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Os desafios no tratamento das Disfunções Temporomandibulares e da Dor Orofacial

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Academic year: 2021

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Segundo o presidente da Sociedade Brasileira para o Es-tudo da Dor (SBED), e coordenador da equipe de Dor Orofa-cial da divisão de Odontologia e do curso de Aprimoramento/ Residência em Odontologia Hospitalar do Hospital das Clíni-cas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, José Tadeu Tessaroli de Siqueira, o modo como essas duas expressões têm sido usadas sugere que sejam excludentes ou, paradoxalmente, sinônimas. “Disfunção Temporomandibular (DTM) compreende um grupo amplo de problemas, afecções ou doenças de natureza musculoesquelética que afeta o apa-relho mastigatório. Portanto, as estruturas afetadas podem ser músculos, ligamentos, articulações tempôromandibulares (ATM) e ossos. Essas afecções, majoritariamente benignas, lo-calizadas e multifatoriais, podem também ter origem sistêmi-ca (como a artrite reumatóide e a fi bromialgia) ou neoplásisistêmi-ca. Por outro lado, o sintoma de dor nem sempre está presente, como ocorre no subgrupo das deformidades craniofaciais, que geralmente são indolores” afi rma.

De acordo com o dinamarquês, Peter Svensson, graduado na faculdde de Odontologia pela Univerisidade de Aarhus, professor titular do Departamento de Fisiologia Oral Clínica e professor honorário da Universidade de Aalborg, clínicos e pesquisadores no mundo todo possuem, hoje, uma grande ferramenta pela qual podem usar o critério de diagnóstico para DTM (DC/TMD), que tem sido extensivamente estudado e descrito. “Não são muitos os sistemas de classifi caçao que podem reportar medidas ao mesmo tempo válidas (sensibili-dade e especifi ci(sensibili-dade) e reprodutíveis, o que é crucial quan-do o diagnóstico clínico é feito. Assim, a comunidade que trabalha com DTM e dor orofacial deve se orgulhar desse sis-tema e pode usá-lo seguramente”. Mais informações podem ser obtidas no site http://www.rdc-tmdinternational.org.

Com relação à dor orofacial, José Siqueira explica que essas dores podem ser odontológicas ou não odontológicas; benignas ou malignas; locais, regionais, ou sistêmicas, ou re-feridas de outras partes do corpo, como crânio, pescoço e tórax. “A natureza destas dores é variada: alveolodentárias (odontalgias em geral), musculoesqueléticas (aqui entram as

Por Paula Ricupero

Dor Orofacial é um termo amplo que envolve diversas condições dolorosas que acometem a cavidade bucal e a face, sendo que as odontalgias, ou seja, dores de origem den-tária, respondem pela grande maioria destas manifestações. Fazem parte deste grupo, ainda, dores originadas em muco-sa oral, língua, periodonto, entre outras estruturas, além de condições extraorais, como sinusites, bem como outras dores de origem neurogênica, como as neuralgias trigeminais.

As Disfunções Temporomandibulares (DTM), por sua vez, enquadram-se, quando dolorosas, como uma subclassifi cação deste grande grupo de Dores Orofaciais. De acordo com o Pro-fessor Titular do Departamento de Prótese da Faculdade de Odontologia de Bauru, Paulo César Rodrigues Conti, “após as odontalgias, a DTM representa, talvez, a segunda maior pre-valência, especialmente as DTMs de origem muscular. Poderia ser defi nida como um termo que conglomera as dores e/ou disfunções que acometem a musculatura mastigatória, a Ar-ticulação Temporomandibular (ATM), ou ambas. Manifestam--se, principalmente, como dores na face/cabeça, difi culdade de movimentação mandibular, além de ruídos na ATM”.

Devido à complexidade inerente ao diagnóstico e à ne-cessidade de terapia multidisciplinar, especialmente nos ca-sos crônicos, Paulo Conti explica que surgiu a necessidade da criação de uma especialidade voltada para a formação de profi ssionais nesta área específi ca. Assim, a partir de 2001, o Conselho Federal de Odontologia (CFO) implementou a espe-cialidade. De acordo com as normas do CFO, ‘Disfunção Tem-poromandibular e Dor Orofacial é a especialidade que tem por objetivo promover e desenvolver uma base de conheci-mentos científi cos para melhor compreensão no diagnóstico e no tratamento das dores e desordens do aparelho masti-gatório, região orofacial e outras estruturas relacionadas’. “Ressalte-se que, até a presente data, já temos mais de mil colegas registrados como especialistas em DTM e Dor Orofa-cial em nosso país, o que demonstra a importância e grande demanda de pacientes com tais problemas”, comenta Conti.

Especialistas falam sobre a relação entre as áreas, os diferentes critérios

e procedimentos de diagnóstico e as perspectivas futuras para a

especialidade no ensino da Odontologia

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DTM), neuropáticas como a Neuralgia do Trigêmeo, que se tornou famosa por causar fortíssima dor e que parece ser dental, ou neurovasculares, como as cefaleias primárias, que se manifestam na face, ou psiquiátricas”, complementa. A tendência, ele diz, é que no futuro Dor Orofacial seja o nome da especialidade, a exemplo do que já ocorre na literatura científi ca mundial.

A importância da abordagem

multidisciplinar no tratamento da dor

Abordar pacientes com dor crônica exige conhecimento amplo, tanto da doença envolvida, como dos mecanismos bio-lógicos da dor, e profunda experiência clínica, preferencial-mente em ambiente multidisciplinar e de múltiplas complexi-dades. A abordagem exige cuidadosa atenção com a narrativa de dor do paciente, com sua história clínica, que não pode se limitar ao dente ou à face, e um exame físico cuidadoso.

O professor Paulo Conti explica que a dor crônica ca-racteriza-se, dentre outras particularidades, pelo grande envolvimento de aspectos comportamentais e psicossociais. Além disso, é sabido que aqueles que têm longos períodos de experiência dolorosa desenvolvem alterações neuronais importantes, não somente em estruturas periféricas, mas também, e principalmente, em estruturas do SNC (Sistema Nervoso Central). “Em muitos dos casos, não fi ca evidente qualquer alteração aparente de lesões periféricas, apesar do relato de dores constantes e, muitas vezes, insuportáveis. O profi ssional deve, portanto, abordar não somente aspectos físicos, mas também pesquisar sobre possíveis distúrbios comportamentais e neuronais. Outro aspecto a ser aborda-do é a existência de outras aborda-doenças que, frequentemente, coexistem com as dores faciais, como as cefaleias primárias, fi bromialgia, artrites, entre outras. Este fato reitera a grande importância da abordagem transdisciplinar nestes casos”.

De acordo com o professor da Faculdade de Odontologia do Univag - Centro Universitário de Várzea Grande, e autor do livro “Disfunções Tempôromandibulares: esclarecendo a confusão” (Editora Santos/Grupo GEN, 2011), Reynaldo Leite Martins Junior, “enquanto no caso de dor aguda a remoção do fator causal geralmente resolve a sintomatologia, nos casos de dor crônica, esta é a doença em si, e não um mero sinto-ma de usinto-ma doença subjacente. Tais pacientes frequentemen-te têm múltiplas queixas de dor em outras regiões do corpo e comorbidades importantes, evidenciando algum défi cit no sistema de modulação da dor. Nestes casos, geralmente é útil uma abordagem multidisciplinar, que raramente envolve ado-ção de procedimentos invasivos ou irreversíveis de qualquer natureza, como cirurgias ou terapias oclusais, que em deter-minados casos podem inclusive piorar o quadro. Além disso, o desconhecimento e o não reconhecimento das condições de dor crônica por profi ssionais de Saúde frequentemente leva ao ‘sobretratamento’, o que faz surgir pacientes com história de diversas tentativas fracassadas de tratamento de ‘causas’ da dor, contribuindo, assim, para a descrença nesses profi ssionais”.

Os especialistas afi rmam que a especialidade que aborda a DTM dispõe de diversas teorias etiológicas, diferentes cri-térios e procedimentos de diagnóstico e inúmeras aborda-gens de tratamento, pois, devido à particularidade de cada caso, não há um protocolo que possa ser aplicado a todos os pacientes. Por ser uma área de interesse de diversas es-pecialidades odontológicas, no início, os tratamentos eram apoiados na especialidade de cada profi ssional, o que fazia com que um mesmo paciente recebesse tratamentos dife-renciados de acordo com quem o atendia.

Na opinião de Paulo Conti, “felizmente, em nossos dias, não há mais espaço para tais ‘modismos’ ou relato de tratamentos miraculosos. Hoje, dispomos de ferramentas de diagnóstico bem consolidadas na Literatura, como o RDC/TMD (aguardan-do sua atualização, o novo DC/TMD), assim como de Revisões Sistemáticas acerca da efi cácia de determinada terapia”.

Sobre este mesmo assunto, José Siqueira afi rma que a ciência e a boa prática clínica mundial e brasileira já dão subsídios para tratar adequadamente os pacientes com dor crônica por DTM. “A esperança é que os professores, a par-tir de uma formação sólida na área, uniformizem, no que a ciência e a clínica já permitem, os conceitos sobre esse tema. Não é uma questão de crença, como no futebol ou na religião, é uma questão de evidências clínicas e científi cas”.

Já o responsável pela área de Odontologia do Ambulató-rio de DTM e Dor Orofacial do Hospital São Paulo da Univer-sidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina, e responsável pelo programa de mestrado e especialização em DTM e Dor Orofacial do Centro de Pesquisas Odontológicas São Leopoldo - Campinas, Antônio Sérgio Guimarães, defen-de que “os protocolos efi cientes existem para o controle das DTMs, e não para o seu tratamento, e mesmo assim, possuem pouca evidência científi ca, pois trata-se de uma patologia pouco conhecida em relação aos seus fatores etiológicos. Os protocolos atualmente empregados são baseados no contro-le dos fatores de risco e não em fatores causais”.

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Procedimentos invasivos e não invasivos

Atualmente, existem procedimentos cirúrgicos indicados para o tratamento da DTM, porém, com relação a este assun-to, os especialistas são unânimes em afi rmar que qualquer procedimento invasivo e irreversível deve ser feito apenas em casos específi cos, quando todas as outras terapias anterio-res falharem. Reynaldo Leite Martins Junior, da Faculdade de Odontologia do Univag diz que, infelizmente, procedimentos cirúrgicos tem se tornado mais parte do problema do que da solução, já que duas ocorrências tem se tornado comum: “a submissão de pacientes a procedimentos cirúrgicos antes de qualquer tentativa de controle clínico adequado, ou falhas graves de diagnóstico levando a procedimentos cirúrgicos absolutamente equivocados”. Como exemplo desta segun-da ocorrência, ele cita o caso de indivíduos que possuem um disco da ATM deslocado e assintomático, visualizado em uma imagem de ressonância magnética, e uma queixa de dor claramente oriunda de uma cefaleia primária (migrânea, por exemplo), que são submetidos a procedimento cirúrgico na ATM na tentativa de se controlar a dor, porque o profi ssional domina a técnica cirúrgica, mas não o diagnóstico.

Diversos ensaios clínicos controlados demonstram um percentual de sucesso no controle dos sintomas de DTM atra-vés de condutas conservadoras e reversíveis. Por isso, para Paulo Conti, a indicação para cirurgia da ATM deveria ser feita com muita cautela. “Um dos problemas na aceitação de procedimento irreversíveis no tratamento das dores de ATM é a possibilidade de alterações nos mecanismos de condução de dor, que tornam a sensação dolorosa independentemente da condição morfológica das estruturas dolorosas”, explica.

No caso de pacientes com neuralgia de trigêmeo (NT), José Siqueira diz que grande parte deles se benefi cia da me-dicação, principalmente dos anticonvulsivantes. Entretanto, ele explica que essa doença é crônica e que, à medida que o tempo passa, podem mudar as necessidades quanto aos medicamentos, tolerância, efeitos colaterais etc. Já a neuro-cirurgia, o especialista alerta que existem diversas técnicas, porém deve ser utilizada apenas quando indicada. “Realço que o problema desses pacientes, pelo menos da maioria, não está no tratamento, mas sim no diagnóstico, e o cirur-gião-dentista tem papel primordial nesta etapa, pois a maior parte o procura quando iniciam as dores. Infelizmente, ainda há demora no reconhecimento da NT e muitos pacientes são submetidos a tratamentos dentários múltiplos. No fi nal, fi -cam sem dentes, continuam com dor e, ironi-camente, nem conseguem usar suas próteses totais enquanto não houver controle das dores da neuralgia”.

Além do tratamento através da cirurgia, outra técnica que gera muita divergência entre os profi ssionais é o em-prego da toxina botulínica em pacientes com bruxismo e DTM. Para os especialistas, a técnica ainda não mostra su-perioridade sobre os demais procedimentos, uma vez que as evidências que a suportam ainda são bastante modestas. De acordo com Antônio Sérgio Guimarães, havendo duas

mo-dalidades distintas de terapias, ambas com evidência cientí-fi ca de sua efetividade, deveria ser escolhida aquela que seja a mais simples, mais barata e menos invasiva. Baseando-se nisso, portanto, ele afi rma que não há evidência que suporte o emprego da toxina botulínica.

Paulo Conti acredita que haja espaço para o uso desta terapia em algumas condições dolorosas, porém sem a mas-sifi cação proposta por diversos meios de comunicação. “O uso da enzima botulínica é baseado na tentativa de se pro-mover uma paralização temporária da atividade muscular com consequente melhora na severidade e frequência das dores musculares. Ainda, nos caso de bruxismo, postula-se que a falta de atividade muscular leve à cessação do hábito. Deve ser lembrado que tal terapia foi inicialmente utilizada, e com sucesso, em distúrbios motores, como o estrabismo, por exemplo, e a partir daí, com fi nalidades estéticas, o que popularizou mundialmente tal técnica”.

“No caso do bruxismo, existem dois grupos: o idiopático, que não tem origem defi nida e que é o mais comum nos consultórios, e o secundário, que é o grupo cujo bruxismo de-corre de doenças ou do uso de medicamentos. Neste segundo grupo, a toxina botulínica é extremamente útil. Quanto ao seu uso em pacientes com bruxismo idiopático as controvér-sias são enormes e o cirurgião-dentista deve fi car atento à boa literatura científi ca. O uso da toxina botulínica em odon-tologia não deveria ser baseado em opiniões, mas em evi-dências científi cas”, comenta José Tadeu Tessaroli de Siqueira. Opinião semelhante apresenta Peter Svensson, que, apesar de recomendar o uso da substância em muito pou-cos casos, diz ser uma boa opção o uso desta em casos de bruxismo severo em que tem sido verifi cado, com sinais de eletromiografi a, mostrando aumento na atividade muscular, por exemplo, durante o sono. “Contudo, é importante frisar que o efeito da toxina botulínica na DTM é pouco debatido, e a maioria dos estudos clínicos controlados e randomizados não têm sido capaz de mostrar efeitos signifi cantes no alívio

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da dor. Assim, eu sou cético com relação ao uso rotineiro de toxina botulínica para dor relacionada à DTM”.

Já no caso das DTMs, Reynaldo Leite Martins Júnior res-salta que os estudos são controversos, e alguns resultados sugerem, inclusive, que o seu efeito é similar ao da infi ltração de anestésicos, ou mesmo agulhamento seco dos músculos da mastigação, que tem um custo e possibilidade de com-plicações muito menor. “Além disso, há um risco grave: a sua utilização indiscriminada por profi ssionais treinados sem for-mação ou conhecimento em Dor Orofacial. A DTM pode ser confundida com uma série de condições dolorosas, incluindo tumores, cefaleias primárias e dores de origem neuropáti-ca. Muitos dos colegas que se propõem a utilizar a toxina botulínica, por exemplo, foram apresentados à técnica em treinamentos de cerca de 48 horas, que de maneira alguma os capacitaria para uma adequada avaliação, classifi cação e condução de um paciente com queixa de dor orofacial”.

O uso de terapias complementares

no tratamento de DTM

Entre o conjunto de terapias reversíveis e pouco invasivas indicadas para o tratamento de DTM, encontram-se alguns procedimentos complementares, como acupuntura, homeo-patia e laser. Já existem inúmeros estudos sobre o uso dessas terapias, porém o assunto continua gerando muita contro-vérsia entre os profi ssionais.

O professor Peter Svensson acredita que, sem dúvida, acupuntura e laser têm algum tipo de efeito biológico, po-rém a questão é se esses efeitos são sufi cientes para desen-cadear o sistema endógeno que inibe a dor e produzir uma ação analgésica signifi cativa para o paciente. “Para ser um pouco polêmico, eu diria que sim, elas funcionam, mas se o paciente acreditar nelas! Na China, acupuntura funcionará devido a muitas razões, mas também porque as pessoas, em geral, acreditam e têm a experiência, antecipação e suporte social para o efeito desta terapia”.

Na visão de Paulo Conti, são terapias secundárias ou de suporte que, ao analisar o real efeito de tais modalidades sob a ótica da evidência científi ca, observa-se uma discre-pância bastante acentuada entre os trabalhos. “Grupos de pacientes heterogêneos, ausência de grupo de controle ou de randomização e critérios de inclusão mal defi nidos são os principais problemas da maioria dos trabalhos que se pro-põe a estudar a efi cácia de determinada técnica terapêuti-ca. Até mesmo as revisões sistemáticas sobre estas terapias apresentam conclusões contraditórias. Recentemente, tive-mos algumas revisões sobre a efi cácia do laser, sendo que algumas indicam sua utilização para distúrbios da ATM, e outras afi rmam não ser efi caz em nenhuma condição. Com relação à acupuntura, há uma recente revisão que conclui haver evidência limitada de sua efi cácia e que mais estudos bem controlados são necessários, enquanto que sobre o uso da homeopatia não tenho informações”.

Para José Siqueira, nem todas essas terapias têm estudos

clínicos adequados, portanto, o especialista afi rma que fi ca difícil avaliar a validade delas. “Como DTM é um grupo he-terogêneo de problemas, nem sempre sabemos exatamente o que foi tratado e qual foi o formato do estudo. Entre es-sas citadas, a acupuntura tem sido alvo de inúmeros estudos e indicada, principalmente, nas dores musculoesqueléticas. Aumentam também os estudos sobre o mecanismo de ação do laser terapêutico na infl amação e na dor. Certamente, à medida que as amostras de pacientes e de diagnósticos forem mais homogêneas, será possível identifi car a real efi -cácia dessas diferentes terapias em dor”.

Contudo, Antônio Sérgio Guimarães diz que nenhuma delas apresenta evidências científi cas que justifi quem os seus empregos em pacientes com DTM. “Nenhum desenho de trabalho bem elaborado em relação a essas terapias foi realizado e nenhuma tem também a aprovação de institutos de pesquisas, tais como o Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos (NIH), para o emprego com essa fi nalidade”.

Na visão de Reynaldo Leite Martins Júnior, a acupuntura pode ter algum efeito no controle da dor e poderia, portan-to, somar-se a outras ferramentas, como adjuvante, espe-cialmente em indivíduos que relatam experiências prévias bem sucedidas com seu uso. Em relação ao laser de baixa potência, entretanto, ele esclarece que não encontrou razões para recomendar sua aplicação em DTM.

O ensino da disciplina de DTM e Dor

Orofacial nas faculdades de Odontologia

Apesar de ainda ser pequena a quantidade de faculdades que possuem departamentos ou áreas específi cas de DTM e Dor Orofacial em sua organização, já é possível observar uma crescente preocupação da comunidade acadêmica em criar disciplinas voltadas para esses estudos nas faculdades de Odontologia. Há uma preocupação, entretanto, que as disciplinas de DTM fi quem vinculadas a outras áreas, como Prótese e Ortodontia.

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De imediato, Reynaldo Leite Martins Júnior afi rma que esse risco ainda existe, mas com a consolidação da espe-cialidade, a tendência é de, gradativamente, ser superado. “Com a possível exceção de particularidades administra-tivas locais (por exemplo, um professor de Ortodontia com amplo conhecimento na área de Dor Orofacial), não há nenhuma razão para a vinculação da DTM à Ortodon-tia, Prótese ou mesmo Cirurgia Bucomaxilofacial, salvo o apego a dogmas ultrapassados. Diversos centros no Brasil têm formado profi ssionais especialistas com sólidas bases científi cas e clínicas na área de Dor Orofacial, os quais com certeza se tornarão uma massa crítica que irá impor mu-danças nas faculdades que ainda não estiverem adequadas aos novos tempos”.

Para José Siqueira, tanto a Prótese como a Ortodontia con-tribuem para a saúde, inclusive a de pacientes com algumas DTMs. Porém, ele diz que a DTM, que é estudada atualmente, e, principalmente, tendo a dor como queixa principal, exige, como a literatura mundial mostra, uma abordagem própria e fundamental a todo jovem estudante. “Por englobar diver-sos problemas, é natural que seja abordada em diversas áreas da Odontologia. A Prótese, quando repõe dentes perdidos e reabilita o paciente, está contribuindo e exige informação a respeito; idem a Cirurgia, quando discute as doenças da ATM; e assim por diante. Entretanto, deve-se evitar a supervaloriza-ção de uma parte em detrimento ao todo. Portanto, a meu ver, a DTM pode e deve ser abordada nas diversas especialidades odontológicas, cada uma na sua especifi cidade”.

Já a Dor Orofacial, na opinião de Siqueira, é um assunto internacional que poderia ser uma disciplina optativa, dada a sua complexidade. “Os alunos dos cursos de saúde pre-cisam entender a amplitude desse fenômeno e porque ele pode causar tantos problemas aos pacientes. Distinguir dor aguda de crônica, infl amatória de neuropática, localizada de referida; compreender seu impacto para o indivíduo, família e sociedade; reconhecer a importância ao sistema público

de saúde... Tudo isso é indispensável aos jovens graduandos. É uma disciplina necessária e que auxiliará muito os nossos futuros profi ssionais, inclusive para entender que, indepen-dentemente de sua especialidade, ele sempre vai se deparar com essa queixa”, conclui José Siqueira.

Na universidade de Aarhus, na Dinamarca, Peter Svens-son conta que há uma disciplina de DTM e Dor Orofacial para alunos de graduação. “Na verdade, temos nosso próprio De-partamento de Fisiologia Clínica Oral (Fisiologia Estomatog-nática), que é responsável por ensinar aos alunos os cuidados com o paciente e a pesquisa dentro dos campos de oclusão, função muscular dos maxilares, função das articulações, sa-liva e dor orofacial”.

Dar um maior enfoque a esses conteúdos nas faculdades pode, além de tudo, contribuir para que sejam quebrados al-guns dogmas na área da DTM, como sua relação direta com a oclusão. Na visão de Reynaldo Leite Martins Júnior, “talvez a maior resistência seja de professores, palestrantes e autores de livros e artigos de opinião, os quais passaram muito tempo (às vezes, décadas) defendendo uma posição que posteriormente se provou falsa. Neste caso, não é fácil reconhecer os próprios equívocos e negar tudo que escreveu e ensinou. Porém, alguns clínicos, principalmente os mais jovens, parecem ter mais fa-cilidade em rever os seus dogmas, desde que adequadamente informados, e daí vem a certeza de que tais dogmas estão condenados ao desaparecimento, cedo ou tarde”.

“Este é o mesmo problema da cirurgia no passado, em que se operavam indiscriminadamente as ATMs. Es-sas desinformações sinalizam para uma possível fraqueza no ensino de Odontologia, seja na graduação ou na pós--graduação. Atualmente, existem inúmeros meios de atu-alização, principalmente a Internet, que permitem acesso às informações científi cas. Cabe aos professores essa res-ponsabilidade, mas, infelizmente, nem sempre o preparo clínico segue os avanços científi cos. Apesar desses dogmas já estarem sendo rompidos, sabemos, porém, que toda mu-dança requer tempo, só que ao se tratar de saúde exis-tem questões éticas envolvidas e que não são apenas uma questão de opção pessoal ou de mercado. São muito mais profundas”, afi rma José Siqueira.

Na opinião de Peter Svensson, para quebrar um dogma como esse é necessário uma mente aberta e uma avaliação crítica da literatura para encontrar o que é realmente sabi-do e o que não é conhecisabi-do sobre as relações entre oclusão e DTM. “Infelizmente, a história nesse campo tem mostra-do uma forte polarização entre ‘os que acreditam’ e ‘os que não acreditam’, e tem gerado, muitas vezes, calorosos debates, para não dizer brigas. Eu espero que a educação clínica, o treinamento em pesquisa e uma atitude de mente aberta a novas ideias nos deixarão mais próximos de uma melhor compreensão da complexa relação entre oclusão e a dor relacionada à DTM”.

“No caso da má-oclusão, inicialmente tida como a grande vilã das dores faciais por DTM, tal crença pode ser

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atribuída em parte ao sucesso obtido com o uso das pla-cas oclusais. Profi ssionais creditavam toda a efi cácia destes aparelhos à ‘restituição’ de uma oclusão ideal, e, a partir daí, técnicas de reconstrução oclusal permanente (por meio de ortodontia ou de reabilitações protéticas extensas) eram indicadas para perpetuar tal posição. Atualmente, sabe-se que o efeito terapêutico das placas vai muito além de um simples restabelecimento da oclusão, e, portanto, não se indica procedimentos irreversíveis para a maioria dos casos. A quebra destes dogmas, apesar de difícil, deve ser focada na exploração e disseminação de estudos bem elaborados e também com textos informativos, em forma de consen-so, como o publicado recentemente a respeito das DTMs e direcionado para o clínico geral. Acredito que as novas gerações de profi ssionais devam ter uma formação menos baseada em dogmas e mais pautada pela evidência”, acres-centa Paulo Conti.

Perspectivas futuras e o avanço

da especialidade no Brasil

Os especialistas defendem a ideia de que a especialidade de DTM e Dor Orofacial está passando por um período de tran-sição na Odontologia brasileira. Desde o seu reconhecimento como especialidade, há cerca de 12 anos, muitas conquistas foram obtidas, porém há ainda muito o que se avançar.

Um dos avanços da área de Dor Orofacial foi a criação, em 2012, da Sociedade Brasileira de Disfunção Temporoman-dibular e Dor Orofacial (SBDOF), da qual Paulo Conti é presi-dente. O especialista explica que as dores orofaciais sempre tiveram espaço em entidades para o estudo da dor e cefaleias no país, como a SBED (Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor) e a SBCe (Sociedade Brasileira de Cefaléia). No entanto, ele afi rma que faltava uma entidade com identidade própria que pudesse ter representatividade junto a órgãos ofi ciais para reivindicar as próprias necessidades da área. “Foi, sem dúvida, uma grande conquista e a realização de um antigo desejo para todos nós. Temos, no entanto, a consciência de que ainda há um longo e árduo caminho a ser percorrido para a consolidação da especialidade em nosso país”, diz.

Para José Siqueira, vive-se hoje um período em que estão sendo trocados os conceitos herdados por fé e pela prática, pelos da informação científi ca. “Entre as perspectivas futu-ras, existe a esperança de que possamos ter uma Comissão ou board em Dor Orofacial e DTM que seja composta por es-pecialistas representantes das diversas associações envolvi-das com a dor no Brasil. É necessário que o CFO, as universi-dades e o setor público de saúde ouçam essa voz consensual da ciência, para aí sim evitar tantos erros e desinformações. Uma profi ssão consciente não pode deixar de lado a análise rigorosa de como está formando seus jovens. Estes devem ser preparados da forma necessária para os desafi os que a dor continua trazendo à Odontologia. Esta, por sua vez, é parte das profi ssões de saúde e deve formar, tendo em conta as necessidades do nosso Sistema Único de Saúde,

multidis-ciplinaridade e visão holística do paciente. O cirurgião-den-tista não pode mais viver isolado em quatro paredes”.

De acordo com Antônio Sérgio Guimarães, a Odontologia brasileira está sendo cada vez mais respeitada e vista com bons olhos pela comunidade científi ca mundial. “Devemos continuar priorizando a formação de jovens pesquisadores orientados para a pesquisa e o desenvolvimento, gerando novos conhecimentos sem dogmas e achismos. Dessa neira, tudo seguirá para o sucesso. Hoje possuímos um ma-terial humano riquíssimo tanto de orientadores muito bem formados quanto de jovens pesquisadores capacitados em Odontologia baseada em evidências”, comenta.

Entretanto, Paulo Conti chama atenção para o fato de que, ainda hoje, muitos cirurgiões-dentistas não têm qual-quer conhecimento sobre a existência dessa especialidade. “Além disso, grande parte da população também não sabe a quem recorrer quando tem sintomas de DTM. Creio que talvez o nosso grande desafi o seja formar uma mentalidade dentro da Odontologia e profi ssões da área de Saúde de que existem pessoas treinadas e capacitadas para tratar especifi -camente estes problemas”.

Na Dinamarca, Peter Svensson explica que há apenas duas especializações reconhecidas: Cirurgia Oral e Maxilo-facial e Ortodontia. Entretanto, ele diz que, em 2012, o Con-selho Dinamarquês de Saúde realizou um comitê especial para revisar a necessidade de incluir outras especialidades de Odontologia, e que a Fisiologia Oral Clínica foi recomendada entre outras cinco especialidades em potencial (Endodon-tia, Prótese, Periodon(Endodon-tia, Odontopediatria). “Infelizmente, devido à falta de dinheiro e de recursos, nenhum curso de especialização está estabelecido até agora. O Brasil é um dos poucos países no mundo com uma especialização formal, e eu espero que as comunidades internacionais de DTM e de Dor Orofacial possam trabalhar juntas para melhor pro-moverem os cursos de graduação e de pós-graduaçao nesse campo. Nossos pacientes precisam disso”, conclui.

Referências

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