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As relações entre a UE e a Ucrânia: na direcção do alargamento?

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Academic year: 2021

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Escola de Sociologia e Políticas Públicas

As relações entre a UE e a Ucrânia: na direção do alargamento?

Henrique Daniel Maia Horta

Dissertação submetida como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Estudos Internacionais

Orientadora:

Doutora Inês Marques Ribeiro, Assistente convidada ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa

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i Resumo

O objetivo deste estudo é compreender a atual relação de aproximação entre a União Europeia e a Ucrânia, através de uma análise do discurso da União Europeia sobre a Ucrânia, e sobre o modo como é construída a assinatura do acordo de associação entre ambas as partes, com base em documentos e discursos oficiais de líderes de Instituições Europeias. Propus duas possíveis hipóteses para esta questão, chegando à conclusão de que apesar das relações entre a União Europeia e a Ucrânia apresentarem uma evolução positiva, o discurso da União Europeia afasta a hipótese de adesão, focando apenas na ideia de um maior aprofundamentamento da Iniciativa da Parceria Oriental, no contexto da Política Europeia de Vizinhança.

Palavras-chave: Ucrânia, União Europeia, Acordo de Associação

Abstract

The aim of this study is to understand the current rapprochement between the European Union and Ukraine through an analysis of the EU's discourse on Ukraine, and on how the signing of the association agreement between both parties is constructed, based on official documents and speeches by leaders of European institutions. I proposed two possible hypotheses for this issue, concluding that although relations between the European Union and Ukraine have evolved positively, the EU's discourse removes the possibility of accession, focusing only on the idea of further deepening the EU Initiative. Eastern Partnership in the context of the European Neighborhood Policy.

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ii Índice

Resumo i

Índice ii

Índice de Siglas iii

INTRODUÇÃO 1

CAPÍTULO 1 - Revisão de Literatura 3

1.1 Aproximação da União Europeia à Ucrânia 3

1.2 Aproximação da Ucrânia à União Europeia 4

1.3 Potencial das relações entre a Ucrânia e a União Europeia 5

CAPÍTULO 2 - Metodologia 7

CAPÍTULO 3 - Análise de discurso das relações entre a UE e a Ucrânia 11

3.1 Herman Van Rompuy, "Europe: a continent in a changing world" 11 3.2 Declaração conjunta de Donald Tusk, Jean-Claude Juncker, e Petro Poroshenko

após a 20ª Cimeira UE-Ucrânia 15

3.3 Acordo de Associação entre a UE e a Ucrânia 19

3.4 Discurso da Alta Representante / Vice-Presidente Federica Mogherini na sessão plenária do Parlamento Europeu sobre a situação da implementação do Acordo de

Associação com a Ucrânia 23

3.5 Palavras do Presidente Jean-Claude Juncker na conferência de imprensa conjunta por ocasião da Cimeira UE-Ucrânia com o Presidente da Ucrânia 25

CAPÍTULO 4 - Discussão: AA como caminho para a adesão ou apenas

aprofundamento da Parceria Oriental? 29

CONCLUSÃO 37

REFERÊNCIAS 40

FONTES 40

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iii Índice de Siglas

AA – Acordo de Associação

APC – Acordo de Parceria e Cooperação

DCFTA – Deep and Comprehensive Free Trade Area EEE – Espaço Económico Europeu

NATO – North American Treaty Organization OTAN – Organização do Tratado Atlântico Norte PO – Parceria Oriental

SEAE – Serviço Europeu de Ação Externa UE – União Europeia

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1 INTRODUÇÃO

Este estudo pretende focar-se nas relações de aproximação entre a Ucrânia e a União Europeia (UE) nos últimos anos, em particular durante o período da formulação do Acordo de Associação entre as duas entidades, assinado a 30 Março de 2012, e com entrada em vigor a 1 de Setembro de 2017, até à atualidade, visando o caminho para um possível alargamento da UE, no qual a própria Ucrânia já demonstrara desejo anteriormente (Harding, 2014) como também mais recentemente (Howort, 2017: 126).

Após a independência da Ucrânia em 1991, o país teve vários períodos de aproximação e afastamento à UE e ao ‘Ocidente’. Um dos momentos mais notáveis verificou-se em 2004, antes da Revolução Euromaidan de 2013, durante o qual, após o então Primeiro-ministro pró-Rússia, Viktor Yanukovych, ter sido declarado vencedor das eleições presidenciais, o Supremo tribunal Ucraniano ter considerado as mesmas eleições inválidas, pois julgou que se encontravam viciadas (Swain, 2005: 685). Os resultados levaram a grandes manifestações públicas a favor do candidato da oposição, Viktor Yushchenko, das quais resultou a Revolução Laranja, trazendo os políticos pró-‘Ocidente’ Viktor Yushchenko e Yulia Tymoshenko para o poder e deixando o seu rival, Vyktor Yanukovych, na oposição (Kubicek, 2009: 324).

Yanukovych acabaria por retornar ao poder em 2006 como Primeiro-ministro no partido Aliança da União Nacional até à convocação de novas eleições, em Setembro de 2007, por parte de Tymoshenko, quando era ele próprio Primeiro-ministro. Durante a crise financeira de 2008, a economia Ucraniana caiu cerca de 15%.1 Disputas com a Rússia

em 2009 levaram a que o abastecimento de gás Russo fosse cortado para a Ucrânia e, consequentemente, para outros países Europeus. Yanukovych foi eleito Presidente da Ucrânia em 2010 com 48% dos votos (Newnham, 2013: 116).

Um acordo entre a Ucrânia e a UE, comummente conhecido como o Acordo de Associação da UE (AA), foi iniciado em 30 de Março de 2012 em Bruxelas. Em 2013, depois de o governo de Yanukovych ter decidido suspender o Acordo de Associação com

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2 a União Europeia e procurar laços económicos mais próximos com a Rússia (Abelho, 2017: 75), uma vaga de manifestações que durou meses, em especial na praça central de Kiev, conhecida como Euromaidan (literalmente ‘Europraça’ ou ‘Praça do Euro’), culminou na revolução Ucraniana de 2014, que destituiu o presidente Yanukovych e estabeleceu um novo governo pró-União Europeia (Onuch, 2015: 217).

Nesta série de eventos, a Rússia, vendo um país na sua esfera de influência a aproximar-se à UE e ao ‘Ocidente’, e com receio de que o novo governo da Ucrânia pudesse ingressar na NATO e que Kiev pudesse expulsar a Frota da Rússia no Mar Negro da sua base de longa data em Sevastopol, anexou a península da Crimeia. Esta ação levou à guerra no Leste da Ucrânia (Treisman, 2016), como também à assinatura do Acordo de Associação com a UE em Junho de 2014, juntamente com outros dois países da antiga União Soviética, a Moldávia e a Geórgia. No dia 1 de Janeiro de 2016, a Ucrânia finalmente aplicou o componente económico da ZCLAA – Zona de comércio livre abrangente e aprofundado com a UE.

A presente dissertação estrutura-se da seguinte maneira: no capítulo 1, começarei por apresentar uma revisão da literatura académica sobre a temática. Este primeiro capítulo divide-se em 3 pontos, em que no primeiro apresenta a literatura académica no que diz respeito à aproximação da União Europeia à Ucrânia, o segundo ponto apresenta a literatura académica em relação à aproximação da Ucrânia à União Europeia e o terceiro apresenta a literatura académica no que diz respeito ao potencial das relações entre as duas partes. No capítulo 2 é apresentada a questão de partida e a metodologia, ou seja, o conjunto de regras ou princípios que empreguei nesta dissertação em que desenvolvo algumas possíveis hipóteses para a minha análise, de modo a responder à questão de partida. No capítulo 3, um pouco mais extenso trato de fazer a análise dos documentos que selecionei que dizem respeito a esta temática, baseados na metodologia do capítulo 2. Divide-se em 5 pontos, consoante o número de documentos que selecionei. No capítulo 4, elaboro a discussão, baseada na literatura académica e bibliografia disponível. E finalmente na conclusão faço a proposição final do que analisei e discuti, explicando e justificando qual das hipóteses acabei por concluir nesta dissertação.

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3 CAPÍTULO 1 - Revisão de Literatura

A revisão da literatura académica dividir-se-á em 3 partes. Na primeira parte irei analisar o que tem sido debatido no meio académico sobre os esforços, por parte da União Europeia, de aproximação à Ucrânia. Na segunda parte irei analisar o que tem sido debatido no meio académico sobre as ações da Ucrânia e dos seus governantes de forma a se aproximarem da UE. Aqui irei considerar os eventos relevantes mais recentes como a revolução Euromaidan, e em especial a assinatura e entrada em vigor do Acordo de Associação e da ZCLAA entre a Ucrânia e a UE, dado que a entrada em vigor do Acordo de Associação em 2017 pode ser considerada um dos marcos mais importantes nas relações entre as duas entidades. Na terceira parte analisarei as interpretações e projeções, feitas por académicos, relativas ao potencial futuro de aproximação de ambas as partes.

1.1 Aproximação da União Europeia à Ucrânia

Desde 2004 (e até antes) que a União Europeia tem tido uma presença cada vez maior na Europa Centro-Oriental. Com a adesão de 10 novos países à UE - nomeadamente Malta, Chipre, Eslovénia, os três países do Báltico, Estónia, Letónia e Lituânia e em especial, o grupo de Visegrado, composto pela Polónia, Hungria, República Checa e Eslováquia - que a esfera de influência da UE se estendeu a Leste, com as respetivas fronteiras externas a tocar na Ucrânia.

Apresentada em 2008 pelos ministros dos Negócios Estrangeiros da Suécia e da Polónia, a Parceria Oriental, uma iniciativa conjunta entre a UE e 6 outros países da ex-União Soviética (Azerbaijão, Arménia, Geórgia, Bielorússia, Moldávia e Ucrânia) no âmbito da Política Europeia de Vizinhança, foi lançada em 2009 e veio a aproximar estes países à UE, através de um discurso baseado nas suas próprias subjetividades e agenda de políticas. Deste modo, o discurso Europeu veio a enquadrar a Parceria Oriental como um esforço que visa "conquistar" os países da vizinhança do Leste e "reverter" a influência

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4 da Rússia (Cadier, 2019). De entre este grupo de países, a Moldávia, Geórgia e finalmente a Ucrânia aproximaram-se com maior intensidade à UE, assinando cada um, respetivamente, acordos de Associação com a UE em Junho de 2014. A Parceria Oriental, apesar do seu poder limitado (Martinaitis, 2018), foi então o primeiro marco para intensificar relações entre a UE e a Ucrânia, nomeadamente através da normalização e harmonização de legislação (Burlyuk e Shapovalova, 2017) como também de modo a providenciar maior segurança relativa na região (Axyonova, 2016).

Apesar de a UE se encontrar relativamente constrangida na zona de influência da Rússia (Kuzio, 2016; Nillson e Silander, 2016), continua a demonstrar vontade em apoiar a Ucrânia na estabilização da sua economia, incentivando reformas judiciais, políticas e económicas e uma maior integração económica (Vosta, Musiyenko e Abrhám; 2016). A UE também reagiu aos desafios que surgiram no contexto da sua aproximação à Ucrânia, posteriormente à assinatura do AA, nomeadamente na sua resposta em relação à anexação da Crimeia, à queda do avião MH17 da Malaysian Airlines e à guerra na região Donbass Para através de poder coercivo como sanções (Natorski e Pomorska, 2017).

1.2 Aproximação da Ucrânia à União Europeia

A Ucrânia teve, recentemente, dois momentos mais notáveis de aproximação ao ‘Ocidente’ e à União Europeia: o primeiro durante a Revolução Laranja, no ano de 2004; e o segundo durante os eventos da revolução Euromaidan, em 2013/4. Na segunda parte da dissertação irei mencionar a volatilidade com que o país alternava entre uma maior proximidade ora com a Rússia, ora com a UE, em especial no período pouco antes e depois da revolução Euromaidan (Kerikmae, 2018) que levou à destituição de um presidente e governo pró-Rússia para alterar o paradigma do país para uma orientação mais próxima do ‘Ocidente’ (Haukkala, 2016) e que levou à assinatura do Acordo de Associação com a UE em 2014, que entrou em vigor em 2017.

Apesar de a construção do Estado Ucraniano e das instituições europeias serem ambos internamente profundamente plurais, ambos processos reivindicam certos

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5 privilégios hegemónicos, contribuindo para atual situação política na Ucrânia (Sakwa, 2017), contribuindo para o atual paradigma e dicotomia de escolha Rússia versus União Europeia no país. Entre outras razões, para além da anexação da península da Crimeia por parte da Rússia, a assinatura do Acordo de Associação com a UE levou também, por consequência, a um maior afastamento da Ucrânia em relação à Rússia, em termos de relações comerciais, e a uma maior aproximação à UE, graças ao seu poder normativo (Veebel, 2018; Petrov, 2018). Este afastamento diminuiu a esfera de influência da Rússia, apesar de várias tentativas para o travar, através de ferramentas de hard power (abordagem coerciva das relações políticas internacionais, especialmente uma que envolve o uso do poder militar, invasão Americana do Iraque, por exemplo) e soft power (uma abordagem persuasiva das relações internacionais, tipicamente envolvendo o uso de influência económica ou cultural, uso dos média por parte de um estado, a Al Jazeera para o Qatar, por exemplo) (Barret, 2018) e aumentou a esfera da influência da União Europeia na Ucrânia, alterando a perceção dos próprios Ucranianos em relação ao seu próprio país e à UE (Eleches e Robertson, 2018; Reznik, 2017).

1.3 Potencial das relações entre a Ucrânia e a União Europeia

Finalmente, na última parte do trabalho, irei analisar as perspetivas que vários autores projetam e preveem, através das várias alternativas que propõem para o futuro no relacionamento entre a Ucrânia e a União Europeia (Davydchyk et al. 2018), olhando também para os efeitos de uma abertura do Mercado Comum à Ucrânia (Harbuzyuk e Lutz, 2008) com especial detalhe para o comércio livre na área da agricultura (Yatsenko et al., 2017), analisando os efeitos produzidos até agora (Kubaeinko, 2018) pelo Acordo de Associação assinado (Lemishko, 2017) como também a sua eficácia (Kovova et al., 2018). A análise será feita, no entanto, com o devido cuidado, pois projeções e outro tipo de análises que prevejam eventuais cenários nas relações entre a UE dependem sempre do clima geopolítico da região e dos dados trabalhados.

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7 CAPÍTULO 2 - Metodologia

O objetivo desta dissertação é analisar a aproximação da União Europeia (a partir da perspetiva da mesma) à Ucrânia, partindo da seguinte questão de partida: no contexto do discurso da União Europeia sobre a Ucrânia, de que modo é construída a assinatura do acordo de associação entre a Ucrânia e a UE?

Para responder a esta questão, proponho duas hipóteses, que irei testar ao longo da dissertação: a primeira é que a assinatura do acordo de associação entre a Ucrânia e a UE é construída como um caminho para a adesão da Ucrânia à UE (Vosta, 2016); e a segunda hipótese é que se trata apenas de um aprofundamento da Parceria Oriental no âmbito da política de Vizinhança da União Europeia (Langbein, 2012). Tendo em conta este percurso, e olhando também para o percurso de outros países vizinhos semelhantes à Ucrânia que visam aderir à UE, pretendo analisar o trabalho político desenvolvido pelas instituições e oficiais de relevo da UE. Mais concretamente, pretendo analisar documentos escritos e produzidos por estas entidades no que diz respeito à elaboração do Acordo de Associação (comunicados oficiais, o acordo de associação em si, avaliações da Comissão Europeia da formação e implementação do mesmo), como também afirmações feitas através dos canais oficias da UE, os seus press releases, passando pelos sites oficiais da Comissão Europeia, Conselho Europeu, e outras instituições Europeias relevantes para a questão de partida.

Visto que o período do Acordo de Associação passa também por um período de transição de atores dentro das Instituições Europeias, irão ser analisadas afirmações dos presidentes da Comissão Europeia, Presidentes do Concelho Europeu, com especial atenção e enfoque em documentos produzidos pelas Instituições Europeias na elaboração, assinatura e entrada em vigor deste tratado. Usarei ao todo cinco fontes, 1) o discurso “Europe: a continent in a changing world / Europa: um continente num mundo em mudança” de Herman Van Rompuy (Presidente do Conselho Europeu) à Associação da Política Externa e das Nações Unidas da Áustria (8 de Abril de 2014); 2) a Declaração conjunta de Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu, Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia, e Petro Poroshenko, presidente da Ucrânia, após a

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8 20ª Cimeira UE-Ucrânia em Bruxelas (9 de julho de 2018) - ambos estes documentos apresentam uma diferença de mais de 4 anos, podendo, de certa forma, mostrar a evolução das relações entre as duas entidades, e foram ambos produzidos pelo Conselho Europeu; 3) o Acordo de Associação entre a UE e a Ucrânia, datado de 29 de Maio de 2014, cujas primeiras 171 páginas detêm conteúdo mais relevante para analisar; como também 4) as declarações da Alta Representante da UE ao Parlamento Europeu acerca da sua implementação, 4 anos depois, em 2018; e, por último, 5) as palavras do Presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, na conferência de imprensa conjunta da Cimeira UE-Ucrânia com o Presidente da Ucrânia, Petro Poroshenko, e Donald Tusk, Presidente do Conselho Europeu (9 de julho de 2018).

Escolhi as duas primeiras fontes pois são as declarações proferidas por oficiais de topo da UE, o presidente do Conselho Europeu na primeira fonte e os presidentes do Conselho Europeu, da Comissão Europeia, e da Ucrânia na segunda. As declarações destes actores distam quatro anos entre si, de 2014 para 2018 respectivamente, o que será interessante também avaliar a evolução das afirmações dos mesmos em relação à aproximação entre as duas entidades. De seguida, escolhi o Acordo de Associação em si, e o seu subsequente relatório, pois o acordo em si é uma das principais razões para a aproximação entre a UE e a Ucrânia. O discurso acerca da sua implementação é também relevante para contextualizar as afirmações dos intervenientes das afirmações nos dois primeiros documentos escolhidos como também contextualiza e explica os avanços nas relações Euro-Ucranianas. Por fim, o último documento foi escolhido da mesma forma que o relatório da implementação, na medida em que ilustra o ponto de situação das relações entre as duas entidades, quatro anos depois.

Usarei a análise de discurso como método de análise dos dados recolhidos. Este tipo de análise baseia-se em diferentes conceitos, o de agência humana (atores), de subjetividade e da primazia da linguagem, o sentido mais oculto ou implícito que determinada frase detém e interpretar as implicações das afirmações veiculadas nestes documentos. De acordo com Flick (2014), a análise de discurso incide sobre os efeitos (sociais, institucionais, psicológicos) do discurso, e não sobre os pensamentos e sentimentos dentro dos indivíduos que podem dar origem às palavras que eles proferem.

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9 Já com as fontes identificadas, a análise de discurso será baseada nas directrizes de Chouliaraki e Fairclough (1999), que permitirão analisar a conjuntura e identificar o aspecto semiótico (i.e., de transmissão de mensagens) dos documentos. Esta análise divide-se em duas: a da conjuntura, onde é especificada a configuração das práticas nas quais o discurso é localizado, e a análise das práticas particulares e das práticas e suas relações com outros elementos (atividade material, processos mentais, relações sociais).

Depois de analisado o discurso é então necessário considerar o aspecto problemático e obstáculos do mesmo, identificar possíveis soluções para o resolver e finalmente, reflectir sobre os mesmos (Queiroz, 2014). Algumas sub-questões de investigação a que procurarei responder são:

• Como é que a UE define a identidade da Ucrânia? Usa expressões como ‘adesão’ ou ‘membro’? Ou usa expressões mais distantes que denotem biliteralismo como ‘parceiro’?

• Verificam-se, nos discursos analisados, alterações de expressões que apresentem uma maior proximidade à Ucrânia na diferença de quatro anos entre documentos?

Usarei, portanto, a análise de discurso, de forma a mapear o modo como a UE fala sobre a Ucrânia neste contexto (através de narrativas), e entender como é que a UE concebe a sua esfera de influência sobre a Ucrânia, no contexto da Parceria Oriental, bem como as condições que subjazem à participação da Ucrânia neste projeto. Apesar de as fontes e a bibliografia se encontrarem em Inglês, irei fazer a análise em Português.

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11 CAPÍTULO 3 - Análise de discurso das relações entre a UE e a Ucrânia

A análise de discurso, com base nos documentos escolhidos, irá, portanto, começar por ordem cronológica, do documento mais antigo, para o mais recente, pois desta forma poderemos ter também noção e estarmos mais cientes de se houve ou não alguma evolução nos discursos e narrativas utilizados pelos diferentes agentes.

3.1 Herman Van Rompuy, "Europe: a continent in a changing world"

Comecemos então pelo discurso “Europe: a continent in a changing world / Europa: um continente num mundo em mudança” de Herman Van Rompuy à Associação da Política Externa e das Nações Unidas da Áustria (8 de Abril de 2014). Feitas as introduções e depois de descrever a situação geopolítica por toda a Europa, terminando com a invasão da Crimeia pela Rússia, o então Presidente do Conselho Europeu, começa por afirmar:

[The Association Agreement between the EU and Ukraine] was a strong way to recognise the aspirations of the people of Ukraine to live in a country governed by values, by democracy and the rule of law, where all citizens – and not just few – have a stake in national prosperity. We recognise the popular yearning for a decent life as a nation, for a European way of life. Last November, it was the refusal to sign that very Association Agreement with the European Union which triggered the Maidan movement – the “Euro Maidan”. A real democratic uprising by people who had had enough of how they were governed. A political and cultural shift. A clash of two political cultures (Presidente do Conselho Europeu, 2014: 2).

Neste excerto, Van Rompuy destaca ‘as aspirações do povo da Ucrânia’, de viver ‘num país governado por valores, pela democracia e pelo Estado de direito’ e mais à frente reconhece estes atributos como um ‘anseio por uma vida decente enquanto nação’, baseados num ‘estilo de vida Europeu’. Aqui, o ‘estilo de vida Europeu’ é colocado num

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12 patamar superior, ao ser caracterizado como desejável / decente, face ao outro que a Ucrânia decidiu abandonar, por oposição caracterizado inerentemente como inferior, indesejável / indecente, um choque de dois paradigmas e culturas políticas explicitamente identificados como opostos / contrastantes. Neste parágrafo podemos observar Van Rompuy a enaltecer a escolha do povo Ucraniano por algo que se coaduna com as normas e valores da UE, também presente no AA, que é tanto normativo como condicional, como veremos mais à frente na análise do terceiro documento. Van Rompuy recorre ao termo ‘Europa’ em vez de ‘União Europeia’, quase como se fossem termos intercambiáveis. Esta escolha não é inocente, nem ao acaso, Van Rompuy fala em nome de uma organização que não inclui todos os Estados da Europa, mas projecta para a Europa os seus ideais. De acordo com Kuus (2011: 1151), o autor defende que a palavra ‘Europa’ detém uma ‘ambiguidade construtiva’, de ser simultaneamente sem fronteiras e claramente delimitada. Kuss defende que Europa é usada como sinónimo para a UE, embora pareça não fazer nada disso, ao mesmo tempo que estabelece uma hierarquia tácita que se baseia não apenas no modo de vida ou em outros indicadores mensuráveis, mas numa qualidade indefinida, porém desejável, uma ‘Europeídade’. Quando a UE (ou, mais especificamente, a Comissão) evoca a Europa, Kuus afirma que é suavemente enquadrado como um exercício descritivo e os seus “efeitos normativos são obscurecidos” (ibid.).

Ao longo do discurso, o Presidente do Conselho Europeu afirma que o AA servirá como uma “bússola”, tendo em conta o contexto anterior, que servirá não só para guiar a Ucrânia numa altura de fortes instabilidades, mas, com os direitos aduaneiros removidos (temporariamente) entre a Ucrânia e a UE, na sua convergência para a ‘Europa’, dado que a bússula indica a ideia de rumo / direção. Van Rompuy continua:

We are also clearly beyond the situation where our main foreign policy tool is EU enlargement – even if, indeed, enlargement has been our most successful foreign policy. The mere perspective of EU accession is helping our closest neighbours to become more stable, modern and democratic. This was particularly true since 1989, when the Iron Curtain came down. One could say we are currently in the third

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post-13

Cold-War wave of enlargement. First, the wave of the Cold War (…) and the third wave is that of the Western Balkans. With the entry of Croatia as our 28th member state, last July, that wave is well on its way. (…) The result of the last election in Serbia endorsed the country's choice for a European future, for peace and prosperity. And as the European flags at the Maidan in Kiev showed, the magnetic force of our Union is still at work (Presidente do Conselho Europeu, 2014: 4).

Ao afirmar que apesar de a política externa da UE estar para além da ideia de o principal instrumento de política externa ser o alargamento, Van Rompuy enfatiza que o alargamento tem sido ‘a política externa de maior sucesso’ da UE e que ‘a mera perspetiva de adesão à UE está a ajudar os nossos vizinhos mais próximos a tornarem-se mais estáveis, modernos e democráticos.’ Com estas afirmações, Van Rompuy afirma que a expansão e alargamento da UE foram bem-sucedidas, como também já há uma grande variedade de instrumentos de política externa ao dispor da União, e o alargamento já não é o principal, mas continua mesmo assim a ser a política de maior sucesso neste âmbito; a mera possibilidade ou perspetiva de outros estados se juntarem à UE é vista como um catalisador de mudança, para estes estados se tornarem mais estáveis, modernos e democráticos. Neste âmbito, Van Rompuy destaca essas mudanças no contexto dos estados aliados ou pertencentes à ex-União Soviética, vendo essas mudanças como sendo positivas e ambicionáveis, ao contrário de estados com maior instabilidade ou antidemocráticos / autocráticos. No entanto, este prelúdio, nas suas palavras, destina-se ao que chama de ‘terceira vaga de alargamento’, referente aos Balcãs Ocidentais, e não necessariamente à Ucrânia.

Depois de descrever a evolução da situação geopolítica na região, o Presidente do Conselho Europeu volta a citar o caso Ucraniano. Analisando estas declarações, apesar de a Ucrânia não estar nos planos mais imediatos de alargamento da União Europeia (que coloca a atenção nos países dos Balcãs Ocidentais), Van Rompuy afirma que a mera perspectiva de adesão, ‘a força magnética da nossa União’, está em ação, afirmação que reflecte a realidade, visto que a vasta maioria dos países dos Balcãs Ocidentais já é oficialmente candidato (incluindo a República da Macedónia do Norte, a

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14 Albânia, a Sérvia, e Montenegro). A ambiguidade de Van Rompuy ao mencionar a ferramenta do alargamento num contexto (Ucrânia) em que esta não está prevista, reflecte a percepção da UE em relação, por um lado, ao seu próprio magnetismo / atractividade, e, por outro, às ambições projectadas pelo governo Ucraniano.

No último paragrafo a destacar deste documento, Van Rompuy afirma: “(...) if the relationship between Ukraine and the European Union was for a long time seen as a matter of interest to Poland alone, already last autumn (so before the latest events) every leader (…) fully realised that what was happening in Ukraine was an issue of common concern” (ibid. 5). Neste último paragrafo, Van Rompuy descreve uma mudança de paradigma, chamando a atenção para a Ucrânia ter passado ser vista como numa preocupação comum da UE, e não apenas uma matéria ou ponto de interesse dos Estados Membros da região da Europa Centro-Oriental, apontando para uma homogeneização no que diz respeito ao interesse da Ucrânia por parte de todos os Estados Membros da UE, relacionada com as agressões militares e económicas à Ucrânia, no momento em que este discurso foi proferido.

Este discurso do então Presidente do Conselho Europeu, apesar de revelar aprovação pelas mudanças políticas ocorridas na Ucrânia, e pela escolha e até mesmo ânsia por “um estilo de vida Europeu”, e a maior consciencialização por parte dos membros da UE face às mudanças políticas que se desenvolveram no país, não usa palavras como ‘membro’, ‘adesão’ ou ‘alargamento’ para descrever diretamente as relações entre a UE e a Ucrânia (embora mencione esta ferramenta da política externa da UE). A palavra mais recorrente é ‘associação’, que está presente no próprio nome do acordo assinado entre as duas entidades, demonstrando o relativo baixo nível de comprometimento que está inerente a este conceito face aos anteriormente mencionados. A descrição do pacote financeiro como uma “bússola” que pudesse guiar a Ucrânia, numa altura em que passava por instabilidade económica e tensões militares indica que Van Rompuy considera que o ponto de referência de padrões adequados para a Ucrânia é a UE, refletindo uma lógica de assimetria na qual a UE se posiciona num patamar superior. Apesar de o Presidente do Conselho Europeu ter posto o foco do alargamento da UE nos países dos Balcãs Ocidentais, a Ucrânia mesmo assim foi

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15 mencionada como exemplo do ‘magnetismo’ e desejabilidade da UE aos olhos de outros países Europeus e da vizinhança.

3.2 Declaração conjunta de Donald Tusk, Jean-Claude Juncker, e Petro Poroshenko após a 20ª Cimeira UE-Ucrânia

Na Declaração conjunta de Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu, Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia, e Petro Poroshenko, presidente da Ucrânia, após a 20ª Cimeira UE-Ucrânia de Bruxelas, de 9 de julho de 2018, pouco mais de quatro anos após o discurso de Van Rompuy, o vocabulário é um pouco mais ‘profundo’, embora as palavras usadas ecoem, de certa forma, as de Van Rompuy quatro anos antes. Decidi selecionar os três primeiros parágrafos que demonstram maior relevância para o estudo do caso. Há que sublinhar o facto de existir um desequilíbrio nos oradores em termos de representatividade das instituições – dois actores da UE e um da Ucrânia, o que se reflecte no discurso e na própria designação da Cimeira, nas quais a menção da União Europeia antecede a da Ucrânia.

We, the leaders of the European Union and Ukraine, gathered today to reaffirm our continuous commitment to strengthening the political association and economic integration of Ukraine with the European Union, on the basis of the Association Agreement and our common values of democracy, the rule of law and human rights. We have reaffirmed our attachment to international law. The EU reiterated its unwavering support and commitment to Ukraine's independence, sovereignty and territorial integrity within its internationally recognised borders. We recognised the substantial progress made by Ukraine in its reform process, which is essential both to meet the demands of Ukraine's citizens and to strengthen Ukraine's resilience to the external challenges it faces (Presidentes do Conselho Europeu, da Comissão Europeia, e da Ucrânia, 2018: 1).

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16 No primeiro paragrafo, como podemos ver, muitas das mesmas palavras e frases são semelhantes às usadas pelo antigo Presidente do Conselho Europeu, ‘os nossos valores comuns de democracia, estado de direito e direitos humanos’, apontando mais uma vez para o caracter normativo da UE e para a assunção de que estes valores são universais e, por conseguinte, comuns com outros actores fora da UE. São também empregues as expressões ‘contínuo reforço’, ‘associação política’, e ‘integração económica’, com base no Acordo de Associação, reflectindo uma certa hierarquia onde a UE se posiciona acima da Ucrânia, na medida em que é a UE que permite a associação e integração da Ucrânia às suas estruturas políticas e económicas, e ainda ‘reconhece os progressos substanciais realizados pela Ucrânia’ nas suas reformas. Nesta última frase podemos ver a União Europeia a colocar-se numa ideia implícita de superioridade: a UE aprova / reconhece o esforço da Ucrânia no caminho de se aproximar aos padrões Europeus no âmbito das suas reformas.

Apesar da autoria do documento ser conjunta, grande parte do texto reflecte o discurso da União Europeia sobre a situação da Ucrânia, sugerindo uma subordinação da mesma à UE. Neste parágrafo podemos também concluir que são reconhecidas uma mudança de paradigma e uma maior proximidade entre as duas entidades, decorrentes das reformas desencadeadas pela Ucrânia, possíveis graças ao apoio e incentivo da UE.

We welcomed the substantial increase in bilateral trade flows and the effective implementation of the visa-free regime, contributing to deepening relations between our societies. We stressed our shared commitment to the Eastern Partnership and welcomed the outcome of the Brussels Summit in November 2017 to guide our joint practical work in the implementation of the "20 deliverables for 2020". While preserving the inclusivity of the Eastern Partnership, we looked forward to engaging the AA/DCFTA partners in joint discussions on the progress, opportunities and challenges concerning the association-related reforms, as requested by these partners, and with the aim of facilitating full implementation of the AA/DCFTA. We commended the entry into force on 1 September 2017 of the Association Agreement and its Deep and

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Comprehensive Free Trade Area (DCFTA), following the December 2016 decision by the EU Heads of State or Government (ibid.).

No segundo parágrafo, os protagonistas saúdam ‘o aumento substancial dos fluxos comerciais bilaterais e a implementação efetiva do regime de isenção de vistos, contribuindo para o aprofundamento das relações’ entre as duas sociedades. Destaque especial para expressões como ‘aumento substancial’, ‘bilaterais’, mas também o ‘aprofundamento’ entre ambas as sociedades. As palavras utilizadas revelam não só uma percepção dos actores de uma maior proximidade e desenvolvimento de relações, como também de reciprocidade, com o uso do termo ‘bilaterais’. Os interlocutores usam várias palavras e expressões que sugerem igualdade como ‘trabalho prático conjunto’, ‘parceiros’, ‘discussões conjuntas’ e depois tornam a usar termos que sugerem desigualdade ou assimetria de poder como ‘progressos’ (em direcção a normas e padrões Europeus), ‘oportunidades’ (graças às condições proporcionadas pela UE) e ‘desafios’ (de um Estado que ainda não atinge o nível / padrões Europeus), mostrando novamente uma maior subordinação da Ucrânia (e outros parceiros ZCLAA) face à União Europeia.

Mais em diante, é mencionado o ‘compromisso comum com a Parceria Oriental’ como também futuras discussões acerca dos ‘progressos, oportunidades e desafios relativos às reformas relacionadas à associação’. Apesar de palavras como ‘progressos’, ‘oportunidades’ e ‘desafios’ serem muito utilizados nestas afirmações (e poderem conter determinadas conotações, acima referidas), o termo mais usado é de ‘associação’ como também o de ‘parceria’, palavras que constam amplamente nos acordos assinados entre a Ucrânia e a União Europeia.

In this context, we acknowledged the European aspirations of Ukraine and welcomed its European choice, as stated in the Association Agreement. We welcomed the results already achieved in the implementation of the Association Agreement including the DCFTA, and reconfirmed our commitment to accelerate these efforts. We welcomed Ukraine’s continued commitment under the AA/DCFTA to approximate its legislation to that of the Union, inter alia in the fields of digital market, customs cooperation and

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energy in order to contribute to creating growth and jobs and to further facilitate trade. We looked forward to jointly taking stock of progress at the next Association Council (ibid. 1).

No terceiro parágrafo, repetem-se um pouco as palavras de Van Rompuy de quatro anos antes, ‘reconhecemos as aspirações Europeias da Ucrânia e congratulamo-nos com a sua escolha Europeia’. Aqui, novamente, são usadas palavras alusivas a ‘Europa’ em vez de ‘União Europeia’, projectando os ideias da UE para a Europa (Kuus, 2011). Para além deste ecoar das palavras do ex-presidente do Conselho Europeu, os actores declaram também que reconfirmam o seu ‘compromisso de acelerar esses esforços’ como também o ‘compromisso continuado da Ucrânia’ ao aproximar a sua legislação à da UE ao abrigo do Acordo de Associação. Através da análise deste discurso, podemos assumir que a posição se mantém: a União Europeia (como também neste caso a Ucrânia, visto que este discurso é uma declaração conjunta), mantém a posição de que a adesão é uma aspiração da Ucrânia, uma ‘escolha Europeia’ (embora a própria UE seja omissa ou rejeite essa hipótese). Destaca-se o comprometimento constante do país de forma a se aproximar da UE no âmbito do Acordo de Associação assinado pelas duas entidades.

Passados quatro anos, algumas das mesmas expressões usadas pelos líderes das instituições da UE são de novo usadas: ‘as aspirações Europeias da Ucrânia’, a sua ‘escolha Europeia’. Reconhecem que é uma ambição do país ter normas e valores que se coadunem com as da organização, numa lógica inerentemente assimétrica. Apesar de neste documento mais recente constarem palavras como ‘progressos’, ‘oportunidades’, ‘aprofundamento’, ‘acelerar’, e mesmo expressões como ‘contínuo reforço da associação política e da integração económica’, os autores reconhecem que todos esses mesmo avanços de relações entre as duas entidades têm sido no âmbito da Parceria Oriental e o Acordo de Associação. Jamais nestes dois documentos a Ucrânia é referida como (futuro) membro, ou a sua relação com a UE descrita como adesão, ou alargamento, estando esse estatuto reservado para os países dos Balcãs Ocidentais, apesar de a mesma ser referida no final do discurso de Van Rompuy como prova do magnetismo da UE.

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19 A Ucrânia tem feito progressos porque identifica estes passos como indo na direcção da adesão; no entanto, a UE é vaga e omissa porque sabe que é importante para a Ucrânia, mas frisa o enquadramento em que decorrem estas aproximações para não ter que se comprometer. As palavras usadas para descrever a relação entre os dois lados são: ‘parceiro’, ‘parceria’ (no âmbito da Parceria Oriental) e chegam mesmo a saudar o “aumento substancial dos fluxos comerciais bilaterais”, expressões que demonstram maior afastamento e distância face ao estatuto de adesão, mas demonstram em simultâneo proximidade, na medida em que expressam paridade / igualdade em vez de hierarquia (embora haja outras que expressam assimetria), expressões que demonstram que, no momento em que foram proferidas, se trata apenas de um aprofundamento da Parceria Oriental no âmbito da política de Vizinhança da UE e não de uma adesão.

Podemos então concluir que a UE, apesar de reconhecer avanços nas relações com a Ucrânia nos quatro anos anteriores, em especial no que diz respeito às suas reformas, continua a olhar para o país, na melhor das hipóteses, como um parceiro, não o descrevendo como potencial ou futuro membro, apesar de lhe reconhecer as aspirações, sejam populares através dos protestos do Maidan ou a nível governamental pela atracção pelo modo de vida e valores da União Europeia e, por conseguinte, vendo a Ucrânia mais frequentemente como não estando exactamente ao mesmo nível, mas aspirando atingir paridade.

3.3 Acordo de Associação entre a UE e a Ucrânia

O próximo documento a ser analisado é o Acordo de Associação, datado de Maio de 2014. Devido à vasta extensão do documento, só analisarei os excertos mais relevantes para este trabalho. A Ucrânia e a UE, no AA, referindo-se conjuntamente como as ‘Partes’ começam:

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TAKING ACCOUNT of the close historical relationship and progressively closer links between the Parties as well as their desire to strengthen and widen relations in an ambitious and innovative way; COMMITTED to a close and lasting relationship that is based on common values, namely respect for democratic principles, the rule of law, good governance, human rights and fundamental freedoms, including the rights of persons belonging to national minorities, non-discrimination of persons belonging to minorities and respect for diversity, human dignity and commitment to the principles of a free market economy, which would facilitate the participation of Ukraine in European policies; RECOGNISING that Ukraine as a European country shares a common history and common values with the Member States of the European Union (EU) and is committed to promoting those values; NOTING the importance Ukraine attaches to its European identity; TAKING INTO ACCOUNT the strong public support in Ukraine for the country's European choice; CONFIRMING that the European Union acknowledges the European aspirations of Ukraine and welcomes its European choice, including its commitment to building a deep and sustainable democracy and a market economy; RECOGNISING that the common values on which the European Union is built – namely democracy, respect for human rights and fundamental freedoms, and the rule of law – are also essential elements of this Agreement; ACKNOWLEDGING that the political association and economic integration of Ukraine with the European Union will depend on progress in the implementation of this Agreement as well as Ukraine's track record in ensuring respect for common values, and progress in achieving convergence with the EU in political, economic and legal areas (União Europeia, 2014: 4).

Analisando então o preâmbulo do Acordo de Associação em si, no qual constam estas declarações, podemos constatar novamente que são destacados ‘os valores comuns’ entre as duas partes, como também é enfatizada ‘a sua [da Ucrânia] ambição e escolha Europeia’, legitimando a mesma através do ‘forte apoio do público’ para a assinatura deste documento. Estes pontos são apresentados como razões que cimentam ‘o desejo reforçar e alargar as relações de uma forma ambiciosa e inovadora’.

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21 Finalmente, no paragrafo final deste excerto do AA, os autores mencionam ‘a associação política e a integração económica da Ucrânia com a União Europeia’. Novamente são usadas palavras como “associação”, termos que revelam um maior distanciamento face à adesão, e nunca directamente palavras como ‘adesão’ ou ‘alargamento’, embora, em simultâneo, sejam usadas expressões como ‘[valores] comuns’ ou ‘integração’, que sugerem uma maior proximidade.

Vejamos então os objectivos listados no primeiro artigo do Acordo de Associação:

(a) to promote gradual rapprochement between the Parties based on common values and close and privileged links, and increasing Ukraine's association with EU policies and participation in programmes and agencies; (b) to provide an appropriate framework for enhanced political dialogue in all areas of mutual interest; (c) to promote, preserve and strengthen peace and stability in the regional and international dimensions in accordance with the principles of the United Nations Charter, and of the Helsinki Final Act of 1975 of the Conference on Security and Cooperation in Europe and the objectives of the Charter of Paris for a New Europe of 1990; (d) to establish conditions for enhanced economic and trade relations leading towards Ukraine's gradual integration in the EU Internal Market, including by setting up a Deep and Comprehensive Free Trade Area as stipulated in Title IV (Trade and Trade-related Matters) of this Agreement, and to support Ukrainian efforts to complete the transition into a functioning market economy by means of, inter alia, the progressive approximation of its legislation to that of the Union; (e) to enhance cooperation in the field of Justice, Freedom and Security with the aim of reinforcing the rule of law and respect for human rights and fundamental freedoms; to establish conditions for increasingly close cooperation in other areas of mutual interest (ibid.: 6).

No excerto acima reproduzido são repetidas novamente as mesmas expressões e ideias usadas no preâmbulo do documento, ‘valores comuns’, ‘estreitamento de ligações’, ‘aproximação gradual’, e o ‘reforço do diálogo político’. Apesar das expressões que indicam maior proximidade entre as duas entidades, logo no primeiro ponto do artigo é

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22 explicitado que este acordo é uma associação, termo novamente que revela maior distanciamento (face à adesão) e bilateralidade. No entanto, no ponto d) deste primeiro artigo do AA, é afirmado que um dos objetivos é conduzir “à integração gradual da Ucrânia no mercado interno da UE, nomeadamente através da criação de uma Zona de Comércio Livre”, o que revela uma maior proximidade entre a Ucrânia e a União Europeia, embora não chegando ao estatuto de adesão.

Apenas 28 estados membros da UE estão totalmente integrados no Mercado Único Europeu, enquanto vários outros países receberam vários graus de acesso a ele. O mercado único foi alargado, com excepções, à Islândia, ao Liechtenstein, e à Noruega, através do acordo sobre o Espaço Económico Europeu (EEE), e da Suíça, através de acordos bilaterais (Comissão Europeia, 2019). No entanto, estas aberturas do Mercado Europeu à Ucrânia (como também à Geórgia e à Moldávia, no âmbito da ZCLAA), são limitadas, com acesso apenas às ‘quatro liberdades’ do Mercado Único da UE: livre circulação de bens, serviços, capital e pessoas. A circulação de pessoas, no entanto, assume a forma de regime de isenção de vistos para viagens de curta duração, enquanto a circulação de trabalhadores continua a ser da competência dos Estados-Membros da UE. A ZCLAA é um "exemplo da integração de um membro não pertencente ao EEE no mercado único da UE" (SEAE: 13).

Este Acordo de Associação e consequente Zona de Comércio Livre, apesar de garantirem o acesso e participação da Ucrânia a certos sectores do Mercado Único da UE, tão pouco são declarados como processos que resultam numa adesão ou alargamento. São, aliás, descritos pelo SEAE como exemplos de integração de um membro que nem pertence ao EEE, no mercado único da UE.

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23 3.4 Discurso da Alta Representante / Vice-Presidente Federica Mogherini na sessão plenária do Parlamento Europeu sobre a situação da implementação do Acordo de Associação com a Ucrânia

Feitas as introduções, a Alta Representante Federica Mogherini descreve brevemente a situação geopolítica tensa na região, no mar de Azov, como também relembra a anexação ilegal da Crimeia, após o que começa então a discutir a implementação do Acordo de Associação da Ucrânia, quatro anos depois:

But now let me focus on (...) the report on the implementation of the Association Agreement by Ukraine. Five years have passed since 2014, and we share the report's assessment that, in these five years and despite very difficult circumstances, Ukraine has passed important reforms, to deliver on its citizensʼ aspirations. I will have an opportunity to discuss progress directly with Prime Minister [of Ukraine, Volodymyr] Groysman (...). Over the past year, many of the reforms demanded by the Ukrainian people have started to take shape. (…) Reforms also advanced in the areas of the judiciary and anti-corruption - even if at a slower pace (Alta Representante, 2018).

No primeiro parágrafo selecionado podemos já ver (novamente) alguma assimetria nas relações entre a Ucrânia e a UE, nomeadamente na parte em que Federica Mogherini diz que ‘a Ucrânia passou importantes reformas, para cumprir as aspirações dos seus cidadãos’. Podemos logo ver o aval ou a aprovação que a UE teve perante as reformas da Ucrânia, para atingir padrões Europeus, como também, mais uma vez o remetimento dessas reformas à Ucrânia e seus cidadãos.

One of Ukraine's main assets is the strength of its civil society – I have seen this first hand many times in Kyiv. We will continue to work on the side of all who have decided to engage personally for Ukraine's common good. We have also encouraged Ukraine to make best use of international consultation mechanisms when preparing important legislative acts, for example those affecting the rights of the persons belonging to

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national minorities. It is important to always take into account the recommendations of specialised international bodies, such as the Office for Democratic Institutions and Human Rights at the OSCE and the Venice Commission of the Council of Europe (ibid.).

No segundo parágrafo, existe novamente uma menção da sociedade civil da Ucrânia, como um dos maiores activos da Ucrânia. Destaca-se também a maneira como Mogherini menciona a capital da Ucrânia - ‘Kyiv’ e não ‘Kiev’ - forma como normalmente era mencionada antes do Euromaidan. A importância política desta diferença discursiva reside no facto de ‘Kyiv’ ser a designação da cidade em Ucraniano, ao passo que 'Kiev' é a palavra em Russo (Taylor, 2014). Ao pronunciar o nome da cidade na sua forma Ucraniana e não em Russo, Mogherini está também, de certa forma, a afastar a influência Russa de aspectos nacionais da Ucrânia. A renomeação ou mudança de topónimos influencia também a forma como são vistos, por actores internos ou externos à mesma, na medida em que constituem categorizações discursivas geopolíticas (Ó Tuathail e Agnew, 1992).

Mogherini volta novamente a mencionar que a UE encorajou a Ucrânia a fazer o melhor uso dos mecanismos internacionais na preparação de actos legistlativos, aludindo, mais uma vez, a uma ideia de desigualdade na qual a Ucrânia é colocada numa posição de subordinação face à UE.

The Association Agreement is the most ambitious agreement that the European Union has ever developed with any partner country. And since 2014, the European Union has invested in Ukraine more than in any other country in the world. We have put together the biggest support package in our history. We want Ukraine to succeed and we are working to make sure that Ukraine succeeds, making its own choices but with our support – in spite of all difficulties and obstacles on the way (Alta Representante, 2018).

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25 No terceiro parágrafo, Mogherini diz que o AA fora o ‘acordo mais ambicioso’ que a UE desenvolvera com outro país parceiro. Estas expressões, como ‘ambicioso’, apesar de revelarem alguma proximidade, são imediatamente ofuscadas pelas palavras ‘acordo’ e ‘país parceiro’, termos que denotam maior distanciamento (face à noção de adesão). Ao afirmar que ‘queremos [a UE] que a Ucrânia seja bem-sucedida e estamos a trabalhar para que a Ucrânia seja bem sucedida, ao fazer as suas próprias escolhas mas com o nosso apoio’, Mogherini reforça a assimetria na relação entre a Ucrânia e a União Europeia, na qual a UE tem objectivos para o futuro do país, e providencia um apoio inerentemente caracterizado como imprescindível.

Novamente são usadas algumas expressões que denotam alguma distância como ‘país parceiro’ e ‘acordo’, ou seja, expressões que denotam maior bilateralismo, não existindo grande diferença ou evolução de vocábulos que denotem proximidade entre este discurso da Alta Representante acerca do relatório de 2018 e o Acordo de Associação, assinado em 2014.

3.5 Palavras do Presidente Jean-Claude Juncker na conferência de imprensa conjunta por ocasião da Cimeira UE-Ucrânia com o Presidente da Ucrânia

No último documento selecionado, ‘Palavras do Presidente Jean-Claude Juncker na conferência de imprensa conjunta por ocasião da Cimeira UE-Ucrânia com o Presidente da Ucrânia’, de 9 de Julho de 2018, o Presidente da Comissão Europeia, num tom mais descontraído do que os discursos analisados anteriormente, reafirma os pontos principais do relatório de implementação do AA que já mencionei:

I am happy that we were able – thanks to the efforts of the President of Ukraine – to have the visafree travel to the European Union. This was done back in 2017 and I am more than delighted that half a million people from Ukraine have already made the most of this new opportunity. This is bringing people together, this is bringing nations together and this visa-free regime for Ukraine is working without any kind of problems.

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Those who have visas, they are going back in the indicated time and so we do not have negative side effects and this is proving once again that the Ukrainians are people worth of trust. We have good results since we signed back in September 2017 the Association Agreement and its Deep and Comprehensive Free Trade Area with Ukraine. The bilateral trade went up by almost 25% last year and the number of Ukrainian companies exporting to the European Union is also up by over 40%, going from 10,000 to 14,136, which is an encouraging result and which is helping Ukraine to grow in a steady pace. Of course, the more Ukraine is reforming, the more the support of the European Union will be developed in an adequate and corresponding way. I am welcoming – because I was insisting on that for years – the reform in the field of the fight against corruption which is a very important issue both for Ukraine – and I know the President is committed to that goal – and for the European Union. We have to perfect, to improve some details of this legislation but it will be done in the next coming days or week. Since I took office, out of the EUR 12.8 billion pledged to Ukraine, the EU and the European financial institutions have mobilised so far over EUR 11 billion. We have made as a Commission a proposal for the 4th Macro-Financial Assistance programme. It was signed days ago by the Council of Ministers and by the European Parliament. This is a commitment I made under conditions to President Poroshenko personally and it will provide EUR 1 billion to support the continued reform efforts. I am delighted that earlier today a EUR 75 million loan from the European Investment Bank was signed. This will go towards improving road infrastructure in Kiev and for other cities, amongst which Odessa has to be mentioned, to make life easier for commuters and to improve road safety across the country (Presidente da Comissão Europeia, 2018).

O Presidente da Comissão Europeia começa por destacar o historial de relações entre a Ucrânia e a UE, que data de 1997, e que, ironicamente, ia contra as intenções da Comissão da altura. Congratula-se também com o progresso e avanço nas relações entre ambas as partes, que reconhece que aceleraram mais nos últimos quatro anos (na altura

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27 em que foi proferido o discurso) face aos anteriores 20 anos, altura em que começaram estas cimeiras.

Novamente, é remetido aos esforços da Ucrânia (neste caso o seu presidente) o avanço das relações entre os dois lados, visto que a implementação do Acordo desbloqueia certos direitos e liberdades à Ucrânia dentro da UE. Depois de referir o processo de liberalização de vistos e o aumento no comércio bilateral, Juncker volta a insistir que o aprofundar das relações entre as duas partes está condicionado pelo ritmo das reformas que a Ucrânia fizer.

Este discurso de Juncker, que tão pouco refere a Ucrânia como ‘parceiro’, ‘membro’, ou fala em adesões ou alargamento, é, no entanto, optimista, na medida em que revela que muitos progressos têm sido feitos para aprofundar as relações entre a Ucrânia e a UE, mas reforça que esse aprofundamento depende das reformas que a Ucrânia fizer nos mais variados níveis, de forma a se aproximar aos padrões da UE. Neste sentido, Juncker, reforça, implicitamente, que a União Europeia se coloca num patamar superior, de modelo a ser copiado por actores como a Ucrânia, que têm que fazer ‘esforços’ e ‘reformas’ para se aproximarem ou atingirem os padrões da UE, o que vai de encontro às ideias veiculadas nos discursos analisados anteriormente.

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29 CAPÍTULO 4 - Discussão: AA como caminho para a adesão ou apenas

aprofundamento da Parceria Oriental?

Neste capítulo, iremos observar os resultados da análise de discurso à luz da literatura académica sobre as relações entre a Ucrânia e a União Europeia, confrontando as perspectivas académicas com as declarações dos agentes nos documentos analisados, de forma a respondermos à questão de partida. O objectivo é testar as hipóteses colocadas inicialmente: se a relação entre a Ucrânia e a UE é construída como um caminho para a adesão da mesma, ou apenas um aprofundamento da Parceria Oriental com base na política de Vizinhança da União Europeia.

Langbein e Wolczuk (2012) defendiam que as relações entre a Ucrânia e a União Europeia não passavam de uma convergência sem adesão. Importa ter em consideração que o artigo em causa foi publicado em 2011, dois anos antes dos eventos do Euromaidan e num clima geopolítico diferente do actual, quando afirmam que ‘o enquadramento contratual das relações entre a UE e a Ucrânia foi o Acordo de Parceria e Cooperação (APC) que entrou em vigor em 1998’ (ibid.: 5). O APC forneceu o quadro legal para operações operacionais, como a energia e o comércio, com vista a aproximar a Ucrânia do quadro jurídico do mercado único Europeu e da Organização Mundial do Comércio. Para este fim, o acordo continha algumas cláusulas evolutivas (que estão ausentes nos APCs com a maioria dos outros estados pós-soviéticos), incluindo a perspectiva de uma área de livre comércio com a UE'. No entanto, não houve menção a um acordo de associação, muito menos a adesão. Como já demonstrado, o Acordo de Associação não só se encontra elaborado, assinado como, no momento da escrita desta dissertação, até algo implementado; no entanto, a posição de que adesão ou perspectivas de adesão não foram mencionadas ou discutidas mantém-se actual, conforme podemos comprovar pela análise desenvolvida no capítulo anterior.

Martinaitis (2018), afirma que a Parceria Oriental visa alcançar os seus objectivos promovendo a mudança institucional nos países parceiros, ou seja, promovendo a democracia, o Estado de direito, os direitos humanos e apoiando a implementação de reformas em áreas mutuamente acordadas, como asilo, normas, auxílios estatais e

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30 similares. No entanto, o autor defende que o progresso foi misto, dado que a assinatura de acordos de associação e o estabelecimento de áreas de comércio livre abrangentes e profundas (ZCLAA) com a Geórgia, a Moldávia, e a Ucrânia em 2016 fornecem provas de sucesso, embora a respectiva implementação continue a ser um desafio, algo também já constatado no relatório de implementação do acordo de 2018 e reafirmado pelas palavras de Junker em 2018.

Martinaitis afirma que a ascensão dos países pós-socialistas da Europa Central e Oriental na UE foi relativamente rápida e suave, precisamente porque as instituições fundamentais necessárias e as regras formais do jogo estavam em grande parte no lugar, ao contrário dos países da PO que, ‘ao invés de serem historicamente e culturalmente incorporados no Ocidente, estão na fronteira do choque de civilizações de Huntington’ (ibid.), dado que lhes falta experiência democrática, salvo excepções pontuais. Para além disso, ‘as tentativas de estabelecer democracia e economia de mercado após 1991 enfrentaram numerosos contratempos ou o entrincheiramento total de regimes autoritários. E ainda, os países da PO também se envolveram na construção de estados-nação, o que resultou em conflitos territoriais armados’ (ibid.). Apesar de se poder corroborar a afirmação do autor de que estes países são apenas considerados parcialmente livres ou democracias com algumas falhas,2 o mesmo é considerado para

países dos Balcãs Ocidentais como a Albânia, Macedónia do Norte, Montenegro ou Bósnia, e isso não impossibilitou o presidente do Conselho Europeu de admitir que estão na próxima vaga de alargamento da União Europeia; pelo que o poder normativo da UE, as perspectivas de adesão, e as reformas que incute nesses países facilmente alteram esse paradigma, como acontecera no passado.

Axyonova (2018) dá maior relevância à sociedade civil em vez das intenções políticas das figuras públicas e com poder de decisão tanto dentro da Ucrânia como na UE, destacando o papel da mobilização civil e activismo político, neste caso da Ucrânia, na aproximação política do país à UE com o Euromaidan. Para a autora, certos grupos da sociedade civil, como por exemplo, grupos de reflexão, são importantes formadores

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31 de opinião, que procuram influenciar os processos de tomada de decisão e as opções políticas nos seus países, incluindo vis-à-vis a UE. Dependendo das percepções mais ou menos positivas da UE, das suas iniciativas, e expectativas sobre o que podem (ou não) oferecer, os actores da sociedade civil estariam mais ou menos ansiosos para se envolverem com a UE e promover uma escolha pró-Europeia, influenciando a política externa da Ucrânia. Nos discursos dos líderes das instituições Europeias analisados nesta dissertação, é frequente lerem-se frases como ‘a escolha Europeia da Ucrânia’ e mesmo no Acordo de Associação em si consta a frase ‘tendo em conta o forte apoio do público na Ucrânia para a escolha europeia do país’, corroborando o que a autora afirma.

De acordo com a análise de Axyonova (2018) (baseada em publicações de think thanks de relevo Ucranianos que trabalham em análise de política externa e de segurança ou observadores de democratização, reforma da administração pública, e liberalização económica), ‘a integração com a UE é narrada como uma oportunidade de acabar com as dificuldades económicas e políticas e melhorar quase todos os aspectos da vida na Ucrânia’ (ibid: 9). Para a autora, a UE é retratada como um poder transformador, que, através da sua insistência em reformas políticas e económicas, poderia desencadear uma mudança positiva no país. Os autores que a mesma analisou defendem que as perspectivas de adesão à UE acelerariam os processos de transformação no país e destacariam a identidade europeia da Ucrânia, ao mesmo tempo sublinhando que uma transformação bem-sucedida só seria possível se o governo Ucraniano cumprisse os seus próprios compromissos em relação às reformas políticas.

Novamente, comprova-se que a mera percepção de possível adesão à UE acelera os processos de transformação política que é também corroborada pelas suas contrapartes da UE, como o próprio Van Rompuy afirma: ‘A mera perspetiva de adesão à UE está a ajudar os nossos vizinhos mais próximos a tornarem-se mais estáveis, modernos e democráticos. Isto foi particularmente verdade desde 1989, quando a Cortina de Ferro caiu’ (Presidente do Conselho Europeu, 2014: 4). A noção de que uma transformação bem-sucedida só seria possível se o governo Ucraniano cumprisse os seus próprios compromissos em relação às reformas políticas é também apoiada pelo relatório de implementação do Acordo de Associação, como já mencionado.

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32 Petrov (2018) afirma que a entrada em vigor do AA trouxe à consideração a questão da promoção dos valores comuns da UE no sistema jurídico da Ucrânia. No entanto, o autor reconhece que ‘não há um esclarecimento direto dessa questão, porque o AA é o primeiro acordo internacional estrutural na história moderna da Ucrânia, o que implica sua integração profunda e abrangente na ordem jurídica de uma organização internacional supranacional’. Petrov reconhece que, para além da condicionalidade mais geral dos "valores comuns", o Acordo de Associação ‘contém uma forma específica de condicionalidade de "acesso ao mercado", que está explicitamente ligada ao processo de aproximação legislativa, sendo assim um dos mecanismos específicos introduzidos para enfrentar os desafios da integração sem adesão. O autor explica que ‘o governo da Ucrânia é obrigado a fornecer relatórios à UE, de acordo com os prazos de aproximação especificados nos acordos. Para além da elaboração de relatórios de progresso, que é uma prática comum na estratégia de pré-adesão da UE e na PO, o procedimento de monitorização pode incluir missões “no local”, com a participação de instituições, organismos e agências da UE, - órgãos governamentais, autoridades de supervisão, especialistas independentes e outros, conforme necessário’ (ibid.).

Petrov afirma ainda que o Acordo de associação serve de modelo para futuras reformas políticas e económicas em todos os países da Parceria Oriental, para além de que a ‘obrigação’ de partilhar os valores democráticos comuns da UE implica um acompanhamento regular por parte das instituições da UE, impedindo a Ucrânia de práticas antidemocráticas. Para além disso, a criação de novas instituições conjuntas no âmbito da AA ajudará países como a Ucrânia a aproximar as leis com a ajuda das suas decisões vinculativas (ibid.). Segundo Petrov (2018), ‘o processo de implementação efetiva das AA constituirá o maior desafio para a Ucrânia, a Moldávia e a Geórgia. Estes países têm de provar a sua adesão aos valores democráticos e económicos comuns da UE e assegurar o funcionamento adequado das suas áreas de comércio livre profundas e abrangentes’.

Analisando as palavras de Petrov, que reafirma a insistência da UE nos valores comuns e na ideia de condicionalidade com base dos mesmos, conclui-se que o acesso ao mercado e a aproximação legislativa no âmbito do Acordo de Associação são

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33 mecanismos específicos introduzidos para enfrentar os desafios da integração sem adesão; no entanto, o autor reconhece que os relatórios de implementação dos Acordos são também uma prática comum na estratégia de pré adesão à UE. Petrov (2018) afirma, tal como o relatório de implementação do AA de 2018 indica, que as reformas da Ucrânia são a chave não só para uma maior proximidade com a UE, como também para desencadear as medidas previstas no mesmo, dependendo inteiramente deste país e da vontade dos seus líderes políticos de prosseguirem com as reformas com que se comprometeram.

Finalmente, analisando a questão do Acordo de Associação e da Parceria Oriental de uma perspectiva geopolítica, Haukalla (2016: 658) considera que a UE abordou a sua vizinhança oriental como essencialmente incontestada, e que a mesma poderia procurar uma continuação do seu modelo de adesão só que por outros meios. O autor afirma que a UE, com a Parceria Oriental, tem estado ocupada a conceber relações que, quando tomadas em conjunto, levariam a Europa de Leste a integrar uma ordem mais ampla de prosperidade, estabilidade e integração centrada na UE, ou seja, dentro da sua esfera de influência, apesar de Haukalla admitir que ‘não foi um projeto de projeção de poder geopolítico no sentido bruto do termo’. O autor defende que, ‘apesar de toda a retórica de parceria - agora em grande parte silenciosa - a realidade subjacente é que as políticas da UE têm enfrentado a insistência da Rússia em enquadrar o papel da UE na vizinhança oriental em termos amplamente negativos e competitivos’ (ibid.).

Como consequência, a UE foi travada numa competição de integração com a Rússia, na qual, como argumenta Haukalla, a UE não está disposta nem preparada para jogar. O autor defende, portanto, que a UE, ao conceber a PO, levaria a Europa Centro-Oriental não só a integrar-se numa ordem mais centrada na UE, e que é também um modelo de adesão, embora por outros meios. Haukalla considera também que, apesar da retórica de ‘parceria’ (que revela maior distanciamento face à ideia adesão, como temos vindo a apontar ao longo da análise), essa mesma retórica tem levado a uma percepção negativa por parte da Rússia, que tem visto o desenvolver das relações entre a UE e a Ucrânia, como também outros países da PO, desencadeando uma competição com a UE pela integração destes países nas suas respectivas zonas de influência.

Referências

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