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Filhos de divorciados. que vivem (felizes) em casas alternadas

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(1)

Filhos

de

divorciados

que vivem (felizes)

(2)

Semana sim

semana não

Com quem deve

viver

um filho

depois de

os

pais

se

divorciarem?

Histórias

de

quem

escolheu

a residência

alternada

como modelo.

(3)

a

residência

alternada

é

escolhida

por cada vez

mais

famílias:

durante

uns dias ficam

com

um

progenitor,

nos

dias seguintes

ficam

com

o

outro.

Porque

os

filhos

têm um

pai

e

uma

mãe

e

direito

a

viver

e

ser educados

por

ambos.

Mesmo

que seja

em

casas

diferentes.

Semana

sir^^H

semana

nã<||^^|

Lua vive urn

l9^|

semana com

<^^^H

e aoutra sem

jflfl

com amãe.

Qu|H^J

se

separaraHHH

Francisco

ii^H

eSusana

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tiveram

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esta era a

met^^H

forma (para

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deexercereH^^J

os deveres

e^^^|

direitos

parentS^H

(4)

QUERES VER ESTA FOTO DO MEU PAI? Aperguntaé deLua. Debraço esticado, tem na mão uma das muitas fotografias queos

pais tiraram quando secasaram, antes de

cianascer. Aimagem tem 15anos cmuita

coisa mudou desde então. Lua nasceu há11

anos, ospais estão separados hásete. Mas

isso nãotem impedido Francisco deserum pai presente na vida desta filha que agora mostra afotografia antiga doprogenitor.

Quando falaram de separação, a

primei-racoisa que Francisco Vasconcelos e

Susa-na Cunha Rego decidiram foi que aLua ia continuar aviver comos dois. «Na altura do divórcio, sehásacrifícios a fazer, têm deser

ospais afazê-los, nãoascrianças», defende Francisco enquanto passa amão nacabeça

dafilha. «Quando há uma separação eela

não cdesejada por umdos lados, a primei-ra barreiprimei-ra épessoal epassa por ultrapassar

isso.» Ele ultrapassou-a. E decidiu que

tu-doia fazer para encontrar forma deas

coi-sasfuncionarem para afilha. Organizou a vida adois quarteirões dacasadaex-mulher parasertudo mais fácil etempos houve em

que chegou aviver nomesmo prédio. «Mui-tagente achou isso ridículo, mas nós acre-ditámos queeraomelhor paraanossa filha

na altura.»

Texto

Sofia

Teixeira

ADECISÃO DE COLOCAR LUAcm primeiro lugar na lista deprioridades não surgiu na

altura dodivórcio. É muito anterior.

Quan-doafilha nasceu, Francisco despediu-se do emprego quetinha epassou atrabalhar em casa como designerfreelancer, deforma a poder acompanhá-la de perto. Afinal, era repetente: quando casou com Susana

ti-nhapassado por umdivórcio ctinha um

fi-lho, Manuel, hoje com 25 anos.

A

primeira

separação foi conturbada e issoteve um

im-pacto narelação entre ambos. «Houve

altu-ras emque nem de15em 15dias viao

Ma-nuel por causados conflitos com amãedele. Peneimesmo muito.»

Do lado da mãe de Lua,a preocupação foi

a mesma: omelhor paraafilha. Porisso

Su-sanaCunha Regonão tevegrandes dúvidas queomelhor eraelapoder viver com osdois.

«OFrancisco, alémde serpai da Lua

-

eum

excelente pai

-

éum amigo.»

Talvez ao contrário do queécomum, cor-reu tudo excecionalmente bem: estiveram

deacordo que afilha deveria morar com os

dois, aLua adaptou-se bem aviver cada

se-mana numa casa, em sete anos de divórcio não houve uma discussão enãohágrandes diferenças doponto devistade regras ou

mo-delos parentais.

A

suaprópria experiência

como filha de pais divorciados foipouco

or-todoxa, mas muito funcional: oirmão ficou a

viver com opaiccia comamãe, mascomo as casaseram uma em frente à outra, andavam

cáelálivremente. Susana casou-se entretan-toeomarido étambém umapoio euma re-ferênciapara afilha. «Agestão dodia-a-dia, entreescola, centro de estudos eoutros

com-promissos étripartida: umas vezes vou eu, outras amãe, outras opadrasto», diz

Fran-cisco. «Sefor caso disso vamos ostrês.»

EM

2008

HOUVE

ALTERAÇÕES

LEGISLATIVAS

AO

DIREITO

DA

FAMÍLIA,

PARA

TORNAR

MAIS IGUALITÁRIO

0

PAPEL

DOS

PAIS. «PODER

PATERNAL»

FOI

SUBSTITUÍDO

POR

«RESPONSABILIDADES

PARENTAIS»

E

TORNOU-SE

REGRA A

ATRIBUIÇÃO

AAMBOS

OS

PROGENITORES

(5)

FONTE: PETIÇÃO EM PRO_DAPRESUNÇÃO JURÍDICA DARESIDÊNCIAALTERNADA, ASSOCIAÇÃO POR~UGUESA PARA A IGUALDADE PARENTAL EDEFESA DOSDIREITOS DAS CRIANÇAS

Lua sente-se amada eapoiada. «Ébom porque opaieamãesão amigos», diz.«Há

outros meninos que também têm pais se-parados, mas eles não são assim amigos...»

E deixa aconstatação em suspenso, com umaexpressão no rosto quemostra umcerto

pesarporquem não tem tantasorte como ela.

PARAQUETUDOFUNCIONEBEMnestadi-nâmica épreciso haver vontade e

demasia-das vezes ascrianças sãousadas como ar-made arremesso entre ocasaldesavindo ou

ofim da relação dita oafastamento deum

deles dosfilhos

-

quase sempre opai. Estas são asguerras quechegam aosescritórios de advogados e àsconferências depais em tri-bunais, e quemuitas vezes estão mais

rela-cionadas com problemas porresolver entre

oex-casal doque com assuntos

relaciona-dos comosfilhos.

Susana eFrancisco fizeram

intuitiva-mente aquilo a que ospsicólogos chamam

deseparar aconjugalidade da

parentalida-de: deixaram de serumcasal, mas não dei-xaramdeserpais.Nemtão-poucodeixaram

que a separação afetasse a relação dealgum

deles comafilha. Pode serdifícil, mas sótraz

benefício paraacriança. «Aliteratura

cien-tífica neste domínio éclara: oprincipal

pre-ditor doajustamento psicológico das

crian-ças aodivórcio éaforma como ospaisfazem a suaprópria adaptação», explica

Catari-naRibeiro, psicóloga do Instituto

Nacio-nal deMedicina Legal e Ciências Forenses

doPorto e professora na Faculdade de

Edu-cação ePsicologia da Universidade Católi-ca. São aatitude, ocomportamento, o

equi-líbrio psicológico earelação dos pais que

condicionam a adaptação dos mais

pe-quenos enão apenas na altura do divórcio.

«Oconflito parental cumdosprincipais

fa-tores dedesajustamento dascrianças, quer quando ospais vivem juntos quer quando vivem separados. Seospais nãosão capazes decomunicar um comooutro deumaforma

funcional eadequada, oimpacto na criança tende asermuito negativo, independente-mente do regime deresponsabilidades pa-rentais queéfixado», diza psicóloga.

Igual entendimento acercadas vantagens deumaboa relação entre paiemãe tem Joa-quim Manuel Silva,juiz defamília e

meno-resnotribunal deMafra. «O problema não

está noregime, está noconflito», defende o

magistrado, conhecido pelos esforços em

tentar conciliar pais desavindos [ver entre-vista na página 24].Porisso, aofixar as

res-ponsabilidades parentais, mais do que jul-gareescolher um dos progenitores, aquilo

quefazéajudar osdois aorganizarem anova

relação, agora apenas como pais, enão

co-mocasal. «O supremo interesse da criançaé

umeonceito indeterminado que eutenho de

preencher eque,no meu entender,

passaso-bretudo por ajudar ospais aevitar o

confli-to. Sóassim podemos terumacriança com direito apai emãee, sobretudo, aum pai e

auma mãe queserespeitem mutuamente,

«0 CONFLITO PARENTAL

É UM DOS PRINCIPAIS FATORES

DE DESAJUSTAMENTO DAS CRIANÇAS, QUER QUANDO OS PAIS

VIVEM JUNTOS QUER QUANDO

VIVEM SEPARADOS», DIZ

A PSICÓLOGA CATARINA RIBEIRO. «SE OS PAIS NÃO SÂO CAPAZES DE

COMUNICAR UM COMO OUTRO DE

FORMA ADEQUADA, 0 IMPACTO NA CRIANÇA TENDE ASER NEGATIVO,

INDEPENDENTEMENTE DO REGIME

DE RESPONSABILIDADES PARENTAIS QUE ÉFIXADO.»

(6)

evitando que a criança viva num stress que

émuito prejudicial aodesenvolvimento.» AnaLúcia eoex-marido, Miguel, não são

propriamente amigosmas têmumarelação amigável. E contam um com ooutro noque

toca aosfilhos Gonçalo, de13anos, cTiago, de11.«Nesta semana enapróxima vou estar com elesporque opai não pode durante ase-manadele. Masàs vezes acompanho omeu namorado nas viagens de trabalho quefaz e, secalham na semana emque estou com os

meninos, também éaopai que recorro pa-ra ficar comeles.

muitaflexibilidade.» NA ALTURA DA SEPARAÇÃO, em 2012, Ana Lúcia Moreira fezuma coisa que nem

sempre éfácil: «Pus-me naposição domeu ex-marido epensei: "O que éque eu

senti-riase sópudesse estar com osmeus filhos de

15em15 dias? Ficava muito, muito triste".» Mas AnaLúcia recorda-se que, quando fo-ram entregar no registo civil oacordo que

eles próprios redigiram, a funcionária

tor-ceu onariz. «Disse quetinha dúvidas se

se-riahomologado porque seconsiderava que umasemana decada lado poderia nãoser o

mais indicado paraascrianças.»

Hoje esse entendimento mudou.

A

resi-dência alternada

-

ou seja, apartilha entre mãe epai de 33a50por cento do tempo de residência e do envolvimento continuado

nos cuidados, na educação ena vida quoti-diana dos filhos

-

tem apoiantes em várias áreas de investigação.

Malin

Bergstrõm, psicóloga clínica einvestigadora no Insti-tuto Karolinska, em Estocolmo, tem mais deduas décadas deexperiência em

media-çãofamiliar. Nos últimos anos fez vários

es-tudos com filhos de casais separados, nos quais conclui queosque têm aresidência al-ternada estão com melhor saúde mental,

fí-sicaebem-estar dogue osquevivem apenas

comumdosprogenitores.Osestudosforam

feitos primeiro com crianças entreos10e os

18 anos edepois com crianças entre os 2e

os5 anos. Os resultados foram osmesmos.

A

psicóloga Catarina Ribeiro alerta para ofacto de serredutor pensar num «modelo

único» para defender ointeresse da crian-çaegerir arelação dos pais com os filhos. Épreciso considerar as especificidades da cadafamília. Mas, feita essaressalva, con-corda que háconsenso: «Quando as com-petências parentais estão asseguradas, o

regime que pode ser mais favorável para a

criança éoque lhe permite terumcontacto alargado com ambos osprogenitores.

Nes-sesentido, oregime de residência alternada podeseroque maisseaproxima deum mo-delo de convívio consistente esecurizante.»

Adivinhando isto mesmo, esem conhece-rem afundo estudos académicos, em 2012 AnaLúcia eMiguel saíram do registo civil a

combinar que,independentemente da

sen-tença que chegasse, iam continuar afazero

que

faziam. O acordo acabou homologa-do ehoje, cinco anos passados, Ana Lúcia

admite que aúnica coisa que lhe custa

nes-te sisnes-tema é que os filhos tenham perdido umacerta noção decasa quetinham antes.

«Agora nunca dizem "a nossa casa", dizem

sempre "acasa da mãe" ou "acasadopai".» Mastambém achaisso um malmenor eque mais grave seria terem perdido oconvívio pleno comum dosdois.

Nocartão de cidadão ficou amorada do pai. Calhou assim. Mas apesar de terem duas casas, não hámalas deum ladopara

EM

20U,

UMA ANALISE

DE

UMA

SOCIÓLOGA DO

INSTITUTO

DE

CIÊNCIAS SOCIAIS

DA

UNIVERSIDADE

DE LISBOA

INDICAVA

QUE

APENAS

22,2

POR CENTO DOS

INQUIRIDOS

CONSIDERAM

0

REGIME

DE

RESIDÊNCIA

MATERNA

E

VISITAS

PATERNAS COMO

0

MELHOR

PARA

A

CRIANÇA,

CONTRASTANDO

COM OS

47,5

POR CENTO QUE

AFIRMAM

ENTENDER SER

MELHOR

A

RESIDÊNCIA ALTERNADA.

(7)

ooutro: têm tudo nas suas duas casas ea única coisa que transportam com eles são

oslivros escolares. Também nãohálugar a pensão de alimentos edividem ameias as

despesas fixas emédicas. Quanto ao res-to, vão combinando sem fazer contas aos

cêntimos. «Se eles precisam de um

casa-coede uns sapatos, opai compra uma

coi-saeeu outra.»

NÃO HÁ EM PORTUGAL estudos extensos

de avaliação dobem-estar das crianças em residência exclusiva ealternada, como osda

sueca

Malin

Bergstrõm, eosnúmeros tam-bém nos dizem pouco acerca da realidade nacional. Osúltimos dados sobre decisões

judiciais nesta matéria datam de

2006

e

apontam para as«guardas conjuntas»

ape-nas em três por cento dos casos. Mas

pas-sados onzeanos estão desatualizados, tanto naspercentagens como na própria termino-logia. Em

2008

houve alterações

legislati-vas ao direito dafamília, no sentido de tor-nar mais igualitário opapel dos pais e co-locar um foco maior nos direitos dos filhos.

A

expressão «poder paternal» foi substituí-da por «responsabilisubstituí-dades parentais»

-

de forma adarênfase aos deveres, por

oposi-ção aos poderes

-

etornou-se regra a atri-buição aambos osprogenitores doexercício destas, poroposição àguarda única que vi-gorava atéaíeeraquase sempre entregue à mãe. Hoje, asresponsabilidades parentais

são quase sempre partilhadas, oque signi-fica que paiemãetêm de tomar decisões im-portantes em comum, podendo a residên-ciaser exclusiva, quando fixada apenas com um, ou alternada, quando com osdois.

«Os Censos 2011mostram que as famí-lias monoparentais erecompostas forma-das pela dissolução conjugal têm vindo a aumentar. As famílias monoparentais fe-mininas sãomaioritárias (89,2%), bem co-mo asfamílias recompostas em queofilho

oufilha nãocomum édamulher (78%)»,

ex-plica a socióloga Sofia Marinho.

A

investi-gadora do Instituto deCiências Sociais da Universidade deLisboa lamenta a inexis-tência de dados oficiais sobre os desfechos

da regulação das responsabilidades paren-tais noquediz respeito aos regimes de resi-dência evisitas das crianças. Isto porque os

Censos fornecem uma informação muito li-mitada: não registam otempo queacriança vive nacasa dooutro progenitor, nãosendo

assim possível saber qual a suaverdadeira situação parental. «Nãosesabe, por exem-plo, quantas crianças sãovítimas de aban-dono parental por parte deumdos seus pro-genitores nestas famílias.»

Apesar destes números, Sofia Marinho acredita que as atitudes estão a mudar. No livro que coordenou, Uma

Família

Paren-tal,Duas Casas (cd. Sílabo, 2017)a investi-gadora publicou aanálise dos dados do in-quérito International Social Survey Pro-gramme (ISSP) aplicado em 2014 auma amostra representativa da população por-tuguesa de 1001pessoas: apenas 22,2por cento dos inquiridos consideram o regime deresidênciamaternae visitas paternas co-mo omelhor para acriança, contrastando com os47,5 por cento queafirmam enten-dersermelhor aresidência alternada.

E algures napassagem das opiniões às

práticas queestas convicções ficam pelo ca-minho. Os obstáculos à residência alterna-da colocam-se principalmente quando os

pais não estão deacordo, mas também pode haver resistênciaquandoesse acordo existe.

«Aausência da residência alternada na le-tradaleiéumdos problemas», diz a

investi-gadora. «Naordemjurídica vigente, o acor-do entre progenitores quanto aoregime de

residência alternada não garante a

aceita-ção deste por parte dosmagistrados.»

quem defenda que apressão social é

um dos problemas. A assistente social Sa-ra MiSa-randa, 40anos, temoseupróprio

pro-cesso de adaptação ainda emcurso porque

étudo mais recente eporque afilha

Mar-garida era bastante mais nova na altura da

separação: hoje tem 3 anos, quando ospais

sesepararam tinha apenas 9meses. O

ex--marido reivindicava o direito apassar o

mesmo tempo comafilha, mas Sara resistiu alguns meses. Nãoestava deacordo e enten-dia que omelhor para afilha era ficar com ela, por ainda ser muito pequena. Para re-solver oimpasse foram ostrês a uma

pedo-psiquiatra esódepois deouvir aprofissional

dizer-lhe queafilha

tinhaamesmavincula-çãocomopaiquetinha com elaéque cedeu.

«Percebo agora que, na realidade, o princi-pal problema que eu enfrentava erao

estig-made sermãe em

par

t-time.»

Sara eoex-marido tiveram um divórcio com quezílias, nãotêmuma relação de pro-ximidade e osmodelos educativos eformas de parentalidade dos dois são muito dife-rentes.

A

gestão das responsabilidades em comum não éisenta deconflitos etêm de-sentendimentos mesmo quanto à interpre-tação do que ficou definido na regulação. Ainda assim, existe um acordo tácito entre

os dois: não há, nem nunca houve,

discus-sões ou conversas sobre otema cm frente à

filha Margarida, deforma a salvaguardá-la

dos conflitos edesentendimentos. «Não é

fácil. Masàsvezestambém não éfácil

quan-do seestájunto como casal. Apesar da mi-nha resistência inicial, hoje defendo que os

pais nãotêmde serdarbem parauma

crian-çapoder estar em residência alternada.» Embora Margarida vádebom grado para

opai, Sara acredita que,selhe perguntassem

oque queria, épossível quepreferisse estar

mais tempo com amãe.Masisso não lhe al-tera em nadaaconvicção deque esteéo me-lhor sistema paraa filha. «SeaMargarida

pudesse, também escolhia almoçar ejantar

chocolate.

coisas que devem seros

adul-tos adecidir, não devem serperguntadas às

crianças desta idade.» Como todas asmães

epais, há momentos em que sente

apreen-sões. Pensa, por exemplo, seum dia afilha não questionaráporque nãoficou amorar só

com ela, massabe que, independentemente do sistemaescolhido, seriasempre assaltada por dúvidas. «Se tivesse ficado aviver só co-migo, por certo também perguntaria amim própria: «Será que elanão vai culpar-me por nãotertido oportunidade deter com opai a

(8)

"AO

FIXAR

A

RESIDÊNCIA

EXCLUSIVA

FICAMOS

COM

UM PROGENITOR

QUE

GANHOU

E

OUTRO

QUE

PERDEU

"

Joaquim

Manuel

Silva, juiz

de

família

e

menores, defende

que

a residência

alternada

de

filhos

de

pais separados

é

a

melhor

opção

para garantir

o

bem-estar

da

criança

-

sobre-tudo quando

os

progenitores

estão

em

guerra,

porque

isso

diminui

o

conflito.

O

magistrado

fala

de

direito, mas

também

de

ciência

e

psicologia,

para

defender

este

ponto

de

vista.

E

acredita

que

seu

papel não

é

apenas

julgar,

mas sobretudo

informar

e

conciliar,

ajudando

os

pais

que

não

estão

juntos a

conseguirem

ser

um

casal

parental

que

restitua

a

família

à

criança.

Entrevista

Sof ia

Teixeira

Fotografias

Paulo Alexandrino/Global

Imagens

Formou-se

em Filosofia e

Direi-to, foi professor no secundá-rio, exerceu advocacia e

che-gou àmagistratura quase aos

40

anos. Hoje tem 56,éjuiz de família emenores desde os44e

assume-se como defensor dosfilhos quando

os pais estão em guerra. Muitas vezes

con-segue omilagre de pais inimigos passarem a ter uma relação civilizada, talvez porque prefere conversar com eles emvez deler re-latórios. Entre osquatro milprocessos

tute-lares cíveis queojuizJoaquim Manuel Silva tratou nos últimos sete anos,sólevou dois ou três a julgamento. E conhecido por flexibi-lizar osprocedimentos deforma a agilizar a

resolução dos casos

-

telefona elepróprio a fazer convocatórias eenvia mensagens por

Facebook, senecessário. Está na comarca deMafra há umano, mas amissão éa mes-ma: impedir que ospais destruam a

infân-cia dos filhos, por melhores que sejam as boas intenções deles.

•Em

Portugal não há estatísticas ofi-ciais acerca dos regimes de regulação dasresponsabilidades parentais fixados pelos tribunais. Doqueobserva, tem no-ção daspercentagens?

Informalmente.

um estudo deuma procuradora minha amiga para o qual entrevistou 28juizes

-

entre os quais eu. Naamostra, que engloba azona norte ea Grande Lisboa, apurou cerca de três por cento de residências alternadas.

Apercentagem de casos emquefixa

re-sidência alternada ébastante diferente. Tem pelo menos mais

um

zero.

Nuncafizcontas ao total, mas vou fazendo a alguns períodos de tempo ecostuma andar entre osvinte eosquarentapor cento. Como vou fazerumdoutoramento nesta área, co-mecei afazer arecolha dos meus casos des-de setembro de2017e,nesta amostra, ainda

pequena, que rondará ossessenta casos, te-nho 41porcento de residências alternadas.

Emque situações équefixaeste regime? Emdois casos: por acordo dospais

-

nestas

situações nem discuto, dou apenas meiadú-ziade conselhos em relação aquestões ope-racionais

-

equando háconflito. Sesão

am-bos bons doponto devista pessoal ede ca-pacidade parental mas estão em conflito, por norma, opto pela residência alternada.

(9)

•O

senso comum eamaioria dos seus colegas defendem ooposto: que, em ca-so de conflito, não hácondições para a residência alternada.

Também tinha essaideia ehácolegas que ainda adefendem, mas hoje tenho uma opinião diferente. Ao

fixar

a residência exclusiva ficamos com um progenitor que ganhou eoutro que perdeu: se a re-lação

era má, pior vai ficar eo confli-toaumenta. Ao estabelecer uma

igualda-deentre os pais queosresponsabiliza aos dois, normalmente começam ater o

cui-dado de proteger os filhos, desenvolvem estratégias para lidar um com ooutro eo

conflito diminui. Nãoéa residência alter-nada que émá para oconflito: oconflito éque émau paratudo, por isso éaí que

te-mos deintervir.

•A

nossa

lei

está desajustada e precisa-va de ser mudada?

Nemtanto.

A

nossa lei émuito inovadora: dizque[Lei nfi 61/2008, número 5do

arti-go 1906a

],

aofixar umregime, devo

esco-lher oprogenitor que sedisponibilize para promover a relação habitual dofilho com

ooutro. Isso, nãosei sedeforma intencio-nal ou não, favorece aquele que facilita,

logo, promove avinculação com ooutro.

A

criança aproxima-se dequem os pais se

aproximam

-

emocional e comportamen-talmente

-

eafastam-se de quem os pais rejeitam.

•Onde

éque fica aqui oconceito tão fa-lado de «pessoa dereferência»?

É um conceito pobre eredutor que foi

ba-seado numa decisão antiga de um tribu-nal superior americano eque, até nos Es-tados Unidos, jáfòi afastada. Àsvezes

cos-tumo dizer a brincar que uma empregada doméstica interna preenche oconceito de pessoa dereferência: leva etraz da

esco-la, dá banho, alimenta, brinca. E,no en-tanto, não passa pela cabeça deninguém

entregar-lhe a guarda da criança. Por ou-tro lado, oobjetivo defixar

responsabili-dades parentais nãodeve serescolher um, mas antes verificar aspotencialidades dos dois eorganizar anova relação entre eles.

Estamos acolocar ofoco noproblema errado?

A

questão émais arelação dos pais do que oregime escolhido?

O problema nunca estánoregime: quando

ospais seentendem todos os regimes são

bons. Seum pai eumamãe têm uma boa relação eambos querem uma residência

exclusiva com um deles, não me oponho. Mas sehá conflito, eu tenho uma situação

degrande perigo para o desenvolvimen-to da criança e,enquanto juiz do processo,

tenho deme preocupar comisso cintervir. Nãoposso limitar-me a dizer com quem é

queacriançafica.Masissoimplicapassar--lhes primeiro uma série de

conhecimen-tos que,por norma, elesnão têm.

•Como

é que faz essa intervenção para abordar pais em guerra?

Com terapia cognitiva: introduzo conhe-cimento para mexer com os sentimentos

deles. Explico-lhes oconceito de

vincula-ção, apresento estudos que mostram que

oconflito parental temefeitos

semelhan-tesaosmaus-tratos, mostro queo ambien-te hostil fazquehaja níveis elevados de cor-tisol nocérebro da criança, quehásinapses

cerebrais que não secriam.

A

criança não

desenvolve océrebro emocional, só o cha-mado cérebro reptiliano, responsável

pe-losinstintos básicos delutar ou fugir.

•E

recorre a peritos noutras áreas, quando sejustifica?

Os pais gostam dos filhos enão querem

este resultado tão danoso. Namaioria dos

casos, aexplicação ésuficiente paraos

mo-tivar para amudança, para protegerem os

filhos. Emcasos mais complicados, há

téc-nicos de mediação epsicologia a apoiar o

processo.

Sinapses, cérebro reptiliano ecortisol não sãootipo de palavras que costuma-mos ouvir aosjuizes. De onde lhe vem umdiscurso tão alicerçado naciência? Ainterdisciplinariedade talvez tenha

vin-do daprimeira licenciatura quefiz,em Fi-losofia. Mas asminhas posições nessaárea foram uma resposta às perplexidades da prática. Até 2005, nem por acordo entre

ospais fixava residência alternada, havia um conjunto de convicções culturais que diziam que ela era má.

•Que

convicções eram essas?

Ter duas casas, as rotinas não serem as

mesmas, a possibilidade de potenciar

o conflito. Mas os casos começaram a

mostrar-me o contrário. Os miúdos que me chegavam com residência alternada tinham um desenvolvimento, em regra, muito acima dos que estavam em residên-ciaexclusiva. Estava a fazer atese de mes-trado [Universidade Autónoma de Lisboa, A Guarda Compatilhada.,

A Família

das

Crianças na Separação dosPais, 2016, Ed Petrony] eaproveitei para fazer

investiga-çãoparatentar perceber através da psico-logia, da neurociência eda antropologia, porque éque isto eraassim.

•O

mito do aumento do conflito

ex-plicou. Como équehojerebateosoutros argumentos, relacionados com duas ro-tinas e duas casas?

«ATÉ

2005,

NEM POR ACORDO ENTRE OS PAIS FIXAVA RESIDÊNCIA ALTERNADA

(...).

MAS OS MIÚDOS QUE ME CHEGAVAM COM RESIDÊNCIA

ALTERNADA

TINHAM

UM DESENVOLVIMENTO, EM REGRA, MUITO ACIMA DOS QUE ESTAVAM

(10)

O que c arotina para uma criança?

Pen-senaadaptação ao infantário: na ausên-cia do pai eda mãe, eindo elapara um sí-tio que de início lhe pode parecer adverso

porque os pais não estão, ela sente segu-rança quando começa aperceber que

to-dos osdias avão buscar adeterminada ho-ra. E quando percebe isso, consegue estar

aexplorar, aaprender, semestar emstress.

Seum casal sesepara etemos dois vincu-ladores, as rotinas mais importantes, no

geral, vão manter-se. E mesmo que haja algumas diferenças em casa, os miúdos adaptam-se.

Ea questão dafalta deestabilidade ge-rada por haver duas casas?

Comecei aperceber que, ao contrário do

que pensava, quanto mais pequenos me-lhor a adaptação. Para o adulto a casa é

um lugar de segurança, mas nas crianças

olugar de segurança éapresença dopai e

da mãe. É por isso que osmais velhos têm

mais dificuldade em ter duas casas: com a

aproximação da idade adulta, a

vincula-ção aopaie àmãepesamenos nasensação desegurança eaautonomialeva-os aficar mais chegados ao espaço físico, ao lugar. Oiço todos osmiúdos apartir dos 4anos,

enos adolescentes, por norma, respeito a opinião deles porque sei queolugar játem muita importância.

•Isso

vai contra mais uma crença

mui-to difundida: que a residência alterna-dacespecialmente má para ascrianças

pequenas.

Nos bebés há na realidade uma certa

li-mitação por causa da amamentação enos

tempos de ausência de cadaum dos pais,

mas apenas isso. O bebé pode perfeita-mente estar dois dias com opaie dois dias com mãe. Já fixei residências alternadas

acrianças de 3 meses, 6meses. São

pro-cessos que

correram e ascrianças fica-ram muito bem.

•Asmãestêmtendênciaaresistiràideia? Muitas vezes resistem inicialmente, mas passado um tempo, quando voltam pa-rafazermos oacompanhamento do pro-cesso,

vêm com outra postura. No ou-tro dia, umadizia-me: «Tinha razão, foi a melhor coisa que podíamos ter feito, pa-ratoda agente, ate para mim.» Mas

so-cialmente asmulheres têm uma grande

pressão: se não ficarem com as crianças

amorar só com elas são catalogadas co-mo más mães.

•Também

sente esta pressão etambém

écriticado?

quem me acuse de ser contra as femi-nistas, mas repare: euéquesoufeminista. Euéque defendo

-

também

-

asmulheres. Porque éque aresponsabilidade detudo o

queestá relacionado com os filhos tem de

ficar exclusivamente com asmães? Onde

éque lhes ficaotempo para avidapessoal,

para acarreira? Fala-se muito na

igualda-deno trabalho, mas, para isso, tem dese

falar primeiro em igualdade na parenta-lidade. Aigualdade damulher passa por envolver eresponsabilizar opainos

cuida-dos aosfilhos.

casos em queospapéis típicos estão invertidos etem uma mãea favor da al-ternada eum pai que não quer assumir

essa responsabilidade?

São casos raros, mas existem. Muitas vezes

percebe-se que sãoindivíduos com infân-cias complicadas, com histórias de

aban-donos, oamor de pai não está dentro deles.

Mas seproponho alternada eopai diz que

não quer, isso

éindicador de muito bai-xa capacidade parental, logo, não vou

su-jeitar a criança a isso.

•Está

a

iniciar

o doutoramento.

Qual

vaiser o tema?

Ésobre justiça restaurativa

-

que eu acre-dito que deve ser oparadigma processu-al na jurisdição dafamília edas crianças. É uma justiça transformativa que, emvez delevar estes casos àsala deaudiências

pa-ra proferir umadecisão, passapor fazer

es-te trabalho com ospais, aescola e a comuni-dade queacaba por ostransformar e recu-perar afamíliadacriançanaparentalidade.

•Que

tipo de esforço éque todas essas

diligências implicam?

Resolvi 1100 processos entre janeiro e

de-zembro de 2017-É exigente emuito duro para mim, do ponto de vista emocional. Mas nunca cum sacrifício quando sefaz uma coisa por paixão. Para fazer este tra-balho épreciso gostar depessoas,

pre-ciso querer mesmo ajudar estes pais, para queeles possam ajudar osfilhos.

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