense a prova da culpa da Administração, permite-lhe demonstrar a culpa da vítima, para excluir ou atenuar a indenização. (RT, 434:94)

Indenização –Fazenda Pública – Suspeito de participação em crime de homicídio morto em tiroteio com a polícia- Culpa exclusiva da vítima, que iniciou o troteio- Abuso de autoridade não configura-Inaplicabilidade do artigo 107 da Constituição da República de 1967 - Indenizatória promovida pelos familiares do falecido julgada improcedente – Recurso não provido (RJTJSP, 126: 154).

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3

RESPONSABILIDADE

ESTATAL

POR

ATOS

JURISDICIONAIS

O artigo 5º, inciso XXV da Constituição Federal assegura que nenhuma lesão ou ameaça a direito individual ou coletivo pode ser subtraída a seu exame. Cumpre precipuamente ao Poder Judiciário o exercício da função jurisdicional a cargo do Estado. Conforme explica José Cretella Júnior (1972, p.211),

O sistema da jurisdição una é aquela em que o Poder Judiciário julga as causas decorrentes da relação jurídico-administrativo, os litígios em que a Administração é parte, quer nas responsabilidades civil do Estado, em decorrência de ato de agente público ou de fato gerado por máquina pública, quer nas hipóteses em que o prejuízo decorre de ato administrativo ilegal, que fere direito líquido e certo do administrado”.

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Assim, a atividade exercida pelo Poder Judiciário compreende, pois, a atividade jurisdicional, como função básica e específica e a atividade não-jurisdicional, como função anômala, não específica, sendo ambas espécies do gênero atividade judicial.

Caracterizam os atos não-jurisdicionais aqueles atos de natureza administrativa, assim entendidos os atos de gestão do Poder Judiciário e os atos ordinatórios do procedimento processual. Caio Mário da Silva Pereira (1990, pp.13-14 e 1989, p. 149) observa que “ao produzir ato de natureza administrativa, o magistrado atua como se fosse um agente administrativo, não devendo a responsabilidade do Estado diferir daquela relativa aos atos da Administração Pública.”

Por outro lado, os atos jurisdicionais são atos nos quais as manifestações do magistrado implicam decisões, com conteúdo deliberativo.

Defendemos o entendimento de que tanto os atos jurisdicionais quanto os não-jurisdicionais ensejam a responsabilidade civil do Estado. Ressalte-se que quanto aos atos não-jurisdicionais, questionamento não há que ser suscitado, já que estes são equiparados aos atos administrativos comuns, sob os quais não paira controvérsia alguma quanto à responsabilização do Estado.

Hely Lopes Meirelles (2001, p. 616) ressalta que “quanto aos atos administrativos praticados por órgãos do Poder Judiciário se equiparam aos demais atos da Administração, e, se lesivos, empenham a responsabilidade objetiva da Fazenda Pública”.

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No tocante à jurisdição voluntária, a doutrina majoritária rejeita a idéia de ser esta portadora de natureza jurisdicional. Defende que, como na jurisdição voluntária não se forma a coisa julgada material, tais decisões não transitam em julgado, podendo o juiz corrigi-las para o interessado, impedindo que os prejuízos se produzam ou continuem a produzir.

Os atos não-jurisdicionais, nos quais se enquadram os emanados de jurisdição voluntária ou graciosa, ensejam a Responsabilidade Civil do Estado da mesma maneira que os atos administrativos originados pelo Poder Executivo, não perfazendo, assim, objeto deste presente trabalho.

3.1 Base normativa da responsabilidade do Estado por atos jurisdicionais

Quanto à responsabilidade estatal dos atos advindos da atividade jurisdicional, a maior parte da doutrina e diversos dispositivos recepcionam a responsabilidade estatal.

A Carta Magna, dispositivo de maior importância que embasa a responsabilidade objetiva ao Estado, sem que seja necessária a comprovação da culpa ou do dolo do agente público na realização de suas atribuições, é o já mencionado § 6º, do art. 37, da Carta Magna, o qual preconiza que “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”

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O serviço judiciário é uma espécie do gênero serviço público do Estado e o juiz, na qualidade de prestador deste serviço, é um agente público, que atua em nome do Estado. Ademais o texto constitucional, ao tratar da responsabilidade do Estado, não excepciona a atividade judiciária.

A Constituição, além do artigo 37, parágrafo 6º, possui outro dispositivo, o artigo 5º, LXXV, que trata especificamente da responsabilidade do Estado por erro judicial, in verbis: “O Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença”.

Nesse sentido, esclarece Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2005, p. 572): “quanto a não ser o juiz o funcionário público, o argumento não é aceitável no direito brasileiro, em que ele ocupa cargo público criado por lei e se enquadra no conceito legal desta categoria funcional.”

A redação do art. 133 do Código de Processo Civil, assim dispõe:

Art. 133. Responderá por perdas e danos o juiz, quando: I - no exercício de suas funções, proceder com dolo ou fraude;

II - recusar, omitir ou retardar, sem justo motivo, providência que deva ordenar de ofício, ou a requerimento da parte.

Parágrafo único. Reputar-se-ão verificadas as hipóteses previstas no II só depois que a parte, por intermédio do escrivão, requerer ao juiz que determine a providência e este não Ihe atender o pedido dentro de 10 (dez) dias.

Por sua vez, o art. 49 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN), in verbis:

Art. 49. Responderá por perdas e danos o magistrado, quando: I – no exercício de suas funções, proceder com dolo ou fraude;

II – recusar, omitir ou retardar, sem justo motivo, providência que deva ordenar de ofício ou a requerimento da parte.

Parágrafo único. Reputar-se-ão verificadas as hipóteses previstas no nº II só depois que a parte, por intermédio do escrivão, requerer ao juiz que determine a providência e este não lhe atender ao pedido dentro de 10 (dez) dias.

Os dispositivos acima transcritos consagram a responsabilidade pessoal do juiz por seus atos funcionais, incluídos aí os atos jurisdicionais.

(31)

3.2 Argumentos a favor da irresponsabilidade estatal pela atividade

judicial danosa

Carlos Maximiliano, adepto da tese da irresponsabilidade, assim dispôs: “A irresponsabilidade do Estado por atos e omissões dos juízes advém da independência da magistratura, prerrogativa, esta, que tem como conseqüência lógica o tornar exclusivamente pessoal a responsabilidade”. (Comentários à Constituição de 1946, v 3/ 259-260).

Durante muito tempo, predominou esta tese na doutrina brasileira, através de teorias elaboradas para defender tal argumento. Apesar da doutrina brasileira dominante defender a tese da responsabilidade, ela ainda está no plano puramente teórico, uma vez que não foi acolhida nem no âmbito da legislação, nem no do Poder Judiciário.

Analisaremos a seguir os principais argumentos utilizados pelos defensores da irresponsabilidade estatal por atos jurisdicionais, bem como se fará a refutação destas idéias, demonstrando que o Estado responde por todos os seus atos, inclusive os jurisdicionais.

3.2.1 A soberania do Poder Judiciário

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de um Poder determinado. Sabe-se hoje que não existe este privilégio em relação aos demais poderes.

Dessa forma, a soberania reside no Estado como um atributo a sua personalidade, e não em qualquer dos órgãos, aos quais compete exclusivamente o exercício da soberania dentro dos limites traçados pela Constituição.

Além disso, como a soberania legitima o poder-dever do Estado com o único escopo de beneficiar a coletividade, a atividade jurisdicional não pode ser considerada absoluta, uma vez que é margeada pela vontade popular, que se consubstancia neste ordenamento jurídico.

3.2.2 A incontrastabilidade da coisa julgada

Em que pese ser esse um dos argumentos mais fortes, iremos refutá-lo. A idéia deste fundamento repousa no reconhecimento de que a responsabilidade estatal por atos jurisdicionais ofenderia a coisa julgada, pois esta tem como finalidade tornar imutável a decisão e, no caso de admitir a responsabilidade do Estado por atos jurisdicionais, aceitar-se-ia que a decisão fora proferida em desacordo com a lei.

(33)

Inicialmente, cabe destacar que nem todos os atos são acobertados pela coisa julgada. Assim, da admissão da res iudicata como princípio limitador da regra geral da responsabilidade estatal, somente pode decorrer a imunidade dos atos jurisdicionais propriamente ditos (as sentenças e acórdãos que julguem a demanda em seu pedido) e não dos demais atos judiciais (decisões nos procedimentos de jurisdição voluntária, preventivos e preparatórios, decisões interlocutórias, despachos, atos de execução), pois somente aos efeitos daqueles adere a qualidade de coisa julgada (DERGINT, 1994, p. 138).

Argumentando que a coisa julgada traz em seu bojo uma presunção de verdade, legalidade e justiça no que se refere à lide que não admite contestação. Nesse sentido, como observa Augusto do Amaral Dergint (1994, p. 135):

Contra a eventual injustiça das decisões judiciárias, possuem as partes as vias recursais. O ato judicial decisório, quando não mais sujeito a recurso, torna-se definitivo, adquirindo a autoridade de coisa julgada. A decisão transita em julgado, ainda que contendo erro de fato ou de direito, cria sua própria “verdade” e seu

próprio direito (res iudicata facit ius). Por tal razão, pressuposta legítima, a decisão

não pode ensejar a responsabilidade civil, que pressupõe dano gerado por ato contrário ao direito.

A presunção é relativa, uma vez que admite prova contrária na ação rescisória (sentença cível) e na revisão criminal (sentença condenatória penal), no qual, sendo o ato jurisdicional anulado e substituído por outro, a indenização é conseqüência lógica.

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contrapõe à ação indenizatória, que será totalmente diversa e autônoma da revestida pela coisa julgada.

3.2.3 A independência da magistratura

Esta teoria defende que o fato de os juízes serem independentes no exercício da magistratura os isentaria de responsabilidade com base em tais atos. Os que refutam a responsabilidade do Estado por atos judiciais alegam que os juízes têm que agir com independência no exercício de suas funções, sem o temor de que suas decisões possam ensejar represálias.

Tal princípio tem por escopo salvaguardar a imparcialidade do juiz, essencial à função judiciária.

O valor da independência do juiz, certamente, é fundamental, porém não é absoluta. Tal princípio não pode, contudo, ser visto sozinho, mas, sim, em conjunto com os demais, como por exemplo, o princípio da responsabilidade democrática dos titulares do poder público perante os cidadãos. Um princípio não deve anular outro, mas sim limitar, de forma que haja um equilíbrio de valores.

José Sento Sé (1976, pp. 102/103) bem demonstra a improcedência do argumento de independência dos juízes como justificativa da irresponsabilidade estatal por atos judiciais:

(35)

Com o intuito de afastar a responsabilidade do Estado por atos jurisdicionais, afirmam que quem litiga em juízo corre os riscos inerentes à falibilidade humana, já que os magistrados são contingentes e estão sujeitos, na apreciação dos fatos, a errar como qualquer outro mortal.

Augusto do Amaral Dergint (1994, p. 147), por sua vez, defende que:

Falhas danosas na prestação da tutela jurisdicional exigem, por certo, a consideração da responsabilidade (pessoal) do magistrado faltoso e, sobretudo, a do Estado, em razão do ineficiente funcionamento do serviço judiciário. Dizer que o jurisdicionado deve assumir os prejuízos decorrentes das possíveis falhas dos juízes conduz à inconcebível idéia de que o homem jamais seria responsável por seus atos (comissivos ou omissivos) – porque naturalmente falível. Ademais a irresponsabilidade judicial, de uma forma ou de outra, favoreceria uma certa displicência dos magistrados no adimplemento de seus deveres funcionais.

Os magistrados, como seres humanos que são, estão sujeito a erros. Ocorre, entretanto, que sua condição profissional não os torna imunes a uma contingência comum a todos os mortais, pois se assim fosse “os jurisdicionados estariam totalmente à mercê de decisões ilegais, injustas, venais prevaricadoras, etc., protegidas sob o pálio da pretensa falibilidade contingencial dos juízes (SOUZA, 1990. p. 34).

3.2.5 Magistrados não são funcionários públicos

Esta tese defende que o juiz não é funcionário público, mas sim agente político, incumbido de aplicar a lei e dizer a justiça. Não sendo funcionário público, não poderia o Estado ser responsabilizado pelos danos decorrentes da atividade jurisdicional.

(36)

A Carta de Cidadã de 1988 utilizou-se do vocábulo agente ao mencionar os ‘agentes’ das pessoas jurídicas de direito público, compreendendo todos aqueles que exercem legitimamente função estatal.

O termo “agente” empregado no artigo 37, § 6º da Constituição Federal tem sentido amplo, abrangendo todas as pessoas cuja vontade possa ser imputada ao Estado, estando juridicamente vinculadas a este ente.

Na lição de Hely Lopes Meirelles (2001, p. 608), agentes públicos são “todas as pessoas físicas incumbidas, definitiva ou transitoriamente, do exercício de alguma função estatal”.

Assim, tem-se que o juiz é agente público porque desempenha atividade privativa do Estado, que é a jurisdição. Como preceituado na Constituição Federal, basta a condição de agente para que o Estado seja responsabilizado, condição esta preenchida pelo magistrado.

Além disso, pode-se considerar os magistrados como funcionários públicos, sujeitos a regime estatutário, tendo seu vínculo com o Estado regido pela LOMAN, ocupando cargos públicos preenchidos por concursos e remunerados pelo erário, não havendo dúvida de que são servidores públicos da espécie funcionários públicos.

Assim, não há como sustentar que o magistrado não seja agente que compromete o Estado. Sendo o juiz um funcionário público, deve ele ser submetido à regra do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, pois, se assim não o fosse, estar-se-ia cometendo uma grave ofensa ao princípio da isonomia entre os funcionários públicos.

Ratifica este entendimento Maria Helena Diniz (2005, p. 568) ao lecionar:

(37)

Por conseguinte, temos o magistrado como funcionário público que, como já expendido, é espécie de agente público, o que o deixa compreendido na regra do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal.

3.2.6 Ausência de texto legal expresso

Por esta teoria, com a justificativa da inexistência de texto expresso autorizando a concessão da indenização, defende-se que o Estado não responde pelos prejuízos causados a terceiros pelos magistrados. Os adeptos desta teoria embasam-se na idéia emanada dos Tribunais Franceses no início do século XX, segundo a qual “não há responsabilidade sem texto”2.

Augusto do Amaral Dergint (1994, p. 154), entretanto, ensina que “existindo textos legais dispondo sobre a responsabilidade do Estado em pontos particulares, o que deles se poderia extrair é um princípio geral de responsabilidade”. Assim, como concluiu o referido autor, se tais textos representassem uma exceção, aceitar-se-ia um princípio geral da irresponsabilidade do Estado, que também prescindiria de um texto expresso.

Conforma assinala Celso Antonio Bandeira de Mello (1992, p.325), “a responsabilidade do Estado, desde o advento do Estado de Direito, sob o ponto de vista lógico poderia independer de regra expressa para firmar-se, bem como dispensar o apelo e as normas de direito privado para lhe servirem de socorro”.

(38)

danosos executivos, legislativos e judiciais. Não se pode dizer que exista uma lacuna no ordenamento jurídico. E caso houvesse, tal fato não eximiria o juiz de julgar, já que, neste caso, deveria recorrer a analogia, aos costumes e aos princípios gerais do direito.

Assim, tal argumento não subsiste ante a regra exposta em nossa Constituição no art. 37, § 6º. Não há que se falar de necessidade expressa, para cada caso, de previsão na legislação, pois a responsabilidade do Estado deflui da Constituição, como princípio geral de responsabilidade.

3.3

Teoria da responsabilidade do Estado-juiz

Vistos os argumentos daqueles que defendem a irresponsabilidade do Estado-Juiz, passaremos à análise de seus principais fundamentos. Esta teoria defende a idéia de que a atividade judiciária danosa enseja responsabilização por seus atos, permitindo, inclusive, ação regressiva contra o magistrado, quando este agir com culpa ou dolo.

Em princípio, o fato jurisdicional regular não gera a responsabilidade civil do Estado. Anota Caio Mário da Silva Pereira:

força é concluir que o fato jurisdicional regular não gera responsabilidade civil do juiz, e portanto ele é imune o Estado. Daí a sentença de Aguiar Dias, que bem o resume ao dizer que, segundo a doutrina corrente, os atos derivados da função jurisdicional ‘não emprenham a responsabilidade do Estado, salvo as exceções expressamente estabelecidas em lei’ (‘Da Responsabilidade Civil’vol II, n 214). Neste sentido decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo (v. ulderico Pires dos Santos, ‘Responsabilidade Civil na Doutrina e na Jurisprudência’, n 67, p 124).

Assim, o simples fato de alguém perder uma demanda em juízo e com isso sofrer prejuízo, sem que tenha havido erro, falha ou demora na prestação jurisdicional não autoriza a responsabilização do Estado por atos jurisdicionais.

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qualidade, causarem a terceiro, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.

O poder constituinte não excepcionou a atividade judiciária desta regra, não podendo o intérprete e o aplicador da lei assim fazê-lo. “Não se prevendo exceção, não é licito ao intérprete criá-la, ao arrepio de toda a sistemática constitucional, o que equivaleria a provocar uma fissura num edifício íntegro e harmônico, no qual ela não surgiria de modo natural” (SILVA, 1985, p. 185).

A responsabilidade estatal decorre da noção de Estado de Direito, em que o Poder Público submete-se ao Direito. O Poder Judiciário, assim como os demais poderes, engendram, portanto, a responsabilidade estatal por suas atividades.

Transcreveremos abaixo a síntese conclusiva de José Cretella Junior, ao sustentar a tese da responsabilidade do Estado por atos judiciais em sentido amplo, dando como válida as seguintes proposições:

a) a responsabilidade do Estado por atos judiciais é espécie do gênero responsabilidade do Estado por atos decorrentes do serviço público; b) as funções do Estado são funções públicas, exercendo-se pelos três poderes; c) o magistrado é órgão do Estado; ao agir, não age em seu nome, mas em nome do Estado, do qual é representante; d)o serviço público judiciário pode causar danos às partes que vão à juízo pleitear seus direitos, propondo ou contestando ações; e)o julgamento, quer no crime, quer no cível, pode consubstanciar-se no erro judiciário, motivado pela falibilidade humana na decisão; f) por meio dos institutos rescisório e revisionista é possível atacar-se o erro judiciário, de acordo com as formas e o modo que a lei prescrever, mas, se o equívoco já produziu danos, cabe ao Estado o dever de repara-los; g) voluntário ou involuntário, o erro de conseqüências danosas exige reparação, respondendo o Estado civilmente pelos prejuízos causados; se o erro foi motivado por falta pessoal do órgão judicante, o Estado responde patrimonialmente pelos prejuízos causados, fundamentando-se a responsabilidade do Poder Público, ora na culpa administrativa, o que envolve também a responsabilidade pessoal do juiz, ora no acidente administrativo, o que exclui o julgador, mas empenha o Estado, por falha técnica do aparelhamento do Estado, ora no risco integral, o que empenha também o Estado, de acordo com o princípio solidarista dos ônus e dos encargos públicos”. (Responsabilidade do Estado por atos judiciais, RF, 230:46).

Discorrendo sobre o tema, em artigo publicado na RT, 652:29, José Guilherme de Souza também concorda em que:

seja voluntário ou involuntário, todo erro que produza conseqüências danosas – em outras palavras, toda atividade judiciária danosa-deve ser reparado, respondendo o Estado civilmente pelos prejuízos, a ele assegurado o direito de regresso contra o agente público responsável pela prática do ato.

(40)

4 DANOS DECORRENTES DA ATIVIDADE JUDICIÁRIA

A irresponsabilidade do Estado por danos causados pelos atos judiciais constitui o último reduto da teoria da irresponsabilidade civil do Estado, apesar de haver expressiva manifestação doutrinária no sentido de reconhecimento da responsabilidade do Estado pelos danos conseqüentes de suas falhas e omissões na prestação jurisdicional.

A atividade jurisdicional pode se configurar como danosa em diversos casos, pois é impossível exercer a jurisdição sem eventuais erros. O juiz, ao decidir, está sujeito a erros de julgamento e de raciocínio, de fato ou de direito.

Entretanto, como já mencionado, não são todos os atos praticados pelos magistrados que os julgadores brasileiros consideram como passíveis de indenização por parte do Estado. Nesse sentido preceitua o Ministro Carlos Mário Velloso (apud Oreste Nestor de Souza Laspro, 2000, p. 95):

(41)

Neste diapasão tratar-se-á, dos atos jurisdicionais danosos reconhecidos pela jurisprudência pátria, bem como da denegação de justiça, na qual se enquadra a morosidade na prestação jurisdicional.

4.1 Erro judiciário

O artigo 5º, LXXV da Constituição Federal reconhecendo a responsabilidade do Estado em decorrência de erro judiciário dispõe nestes termos: “O Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado pela sentença”.

Assegurando reparação à vítima por erro judiciário, sem condicioná-lo à revisão da sentença condenatória, Yussef Said Cahali (1996, p. 603) assim dispõe:

Impondo ao Estado a obrigação de indenizar àquele que ficar preso além do tempo fixado na sentença, estará implicitamente também assegurando ao sentenciado o direito de ser indenizado em virtude de prisão sem sentença condenatória. Com efeito, não se compreende que, sendo injusta a prisão no que exceder o prazo fixado na sentença condenatória, seja menos injusta a prisão do réu que nela é mantido se ao final vem a ser julgada improcedente a denúncia pela sentença absolutória.

Erro judiciário, conforme assevera José Cretella Júnior (1999, p. 655), é o equívoco da sentença judicial, tanto na esfera cível quanto na criminal, que podem conter:

Error in procedendo e error in judicando, enganos de boa-fé do juiz no decorrer do julgamento, mas haverá casos em que o julgador, desempenhando anomalamente suas funções, viola os deveres inerentes ao cargo, decidindo com parcialidade, auferindo lucros, perseguindo, fazendo seu o processo.

(42)

Responsabilidade civil do Estado –Indenização- Réu Preso preventivamente e absolvido por insuficiência de provas-Decreto Segregatório dentro dos limites de ordem legal, sem que tenha havido qualquer ato de natureza culposa, erro judiciário, ilegalidade ou arbitrariedade – Verba Indevida ( RT, 752:319).

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO: ATOS DOS JUÍZES. C.F., ART. 37, § 6º. I. - A responsabilidade objetiva do Estado não se aplica aos atos dos juízes, a não ser nos casos expressamente declarados em lei. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. RE-AgR 429518 / SC - SANTA CATARINA. Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO. Julgamento: 05/10/2004. Órgão Julgador: Segunda Turma. Publicação: DJ 28-10-2004 PP-00049 EMENT VOL-02170-04 PP-00707 RDDP n. 22, 2005, p. 142-145 RTJ VOL 00192-02 PP-00749

O ESTADO SÓ RESPONDE PELOS ERROS DOS ÓRGÃOS DO PODER JUDICIARIO, NA HIPÓTESE PREVISTA NO ART. 630 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. FORA DISSO, DOMINA A NÃO RESPONSABILIDADE DO ESTADO. RECURSO NÃO CONHECIDO. RE 35500 / RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Relator(a): Min. ANTONIO VILLAS BOAS. Julgamento: 09/12/1958. Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA. Publicação: EMENT VOL-00374 00889 EMENT VOL-VOL-00374-02 00889 RTJ VOL-00008-01 PP-00193 .

RESPONSABILIDADE CIVIL- Fazenda Pública – Danos Moral e Material – Erro Judiciário- Prisão Indevida – Sentença Penal desconstituída em ação revisional- Responsabilidade Objetiva do Estado, independente da apuração de culpa ou dolo, pelos atos de seus agentes- Verbas devidas (JTJ, Lex, 225: 87).

INDENIZAÇÃO-ERRO JUDICIÁRIO- Prisão Iinjusta – Autor mantido em cadeia pública apesar de absolvido e sujeito à medida de segurança detentiva em estabelecimento adequado- Falta de vagas, como motivo alegado- Falha no funcionamento do aparelho estatal que não é causa elidente de responsabilidade – Verba Devida. (JTJ Lex, 155:74)

INDENIZAÇÃO – FAZENDA PÚBLICA- MAGISTRADO- Condenação do autor em lugar de outren- Confusão com outra pessoa – Falha do serviço público quando do indiciamento do verdadeiro autor do delito – Responsabilidade Objetiva do Estado e não pessoal do juiz – Reparação Inquestionável (JTJ, Lex, 200:91). INDENIZAÇÃO –RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

Nas hipóteses de erro judiciário (CPP, art. 630), a indenização por perdas e danos compreende os prejuízos materiais e morais, que sofreu e que serão apurados em execução, por arbitramento (RT, 329:744).

INDENIZAÇÃO –RESPONSABILIDADE CIVIL DO MAGISTRADO

A responsabilidade civil do magistrado somente se configura quando se apura tenha ele agido com dolo ou fraude e não pelo simples fato de haver errado. A independência funcional, inerente à Magistratuta, tornar-se-ia letra morta se o juiz, pelo fato de ter proferido decisão neste ou naquele sentido, pudesse ser acionado para compor perdas e danos em favor da parte A ou da parte B, pelo fato de a decisão ser reformada pela instância superior. (RJTJSP, 48;95).

RESPONSABILIDADE OBJETIVA- Ilegitimidade da parte passiva – RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA DO ESTADO

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concorrente em face de eventuais prejuízos causados a terceiros pela autoridade julgadora no exercício de suas funções, a teor do artigo 37, § 6ºda CF/88 ( STF, RE 228.977.2-SP, 2ª T., Rel. Min. Néri da Silveira, DJU, 12 abr. 2002)

O direito brasileiro tratou expressamente do erro penal conforme se verifica no artigo 5º, LXXV da Constituição Federal e no artigo 630 do Código de Processo Penal. Este fato é explicado pelos doutrinadores na medida em que o erro penal viola mais gravemente os direitos individuais, como a integridade, a honra e a moral da pessoa, sendo manifesta a responsabilidade do Estado.

O artigo 630, parágrafo 2º, inciso a dispõe que “se o erro ou a injustiça da condenação proceder de ato ou falta imputável ao próprio impetrante, como a confissão ou a ocultação de prova em seu poder”. Entendemos que tal disposição decorre da inexistência da relação de causalidade. Se o erro decorre da conduta do autor, não se pode atribuir a responsabilidade ao Estado.

Verificado, a qualquer tempo, o erro judiciário penal, mediante processo de revisão criminal, cumpre restabelecer o status quo ante à condenação em todas as dimensões jurídicas nas quais tenha afetado o condenado. Mais do que isso, cumpre restabelecer a situação hipotética atual em que estaria o condenado, caso não houvesse sofrido o prejuízo injustamente imposto (DERGINT, 1994, p. 170/171).

(44)

Neste sentido, defendendo a tese da responsabilidade estatal decorrente de erro judiciário civil, pondera Augusto do Amaral Dergint (1994, p. 183):

Tanto no processo civil quanto no penal, o Estado desempenha indistintamente (através do juiz, seu agente) a função jurisdicional. Ademais, o ato jurisdicional danoso pode derivar de culpa ou dolo do magistrado, não havendo como negar indenização à vítima a cargo do Estado, que responde a título principal, de modo a garantir a vítima contra a eventual precariedade econômica do magistrado. Não se pode esquecer que o juiz age em nome do Estado – este tirando proveito da atividade daquele (e, portanto, respondendo pelos danos por ela ocasionalmente gerados).

4.2 Dolo ou culpa do magistrado

Apesar da responsabilidade do Estado por atos judiciais não receber uma disciplina legal unitária, prevalece na esfera penal o princípio da responsabilidade estatal. Já na esfera civil, prevalece a responsabilidade pessoal do magistrado. O último caso está previsto no artigo 133, incisos I e II do Código de Processo Civil, in verbis:

Art. 133. Responderá por perdas e danos o juiz, quando: I – no exercício de suas funções, proceder com dolo ou fraude;

II – recusar, omitir ou retardar, sem justo motivo, providência que deva ordenar de ofício, ou a requerimento da parte.

Parágrafo único. Reputar-se-ão verificadas as hipóteses previstas no nº II só depois que a parte, por intermédio do escrivão, requerer ao juiz que determine a providência e este não lhe atender o pedido dentro de dez dias.

O dolo e a fraude praticados pelos magistrados são puníveis expressamente no inciso I do artigo 133 do CPC – Código de Processo Civil, bem como no inciso I do art. 49 da LOMAN – Lei Orgânica da Magistratura Nacional.

Considera-se que age dolosamente aquele juiz que tem o intuito de prejudicar, ou ainda não querendo esse resultado, aceita que o mesmo aconteça.

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Assim sendo, age com dolo o Juiz, no exercício de sua função, quando pratica ato que sabe indevido e assim o faz com o fim de violar a lei e causar direta ou indiretamente dano à parte. Por sua vez, a fraude, a rigor, está incluída no conceito amplo de dolo, que compreende toda a forma de artifício capaz de induzir outrem a engano.

O artigo 133, II do CPC, prevê hipóteses de haver a responsabilização do juiz nos casos em que este prevarica por omissão, recusando, omitindo ou retardando providências que deve determinar ex officio ou a requerimento da parte.

As possibilidades de responsabilização devem ser interpretadas no âmbito do Estado-juiz e dos seus representantes, no caso, o Estado-juiz. A grande celeuma ao redor do tema reside na possibilidade ou não de o jurisdicionado lesado pela recusa, omissão ou retardo nos atos que deveriam ter sido prestados pelo magistrado poder impetrar ação contra o Estado, ou se teria que acionar diretamente o juiz. Entendemos que a hipótese mais acertada seria aquela em que o jurisdicionado tem o direito de exercer ação contra o Estado, cabendo a este posteriormente o direito de regresso contra o juiz infrator.

4.3 Denegação de justiça

O Estado é o responsável pelo monopólio da prestação jurisdicional. Quando não exerce seu encargo a contento, ocorre uma deficiência na organização ou no exercício da função jurisdicional.

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se pronunciar. O silêncio judicial, da mesma forma que a inércia da Administração, deve ser sancionado quando ocorrido.

O legislador pátrio, entretanto, não tratou da denegação de justiça no âmbito da responsabilidade estatal, omitindo-se assim quanto à escusa do juiz em alegar lacuna na lei e quanto a morosidade na prestação jurisdicional.

Sucede a denegação da justiça quando impede-se o acesso ao Poder Judiciário, há negativa de aplicação do direito ou recusa a execução de uma sentença, bem como quando ocorre negligência no dar andamento a um processo. Em todas as hipóteses acima elencadas, há a chamada falta do serviço judiciário.

Pondera Mário Mocyr Porto (1989, p.156):

a denegação da justiça ocorre não apenas quando da omissão do juiz, mas também quando de falha na estrutura ou no funcionamento do serviço judiciário, como por exemplo, o cidadão que não tem acesso amplo e satisfatório à prestação jurisdicional em razão da escassez dos seus recursos pecuniários.

Após o ajuizamento da ação, não pode o magistrado se negar ao julgamento do pleito subjetivo sob alegação de lacuna na lei, deve recorrer, quando possível, à analogia, aos bons costumes e aos princípios gerais do direito.

(47)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No direito brasileiro, cada vez mais a doutrina e a jurisprudência vêm tendendo a aceitar a responsabilidade objetiva por erro na prestação jurisdicional. Segundo o sistema de responsabilização objetiva, deve haver o fato administrativo, assim considerado como qualquer forma de conduta, omissiva ou comissiva, lícita ou ilícita, atribuída ao Poder Público; o dano e o nexo causal. Significa dizer que ao lesado cabe apenas demonstrar que o prejuízo sofrido se originou da conduta estatal, sem qualquer consideração sobre dolo ou culpa.

A responsabilidade extracontratual do Estado fundamenta-se no princípio da isonomia, porque não é justo que danos decorrentes do desempenho de funções públicas prejudiquem apenas alguns indivíduos. Daí a necessidade de, tendo em vista o restabelecimento do equilíbrio social, indenizar o prejudicado às custas da Fazenda Pública.

(48)

A responsabilidade é a tradução para o sistema jurídico do dever moral de não prejudicar o outro. A sujeição diferenciada do Estado às regras da responsabilidade importaria a negação, a mais formal, do direito e da justiça.

A legislação pátria, conforme exposto neste trabalho, aderiu à responsabilidade objetiva do Estado, ressalvando, apenas, o direito de regresso ao agente causador do dano, quando este houver agido com culpa ou dolo.

Não se vislumbra, pois, a possibilidade de responsabilizar diretamente o agente público, assim como não há a possibilidade de escolha, por parte do jurisdicionado, em acionar o Estado ou o agente público, devendo, aquele, pleitear seu direito apenas contra o ente estatal, uma vez que este assumiu o risco de prestar esta atividade.

Não pode servir de justificativa para a responsabilização do Estado pela tutela jurisdicional danosa, os problemas encontrados no Poder Judiciário brasileiro, como estrutura física precária, recursos financeiros escassos, reduzido número de juízes, dentre outros, ainda assim, posto que tais problemas, também encontrados nos outros poderes, não servem para eximi-los de tal responsabilidade, pois ultrapassa o limite do aceitável e do razoável, produzindo, infelizmente, o descrédito na justiça, que se desenvolve a cada dia.

(49)

REFERÊNCIAS

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Referências

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