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PESQUISA ATUAL E PERSPECTIVAS. Organizadores

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Academic year: 2022

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A ORNITOLOGIA NO BRASIL

PESQUISA ATUAL E PERSPECTIVAS

Organizadores

Maria Alice dos Santos Alves José Maria Cardoso da Silva

Monique Van Sluys Helena de Godoy Bergallo Carlos Frederico Duarte da Rocha

uerJ

edl

Rio de Janeiro 2000

ALVES, M. A. S.; ROCHA, C. F. D.; VAN SLUYS, M.; BERGALLO, H. G. Guildas de Beija-flores polinizadores de quatro espécies de Bromeliaceae da Mata Atlântica da Ilha Grande, RJ: Composição e taxas de visitação. In: M. A. S. Alves; J. M. C.

Cardoso; M. Van Sluys; H. G. Bergallo; C. F. D. Rocha. (Orgs). A Ornitologia no Brasil: Pesquisa Atual e Perspectivas. 1 ed.

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Guildas de Beija-Flores Polinizadores de Quatro Espécies de Bromeliaceae de Mata Atlântica da Ilha Grande, RJ,

Brasil: Composição e Taxas de Visitação

Maria Alice dos Santos Alves, Cor/os Frederico Duarte da Rocha, Monique Van Sluys e Helena de Godoy Bergallo

As flores de bromeliáceas constituem uma importante fonte de néctar para muitas espécies de beija-flores em Mata Atlântica (ex.: Snow e Snow, 1986; Araújo et al., 1994; Van Sluys e Stotz, 1995), entre outros polinizadores (ex.: morcegos - Sazimaef al., 1995,insetos - Gardner, 1986).

Em muitas espécies de bromélias, o conjunto de características florais para maximizar a atração de um determinado grupo de polinizadores (síndrome de polinização) (Baker e Hurd, 1968;Waseret ai; 1996) resulta na atração predominantemente de beija-flores(ornitofilia),embora outros polinízadores também possam estar associados ao sistema. Os beija-flores têm sido con- siderados como os principais polinizadores de bromeliáceas, as quais pos- suiriam flores primariamente omitófilas (McWilliams,1974;Smith e Downs, 1974; Sick, 1997). Características como o tamanho e a coloração da flor, e a taxa de produção de néctar, variam fortemente entre as flores das dife- rentes espécies de bromélia (ex.: Gardner, 1986). Assim, o nível de especificidade, em termos da taxa com que as diferentes bromeliáceas são visitadas por beija-flores, deve variar, pois estes últimos dependem do néctar disponível nas flores para sua manutenção metabólica (Freeman et al., 1984). Portanto, deve ser esperado que, mesmo entre espécies de bromeliáceas ornitófilas simpátricas, a taxa de visitação e a guilda de beija- flores polinizadores varie, com algumas sendo predominantemente ornitófilas, enquanto outras seriam polínizadas por diferentes grupos ani- mais, com as diferentes espécies de beija-flores visitando-as em variados graus.

Na área de Mata Atlântica da Vila Dois Rios, na Ilha Grande, a comunidade de bromeliáceas é composta por pelo menos dezenove espé-

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A ORNITOLOGIA NO BRASIL

cies, as quais ocupam os mais variados tipos de substratos e estrato vertical na mata (Almeida et al.,1998). Observações dos autores do presente estudo mostraram que várias espécies de bromélias da comunidade local são vi- sitadas por beija-flores e sugeriram que as freqüências de visitação variam entre as espécies de plantas.

Para conhecer a guilda de beija-flores associada a uma determi- nada espécie de bromélia e avaliar a taxa de visitação de cada espécie de planta por diferentes espécies de beija-flores, atuando como agentes polinizadores, nós estudamos os polinizadores de quatro espécies de Bromeliaceae epífitas na Mata Atlântica da Ilha Grande, RJ. Visamos a responder as seguintes perguntas: i) qual a guilda de polinizadores asso- ciada a cada uma das diferentes espécies de bromélias estudadas? ii) Quais as taxas (visitas/unidade de tempo) com que as flores das diferentes espé- cies de bromélias são visitadas por beija-flores? iii) Quais espécies de bromélias, entre aquelas estudadas, possuem maior similaridade na guilda de beija-flores polinizadores? iv) Em que extensão as espécies de beija-flores estudadas diferem na largura de nicho alimentar (medida em termos da heterogeneidade de flores das diferentes espécies de bromélias utilizadas)?

Material e métodos

Area de Estudo

O estudo foi realizado em uma área de Mata Atlântica secundária e em área antrópica da Vila Dois Rios (23011' S, 440 12' W), na Ilha Grande, que se localiza no sul do Estado do Rio de Janeiro, sudeste do Brasil (Fi- gura 1). A Ilha Grande, que possui uma área de 19.000 hectares, é coberta por densa Floresta Atlântica em diferentes estágios de regeneração, devido à degradação resultante da ação antrópica na região ao longo dos últimos séculos (a ilha constituiu uma importante área de plantio de café, milho e açúcar no passado). Alguns remanescentes de floresta pouco perturbada podem ser encontrados nas porções centrais de acesso mais difícil da ilha, devido ao relevo acidentado (Araújo e Oliveira, 1988; Almeida et al., 1998). Nas últimas décadas a taxa de ocupação do solo foi sendo reduzida sucessivamente, especialmente nos últimos anos, com a trans- formação da área em um Parque Estadual (Araújo e Oliveira, 1988). A

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GUllDAS DE BEUA-FlORES POllNIZADORES

pluviosidade anual na área é de aproximadamente 2.200 mm, com tem- peratura média anual em torno de 23° C.

Métodos de coleta e análise

Utilizamos para o estudo quatro espécies de bromélias com ca- racterísticas florais que incluem a ornitofilia: Vnesea procera, V. vngnns, Tillnndsia stricta eAechmea grncilis. Na região da Vila Dois Rios estas espé- cies são abundantes e facilmente encontradas (Almeida et al.,1998). Para cada espécie de bromélia analisamos as espécies de beija-flores a elas as- sociadas e medimos a taxa de visitação por unidade de tempo (expressa como número de visitas/hora). Registramos também o número de visitas por outros polinizadores, como os insetos ou outras eventuais espécies de aves, para estimar a proporção da taxa de visita de cada polinizador. Re- alizamos o estudo em duas estações reprodutivas das plantas (novembro de 1996 a maio de 1997 e novembro de 1997 a maio de 1998).Para cada espécie de bromélia, durante seu período de floração, estabelecemos 3 a 5 pontos fixos de observação. A faixa de altura das bromélias estudadas foi de 1,5 a 5,0 m de altura acima do solo(A. gracihs, 1,5 a 2,5 m; T. stncta, 1,5 a 4 m; V. vagans 1,5 a 5,0 m e V.procera 2,5 a 4,0 m).

As flores das bromélias foram marcadas e observadas quanto aos seus polinizadores, por um observador ao longo do período diurno (6:00- 18:00h). As plantas foram individualmente marcadas com o uso de uma etiqueta plástica contendo o número da planta e a identificação da espécie.

As flores de indivíduos marcados foram observadas por um período regu- lar de 20 minutos a cada meia hora entre 6:00 e 18:00h (para V.procera, o período de observação foi de 10 minutos a cada meia hora). Com o auxílio de binóculos (8 x 40), registramos as espécies de beija-flores e o número de visitas por unidade de tempo (número de visitas por hora). Uma visita foi considerada como a ação completa desde a chegada do polinizador a uma flor da inflorescência, a inserção do bico na corola para a obtenção do néctar e a saída por completo daquela flor. No caso de insetos, uma visita foi considerada quando estes tocaram as estru- turas reprodutivas das flores. O método de observação foi o do indiví- duo focal (Altmann, 1974).

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A ORNITOLOGIA NO BRASIL

Para estimar a guilda de beija-flores polinizadores de cada bromélia, registramos o número de espécies de beija-flores associados a cada espécie de bromélia e calculamos os valores da taxa de visitação de cada bromélia pelas diferentes espécies de beija-flores. Estimamos também a pro- porção de visitas realizadas por outros agentes polinizadores além dos beija- flores.Adicionalmente, registramos a coloração da corola de cada espécie de bromélia e medimos a profundidade média desta (em mm), com o uso de um paquimetro. A similaridade entre a guilda de beija-flores polinizadores asso- ciada às plantas foi estimada pelo índice de Jaccard

S= 1/

(a+b)

-I

(Magurran, 1988)em que Sé o valor da similaridade na guilda de beija-florespolinizadores entre duas espécies de bromélias, aé o número de espécies de beija-flores associados à bromélia A, bé o número de espécies associadas à bromélia B e,

1

é o número de espécies comuns a ambas espécies de bromélias.

A extensão do nicho alimentar de flores de bromélias (em termos da heterogeneidade de flores utilizadas como recurso) de cada espécie de beija-flor foi estimada pelo índice de Simpson :Bi;= 1/ SPi 2, (Magurran, 1988)em quep;é a proporção de indivíduos da espécie de beija-flor ivisitan- do as flores da bromélia z

Resultados

Encontramos um total de seis espécies de beija-flores associadas às bromélias estudadas (Tabela 1). Todas as quatro espécies de Bromeliaceae estudadas foram visitadas por beija-flores,mas a taxa de visitaçãovariou com a espécie de bromélia. A bromélia Vnsen procera foivisitada por cinco espécies de beija-flores, enquanto Vnesea vagans por quatro, Tillandsia strictapor duas eA. gradlis por uma (Tabela1).Além de ser visitada por beija-flores,T.stricta foi visitada por outra espécie de ave, Coereba jlaveoln, apenas uma vez. Em todas as espécies de bromélias as flores foram visitadas tanto por beija-flores (Tabela I),quanto por insetos, mas a proporção de visitas por beija-flores e por outros polinizadores (como os insetos) diferiu entre as espécies de bromélias (Tabela 2).A proporção de visitação por beija-flores em relação ao total de visitas registradas para todos os grupos de polinizadores foi supe- rior em V.procera (92%), intermediária em V. vagans (48,3%) e em T. stricta (34%) e consideravelmente mais baixa em A. gractlis (3,3%) (Tabela 2).

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GUILDAS DE BEUA-FlORES POllNIZADORfS

Tülandsta stricta teve o maior número de flores abertas por dia por inflorescência (4 a 6 flores), enquanto V. vngnns eA. gracihs tiveram 3 a 4 e, em V. procern, apenas uma ou duas flores. As duas espécies de VrieseJ1 tiveram flores de coloração amarela e profundidade de corola similares (20 a 25 mm). EmA. grncllis, com flores de cor violácea e rosa, a profundidade da corola foi de 15 a 20 mm e, em T. stncta, que possui flores de cor rosa, a profundidade da'corola foi de 12 a 15 mm.

Em termos de visitas por unidade de tempo, a taxa geral de visitação por beija-flores variou acentuadamente entre as espécies de bromélias, sendo maior em T.stricta (6,7 visitas/h), decrescendo para 3,5 visitas/h em V. vngnns, 1,7 visitas/h em V. procern e sendo mais baixa em A. grncllis (0,3 visitas /h).

A espécie de beija-flor com a maior largura de nicho alimentar (em termos de flores de diferentes espécies de bromélias visitadas) foi Amazilia fimbriata (Bij = 2,94), decrescendo acentuadamente para Melanothrochitusfuscus (Bij= 1,72),Thalurania g!aucopis (Bij= 1,65) ePolytmus guainumbi (Bij= 1,41), e sendo menor para Colibri serrirostris e Eupetomena

macroura (Bij'= 1,00).

As maiores similaridades na guilda de beija-flores entre as bromélias estudadas (que foi de 50%) ocorreram entre as duas espécies do gênero Vnesea (V.procera e V. vl1gl1ns)e entre V. vagans eT.stncta. As bromélias T. stricta e A. gracilis não compartilharam nenhuma espécie de beija-flor entre seus polinizadores (Tabela 3).

Discussão

Os dados no presente estudo indicaram que os beija-flores cons- tituem agentes polinizadores para as quatro espécies de bromélias estuda- das na Mata Atlântica da Ilha Grande, mas que a relevância de cada espé- cie de beija-flor como agente polinizador varia entre as espécies de bromélia Esta variação na importância relativa dos beija-flores como polinizadores foi inversamente proporcional à taxa de visitas por insetos em cada uma das plantas estudadas. Um dos resultados que mais merece destaque no presente estudo é a considerável taxa de visitação realizada por insetos em três das quatro espécies estudadas. Entre as bromelíáceas, os beija-flores

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A ORNITOLOGIA NO BRASIL

têm sido considerados os seus principais polinizadores (McWilliams, 1974;

Smith e Downs, 1974;Sazimaet ai, 1989;Vogel, 1990),sendo considerados neste processo mais importantes do que os insetos (Smith e Downs, 1974;

Vogel, 1990).Nossos dados mostraram que todas as espécies de bromélias incluíram insetos como seus polinizadores (Tabela 2), predominantemente himenópteros e lepidópteros (obs. pes.).

Além disso, a taxa de visitação foi maior por insetos em T. stricta (66 %) e emA. gracilis (96,7 %), enquanto em V. vagans beija-flores e insetos visitaram de forma proporcionalmente similar. Entretanto, para V. vagans as observações foram feitas em área antrópica e área de Mata Atlântica pouco perturbada. Em V. procera, estudada apenas em área antrópica, a polinização ocorreu em grande extensão por beija-flores (Tabela 2). No entanto, em V. vagans, os beija-flores visitaram mais (78,8%, N=363) que insetos (21,2%, N=363) somente na área antrópica. A diferença relativa- mente acentuada na taxa de visitação por insetos nas duas espécies de lIrieseapode ser devida à diferença nos micro-hábitats amostrados. No caso de V. vagans, por exemplo, os indivíduos observados na área antrópica localizaram-se mais ao alto (5,0 m) do que na área pouco perturbada antropicamente (1,5 m).

Embora não tenhamos analisado a eficiência de cada agente polinizador, nossos dados mostram que, pelo menos para as bromélias que estudamos, o papel dos insetos corno polinizadores deve não só ser consi- derado não negligenciável mas, para algumas espécies de bromélias, ele parece ser importante (corno é o caso de A. gracilis). A falta de estudos sobre polinização e de medições no campo de taxas de visitação em bromélias limita as nossas interpretações sobre a real importância relativa de insetos e de beija-flores corno polinizadores destas plantas. Éprovável que, com o acúmulo de informações sobre a polinização de espécies de bromeliáceas, a relevância dos insetos corno seus agentes polinizadores seja revista. Características da biologia floral, corno o tamanho e a cor da flor, a profundidade da corola, o tipo e a estrutura da inflorescência e a cor serão determinantes no grau relativo com que uma determinada espécie seja polinizada por insetos ou por beija-flores.Por exemplo, o escapo ascendente ou descendente longo permite a aproximação de um beija-flor à flor e, con- seqüentemente, a utilização desta como fonte de néctar. Assim, para as bromélias que possuam inflorescências com escapo longo (ascendente ou

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GUILDAS DE BEIJA-FLORES POllNIZADORES

descendente), a polinização por beija-flores deve ocorrer com relativa fre- qüência, conforme observado no presente estudo. Seria de se supor que as espécies de bromélias com inflorescências do tipo nidular não devam incluir beija-flores entre seus polinizadores mais freqüentes, mas principalmente insetos. Embora o beija-flor Heliothryx aurita visite flores de Nidularium

scheremetietoi: (Martinelli, 1997), suas taxas de visitação não foram mensuradas.

As quatro bromélias estudadas foram utilizadas como fonte de recurso por um total de seis espécies de beija-flores polinizadores mas nem todas as bromélias foram polinizadas por todas as espécies de aves, indi- cando que as características específicas das flores de cada planta, do seu hábitat ou do período do ano em que florescem podem afetar a composição da guilda e a taxa com que são visitadas pelas espécies de beija-flores.

Algumas espécies, como V procera, tiveram cinco espécies de beija-flores associadas, enquanto outras apenas uma espécie (ex.: A.gracilis). Similar- mente, algumas bromélias tiveram uma taxa de visitação comparativamen- te alta (ex.: T. stricta), enquanto em outras esta taxa foi consideravelmente mais baixa (ex.: A.gractlis). A maior taxa de visitação por beija-flores en- contrada em T.stricta provavelmente resulta do fato de ser esta uma das espécies de bromélia mais abundantes na área (Almeida et al., 1998), carac- terizando um recurso mais fácil de ser localizado e mais vantajoso pela disponibilidade, além de a mesma ser comum a ambientes abertos, o que supostamente facilitaria a localização, aproximação e utilização da flor como recurso por um beija-flor. Além disso, não sabemos em que extensão a disponibilidade de néctar relativamente regular, mas em pequenas quanti- dades, implicaria maior taxa de visitação. Contrariamente, A. gracilis teve uma baixa taxa de visitas em apenas uma das quatro plantas estudadas.

Uma possível explicação para a baixa taxa de visitas e reduzido número de plantas visitadas na mata da Ilha Grande poderia ser a esciofilia de A.

gractlis, a qual provavelmente resultaria em esta espécie vegetar em condi- ções menos favoráveis à localização, aproximação e utilização das suas flores pelos beija-flores no interior da floresta. Este fato resultaria em uma menor taxa de visitação, e por menos espécies de beija-flor, se comparado com as demais espécies de bromeliáceas que vegetam em condições mais abertas e, portanto, mais acessíveis e de mais fácil localização.

Em alguns grupos de bromeli-ceas, como para o gênero Tlllandsia, as similaridades nas características florais de certos conjuntos de espécies

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A QRt.ITOlOGIA NO BRASil

resultam em guildas de polinizadores similares (Gardner, 1986).Os nossos dados estão de acordo com esta idéia para as espécies do gênero Vnesea e sugerem que a semelhança na síndrome de polinização entre as flores de algumas das bromélias da área da Ilha Grande afeta a similaridade na guilda de polinizadores entre diferentes pares de bromeliáceas. As duas espécies de Vnesea tiveram considerável similaridade na guilda de seus beija-flores associados e isto parece resultar da similaridade na síndrome de polinização das flores destas espécies (flores amarelas, escapo avermelhado, tamanho e forma do cálice e corola similares).Épossível que parte da guilda de beija-flores de uma determinada espécie de bromélia (ou de espécies próximas taxonomieamente e similares na morfologia) ten- da a se manter entre diferentes localidades de ocorrência da planta - evidentemente desde que os mesmos grupos de espécies de polinizadores estejam presentes. Embora faltem dados sobre polinização para a maioria das espécies de bromeliáceas, para Vnesea neoglutinosa (uma espécie taxonomicamente próxima de V. procera, dificilmente distinguível desta última e que ocorre do sul da Bahia até Santa Catarina), estudos mostra- ram que a guilda de seus polinizadores não apenas era composta predo- minantemente de beija-flores, como, de forma geral, por algumas das mesmas espécies encontradas no presente estudo (ex.:Amaziha fímbriata, Eupetomena macraura, Polytmus guainumbt) (Van Sluys e Stotz, 1995). Isto mostra não apenas a importância de beija-flores como polinizadores destas bromélias mas também é sugestivo de que a guilda dessas aves possa se manter relativamente constante independentemente da localidade em que a bromélia esteja ocorrendo.

Contrariamente, o fato de as bromélias T. stricta eA. gracilis não terem compartilhado nenhuma espécie de beija-flor na sua guilda de polinizadores poderia ser considerado relativamente inesperado, já que as duas bromélias possuem flor com profundidade de corola relativamente aproximada (ambas de 15 a 20 mm) e coloração predominante rosa. Isto representaria uma fonte similar de atração para beija-flores orientados para esta coloração e com necessidades metabólicas semelhantes (seria de se supor, por exemplo, que o tamanho floral afeta a quantidade de néctar), o que deveria resultar em uma semelhança na sua guilda de beija-flores.

Contudo, não se pode negligenciar as diferenças nomiero-habitat preferen- cial de cada espécie de bromélia na floresta e em áreas perturbadas, o que

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GUILDAS DE BEUA-FLORES POLlNIZADORES

deve afetar a guilda de polinizadores locais.Aechmea graezlisé uma bromélia esciófilaque vegeta nas porções inferiores da floresta, até uma altura máxima de 12 m, e em áreas de mata degradada só vegeta até 2 m de altura (Almeida et al., 1998). Por outro lado, T strieta é uma heliófila que na floresta pouco alterada só vegeta sobre os galhos nas porções mais eleva- das no dossel (25-35m de altura) e, nas áreas degradadas (incluindo áreas urbanizadas), vegeta sobre qualquer tipo de substrato e qualquer altura já que possuem acentuada preferência por micro-hábitats com radiação solar direta (Almeida etal.,1998).Éprovável que tais diferenças acentuadas no micro-hábitat preferencial de cada bromélia resultem em que o universo de beija-flores polinizadores a que estejam expostas seja concomitantemente afetado, resultando na não-sobreposição encontrada na guilda de seus beija- flores polinizadores. Embora a faixa de altura dos indivíduos observados das diferentes espécies de bromélias tenha em geral se sobreposto ampla- mente no presente estudo, é possível que parte das diferenças específicas observadas na taxa com que são visitadas por beija-flores ou por insetos seja explicada por tais diferenças na altura de estabelecimento dos indiví- duos, como parece ser o caso de V. vagans.

Os dados obtidos sobre a largura de nicho alimentar dos beija- flores (medida em termos da heterogeneidade de flores das espécies de bromélias utilizadas) sugerem que as espécies de beija-flores estudadas diferem acentuadamente na extensão de diferentes flores de bromélias que utilizam. A largura de nicho foi consideravelmente maior para o beija-flor A.fimbriata do que para quaisquer das outras espécies. Esta espécie de beija-flor tem sido relatada em outras áreas de polinizar diferentes espécies de plantas, sejam bromeliáceas (ex.: Van Sluys e Stotz, 1995;Araújo, 1996) ou plantas de outras famílias (ex.: Araújo, 1996;Oliveira, 1998).Na região da Mata Atlântica de Picinguaba, no Estado de São Paulo, A. jimbn'ata poliniza plantas de pelo menos treze famílias (Araújo, 1996). Adicional- mente, em área do cerrado do Brasil central, A. jimbriata foi considerada como uma espécie de beija-flor com estratégia de forrageamento generalista (Oliveira, 1998).A maior largura de nicho encontrada no presente estudo para esta espécie de beija-flor é compatível com as tendências encontradas para a espécie em outras áreas e é indicativo de que esta espécie seja generalista. Embora requeira teste específico de hipótese avaliando esta questão, é provável que esta amplitude de nicho resulte de características

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A 0RN10I.0GIA NO BRASil

generalizadas da morfologia e tamanho do bico deA. fimbriata (se compa- rado com outras espécies de beija-flor), que favoreceriam a utilização de flores com uma gama de tamanho e forma mais variada. Adicionalmente, no presente estudo, Thalurania glaucopis foi uma das espécies com maior largura de nicho entre os beija-flores e isto é compatível com o encontrado para a espécie em outras áreas de Mata Atlântica. Na região de Picinguaba, T. glaucopis foi, em conjunto comA.fimbriata, a espécie que visitou maior número de flores de diferentes espécies de plantas (Araújo, 1996). Isto reforça a idéia de generalização em termos de recursos florais explorados por estas espécies de beija-flor nas áreas em que ocorrem.

Na área de Mata Atlântica da Ilha Grande, as quatro espécies de bromeliáceas estudadas, embora constituam uma fonte de recurso alimen- tar relevante para as seis espécies de beija-flores a elas associadas, apresen- taram guildas de polinizadores que variaram consistentemente para cada espécie de bromélia, tendendo, entre as plantas estudadas, a ser mais simi- lar entre aquelas com semelhanças nas características florais e no micro- hábitat que ocupam (em termos de gradiente vertical e tipo de substrato).

Adicionahnente, a taxa consideravehnente superior com que insetos visita- ram a maioria das espécies de bromélias é sugestiva de que estes devam possuir uma relevância, como polinizadores de bromeliáceas, superior ao que se supõe.

Agradecimentos

Este estudo é parte do Programa de Ecologia, Conservação e Manejo de Ecossistemas do Sudeste Brasileiro e do Projeto de Ecologia de Vertebrados do Sudeste do Brasil, ambos do Laboratório de Ecologia de Vertebrados do Setor de Ecologia, Instituto de Biologia Roberto Alcântara Gomes (IBRAG),da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.Agradece- mos ao pessoal do Centro de Estudos Ambientais e Desenvolvimento Sus- tentável - CEADS, no Campus Regional da UERJ na Ilha Grande, e da Coordenadoria de Campi Regionais - CCR, Isabel M. Gurgel, Márcio T.

Ribeiro Francisco e José C. Dansinger, pelas facilidades locais.Carla Cardozo, Renato Mangolin, Maurício B. Vecchi e Cristiane A. Giani ajudaram no trabalho de campo. À Sub-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa - SR-2,

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GUllDAS DE BEUMlORES POUNIZAI>ORES

FAP /SR-2 e, especialmente, a Reinaldo Guimarães, pelo contínuo apoio à pesquisa na área. Agradecemos a Elton Leme pela identificação das bromélias estudadas. Davor Vrcibradic e L. Geise gentilmente revisaram o texto, oferecendo valiosas sugestões. Agradecemos também aos revisores Fábio Scarano e Andrea Costa, pelas importantes críticas e sugestões que melhoraram muito o manuscrito e a Paulo José A. Rêgo pela confecção da figura. Ao Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq, pelas bolsas de Produtividade em Pesquisa para M.A.S. Alves (Processo n' 301 524/88-2), C.ED. Rocha (n~300 819/94-3), M. Van Sluys (n~301 117/95-0) e para H.G. Bergallo (n'301 372/95-0).

ABSTRACf. Guilds of pollinator hummingbirds in four Atlantic Forest Bromeliaceae species in Ilha Grande, RJ, Brazil: composition and visiting rates. We studied guilds of hummingbird pollinators of four 8romeliaceae species of Atlantic Forest in Ilha Grande, RJ. The bromeliad species studied were Vnesea procero, 1/vogons, Tillondsio stricta and Aechmea graalis, from which we recorded the hummingbird species acting as pollinator agents, and their visiting rate (number of visits per hour) from November to May. All the bromeliads were visited by hummingbirds and also insects, but the visiting rate varied according to each bromeliad specíes. Vrieseo procero was visited by five hummingbird species (Amazilia fimbriata, Colibri serrirostris, Eupetomena macroura, Thalurania g/oucopis and Melanotrochüus fuscus), 1/ vagons by four (A.

fimbriata, T. g/tlllcopis, M fuscus and Poiythmus guainumbz), T.stricta by two (A.fimbriata and P. gutlinumbl) and A. grocrfis was visited by only one species(T. g/aucopis). The visiting rate by hummingbirds was higher in T. stricta (6.7 visits/h), intermediate in 1/vagans, (:?.5visits/h) and 1/

procero (1.7 visits/h) and lowest inA. gracrfis (0.3 visits/h). Our results indicated that the hummingbirds are pollinators of four bromeliad species, but they differed in their relative importance as pollinator agents to each bromeliad species. The relative importance of hummingbirds as pollinators was proportionally inverse to the insects visiting rate (Hymenoptera and Lepidoptera) in each bromeliad species studied (T.

stncta 66%, A. grocilis 96.7%, 1/vogans 51.7%, and 1/procera 8%). Amazilia fimõria and T.glaucopis visited more flowers than the other hwnmingbird

species, which suggests that these species are generalists in terms of the

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A ORNITOLOGIA NO BRASIL

flower resources they exploit. The relatively high rate with which insects visited most of the bromeliad species suggest that they are important pollinator agents of bromeliads.

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(15)

A ORNITOlOGIA NO BRASil

1iúJdu1:Espécies de bromeliáceas estudadas na área de Mata Atlântica da Ilha Grande, RJ, e as diferentes espécies de beija-flores polinizadores a elas associadas.

BROMÉLlA BEIJA-FLOR

Vriesea procera

Amazilia fimbriata Colibri serrirostris Eupetomena macroura

Talurania glaucopis Melanotrochilus fuscus

Vriesea vagans

Amazilia timbriata Thalurania glaucopis Melanotrochilus fuscus

Polythmus guainumbi

Tillandsia stricta Amazilia fimbriata

Polythmus guainumbi

Aechmea gracilis Thalurania glaucopis

Tabela2:Proporções relativas de visitas por beija-flores e por outros grupos de polinizadores nas bromélias ~/esea procera, Vriesea vagans, Tillandsia stricta eAechmea

gracilis na Mata Atlântica da Ilha Grande, Rio de Janeiro.

Bromélia Beija- Insetos Outras Número Taxa de Horas

flores ("Ia) aves total de visitação de obs.

("Ia) ("Ia) visitas por Beija-

flores (visitaslh )

Vriesea procera 92,0 8,0 O 199 1,7 132

Vriesea vagans 48,3 51,7 O 594 3,5 60

Tillandsia stricta 34,0 66,0 0,5 453 6,7 84

Aechmea gracilis 3,3 96,7 O 243 0,3 64

Tabelo3: Valores de similaridade (índice de Jaccard - C) encontrados entre pares de espécies de bromélias para a guilda de beija-flores de quatro espécies de bromeliáceas da

Mata Atlântica da ilha Grande. Vp = Vriesea procera; Vv = Vriesea vognns; Ts=Tütandsia stncta e Ag = Aechmea graciãs.

Espécie Vp Vv Ts Ag

Vp

Vv 0,50

Ts 0,17 0,50

Ag 0,20 0,25 O

(16)

GUllDAS DE BEUA-FlORES POlINIZADORES

- 22°00' ESTADO DO RIO DE JANEIRO

- 23°00'

Região da Bala da Ilha Grande

44°00'

I

42°00'

Figuro 1:Localização geográfica da Ilha Grande no Estado do Rio de Janeiro.

Referências

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