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ECLI:PT:STJ:2013: TBOLH.E1.S1

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ECLI:PT:STJ:2013:317.09.9TBOLH.E1.S1

http://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2013:317.09.9TBOLH.E1.S1

Relator Nº do Documento

Marques Pereira

Apenso Data do Acordão

24/09/2013

Data de decisão sumária Votação

unanimidade

Tribunal de recurso Processo de recurso

Data Recurso

Referência de processo de recurso Nivel de acesso

Público

Meio Processual Decisão

Revista negada a revista

Indicações eventuais Área Temática

direito civil - direito das obrigações / contratos em

especial / arrendamento urbano.

Referencias Internacionais

Jurisprudência Nacional

Acórdãos Do Supremo Tribunal De Justiça: -de 20-01-2010, De 15-11-2011, De 12-06-2012. Acórdãos Dos Tribunais Das Relações:

-da Rp De 23-02-2010, Da Rl De 16-05-2013, Da Rg, De 04-06-2013, Todos In Www.dgsi.pt;

-da Rp, De 28-03-2011 E Da Rc, De 15 De Novembro De 2011, Ambos, Na Cj, Ano Xxxvi, Tomo Ii, P. 207 E Ss. E Tomo V, P. 10 E Ss., Respectivamente;

-da Rp, De 22/5/1995, Cj Ano Xx, Tomo Iii, P. 219 E Ss.; -da Rc, De 10/12/1996, Cj Ano Xxi, Tomo 5, P. 40.

Legislação Comunitária

Legislação Estrangeira

Descritores

contrato de arrendamento; prédio rústico; arrendamento para fins não habitacionais; oposição à renovação; aplicação da lei no tempo;

(2)

Sumário:

I - Será de qualificar como arrendamento de prédio rústico o que tem por objecto um terreno, cuja utilização (a prática do futebol) constitui o fim principal do contrato e uma construção nele existente (destinada a balneário e vestuário), com uma função meramente complementar e subordinada em relação àquele.

II - O arrendamento em causa é um arrendamento de prédio rústico não sujeito a regime especial, regulado, com as necessárias adaptações, pelas regras aplicáveis aos arrendamentos urbanos para fins não habitacionais e em conjunto com o regime geral da locação civil, nos termos do art. 1108.º do CC (na redacção dada pela Lei n.º 6/2006).

III - O regime da denúncia/oposição à renovação do contrato pelo senhorio, aplicável aos

arrendamentos rústicos não sujeitos a regime especial, celebrados antes da entrada em vigor do RAU, é o previsto no regime geral da locação (arts.1054.º e 1055.º do CC).

Decisão Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

No Tribunal Judicial de Olhão, AA intentou acção declarativa, com processo ordinário, pedindo a condenação de BB a restituir-lhe o prédio urbano situado na ... na Rua ..., inscrito na matriz da freguesia da ... sob o artigo ...º e descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o número ... – ....

Alegou, em resumo, os seguintes fundamentos:

É a actual proprietária do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o número ..., por aquisição de ½ em partilhas de herança e aquisição de ½ por compra, factos que foram

levados ao registo em 8/11/2001 e 17/12/2001, respectivamente.

Esse prédio é composto por um parque desportivo e uma pequena arrecadação com a área descoberta de 5.000 m2 e coberta de 25 m2.

Em … de … de 19.., CC, seu avô paterno, cedeu o gozo do prédio ao Réu, pelo prazo de um ano, renovável por idênticos períodos, mediante pagamento da quantia mensal de 200$00, para a prática do desporto de futebol.

Em 24 de Janeiro de 2008, a Autora, por notificação judicial avulsa, comunicou ao réu que não queria a renovação do contrato de arrendamento do campo de futebol e por haver considerado cessado o arrendamento no dia 26 de Fevereiro de 2008, pediu a entrega do arrendado no prazo de sete dias após esta data.

O Réu não entregou o imóvel à Autora. Não foi apresentada contestação.

Julgou-se improcedente o incidente da falta de citação.

Consideraram-se confessados os factos alegados pela autora e proferiu-se sentença que julgou improcedente a acção, absolvendo o Réu do pedido.

(3)

A Autora apelou para a Relação de Évora que, por acórdão de 17 de Maio de 2012, na procedência do recurso, revogou a sentença, condenando o Réu a restituir à Autora o prédio indicado na petição inicial.

Inconformado, o Réu recorreu, de revista, formulando as seguintes conclusões (transcrição): I- O contrato de arrendamento foi celebrado em … de … de 19…, entre CC e o R BB, altura em que vigorava o Cód. Civil aprovado pelo Dec. Lei n.º 47344, de 25/11/66.

II- A acção foi proposta na vigência do NRAU, aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro.

III- O prédio objecto deste contrato de arrendamento encontra-se registado na Conservatória do Registo Predial de …, sob o n.º ..., descrito como "PRÉDIO URBANO - Rua. ... - destinado à prática do desporto, composto de parte de um parque desportivo e de uma pequena arrecadação", sito na ..., na Rua ..., inscrito na matriz da Freguesia da ... sob o artigo ..., encontrando-se, pelas inscrições G2, G3 e G4 (esta datada de 17 de Dezembro de 2001) inscrita a aquisição a favor de AA.

IV- Estando perante um prédio urbano, descrito como tal na descrição na Conservatória do Registo Predial, e sendo o fim a prática do desporto de futebol, e a possibilidade de utilização do

compartimento que faz parte do artigo urbano n.º … para balneário e vestuário, daqui se conclui que o fim do contrato não é habitacional (artigo 1067.º, n.º 1, do Código Civil), ainda mais, não sendo sequer aquele um espaço habitável.

V- Estando perante um arrendamento urbano não habitacional, celebrado antes do Decreto-lei n.º 275/95, de 30 de Setembro, ser-lhe-á aplicável o regime previsto nos artigo 27.º e seguintes da Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro e o regime previsto nos artigo 1022.º e seguintes do Código Civil no que não estiver regulado naquele regime.

VI- A aplicação no tempo do NRAU consta do respectivo art. 59 nº 1, segundo o qual ele se aplica "aos contratos celebrados após a sua entrada em vigor, bem como às relações contratuais

constituídas que subsistam nessa data, sem prejuízo das normas transitórias"; estas normas constam dos arts 26 a 28 NRAU.

VII- Da conjugação dos arts 26, 27 e 28 dessa Lei resulta que o legislador pretendeu que aos

contratos de arrendamento para fins não habitacionais (assim como aos contratos de arrendamento habitacionais celebrados antes do RAU), anteriores ao D.L. nº 257/95, de 30/9, não se aplique a regra da denúncia livre por parte do senhorio.

VIII- Desta forma, o legislador manteve em vigor os antigos regimes, relativamente aos contratos celebrados à sua sombra; as disposições transitórias acabam por funcionar como não tocando nos anteriores regimes do arrendamento urbano, em matérias como a denúncia ou a oposição à

renovação do contrato.

IX- O Tribunal recorrido fez uma errada interpretação das apontadas normas. X- De onde, errou de direito o acórdão recorrido.

Houve contra-alegações.

Colhidos os vistos, cumpre decidir. Factos provados:

a) A autora é dona e legítima possuidora do prédio composto de um parque desportivo e de uma pequena arrecadação com a área descoberta de 5.000 m2 e coberta de 25 mº2, situado na ... na Rua ..., inscrito na matriz predial urbana da freguesia da ... sob o artigo ...º e descrito na

(4)

Conservatória do Registo Predial de … sob o número ....

b) Em 26 de Fevereiro de 1969, o avô da autora, CC, e a ré BB, representada pelo seu presidente DD, por escrito que denominaram contrato de arrendamento declararam o seguinte:

“a) Que o primeiro outorgante é legítimo dono de uma courela de terreno na povoação de ... … inscrito na matriz respectiva daquela referida freguesia da ... sob o nº ….

b) Que ele primeiro outorgante dá por este contrato de arrendamento aquele seu terreno ao segundo outorgante nos termos e sob as cláusulas seguintes:

1ª O arrendamento é feito por um ano, considerando-se renovável enquanto as partes entenderem. 2ª No terreno arrendado encontra-se um pequeno compartimento que faz parte do artigo urbano nº … e que poderá ser utilizado pelo segundo outorgante exclusivamente para balneário e vestuário. 3ª O terreno destina-se apenas à prática do desporto de futebol não podendo o segundo outorgante dar-lhe qualquer outro destino ou utilizá-lo em qualquer outro fim.

4ª A renda é esc. 200$00 (Duzentos escudos) mensais paga no primeiro dia do mês a que respeita …”

c) Em 12 de Março de 1969, a ré enviou uma carta a CC onde consta o seguinte: “(…) a Direcção em sua reunião só agora decidiu o que passo a expor:

1) Pagar os 200$00 mensais pelo aluguer do campo de futebol, a partir do corrente mês de Março de 1969 (inclusive).

2) Não poder utilizar a porta do armazém que dá acesso ao referido Campo sem prévia autorização da Direcção vigente.

3) Que a cobrança do aluguer seja efectuada nesta localidade até ao dia 6 de cada mês. 4) Que V. Exª se digne, por meio de escrito, fazer-nos constar que concordou com a nossa decisão.”

d) Por notificação judicial avulsa, requerida pela autora e executada em 24/1/2008, a Ré, na pessoa do presidente da Ré, EE, foi notificada, além do mais, o seguinte:

“(…) 3º O arrendamento teve início no dia 26 de Fevereiro de 1969 e foi celebrado pelo prazo de um ano renovável.

4º O único fim do arrendado é o da prática de futebol.

5º O prazo de arrendamento em curso termina em 26 de Fevereiro de 2008.

6º Dado tratar-se de arrendamento não vinculativo, a requerente não deseja a continuação do mesmo e põe termo ao contrato de arrendamento celebrado com a requerida com efeitos no primeiro dia posterior a 26 de Fevereiro de 2008.

7º O prédio deverá ser entregue à requerente livre de todos os pertences e bens da requerida, no prazo de sete dias após 26 de Fevereiro de 2008.

Matéria de direito:

Sabido que o recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente – sem prejuízo de questões que sejam do conhecimento oficioso do tribunal –, a nossa análise tem de incidir,

essencialmente, sobre duas questões:

- Da qualificação do contrato de arrendamento em causa; - Do regime de denúncia do senhorio.

Primeira questão:

No acórdão recorrido, qualificou-se o arrendamento em causa como arrendamento de prédio rústico não abrangido pelo regime do arrendamento rural (na lei vigente à data da

(5)

celebração do contrato) ou arrendamento rústico não sujeito a regime especial (na lei actual). Para o Recorrente, trata-se antes de um arrendamento urbano, como se considerou na 1.ª instância.

Vejamos.

O arrendamento será urbano ou rústico consoante recaia sobre um prédio urbano ou sobre um prédio rústico.

Nos termos do art. 204, n.º 2 do CC,

“Entende-se por prédio rústico uma parte delimitada do solo e as construções nele existentes que não tenham autonomia económica, e por prédio urbano qualquer edifício incorporado no solo, com os terrenos que lhe sirvam de logradouro”.

Para os casos duvidosos, a doutrina e a jurisprudência têm defendido neste âmbito a teoria da afectação económica, que pondera o fim do aproveitamento do prédio.

Assim, como refere Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, [1] “em relação a qualquer prédio composto por edificações e terrenos terá que se verificar se a afectação económica

predominante é a utilização do terreno, á qual se subordinam as edificações existentes, ou se pelo contrário, o terreno é um mero logradouro, destinando a permitir o melhor aproveitamento do edifício, tendo carácter complementar e subordinado em relação a este”.

Como solução de recurso, preconiza António Menezes Cordeiro, [2] que não se provando factos que permitam uma qualificação como urbano, o prédio é rústico.

Sendo indiferente, para efeitos de qualificação civil, o tipo de inscrição matricial, dada a especificidade dos critérios fiscais, bem como o tipo de descrição predial; por outro lado, a lei não admite, aqui, o qualificativo de “prédio misto”. [3]

Resulta dos termos do contrato em causa, que o arrendamento tem por objecto um “terreno” e um “pequeno compartimento” que no mesmo se encontra.

O terreno arrendado destina-se apenas á prática do futebol.

O pequeno compartimento poderá ser utilizado exclusivamente para balneário e vestuário. O local arrendado tem 5.000 m2 de área descoberta e 28 m2 de área coberta.

Estamos, deste modo, perante um arrendamento, que tem por objecto um terreno, cuja utilização (a prática do futebol) constitui o fim principal do contrato e uma construção nele existente (destinada a balneário e vestuário), com uma função meramente complementar e subordinada em relação àquele.

Um arrendamento de prédio rústico não abrangido pelo regime do arrendamento rural, como era designado no Código Civil de 1967, no texto vigente à data da celebração do contrato. [4]

Ou, na designação actual, um arrendamento rústico não sujeito a regime especial (v. art. 1108 do Cód. Civil). [5]

Entendemos, portanto, ter sido correcta a qualificação do arrendamento em causa, efectuada no acórdão recorrido.

(6)

Discute-se nos autos se estamos perante um contrato de arrendamento sujeito ao regime de denúncia livre do senhorio, posição que foi a do acórdão recorrido e da qual o Réu discorda. O contrato foi, como se disse, realizado em 26 de Fevereiro de 1969 e a “oposição á renovação” pela senhoria efectuada por notificação judicial avulsa de 24 de Janeiro de 2008.

De acordo com o “princípio geral”, em vigor á data da celebração do contrato, no arrendamento em causa, o senhorio não gozava do direito de denúncia (art. 1095 do Cód. Civil, preceito integrado na Subsecção III, Denúncia do contrato, da Secção VIII, Arrendamento de prédios urbanos e

arrendamento de prédios rústicos não abrangidos na secção precedente; respeitante esta ao arrendamento rural). [6]

A situação modificou-se com o DL n.º 321-B/90, de 15 de Outubro, que, no respectivo Decreto Preambular, aprovou o RAU (art. 1), tendo revogado, expressamente, os artigos 1083 a 1120 do Código Civil ((art. 3, n.º 1, al. a)).

Nos termos do art. 6, n.º 1 do RAU, “aos arrendamentos rústicos não sujeitos a regimes especiais…aplica-se o regime geral da locação civil, bem como o disposto nos artigos 2 a 4, 19 a 21, 44 a 46, 74 a 76 e 83 a 85, 88 e 89 do presente diploma, com as devidas adaptações”. [7] Conforme sustenta, António Pais de Sousa, [8] reportando-se aos arrendamentos rústicos não sujeitos a regimes especiais: “trata-se daqueles arrendamentos a que o Código Civil de 1967 designava por arrendamentos de prédios rústicos não abrangidos pelo arrendamento rural”. Acrescentando que: “No Código Civil eles mereceram toda a protecção conferida ao arrendamento urbano, o que não sucede no RAU”.

Com efeito, nos arrendamentos rústicos não sujeitos a regime especial, o senhorio passou a poder denunciar o contrato nos termos do regime geral da locação civil, por não estar sujeito à restrição do n.º 2 do artigo 68 do RAU (uma vez, excluída a aplicação a tais arrendamentos dos arts. 69 a 72 do RAU).

Sendo esta possibilidade legal aplicável mesmo aos arrendamentos rústicos não sujeitos a regime especial, que tenham sido celebrados antes de 15 de Novembro de 1990, como no caso do contrato sub judice. [9]

A Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro (conhecida como NRAU), que entrou em vigor em 28 de Junho, devolvendo a disciplina substantiva do arrendamento urbano ao Cód. Civil, repôs (com a redacção dada pelo art. 3) os arts. 1064 a 1113. [10]

Pretendeu o legislador do NRAU, como se sabe, reduzir o vinculismo arrendatício.

Preceitua o art. 1108 (na redacção da Lei n.º 6/2006, como os demais artigos a seguir citados sem menção de origem) que:

“As regras da presente subsecção aplicam-se aos arrendamentos urbanos para fins não

habitacionais, bem como, com as necessárias adaptações e em conjunto com o regime geral da locação civil, aos arrendamentos rústicos não sujeitos a regimes especiais”. [11]

As disposições especiais do arrendamento para fins não habitacionais são as que constam dos arts. 1108 a 1113 do CC, regendo o art. 1110, n.º 1 e 2 sobre a “duração, denúncia ou oposição à renovação”.

(7)

Na Lei n.º 6/2006, a norma fundamental sobre a aplicação no tempo é a constante do art. 59, n.º 1: “O NRAU aplica-se aos contratos celebrados após a sua entrada em vigor, bem como às relações contratuais constituídas que subsistam nessa data, sem prejuízo do previsto nas normas

transitórias”.

Manda esta norma aplicar o NRAU às relações contratuais constituídas que subsistam na data da sua entrada em vigor, como é o caso em análise, sem prejuízo do previsto nas normas transitórias.

As normas transitórias, a que se alude, são as constantes dos arts. 26 a 28 do NRAU -normas que integram os Capítulo I (“contratos habitacionais celebrados na vigência do regime do arrendamento urbano e contratos não habitacionais celebrados depois do Decreto-Lei n.º 257/95, de 30 de Setembro”) e II (“contratos habitacionais celebrados antes da vigência do RAU e

contratos não habitacionais celebrados antes do Decreto-Lei n.º 257/95, de 30 de Setembro)”, do Título II, da Lei n.º 6/2006.

Aos contratos englobados no referido Capítulo II, manda o art. 28 aplicar, com as devidas adaptações, o previsto no art. 26.

Distinguindo este, nomeadamente, entre o regime transitório aplicável aos contratos de duração limitada (n.º 3) e aos contratos sem duração limitada (n.º 4). [12] / [13]

Como nota o Conselheiro Jorge Pinto Furtado, obra citada, p. 178, acerca do regime transitório do Capítulo II, do Título II, da Lei n.º 6/2006:

“A diferença dos dois períodos explica-se pela intenção de englobar todos os contratos que se encontram onerados com o vínculo da prorrogação forçada.

Em 15 de Novembro de 1990, com a entrada em vigor do RAU, passou a ser admitida a celebração de arrendamentos para habitação ditos de duração limitada, isto é, em que ultimado o prazo por que foram celebrados, podia o senhorio (embora com um aviso prévio de 1 ano) livremente não prorrogar o contrato, mas fazê-lo cessar.

Esta faculdade só veio a ser permitida relativamente aos arrendamentos não habitacionais (para comércio ou indústria, para exercício de profissão liberal ou para outro fim não habitacional) com a publicação do Decreto-Lei n.º 275/95.

É isto que justifica a referência a estes diplomas e às respectivas entradas em vigor. É a tais arrendamentos que se referem os arts. 27 e ss. da Lei n.º 6/2006”. [14]

Revertendo ao caso dos autos.

Ao tomarmos posição sobre a qualificação jurídica do contrato em causa, celebrado em 26 de Fevereiro de 1969, dissemos tratar-se de um contrato de arrendamento rústico não sujeito a regime especial.

Vimos, também, que os contratos de arrendamento rústicos não sujeitos a regime especial, com a entrada em vigor do RAU, passaram a ser livremente denunciados pelo senhorio, findo o prazo do contrato ou da respectiva renovação, nos termos gerais do art. 1055 do Cód. Civil, valendo tal solução mesmo quanto a arrendamentos anteriores a 15 de Novembro de 1990.

Ora, radicando a existência dos dois grupos de normas transitórias (os Capítulos I e II, do Título II da Lei n.º 6/2006) na intenção do legislador de englobar (no Capitulo II) todos os contratos que se

(8)

encontravam onerados com o vínculo da prorrogação forçada, não parece fazer sentido, segundo julgamos, a integração do arrendamento em causa no âmbito de aplicação das referidas normas transitórias do NRAU: no Capítulo II, por já não se tratar de contrato sujeito ao regime vinculistico; e no Capítulo I, por ter sido celebrado em data anterior ao quadro temporal a que este se refere. [15] Afastada, deste modo, a aplicação, ao caso, das normas transitórias dos Capítulos I e II, do Título II, do NRAU, atinentes à questão que nos ocupa.

No que diz respeito ao regime da “duração, denúncia ou oposição à renovação”, em sede de disposições especiais do arrendamento para fins não habitacionais, dispõe o art. 1110 o seguinte: “1.As regras relativas à duração, denúncia e oposição à renovação dos contratos de arrendamento para fins não habitacionais são livremente estabelecidas pelas partes, aplicando-se, na falta de estipulação, o disposto quanto ao arrendamento para habitação.

2.Na falta de estipulação, o contrato considera-se celebrado com prazo certo, pelo período de 10 anos, não podendo o arrendatário denunciá-lo com antecedência inferior a um ano”.

Nos termos do acordado entre as partes, no contrato realizado, o arrendamento é feito por um ano, considerando-se renovável enquanto as partes entenderem.

Quer dizer: houve estipulação das partes sobre o prazo (de um ano) e renovação (renovável enquanto as partes entenderem).

Não sendo caso de aplicação do regime subsidiário previsto na mencionada disposição especial do art. 1110.

Como se considerou no acórdão recorrido, o regime aplicável ao caso é, por conseguinte, o regime geral da locação civil:

Art. 1054 do CC (sob a epígrafe “Renovação do contrato”):

“1. Findo o prazo do arrendamento, o contrato renova-se por períodos sucessivos se nenhuma das partes se tiver oposto á renovação no tempo e pela forma convencionados ou designados na lei.

2. …”.

Art. 1055 do CC (sob a epígrafe “Oposição à renovação”):

“1. A oposição à renovação tem de ser comunicada ao outro contraente com a antecedência mínima seguinte:

(…)

b) Sessenta dias, se o prazo for de um a seis anos;

c) Trinta dias, quando o prazo for de três meses a um ano; (…).

2. A antecedência a que se refere o número anterior reporta-se ao fim do contrato ou da renovação”.

Assim sendo, tinha a Autora/senhoria o direito de se opor à renovação do contrato de

arrendamento em causa, nos termos do disposto nos arts. 1054, n.º 1 e 1055, n.º 1 do CC, pondo termo ao contrato.

A comunicação da Autora devia, contudo, ter sido efectuada com a antecedência de sessenta dias (e não de trinta dias), reportada ao fim do prazo da renovação, por ser aplicável a al. b) e não a al.

(9)

c) do n.º 1 do 1055 do CC. [16]

Não tendo deduzido contestação, o Réu não alegou em sua defesa a inobservância do prazo de antecedência mínima legalmente estabelecido.

Neste caso, embora o ponto venha sendo objecto de alguma controvérsia, pensamos que a melhor solução será a de considerar o prazo seguinte da renovação. [17]

Sumário:

I – Será de qualificar como arrendamento de prédio rústico o que tem por objecto um terreno, cuja utilização (a prática do futebol) constitui o fim principal do contrato e uma construção nele existente (destinada a balneário e vestuário), com uma função meramente complementar e subordinada em relação àquele.

II – O arrendamento em causa é um arrendamento de prédio rústico não sujeito a regime especial, regulado, com as necessárias adaptações, pelas regras aplicáveis aos arrendamentos urbanos para fins não habitacionais e em conjunto com o regime geral da locação civil, nos termos do art. 1108 do Código Civil (na redacção dada pela Lei n.º 6/2006);

III – O regime da denúncia/oposição à renovação do contrato pelo senhorio, aplicável aos arrendamentos rústicos não sujeitos a regime especial, celebrados antes da entrada em vigor do RAU, é o previsto no regime geral da locação (artigos 1054 e 1055 do Código Civil).

Decisão:

Nos termos e com os fundamentos expostos, nega-se a revista, considerando-se, no entanto, como data da extinção do contrato de arrendamento em causa o dia 26 de Março de 2009, ou seja, a data da renovação contratual subsequente.

Custas pela parte vencida. Lisboa, 24 de Setembro de 2013 Marques Pereira (Relator)

Ana Paula Boularot Azevedo Ramos

_______________________

[1] Direitos Reais, 3.ª ed., p. 64.

[2] Tratado de Direito Civil, III, Parte Geral, Coisas, 3.ª ed., p. 178.

[3] No mesmo sentido, v, ainda, entre outros, José Alberto C. Vieira, Direitos Reais, p. 159 e ss. [4] É, como se sabe, a lei vigente na altura da celebração do contrato de arrendamento que regula a sua forma e a sua natureza, urbana ou rústica (v. Ac. da RP, de 22 de Maio de 1995, CJ Ano XX, Tomo III, p. 219 e ss.

[5] Cfr. Código Civil Anotado, de Abílio Neto, 18.ª edição, p. 1056, nota 2, ao art. 1108, na qual, se dão exemplos das duas categorias de “arrendamentos para fins não habitacionais previstas no mesmo artigo”.

(10)

compreendem o arrendamento rural, regulado pelo DL n.º 294/2009, de 13-10, e o arrendamento florestal, que se rege pelo DL n.º 394/88, de 8-11, uma vez que o Código Florestal, aprovado pelo DL n.º 254/2009, de 24-9, foi revogado pela Lei n.º 12/2012, de 13-3, e represtinou o quadro legal existente à data da publicação do mencionado DL n.º 254/2009”.

Entendeu o Ac. da RC, de 10/12/1996, CJ Ano XXI, Tomo 5, p. 40, que os arrendamentos de prédios rústicos para fins não rurais ou florestais (v.g. desportivos) não são sujeitos a regime especial e podem ser denunciados para o fim do contrato ou da sua renovação (ponto I, do

respectivo Sumário). No caso, tratava-se do arrendamento de um prédio rústico para um campo de futebol.

[6] Dispunha então o art. 1095 do CC (sob a epígrafe “Princípio geral”) que: “Nos arrendamentos a que esta secção se refere, o senhorio não goza do direito de denúncia, considerando-se o contrato renovado se não for denunciado pelo arrendatário nos termos do art. 1055”.

Cfr. Abílio Neto, Leis do Inquilinato, Notas e Comentários, 6.ª ed., p. 195.

[7] Estando o regime geral da locação civil previsto nos arts. 1022 a 1063 do CC. [8] Anotações ao Regime do Arrendamento Urbano (RAU), 6.ª ed., p. 76.

Conforme Pereira Coelho, in Breves Notas ao Regime do Arrendamento Urbano, RLJ Ano 125, p.259, o n.º 1 do art. 6 do RAU só se aplica aos arrendamentos rústicos não rurais nem florestais “para outro fim” (que não seja o exercício de comércio, indústria ou profissão liberal pelo

arrendatário), devendo tal norma ser, portanto, objecto da correspondente interpretação restritiva. [9] Neste sentido, p.ex., António Pais de Sousa, obra citada, p. 77; Jorge Alberto Aragão Seia, Arrendamento Urbano, 7.ª ed., p. 176 a 178, nota n.º 6; Pereira Coelho, RLJ Ano 125, p. 260, nota 11; Carneiro da Frada, O Novo Regime do Arrendamento Urbano, Revista da Ordem dos

Advogados, Ano 51, p. 174 e ss.

[10] Introduziu também algumas alterações no regime geral da locação (art. 2).

Foi, entretanto, publicada a Lei n.º 31/2012, de 14 de Agosto, em vigor desde 12 de Novembro de 2012, que procedeu à revisão do regime jurídico do arrendamento urbano, alterando o Código Civil, o Código de Processo Civil e a Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro.

[11] Trata-se da Subsecção VIII (da Secção VII, do Capítulo IV, do Título II, do Livro II, do Código Civil), sob a epígrafe “Disposições especiais do arrendamento para fins não habitacionais”.

Sobre as dificuldades de interpretação que esta norma pode levantar, no que toca ao regime aplicável aos arrendamentos rústicos não sujeitos regime especial, v. Manuel Januário da Costa Gomes, no seu artigo “”Breves notas sobre as “Disposições especiais do arrendamento para fins não habitacionais”, no projecto do NRAU””, na revista O Direito, Ano 137, 2005, II, p. 374.

[12] Quanto à sua duração, o CC distingue, actualmente, entre os arrendamentos para habitação com prazo certo (arts. 1095 a 1098) e com duração indeterminada (arts. 1099 a 1107).

Sobre a distinção entre ambas as apontadas categorias (que, igualmente, se aplicam, no âmbito dos arrendamentos para fins não habitacionais, ex vi do art. 1110, n.º 1), v. Conselheiro Jorge Pinto Furtado, Manual de Arrendamento Urbano, volume I, 4.ª ed., p. 282.

[13] Sobre o regime da denúncia do senhorio, em particular, no âmbito dos contratos a que se refere o Capítulo II, da Parte II, da Lei n.º 6/2006, podem consultar-se, na doutrina, entre outros, Luís Menezes Leitão, Arrendamento Urbano, 5.ª ed., p. 204; Manuel Januário da Costa Gomes, Sobre a (vera e própria) denúncia do contrato de arrendamento. Considerações gerais, revista O Direito, Ano 143, 2011, I, p. 30 e ss.; Elsa Sequeira Duarte, O Regime Transitório no Novo Regime

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do Arrendamento Urbano”, THEMIS, Ano VIII, N.º 15, p. 87; Fernando Gravato Morais, Cadernos de Direito Privado, n.º 33, p. 58 e ss. e na Revista JULGAR, n.º 19, p. 13 e ss.; Maria Olinda Garcia, A Nova Disciplina do Arrendamento Urbano, 2.ª ed., p. 51 e ss. e Arrendamento Urbano Anotado, Regime Substantivo e Processual, 2.ª ed., p. 19 e ss. e 125 e ss..

Na jurisprudência, entre outros, Acs. do STJ; de 20-01-2010, (Conselheiro Álvaro Rodrigues), de 15-11-2011 (Conselheiro Garcia Calejo), de 12-06-2012 (Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza); da RP de 23-02-2010 (Desembargador Vieira e Cunha), da RL de 16-05-2013

(Desembargador Aguiar Pereira), da RG, de 04-06-2013 (Desembargador Paulo Duarte Barreto), todos in www.dgsi.pt; e Acs. da RP, de 28-03-2011 (Desembargador Caimoto Jácome) e da RC, de 15 de Novembro de 2011 (Desembargador Barateiro Martins), ambos, na CJ, Ano XXXVI, Tomo II, p. 207 e ss. e Tomo V, p. 10 e ss., respectivamente.

[14] Cfr. também, Rui Pinto Duarte, “A Cessação da Relação de Arrendamento Urbano no NRAU”, THEMIS, Ano VIII, N.º 15, p. 71, nota 19.

[15] O Regime Transitório do NRAU não contém qualquer norma referente aos arrendamentos rústicos não sujeitos a regime especial.

[16] No sentido de ser aplicável, quanto ao prazo de um ano (do contrato ou da renovação) a al. b), em vez da al. c) do n.º 1 do art. 1055 do CC., v., por todos, Código Civil Anotado de Pires de Lima e Antunes Varela, volume II, 4.ª ed., p. 399.

[17] Neste sentido, entre outros, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, II, 4.ª ed., pp.624 e 625; Aragão Seia, Arrendamento Urbano, 7.ª ed., p. 515; António Sequeira Ribeiro, Sobre a Denúncia no Contrato de Arrendamento Urbano para Habitação, LEX, p. 101.

Referências

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