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UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

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CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

DAYANA DOS SANTOS DELMIRO COSTA

A MAGISTRATURA NO MARANHÃO E AS RELAÇÕES DE GÊNERO: Origens sociais, carreiras e representações das juízas

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CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

DAYANA DOS SANTOS DELMIRO COSTA

A MAGISTRATURA NO MARANHÃO E AS RELAÇÕES DE GÊNERO: Origens sociais, carreiras e representações das juízas

Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal do Maranhão como requisito parcial para obtenção do título de doutora em Ciências Sociais.

Orientador: Prof. Dr. Igor Gastal Grill

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Costa, Dayana dos Santos Delmiro.

A magistratura no Maranhão e as relações de gênero: origens sociais, carreiras e representações das juízas / Dayana dos Santos Delmiro Costa. — São Luís, 2015.

289 f.

Orientador: Igor Gastal Grill.

Doutorado (Tese) – Universidade Federal do Maranhão, Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, 2015.

1. Magistratura - Maranhão. 2. Relações de gênero. 3. Juízas. 4. Elite jurídica. I. Título.

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Esta tese somente se fez possível a partir do esforço conjunto de inúmeras pessoas, cada uma contribuiu em momentos distintos, mas todas foram essenciais para o alcance dessa conquista. Inicialmente agradeço a Deus, meu mestre, fonte de vida, por me conceder a saúde necessária e paz de espírito para concluir essa tese.

Na academia, minha principal dívida intelectual é com meu orientador, professor Igor Grill, trago em mim a convicção de que esta tese não existiria se não fosse sua atenção, seu compromisso permanente com a leitura crítica de meus escritos e seus ensinamentos rigorosos sobre a atividade de pesquisa. Em suas aulas, sua inteligência e presteza sempre produziram em mim uma admiração da ordem do indizível. A ele que lê meus trabalhos minunciosamente, desde os tempos do mestrado, só devo expressar meus sinceros agradecimentos. Sou grata ainda, pelo fato dele ter me proporcionado contatos chaves com o universo de minhas nativas. Obrigada Dr. Grill, por teres me inspirado na maneira de fazer e conceber as Ciências Sociais.

Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal do Maranhão, de modo especial ao professor Horácio Antunes, de quem fui aluna em diferentes etapas acadêmicas, da graduação ao doutorado, suas práticas têm me passado a lição de dedicação e humildade mais valiosa que já recebi. Foi ao lado dele que ainda recém-graduada, pude iniciar no mundo da docência durante as viagens pelo PRONERA. Com ele aprendi o deslumbre do qual não me desgarro: o prazer do eterno ensinar e aprender. É uma honra depois desses anos todos, contar com sua presença na banca de defesa desta tese, obrigada por ter aceitado o convite. Devo agradecer igualmente, à professora Beta, minha eterna tutora do PET de Ciências Sociais, professor Biné, que acompanhou a fase embrionária desse trabalho na disciplina de métodos, professora Sandra Nascimento e professor Carlão, meu pai acadêmico, obrigada a todos estes com os quais cursei disciplina no doutorado e são importantes referências para minha formação. Agradeço também à professora Arleth Borges pela interlocução no estágio inicial desta pesquisa. E aos professores Marcelo Carneiro e Jose Benevides que, como coordenadores do PPGCSoc-UFMA, sempre se colocaram a disposição nos assuntos burocráticos para o avanço do trabalho.

Agradeço aos professores Juarez de Carvalho e Cindia Brustolin pelas valiosas contribuições e redimensionamento de alguns capítulos na banca de qualificação e por terem aceitado compor a banca de defesa desta tese.

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Agradeço também por gentilmente ter aceitado o convite para compor a banca de defesa da tese.

Agradeço à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior- CAPES, pela bolsa concedida. Além da bolsa CAPES-Demanda Social, durante a elaboração deste trabalho, tive a oportunidade de receber bolsa CAPES do Programa de Doutorado Sanduíche no exterior-PDSE, para estagiar no Laboratório do Institut des sciences sociales du politique da École Normale Superieure-ENS de Cachan. A contribuição que muitos pesquisadores realizaram ao meu trabalho foi bastante significativa. Gostaria de tecer especiais agradecimentos ao monsieur Benoit Bastard, meu diretor de tese, pela sua calorosa acolhida, pela disponibilização de estrutura de trabalho no ISP, por sua interlocução sincera e por seu entusiasmo ao me introduzir na comunidade local de pesquisadores ligados a temática de minha tese. Agradeço também aos pesquisadores Jacques Commaille e Anne Boigeol pelas coerentes críticas e ricas sugestões ao meu trabalho. Agradeço a parceria dos colegas que fiz durante o estágio na ENS, Benjamim Morel, Kaisa Vuoristo, Liliane Umubyeyi, Johannes Schmid, Shylaja, Alessandra Fujii, Bruno Luchini e Alexandre Rios. Shylu, Alê, Luchini e Alexandre por serem externos ao mundo das Ciências Sociais, nada sabiam de Bourdieu ou sobre espaço jurídico, mas muito sabiam sobre cumplicidade, almoços nos resto’U du CROUS, música, vinho, boas conversas e risadas nos gramados da ENS, devo agradecê-los por tornarem minha estadia na França mais leve.

Ainda sobre o estágio no exterior, devo agradecer aos pesquisadores Afrânio Garcia e Vassili Rivron da École des Hautes Études en Sciences Sociales-EHESS, sinto-me privilegiada por ter apresentado versões preliminares dos capítulos desta tese, no seminário sobre Antropologia Política do Brasil, sou grata pelas dicas valiosas. Dos colegas reunidos na EHESS, agradeço de modo carinhoso a Lucas Carvalho, Juliana Basílio e Roseane Sousa.

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esforço para me ajudar nas transcrições das entrevistas, pela paciência em responder meus e-mails nada pequenos sobre as discussões presente nos capítulos deste trabalho, pelo empréstimo de livros e por me brindar com sua visão de quem pertence também ao universo dos bacharéis em direito. E tem outra Carla que gostaria de agradecer, apesar dela não pertencer atualmente a UFMA, Carla Georgea faz parte daqueles sorrisos que me impulsionam sempre a continuar. Obrigada amigas!

Esta tese foi possível também graças ao afastamento de minhas atividades docente, pelo período de quinze meses, concedido pelo Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia/ IFMA-Campus Pinheiro. Obrigada a todos os colegas de trabalho que contribuíram e alunos que torceram pelo alcance deste objetivo. Um agradecimento especial ao professor Edinaldo Mourão, à época DRG do campus, hoje um grande amigo, pessoa que nos ensina, com seu exemplo, o verdadeiro compromisso com o serviço público, e às professoras Flavya Gurgel, Jacira Brito, Darlene Freitas, Josenice, Jully, Bruna e Emilly Rios, pelas muitas razões que elas bem sabem. Agradeço também às servidoras Cleomar Pereira, Fátima Correa e Eruídes. Ainda no âmbito do IFMA, agradeço toda equipe da PRPGI, representada pela profª Natilene Brito, sou grata de igual modo a Adriana Nogueira que sempre se colocou à disposição na resolução de diferentes questões burocráticas durante os quatro anos de doutorado, profª. Valéria Martins e prof. Roberto Brandão, gestores pelos quais nutro grande respeito e admiração.

Agradeço todas às juízas que se dispuseram a reservar um tempo em sua apertada agenda e nos conceder entrevista, se estas não aparecem aqui nomeadas, é apenas devido a preservação de suas identidades. Meus sinceros agradecimentos a Emília Lacerda, Giorgione Lauande e Lúcio Novaes, com quem pude contar no acesso aos contatos das magistradas.

A Jean-Christophe Goux pelo auxílio na tradução e revisão do projeto de pesquisa para o francês, a fim de realização do estágio no exterior. Às professoras Terezinha, Stéphanie Pédèches e Frédérique Chef, pelas imprescindíveis aulas de francês.

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Tentar pensar o Estado é expor-se a assumir um pensamento de Estado, a aplicar ao Estado categorias de pensamento produzidas e garantidas pelo Estado e, portanto, a não compreender a verdade mais fundamental do Estado (BOURDIEU, 2010c:91).

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Esta tese apresenta uma discussão sobre o processo de diversificação do espaço jurídico, por meio do estudo dos padrões de recrutamento de mulheres na magistratura no estado do Maranhão. Em primeiro lugar, utilizando macrofatores explicativos das formas de recrutamento (origens sociais, escolarização, profissão etc), assim como micromecanismos que acionam tais aspectos a partir das dinâmicas sociais que são peculiares do contexto maranhense, o estudo tratou de apreender os condicionantes sociais implicados na composição dessa elite jurídica. Em segundo lugar, além dos dados de origens sociais, consideramos os aspectos relacionados à carreira na magistratura e destacamos também o longo movimento ligado à capacidade coercitiva da magistratura sobre as tomadas de posição dos agentes, isto é, a formação de seus esquemas de percepção, suas preferências e mais largamente como concebem o papel de juiz e as relações de gênero no interior desse espaço. Por fim, o enfoque recaiu sobre as relações entre o espaço jurídico e a política, por meio da análise das representações que as magistradas possuem sobre a autonomia do judiciário e atuação deste em períodos eleitorais, exploramos ainda as percepções que estas atribuem ao papel do Conselho Nacional de Justiça e da Associação dos Magistrados do Maranhão. Utilizamos como estratégias metodológicas levantamento bibliográfico sobre a temática em pauta, análise documental, coleta de dados em fontes secundárias e entrevistas em profundidade com juízas.

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Cette thèse présente une discussion sur le processus de diversification de l'espace juridique, à travers de l'étude des modes de recrutement des femmes dans le système judiciaire dans l'état de Maranhão. Sur la base de l'identification de l'influence des biens familiaux, sur à l'entrée de la carrière des femmes dans la magistrature, en utilisant des macrofacteurs explicatifs des formes de recrutement (origine sociale, l'éducation, la profession, etc.) et micromécanismes qui déclenchent ces aspects de la dynamique sociale, qui sont typiques de contexte du Maranhão, l'étude a tenté d'appréhender les contraintes sociales impliquées dans l'organisation de l'élite juridique. Deuxièmement, en plus de sources de données sociales, prendre en considération les aspects liés à la carrière judiciaire, mettent également en évidence le long mouvement de la capacité de coercition de la magistrature sur les positions des agents, à savoir la formation de leurs schèmes de perception, vos préférences et plus largement, comme ils comprendre le rôle de juge et relations entre les genre au sein de cet espace. Enfin, l'accent était mis sur la relation entre l'espace juridique et politique, à travers l'analyse des représentations que les magistrats ont sur l'autonomie de l'appareil judiciaire et agissant en cette période électorale, nous avons également exploré les perceptions que celles-ci se fixent sur le rôle du Conseil national de la Justice et l'Association des Magistrats de Maranhão. Nous utilisons des stratégies méthodologiques la littérature sur le sujet , l'analyse de documents , la collecte de données à partir de sources secondaires et des entrevues avec les juges .

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This thesis presents a discussion on the process of discussion of the process of diversification of the legal system space, through the study of women's recruitment standards in the magistracy in the state of Maranhão. Firstly, by utilizing explanatory large-scale factors on the forms of recruitment (social background, education, occupation, etc) as well as micro-mechanisms which bring to life such aspects from social dynamics, typical of Maranhão context, the study endeavours to point out the social constraints involved in the organization of this judiciary elite. Secondly, in addition to social data sources, taking into consideration justicial-related carreer aspects it is also highlighted the long movement linked to the coercive capacity of the judiciary on the agents’ definition of position, namely, the formation of their perception planning, preferences and more widely how a judge’s role is taken as well as the gender relation-ship inside such a space. Ultimately the approach lied on the relations between the judiciary space and politics trough the analyses of representations which male judge bodies posses upon the legal system autonomy just as its performance inside election periods, it is also tackled the perception attributed by them to the role of both National Council of Justice and Maranhão Judge body Association. We use methodological strategies as literature on the subject at hand, document analysis , data collection from secondary sources and interviews with judges .

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ABMCJ-Associação Brasileira de Mulheres das Carreiras Jurídicas

AJUFE- Associação dos Juízes Federais

AMMA- Associação dos Magistrados do Maranhão

AMPEM- Associação do Ministério Público do Estado do Maranhão

CEFEMEA-Centro Feminista de Estudos e Assessoria

CEPEJ- Comissão Europeia pela Eficácia da Justiça

CEUMA- Centro Universitário do Maranhão

CEPAL- Comissão Econômica para América Latina e Caribe

CNJ- Conselho Nacional de Justiça

ENS- École Normale Supérieure

GTA - Grupo Tático Aéreo

ISP- Institut des sciences sociales du politique

LADH- Liga Argentina por los Derechos del Hombre

MP- Ministério Público

OAB- Ordem dos Advogados do Brasil

OIG- Observatório da Igualdade de Gênero da América Latina e Caribe

ONU- Organização das Nações Unidas

PC do B- Partido Comunista do Brasil

PFL-Partido da Frente Liberal

PMDB- Partido do Movimento Democrático Brasileiro

PRONERA- Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária

PSDB- Partido da Social Democracia Brasileira

PSL- Partido Social Liberal

PT- Partido dos Trabalhadores

PV- Partido Verde

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STF- Superior Tribunal Federal

STJ- Superior Tribunal de Justiça

STM- Superior Tribunal Militar

TJ- Tribunal de Justiça

TRT- Tribunal Regional do Trabalho

TSE- Tribunal Superior Eleitoral

TST- Tribunal Superior do Trabalho

UFMA- Universidade Federal do Maranhão

UFRGS- Universidade Federal do Rio Grande do Sul

UFSC- Universidade Federal de Santa Catarina

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Quadro 1- Cenário internacional da presença das mulheres nos tribunais

Quadro 2- Distribuição dos presidentes e membros da suprema corte (homens e mulheres) nos países da União Europeia em 2003

Quadro 3- Distribuição dos presidentes e membros da suprema corte (homens e mulheres) nos países da União Europeia em 2013

Quadro 4- Crescimento da participação de mulheres nos tribunais superiores de justiça na América Latina, 2001-2011

Quadro 5- Participação de mulheres no máximo tribunal de justiça na América Latina (20 países) e caribe (13 países e territórios) em 2011

Quadro 6- Presença de mulheres na magistratura brasileira de 1960 a 2014

Quadro 7- Distribuição de homens e mulheres nos tribunais superiores no Brasil

Quadro 8- Mulheres aprovadas no concurso para juiz de direito no Maranhão

Quadro 9- Quadro sinótico das trajetórias das desembargadoras do Maranhão- 2014

Quadro 10- Local de nascimento dos avós

Quadro 11- Local de nascimento dos desembargadores do Maranhão

Quadro 12- Local de nascimento dos pais

Quadro 13- Local de nascimento das juízas

Quadro 14- Grau de escolarização dos avós

Quadro 15- Ocupação dos avós

Quadro 16- Grau de escolarização dos pais

Quadro 17- Ocupação dos pais

Quadro 18- Ocupação dos irmãos

Quadro 19- Laços de parentesco com profissionais da área jurídica

Quadro 20- Escolas frequentadas pelas juízas

Quadro 21- Instituições frequentadas pelas magistradas no ensino superior

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Quadro 24- Tempo entre a graduação e aprovação no concurso

Quadro 25- Números de concursos realizados

Quadro 26- Sentiu algum tratamento diferenciado devido ao gênero nas etapas do concurso

Quadro 27- Sentiu algum tratamento diferenciado devido ao gênero durante os anos de exercício da profissão

Quadro 28- Perfil etário dos desembargadores no Maranhão- 2013

Quadro 29- Perfil etário das juízas entrevistadas- 2012

Quadro 30- Idade de ingresso na magistratura

Quadro 31- Profissões exercidas antes da magistratura

Quadro 32- Magistradas que cursaram pós-graduação

Quadro 33- Tipo de pós-graduação cursada

Quadro 34- Instituição que realizou a pós-graduação

Quadro 35- Publicação de artigos na área jurídica

Quadro 36- Condição em que participou da Associação dos Magistrados

Quadro 37- Participação na Associação Brasileira de Mulheres das Carreiras Jurídicas

Quadro 38- Tempo de atuação na magistratura

Quadro 39- Divisão por entrância

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Imagem 1- Fórum Desembargador Sarney Costa

Imagem 2- Diretoria do TJ-MA composta por três mulheres (2014/2015)

Imagem 3- José Sarney, ministro Edison Lobão e senador Lobão Filho apoiando a candidatura de genro de Nelma Sarney

Imagem 4- Desembargadora Nelma Sarney leva seu irmão ao altar

Imagem 5- Casamento de Natássia Weba e Telmo Jr

Imagem 6- José Leandro em campanha para prefeitura- 2012

Imagem 7- Senador José Sarney e deputado estadual Edilázio Jr ao lado de José Leandro

Imagem 8- José Leandro com Roseana Sarney e o prefeito de Lago Verde-MA

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 19

I- POR UMA SOCIOLOGIA POLÍTICA DA MAGISTRATURA ... 19

II Diversificação do espaço jurídico: ingressos de novos segmentos e autonomização da instituição judiciária ... 29

III- Os juristas como agentes especializados de produção da dimensão simbólica do poder estatal ... 39

IV- Trabalho de campo e materiais empíricos ... 43

CAPÍTULO 1- DIVERSIFICAÇÃO DO ESPAÇO JURÍDICO E O INGRESSO DE MULHERES NA MAGISTRATURA ... 47

1.1 O CENÁRIO INTERNACIONAL ... 47

1.1.1 Dificuldades no acesso ... 48

1.1.2- Os tipos de sistema jurídico ... 52

1.1.3 Mulheres nas Supremas Cortes da Europa e na América Latina ... 57

1.2 Mulheres nos Tribunais Brasileiros ... 63

1.2.1 Mulheres na magistratura maranhense ... 69

CAPÍTULO 2- DIVERSIFICAÇÃO SOCIAL E PADRÕES DE RECRUTAMENTO ... 93

2.1 - Origem geográfica e social ... 95

2.1.1 Escolaridade e ocupação ... 98

2.1.2 Situação conjugal ... 107

2.2 Trajetórias sociais das juízas: alguns casos exemplares ... 108

2.2.1 De “grandes proprietários rurais” ao espaço jurídico ... 110

2.2.2- De empresários ao espaço jurídico ... 121

2.2.3- Da “sala de aula” ao espaço jurídico ... 125

CAPÍTULO 3 - OS PADRÕES DE CARREIRA NA MAGISTRATURA ... 134

3.1- Aprovação no concurso ... 136

3.2 Perfil etário ... 142

3.3- Experiência profissional ... 144

3.4- Formação e produção intelectual ... 146

3.4.1 Publicação de artigos e o “papel social do juiz” ... 149

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CAPÍTULO 4 – GÊNERO, CULTURA INSTITUCIONAL E O EXERCÍCIO DA

JUDICATURA: INCORPORAÇÃO, PAPÉIS E SIGNIFICADOS ... 175

4.1- O gênero e a incorporação da dominação masculina ... 178

4.2- Ilegitimidade e legitimação da mulher juíza: “mas é ela mesmo que vai decidir? Não tem um juiz não?” ... 181

4.2.1- Em busca de legitimidade ... 189

4.3- Construção social do papel de juiz ... 198

4.4 – Desempenhando Papéis: Juíza, mãe e esposa ... 210

4.5- Basta olhar além da toga: “ser juiz” na perspectiva da AMMA ... 214

CAPÍTULO 5- INSTITUIÇÕES JUDICIAIS E DINÂMICAS POLÍTICAS NO MARANHÃO: AUTONOMIA, ELEIÇÃO E ENGAJAMENTO ASSOCIATIVO ...222

5.1- Judiciário e Política ... 223

5.2- Juízas no “Tempo da política” ... 236

5.3- Engajamento Associativo no Judiciário Maranhense ... 243

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 252

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 259

APÊNDICE I ... 264

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INTRODUÇÃO

I- POR UMA SOCIOLOGIA POLÍTICA DA MAGISTRATURA

O objetivismo constitui o mundo social como um espetáculo oferecido a um observador que adota “um ponto de vista” sobre a ação e que, ao importar ao objeto os princípios de sua relação com o objeto, faz como se estivesse destinado somente ao conhecimento (...). Pode-se, com efeito, com o Marx das Teses sobre Feuerbach, abandonar o ponto de vista soberano a partir do qual o idealismo objetivista ordena o mundo sem ser obrigado a lhe abandonar “o aspecto ativo” da apreensão do mundo ao reduzir o conhecimento a um registro: basta para isso se situar na “atividade real como tal” (BOURDIEU, 2009:86)

L’objectivation- inséparable de l’institutionnalisation- ne se confond pas avec um “moment originel” de l’institution; c’est um processos permanente qui tend à faire passer des règles, des savoirs, des dispositifs, des regularités, et des rôles, ce que l’on designe par l’ “institué”, pour nécessaires et fonctionnels, et qui peut même les soustraire à la discussion e les absolutiser (LAGROYE, J; OFFERLÉ, M, 2010:13).

Ao convidarmos Bourdieu, Lagroye e Offerlé para dar fruição ao texto dessa tese com trechos que remetem às discussões epistemológicas sobre as diferenças entre a postura objetivista e a perspectiva voltada para objetivação nas Ciências Sociais, buscamos situar o leitor sobre as escolhas dos referenciais de análise que orientaram nossa construção do objeto e a noção de instituição que utilizaremos em todo decorrer do trabalho ao discutirmos sobre a Magistratura. Para realizarmos uma sociologia política do Estado, mais especificamente da Magistratura, precisamos nos afastar da tendência à reificação que está relacionada a essa postura contemplativa criticada por Bourdieu (2010a) no fragmento acima.

O conhecimento da sociologia disposicional, relacional e concorrencial de Bourdieu em detrimento ao objetivismo nos foi apresentado como esquema de análise desde o período do mestrado, que realizamos no PPGCSoc da UFMA, sobretudo na disciplina Sociologia do Poder1, e passou a influenciar nossos interesses e práticas de pesquisa. Entre as leituras que tivemos acesso naquela ocasião, destacamos um texto instigante que renova constantemente tal discussão, “Ordre politique et ordre social: objetivisme, objetivation et analysepolitique”, de Bernard Lacroix (1985), em que o autor, ao tratar justamente sobre as pré-noções e o risco de se pensar o Estado como realidade dada, instituída, salienta que tal postura pode ser superada quando consideramos que a questão não é pensar as realizações observáveis ex post a partir das categorias ou dos discursos que os definiram, e sim conceber essas realizações ex ante na maneira como elas se formam e como se impõem (LACROIX, 1985). Nessa direção,

1 Ministrada pelo prof. Igor Grill, no doutorado também tivemos a oportunidade de renovar a discussão com a

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buscamos, na construção desse trabalho, levar em conta os sentidos que os agentes atribuem às práticas, às teias de relações, aos conflitos, aos movimentos interdependentes, ao tratarmos das várias dimensões articuladas na construção do espaço social2 relacionado às dinâmicas sociais da magistratura maranhense.

Enquanto, no mestrado, o foco recaiu sobre as “elites políticas”, ao desenvolvermos uma pesquisa sobre os processos de especialização política, análise dos perfis e carreiras das deputadas no Maranhão3, no doutorado, no intuito de dar continuidade aos objetivos de estudo de “elites”, a análise desenvolvida aqui buscou avançar nas discussões sobre o recrutamento de “elites jurídicas” no Maranhão e na compreensão do processo de diversificação do espaço jurídico no contexto de uma dinâmica social e política representada pelo ingresso de mulheres na magistratura. Desse modo, continuamos com alguns referenciais teóricos que se fizeram pertinentes, tais como a noção de estratégias, de reprodução de “elites” em sociedades ditas “periféricas”, relações de gênero, volume e estruturas de capitais, trajetórias, conforme apresentaremos adiante; e renovamos as discussões com o estudo de outra instituição, a Magistratura, focando na formação e recrutamento das “elites jurídicas”, nas práticas e trajetórias dos agentes e nas peculiaridades do espaço em pauta.

Com efeito, a caracterização social dos ocupantes dos postos mais elevados de uma instituição serve como expediente para a compreensão de uma gama de aspectos interligados. Isto é, a composição de determinado segmento de “elite” pode contribuir para revelar simultaneamente: 1) a posição das diferentes esferas do espaço do poder umas em relação às outras, além de possíveis cadeias de interdependências que estabelecem entre si; 2) as transformações mais gerais dos princípios de estruturação social que regem determinada configuração social; 3) papéis, regras, disposições, recursos, estratégias, elementos dóxicos, crenças, representações que presidem dados universos sociais que são indistintamente práticos e simbólicos.

Outro viés dirige-se ao tratamento da instituição judiciária à luz de “uma perspectiva processual, construtivista e disposicional de análise” (GRILL, 2012a: 2). Ou seja: “o de considerar indissociavelmente o caráter coercitivo das instituições e o quanto elas devem aos investimentos (conscientes ou não) dos agentes, no sentido da sua invenção, adaptação, consolidação, reforma, reprodução, insubordinação, etc” (GRILL, 2012a: 3), sem deixar de considerar, que a apreensão dos fatores acima elencados depende de fina “análise de percursos individuais e suas imbricações com o modus operandi em um domínio específico”

2 Realidade invisível, que não podemos mostrar nem tocar e que organiza as práticas e as representações dos agentes.

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(GRILL, 2012a: 4) e como tal procedimento “funciona como instrumento heurístico para a reflexão centrada nos ajustamentos entre disposições e regras/papéis prescritos” (GRILL, 2012a: 6). Regras essas que podem ser formais e informais, morais e pragmáticas4.

Em alguns países da Europa, na França principalmente, as pesquisas que evidenciam a entrada de novos perfis na magistratura, o que inclui a diversificação de gênero, têm demonstrado uma associação desse movimento ao processo de autonomização do judiciário (GARRAUD, 2001; VAUCHEZ, 2001, 2009; MUSELLA, 2001; ROUSSEL, 1998; BOIGEOL, 1989). Testar a relação entre a entrada de novos segmentos na magistratura e o grau de autonomização nesse espaço se mostra um procedimento importante de investigação em contextos como aqueles encontrados no Brasil. Ter como espaço empírico o estado do Maranhão, onde o peso das relações pessoais e do capital personificado pode evidenciar lógicas totalmente diferentes do contexto europeu, devido às particularidades nacionais encontradas em tais Estados híbridos (BADIE e HERMET, 1993), se apresenta como uma contribuição a essa discussão.

A perspectiva que sugerimos para nortear esta análise centra-se na concepção dos fenômenos políticos em termos de dinâmicas que não seguem a determinantes universais, antes considera “o político” atrelado às especificidades e indissociável das noções de “cultura” e “história”, diferente, portanto, da vertente clássica que sustenta uma visão de universalidade dos fenômenos de constituição do poder político. Seguindo Seidl e Grill (2013:11):

ao relativizar as dinâmicas assumidas pelo fenômeno político e optar pela ideia de diferentes configurações do poder, o enfoque abre uma série de pistas de investigação sobre as lógicas próprias de constituição e transformação das concepções sobre o político e suas instituições (quando existem), sobre os atores e suas práticas concretas. Assim, numa abordagem da política sensível à história, (...), o estudo da gênese do espaço político ocupa lugar de destaque: gênese das instituições (Estado, burocracia, partidos, movimentos sociais), das categorias de pensamento e de compreensão que dão sentido ao jogo político (direita, centro e esquerda, liberal e conservador, cidadania, civismo), dos rituais, festas e símbolos do poder (campanhas, formas de publicidade e manifestações, cotidiano dos gabinetes e das assembleias, posses, discursos), das atividades e dos atores mais ou menos especializados na política (governantes, assessores, militantes, funcionários, marqueteiros, analistas).

Consideramos que as condições de construção dos Estados ditos “periféricos”, no qual o Brasil está inserido, decorrem da importação de modelos exógenos, resultante da subordinação desses países à metrópole. As modificações significativas no modelo adotado

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nos países não ocidentais e na América Latina advém justamente da impossibilidade de reprodução fiel aos modelos de instituições europeias, uma vez que tais países possuem histórias e culturas específicas, fazendo com que a transposição das instituições estrangeiras acabe sofrendo um processo de adaptação, interpretação e modificação frente ao modelo importado (BADIE e HERMET, 1993).

Estudar o ingresso das mulheres, suas práticas e representações na Magistratura, tendo como espaço empírico o Maranhão, nos permite observar as relações em uma instituição que possui este caráter híbrido, que pende entre duas lógicas; de um lado, as regras formais que regem o ingresso, promoção e atuação na profissão e, de outro, as relações pessoalizadas que permeiam e caracterizam as práticas dos agentes. Sobre essa questão da difusão de pensamentos e ideias estrangeiras e seus efeitos nos países importadores, Badie e Hermet (1993) pontuam que o Estado periférico é atravessado por duas lógicas: uma "dinâmica externa", que sustenta as relações de dependência e submete seu funcionamento às exigências internacionais, e uma "dinâmica interna", cujo objetivo é evitar a perigosa degradação das relações entre governantes e governados.

Ainda sobre importação de modelos de instituições estrangeiras, além da Europa, mais recentemente, os Estados Unidos também exerceram e ainda exercem forte influência na construção do conhecimento e deslocamento dos modelos de Estado no Brasil. Nessa direção, Dezalay e Garth (2000), chamaram atenção para o papel do conhecimento especializado dos economistas e dos advogados de alguns países da América Latina5 e da atuação destes nas transformações dos Estados do bem-estar para os Estados neoliberais, evidenciando como o critério para legitimação destes profissionais, era dado de acordo com o mercado internacional centrado nos Estados Unidos.

Dezalay e Garth (2000), ao enfocarem nas transformações ocorridas entre os anos de 1960 a 2000, ressaltaram que mesmo com as diferenças no campo do poder estatal entre os Estados Unidos e países da América Latina, na década de 1960 havia semelhanças estruturais na posição dos que eles chamam de “políticos-bacharéis”, aproximações referente aos poderes econômico e político. “Tanto no Sul quanto no Norte, os políticos-bacharéis serviam como intermediários entre as principais famílias e empresas de seus países, assim como agiam mais como estadistas quando no governo” (DEZALAY; GARTH, 2000:164). De modo que, segundo os autores, o intercâmbio no fluxo de ideias entre tais países foi facilitado, justamente em virtude dessa homologia estrutural.

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Atualmente, a expansão da influência norte-americana acontece por meio dos que os autores nomeiam de “técnicos-políticos”, seriam os profissionais que conseguem circular entre os diferentes países, ONGs, bancos multilaterais, escritórios de advocacia e centros de pesquisa que atuam na administração pública. Por meio de importações e exportações simbólicas, os “técnicos-políticos” permitem que os universos local e transnacional se conectem, de modo que valores internacionais sejam traduzidos como locais e o movimento contrário também se efetue. Dezalay e Garth pontuam:

Exportações simbólicas tendem a ser mais bem-sucedidas quando há homologias estruturais entre o Sul e o Norte. Quando as posições estruturais são similares, como eram no tempo dos políticos-bacharéis e são novamente agora, com os técnico-políticos, o Norte é capaz de exportar as suas próprias lutas internas para o Sul. Estratégias internacionais no Sul se conectam com as estratégias internacionais de atores do Norte lutando suas lutas domésticas. Na verdade, quando as estruturas se encaixam particularmente bem, as exportações não são nem mesmo vistas como exportações (DEZALAY; GARTH 2000:165).

Assim, por meio do conceito de “estratégia internacional”, que se refere à maneira pela qual os agentes usam capital internacional, títulos universitários, conhecimento técnico, contatos, e legitimidade obtida no exterior para construir suas carreiras em seus países natais, os autores mostram como as exportações das lutas internas dos Estados Unidos são incorporadas pela América Latina, não apenas pelo fato de todos os lados acreditarem nos mesmos referenciais e nas mesmas formas de resolver os problemas, mas sobretudo porque suas estratégias os levam a fazer o trabalho de seus parceiros internacionalizados.

Esta circulação de tecnologias e problemáticas é exemplificada pelos autores no caso dos economistas com os investimentos dos professores da Universidade de Chicago. Os economistas de Chicago investiram em seus possíveis parceiros no Sul, principalmente na Universidade Católica de Santiago, no Chile, casa dos “Chicago-boys” originais. Vários jovens economistas da Universidade Católica foram para Chicago e, ao voltar ao Chile, estabeleceram no país alianças políticas semelhantes às criadas no interior do bloco político conservador nos Estados Unidos. Eles usaram a economia matemática, suas ligações com os economistas de Chicago, então em ascensão na profissão no ambiente norte-americano, para clamar por um tratamento de choque, e uma série de reformas que se tornaram, naquele momento, a maior inspiração dos ataques neoliberais ao intervencionismo estatal em outros países (DEZALAY; GARTH, 2000: 166).

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Departamento de Economia da Pontifícia Universidade Católica- PUC do Rio de Janeiro e foi possível alinhá-lo com o mercado global emergente. “Eles usaram a economia norte-americana e a legitimidade da Matemática contra o Estado forte e as políticas de Delfim Netto nos anos 1970, promotoras de taxas relativamente altas de inflação” (DEZALAY; GARTH, 2000:167).

Ao tratarem especificamente da diversificação das carreiras jurídicas e as lutas entre grupos profissionais ligados ao Direito empresarial e advocacia de interesse público, no sentido do grupo de direitos humanos, Dezalay e Garth (2000) sublinham que em todos os países em que desenvolveram a pesquisa, demonstraram que o investimento da primeira geração nos direitos humanos forneceu um excelente recurso para a atividade política posteriormente.

Nessa linha que Dezalay e Garth (2000) ao diferenciarem o espaço jurídico norte-americano da diversificação do espaço jurídico na América Latina, pontuam que a legitimidade do Direito e a posição dos formados em Direito na América Latina se originam muito menos de investimentos nos direitos à justiça dos menos favorecidos e muito mais da política tradicional. Os advogados de direito empresarial latino-americanos viam relativamente pouca necessidade de se investir na legitimidade do Direito, e a elite da profissão não enxergava espaço para qualquer estratégia jurídica para os desfavorecidos. Advogados que tinham interesse em ajudar ou representar os mais pobres, não seguiram estratégias profissionais. Eles se tornaram ativos, principalmente em partidos políticos, na busca pelo poder do Estado.

Não trataremos ao longo da tese, de questões relacionadas a atuação dos advogados do ramo empresarial ou do âmbito dos direitos humanos no Maranhão e a utilização de estratégias internacionaisos, mas acreditamos que os estudos realizados por Dezalay e Garth (2000) sobre importação e exportação da expertise profissional de carreiras jurídicas nos ajudam a pensar como são redefinidos no Brasil os campos de poder nacional de acordo com o planejamento dos importadores e exportadores.

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político na dinâmica de práticas clientelísticas que caracterizam o período eleitoral no Maranhão. Nesse eixo da relação dessas duas esferas, ilustraremos também, ainda que rapidamente, dois casos de utilização dos conhecimentos da profissão jurídica como trunfo para obter êxito na política eleitoral. Em terceiro lugar, procuramos identificar se ocorrem investimentos em títulos de pós-graduação por parte das magistradas e, em caso afirmativo, quais as instituições priorizadas.

Seidl e Grill (2013) afirmam que, em tais contextos híbridos, a ausência de um processo de autonomização e de relativa diferenciação entre as diversas esferas sociais, com suas regras de funcionamento, ethos e princípios de hierarquização próprios, delineia contornos altamente fluidos de uma esfera política que tende a ser atravessada por múltiplas lógicas e racionalidades. Os autores citam como exemplo disso os diversos ismos na dinâmica política brasileira: neopatrimonialismo, clientelismo, faccionalismo, militarismo, autoritarismo, populismo, golpismo. Diversos pesquisadores da dinâmica política maranhense têm apontado as características “neopatrimoniais”, “clientelistas”, “faccionais” e o caráter “oligárquico” que regem as relações sociais e políticas no estado (GRILL e REIS, 2012; GRILL, 2013; GRILL, 2014; BORGES, 2004; COSTA, 1997, 2006; SILVA, 2001; GONÇALVES, 2000; 2006; REIS, 2007). Sendo assim, perguntamos como as relações que se desenvolvem de maneira pessoal, permeadas por normas de lealdade e reciprocidade na política maranhense, podem estar presentes também entre os agentes do judiciário?

Entre os estados brasileiros, o Maranhão destaca-se perante as demais unidades da federação por apresentar os piores índices sociais6 e as práticas “oligárquicas” de diferentes “grupos políticos” (como são denominados na linguagem do meio) têm marcado por várias décadas a dinâmica econômica, política e social no estado. O cenário político maranhense nas décadas de 1950 e 1960 era marcado pela polarização de duas facções nos embates eleitorais, representadas pelos “vitorinistas” e “oposicionistas”, a primeira liderada pelo pernambucano Victorino Freire e a segunda, em 1965, teve como candidato ao cargo de governador do Maranhão José Sarney, sob o lema do “Maranhão Novo”.

Gonçalves (2006) aponta que nos anos 1960, precisamente na gestão de José Sarney, o atributo “novo” tendeu a definir entre os pares de oposição a noção de “desenvolvimento regional no Maranhão”. Inicialmente José Sarney prometia o “desenvolvimento”, melhoria

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dos índices sociais do estado e se apresentava como alternativa de mudança ao longo dos vinte anos de práticas “oligárquicas” conduzidas por Victorino Freire e seus aliados. Entretanto, ações de continuidade de estratégias de produção e reprodução do poder político liderado por José Sarney puderam ser observadas ao longo de quase cinquenta anos no Maranhão, com a vitória nas eleições em diferentes cargos por seus filhos (Roseana Sarney e Sarney Filho), apadrinhados e aliados políticos.

No plano das lutas políticas entre “vitorinismo” e “sarneyismo” no Maranhão, Grill (2012b) realiza uma análise das tomadas de posição dos intérpretes e líderes políticos desses “ismos”. Inspirado no trabalho de Collovald (1991) sobre os mecanismos de avaliação tanto de forma positiva como negativa em torno das diferentes leituras do poujadismo na França, Grill (2012b) realiza um estudo sobre as lógicas das “etiquetagens” e fabricação de “ícones” da política nos estados do Maranhão e Rio Grande do Sul. No Maranhão, o autor evidencia como os significados em torno do “vitorinismo” e do “sarneyismo” dão sentido às lutas políticas e:

abrangem, por um lado, a afirmação de características sociais, as trajetórias seguidas e os posicionamentos assumidos por determinadas lideranças políticas que, por sua vez, afirmam-se como “ícones” das “histórias políticas” regionais e, por outro lado, são tributárias das apropriações e versões oferecidas por agentes imersos tanto nas disputas político-partidárias como nas “letradas” (vinculadas de alguma forma ao universo “intelectual”) que permeiam tais dinâmicas (GRILL, 2012b: 194)

Ao analisar tais versões em torno dos “ismos” em questão, produzidas por políticos e intelectuais inseridos na dinâmica política maranhense, Grill (2012b) examina tanto construções biográficas como intérpretes críticos. No caso das biografias, observamos por meio do trabalho de Grill (2012b) que o narrador, apesar de ocupar uma posição externa, está ao mesmo tempo mesclado à vida política a qual ele descreve, fato que faz com que este compartilhe as mesmas categorias cognitivas que constroem e reforçam as diferenças. No caso dos empreendimentos críticos:

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Por meio de sua pesquisa Grill (2012b) evidencia a dinamicidade dos alinhamentos faccionais7 nas disputas políticas no Maranhão. O estudo da produção da categoria “sarneysmo”, por exemplo, mostra como esta pode significar “continuísmo”, “dominação oligárquica”, “mandonismo” e ao mesmo tempo ser um importante elemento de localização dos agentes no espaço político dotado de plasticidade. Soma-se a isso, o fato dessas expressões, possuírem uma tendência de personificação ou reificação das relações sociais em detrimento da adoção do modelo relacional ou processual. “Essa tendência de personificar ou reificar as relações de poder leva a identificar “alguém” (Sarney e aqueles ligados a ele) ou um “tipo de entidade sobre-humana” (a “oligarquia”) como “detentores” do poder” (GRILL, 2012b: 205).

Momentos que aparentam rupturas foram presenciados recentemente na política maranhense com a vitória nas urnas do governador Flávio Dino do PC do B em 2014, este que se apresentou nas campanhas como oposição ao chamado “grupo” liderado por José Sarney. Diferentes exemplos das ações dos agentes que denotam as imbricações do político com o jurídico no Maranhão em torno tanto de José Sarney como do governador Flávio Dino são analisadas nesse trabalho, assim como de outras figuras políticas menos conhecidas nacionalmente. Desse modo, o estudo dá continuidade a uma agenda de pesquisa já levantada por Grill e Reis (2012:493):

a investigação se detém sobre uma configuração histórica marcada pela justaposição entre as múltiplas dimensões, lógicas e recursos de luta (inclusive sendo monopolizados por “famílias” e círculos restritos de uma elite com participação em distintas instâncias e fundados em redes de inter-conhecimento), sendo os diferentes protagonistas dos “casos” (políticos, jornalistas, advogados, juízes, etc.), assim como as instituições (partidárias, empresas de comunicação, escritórios de advocacia, instâncias jurídicas), partes integrantes de lutas entre facções8. Não é possível, então, simplesmente transpor os modelos de análise que constatam as transformações internas e externas simultâneas aos diferentes campos (jurídico, midiático e político); a existência de posições homólogas em cada um deles; a imposição de critérios de excelência ligados à capacidade crítica ou ao ideal de independência; e os usos feitos pelos diferentes protagonistas da legitimidade conquistada em um espaço político mais ampliado e diversificado.

7 Por meio das análises dos percursos de lideranças políticas que possuem relações pessoais e políticas com a “família Sarney” (deputados Manoel Ribeiro e Ricardo Murad) e de políticos que protagonizaram o movimento “anti-sarneysta” (Roberto Rocha e Haroldo Sabóia), Grill (2012b) demostra os diferentes posicionamentos, alianças e clivagens na dinâmica política no estado do Maranhão, o autor analisa ainda como diferentes intelectuais contribuem para legitimação de José Sarney no panteão de escritores.

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No que se refere à identificação do grau de autonomização da magistratura e funcionamento concreto das instituições, objetivamos contemplar três dimensões sistematizadas por Lagroye e Offerlé (2010) e mais especificamente o que aponta Delphine Dulong (2010) para análise da diversificação do espaço jurídico, que estão relacionadas à rejeição da visão fixa, estática, de instituição de que falávamos acima. Primeiramente, procuramos identificar a influência do patrimônio familiar no ingresso e no desempenho das carreiras das mulheres na magistratura, utilizando macrofatores explicativos das formas de recrutamento (origens sociais, escolarização, profissão etc), assim como micromecanismos que acionam tais aspectos a partir das dinâmicas sociais que são peculiares ao contexto maranhense, sem deixar de considerar a importância dos usos das origens sociais no ingresso e atuação nas carreiras. Em segundo lugar, consideramos o longo movimento ligado à capacidade coercitiva da Magistratura sobre o comportamento dos agentes, isto é, a formação de seus esquemas de percepção, suas preferências e mais largamente sua identidade social. Buscamos perceber, no interior do espaço jurídico maranhense, como um conjunto de regras de conduta, de convenções, de valores e de normas, diversamente codificadas, interiorizadas, incorporadas, como os papéis prescritos se definem e são interiorizados produzindo representações de justiça. Por fim, é imprescindível identificar como a magistratura se transforma. Cumpre, então, identificar nos depoimentos das juízas entrevistadas tomadas de posição que visam conduzir ou subverter a instituição, tendo em vista suas posições objetivas no espaço de relações competitivas ou cooperativas entre seus pares.

O que a presença de mulheres na magistratura maranhense revela em termos de grau de institucionalização desse espaço? Qual o perfil social dessas mulheres que conseguiram ingressar na magistratura no Maranhão? Qual o peso das relações familiares e de amizade9 na carreira? Qual a representação do papel de juiz dos agentes entrevistados? O ingresso de novos perfis na magistratura, principalmente de agentes que historicamente tiveram possibilidades restritas de acessos a arenas de exercício de poder, é utilizado nesta agenda como fator que, ao mesmo tempo, exemplifica o processo de diversificação social pelo qual passa a instituição e evidencia a complexa e intrincada teia de tensões, osmoses, entre forças conservadoras e subversivas, agentes estabelecidos e outsiders10 que se desenha no seu interior.

9 Ver Wolf (2003).

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II Diversificação do espaço jurídico: ingressos de novos segmentos e autonomização da instituição judiciária

Integrando as dimensões de análise proposta, procuramos demonstrar as peculiaridades do processo de diversificação social do espaço jurídico no estado do Maranhão com o ingresso dos “novos agentes”, no caso em questão representado pelas mulheres juízas. Consideramos relevante a realização de tal empreendimento de estudo devido justamente às especificidades encontradas em um contexto marcado por lutas faccionais, estrutura “oligárquica”, onde se destaca o peso das relações pessoais e de parentesco, diferenciando-se, assim, do espaço jurídico encontrado na França, como iremos expor agora e deslocando-se também da situação apresentada no contexto brasileiro mais amplo.

Na França houve uma longa história de submissão da justiça e dos magistrados ao poder político. Esta passa largamente pelo controle do recrutamento e de seu avanço no curso de questões a certos “negócios” que colocavam em cheque os “homens políticos”. Tudo leva a pensar que a dependência original, bastante forte da justiça frente ao poder político, foi constitutiva de uma cultura profissional específica, relacionada ao fato da aprendizagem e de interiorização de todo um conjunto de normas e valores, de regras de conduta que são sociais profissionais e políticas. O recrutamento de magistrados se deu por muito tempo na França preponderantemente por patronagem política, cartas de recomendação de ministros e parlamentares.

Em agosto de 1906, foi temporariamente instituído o concurso como forma de recrutamento da magistratura francesa pelo “décret Sarrien”. Tal decreto, além do concurso, trazia outras possibilidades de modificações profundas de mentalidades e práticas com vistas a uma maior democratização do corpo e uma autonomia maior da magistratura. No entanto, este foi fortemente combatido pelo partido radical e revogado muito rapidamente em fevereiro de 1908. Somente em 1958, cinquenta anos depois, que o concurso como modo de recrutamento foi definitivamente instituído.

Garraud (2001) discorre sobre a construção de uma cultura profissional de conformismo social pesando sobre a atitude de submissão da magistratura. Como exemplar de tal situação o autor cita as ações dos magistrados sob o regime de Vichy11. A nova política judiciária de exclusão e exceção e a construção de uma nova elite jurídica por meio do jogo de promoções aos juízes que aderissem abertamente as suas práticas, a inserção de militares,

11 Regime autoritário anti-semita, atuou na França de 1940-1944. Para maiores informações sobre a magistratura

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antigos combatentes e policiais no corpo judiciário, não suscitaramprotestações por parte dos juízes profissionais, ao contrário, ocorreu uma aceitação mais ou menos ativa ou passiva.

Analisar a magistratura sob Vichy permite ver não só como um poder autoritário, engajado em uma “revolução nacional” com meios violentos para sua existência faz uso da justiça, como também permite observar de que forma um corpo judiciário, possuidor de tradições seculares e ligado a um regime republicano precedente, reage frente a um regime que contradiz alguns de seus princípios constitutivos.

Garraud (2001) chama atenção para o fato da magistratura não ter na época um movimento coletivo e organizado como em outras profissões, mas apenas engajamentos individuais de resistência. Essa atitude de submissão se explica por essa interiorização de uma cultura profissional de “conformismo” social. Não podemos esquecer a dimensão processual central no espaço judiciário como espaço profissional. A atividade profissional da magistratura e suas maneiras de agir são estreitamente inseridas nos processos jurídicos, extremamente formalizados e codificados, deixando, a priori, pouco lugar ao engajamento político.

O funcionamento da justiça como instituição na França é condicionado por três fases principais: engajamento da ação pública (ação exclusiva do ministério público e seu representante local, le parquet12), a instrução (conjunto de investigações) e o julgamento (é condicionado pela instrução, mas depende também de outras regras processuais).

Garraud (2001) mostra como a instituição judiciária foi por muito tempo na França fortemente dependente do poder político. A autonomização é produto de várias mudanças que acumuladas e interagindo entre si possibilitaram um relaxamento sensível das possibilidades de controle da instituição judiciária pelo poder político. As transformações das regras do jogo aparecem como condição central de papéis novos assumidos pelos magistrados.

Dentre os fatores que contribuíram para autonomização da magistratura na França está a transformação da origem social dos juízes por meio da mudança na forma de recrutamento; a criação da Escola Nacional da Magistratura, em 1959, a emergência do sindicato profissional de magistrados, em 1968, e a gestão das carreiras.

A utilização do concurso, como mencionamos anteriormente, como modo de recrutamento veio de forma extremamente tardia na França, em 1958, e a formação só se

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desenvolveu realmente com a transformação da Escola Nacional de Magistratura, em Bourdeaux, possibilitando uma aprendizagem e interiorização de uma visão social do mundo mais larga, mais aberta. Foi a Escola Nacional de Magistratura que contribuiu para unidade do corpo judiciário, proporcionando a construção de uma identidade e estabelecendo o ensino de uma deotolongia comum. De modo que a ENM ajudou adquirir um conjunto sólido de uma cultura de independência. São os sindicatos profissionais que engajaram um trabalho de reflexão sobre a função de magistrados que levou a um combate vigoroso por uma unidade do corpo judiciário e sua independência (GARRAUD, 2001).

O novo modo de recrutamento instituído em 1958 contribuiu para a transformação da origem social dos magistrados, possibilitando a entrada mais acentuada de segmentos da classe média assalariada. Esse fenômeno resultou em um relaxamento da proximidade social que unia magistrados e “notáveis” políticos locais. Cabe destacar, portanto, que a forte sindicalização dos anos 1970 não é independente da transformação da origem social da magistratura.

Todos esses elementos diferentes (recrutamento por concurso, sindicalismo, ENM) e relacionados entre si, contribuíram para uma transformação profunda da profissão. Aquele antigo perfil do magistrado, isolado por conta da sua posição na hierarquia social, proveniente das altas camadas sociais, é substituído por um modo de organização da profissão que conduziu uma redefinição progressiva da identidade profissional e do papel dos magistrados.

No Brasil, diversamente do contexto francês, devido seu passado colonial, sua situação de dependência econômica e política de Portugal, a magistratura inicialmente se estabelece na esteira da situação de que falávamos anteriormente sobre importação de um modelo estatal, salientada por Badie e Hermet (1993). É interessante notar que essa importação do modelo de magistratura, ou mais amplamente, modelo de Estado, não ocorria apenas em virtude de um sistema mantido por uma ordem internacional que objetivava reproduzir uma estrutura de poder no Brasil, mas também é consequência de um conjunto de atores, “construtores de Estado”, que estavam inclinados a realizar esta importação, em virtude de suas origens sociais e seus interesses.

Desde o período imperial que os juízes no Brasil surgiram como importantes componentes da elite política, exercendo diferentes funções de Estado. Essa imbricação entre os espaços político e jurídico foi chamada de bacharelismo13. Em um contexto de pouca diferenciação estrutural entre estas esferas de dominação, percebemos a baixa autonomia

13 Expressão para explicar a relação do bacharel com a esfera política no Brasil, especialmente no período

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relativa do espaço jurídico. A ausência dos cursos superiores no Brasil é atribuída justamente a esse projeto colonizador da Coroa, possibilitando apenas a uma pequena parcela da sociedade ter acesso às universidades, devido aos custos elevados para se deslocar e estudar na Europa, formando assim a “ilha de letrados”, a qual se refere Carvalho (2003). A ideia de homogeneidade da elite brasileira, nesse período, é sustentada pelo autor :

A homogeneidade ideológica da elite política e o treinamento seriam características marcantes da elite política portuguesa, criatura e criadora do Estado Absolutista. Uma das políticas dessa elite seria reproduzir na colônia uma outra elite feita a sua imagem e semelhança. A elite brasileira, particularmente da primeira metade do século XIX, teria treinamento em Coimbra concentrado na formação jurídica e seria em sua grande maioria, parte do funcionalismo público, especialmente da magistratura e do Exército (CARVALHO, 2003:34, grifos nossos).

Carvalho (2003) fala sobre a importância do bacharelismo, especialmente da chamada geração coimbrã14, no fomento de uma elite burocrática que ocupava especialmente a magistratura:

Partimos da suposição de que o emprego público era a ocupação que mais favorecia uma orientação estatística e que melhor treinava para as tarefas de construção do Estado na fase inicial de acumulação do poder. A suposição era particularmente válida para os magistrados que apresentavam a mais perfeita combinação de elementos intelectuais, ideológicos e práticos favoráveis ao estatismo (CARVALHO, 2003: 99, grifos nossos).

Engelmann (2006), ao realizar uma sociologia do campo jurídico no Rio Grande do Sul, demonstrou como a apropriação das tecnologias institucionais no Brasil, na sua origem, de fato estava pautada na tradição de manutenção e reprodução das hierarquias sociais. O autor evidencia uma tradição jurídica herdeira do padrão do bacharelismo imperial. De acordo com Engelmann:

A tradição que se constitui no Rio Grande do Sul está estreitamente vinculada à modalidade brasileira formada no período colonial e imperial, que originou a expressão “bacharelismo”. Nesses termos, pode ser apreendida na análise dos diversos usos do título de bacharel, do saber-fazer e da relação dos juristas com o ensino e o conhecimento jurídico na sua inserção social e política (...) além da forte presença dos bacharéis em direito exercendo mandatos parlamentares e cargos executivos ao longo do Império, não há uma diferenciação do campo jurídico em relação ao mundo da política (2006: 51-52).

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No início do século XIX, com a transferência da corte portuguesa para o Rio de Janeiro, Sadek (2010) destaca algumas mudanças ocorridas na estrutura judiciária brasileira, com destaque para a criação do Supremo Tribunal de Justiça:

O ano de 1808 foi o marco inicial de uma série de mudanças que terão reflexos no período imperial e também no republicano. Foram várias as modificações introduzidas na organização judiciária. Entre elas destaca-se como a mais importante a transformação da Relação do Rio de Janeiro em Supremo Tribunal de Justiça, equiparado à Casa de Suplicação de Lisboa. Com esta medida, criou-se um tribunal de última instância, apto a examinar todos os recursos, por maiores que fossem os valores envolvidos, e com jurisdição sobre todo o País e também sobre as ilhas dos Açores e da Madeira. Foram também criados mais dois tribunais de relação, um no Maranhão e outro em Pernambuco; instalou-se o Supremo Conselho Militar e de Justiça; o Tribunal da Mesa do Desembargo do Paço e da Consciência e Ordens; a Intendência Geral de Polícia e juizados privativos (SADEK, 2010: 3).

Mesmo com a extinção desses órgãos em 1821, tal estrutura serviu como núcleo para as instituições judiciárias do período pós-Independência. Percebemos, por meio da citação de Sadek, que o Tribunal do Maranhão figura entre os pioneiros de nosso país.

Embora a relação dos magistrados com a conservação das hierarquias sociais em diferentes momentos possa ser considerada quase como um fator de continuidade e unidade, Engelmann (2006:51) afirma que “as bases sociais que condicionam essa relação apresentam grande diversidade”. No Rio Grande do Sul, por exemplo, local onde o autor desenvolveu sua pesquisa, a formação e reprodução da “tradição jurídica” estava relacionada às reconversões de grupos familiares que continuaram, por muitos anos, ocupando posições de destaque no campo jurídico e político. E mais tarde, a fundação da Faculdade de Direito de Porto Alegre, em 1901, se afirmou como importante pólo formador e reprodutor da elite jurídica no Rio Grande do Sul. Com o passar dos anos, com a redemocratização, acompanhada do fenômeno da expansão do mercado escolar, que se iniciara a partir da década de 1970, se acentuando nos anos 1990, o autor mostra como no estado Rio Grande do Sul acontece um processo de diversificação das características dos que tem acesso ao título de bacharel. Engelmann (2006) evidencia os principais fatores que distinguem o conjunto de operadores jurídicos, sendo um segmento que pertence à elite social e outro que se refere aos grupos que ascendem no espaço jurídico por meio do investimento em titulação acadêmica.

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segmento de elite social dos “novos agentes”. Com origem geográfica interiorana, de baixa ou média origem social e não originários das “famílias de tradição jurídica” os investimentos nos títulos de mestrado e doutorado entre os “novos agentes”, mostram-se como importantes recursos para ascensão social. Essa diversificação possibilitou uma ampliação entre as definições de “Estado” e “justiça”, permitindo uma reelaboração dos usos do direito. Engelmann (2006) analisou as diversas possibilidades do uso do título acadêmico, nos mecanismos de promoção nas carreiras de estado, na profissionalização da carreira docente, assim como na gestão dos títulos frentes aos movimentos associativos, ONGs e sindicato dos trabalhadores.

Entender as bases sociais que condicionam a formação e reprodução das elites jurídicas no Maranhão consiste em um dos objetivos de nossa pesquisa, especificamente sobre a justiça estadual.

A organização da Justiça dos Estados15 no Brasil foi bastante deficiente, uma vez que a Constituição de 1891 não deu qualquer diretriz nesse sentido. Embora essa tenha adotado um regime presidencialista e federalista espelhando-se nos Estados Unidos, tal modelo não foi seguido pelos Estados nas suas organizações judiciárias, resultando essas, em sua maioria, de cópias das vigentes no regime imperial. Sobre a ausência de diretrizes para a justiça estadual na constituição de 1981, ressalta Sadek:

A justiça dos estados herdou em linhas gerais a organização judiciária provincial. A Constituição de 1891 silenciou sobre a sua organização e sobre as garantias de seus juízes. Só com a Reforma de 1926 tornaram-se expressas a inamovibilidade e a vitaliciedade dos magistrados e a irredutibilidade de seus vencimentos. Cabia aos estados a organização de sua justiça, cada um com seu Tribunal de Apelação e juízes de comarcas, municípios e distritos (SADEK, 2010: 5).

Com a instauração do Governo Provisório16 (1930-1934), o STF sofreu modificações no que se refere ao seu funcionamento interno. Visando reduzir o problema da morosidade

15Em cada Estado havia um Tribunal de Justiça na capital, com jurisdição sobre todo o território estadual e juízes de direito nas comarcas. Na grande maioria dos Estados havia juízes temporários nos termos, nomeados pelo governo com funções de preparação de processos civis e criminais e de julgamento das causas de menor valor, os quais eram denominados de juízes municipais, substitutos ou distritais. Em cada distrito havia também o tribunal do júri e o juiz de paz (LEAL, 1997).

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foram criadas turmas de cinco juízes, que seriam acrescidas de mais dois quando estivessem em pauta questões constitucionais. Acreditava-se que essa providência traria mais agilidade no pronunciamento sobre os processos, já que as turmas assegurariam a duplicação dos julgamentos de recursos extraordinários e agravos. Naquele momento, estes já haviam se multiplicado mais de 25 vezes, tomando-se como ponto de referência o período em que o STF começou a funcionar. O mesmo decreto (nº 19.656/31) reduziu de 15 para 11 o número de juízes do Supremo. Considerando o mesmo argumento de combater a morosidade e expressando o reconhecimento então existente da necessidade de justiças especializadas, foram ainda regulamentados pela Constituição de 1934 dois novos órgãos: a Justiça Eleitoral e a Justiça Militar. Foi também instituída a Justiça do Trabalho, como órgão administrativo, não, porém, como órgão integrante do Poder Judiciário, somente em 1946 vai ser institucionalizada a justiça trabalhista.

Assim, já em maio de 1932, era instalado o Tribunal Superior Eleitoral, integrando a Justiça Eleitoral, também os Tribunais Regionais Eleitorais nos Estados e os juízes eleitorais. Aspectos adotados na Constituição de 193417 contemplaram bastante a justiça estadual. Esta trouxe a obrigatoriedade do concurso como forma de ingresso na magistratura, regulou o acesso dos magistrados às entrâncias e conferiu ao tribunal, com exclusividade, a prerrogativa de propor alterações no número de juízes e em sua organização interna.

A forma de ingresso via concurso para magistratura é apontada como um dos fatores que contribuíram para diversificação do espaço jurídico no Brasil. Além da forma de recrutamento, Vianna (1997) aponta, de forma mais acentuada, para o alargamento das oportunidades acadêmicas como elemento impulsionador das transformações no perfil da magistratura. Ao falar da juvenialização na magistratura, o autor destaca que a variável “idade” não pode ser percebida fora das grandes transformações produzidas no sistema universitário, “especialmente das escolas privadas, dos cursos noturnos e das faculdades do interior do país, responsável pela notável ampliação do contingente de juízes jovens” (VIANNA, 1997: 65).

Júlio Prestes, apoiado pela elite de São Paulo, fato que fez Getúlio Vargas e muitos políticos do Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Paraíba ficarem insatisfeitos. Em julho do mesmo ano, o candidato a vice-presidente de Getúlio Vargas, o paraibano João Pessoa, foi assassinado. Isso gerou revolta popular em várias regiões do Brasil. Estes conflitos eram, principalmente, entre partidários da Aliança Liberal e defensores do governo federal, todo esse contexto contribuiu para a chamada Revolução de 1930.

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