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O factor geológico, rocha-mãe, na caracterização agrológica dos solos portugueses

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Academic year: 2021

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solos

na caracterização agrológica dos

portugueses (1)

pelo

Prof. E. A. MENDES FRAZÃO da Cadeira de Ffslca Agrícola

Só nos últimos anos, os estudos agrológicos em Portugal toma­ ram verdadeiro incremento, mercê do impulso dado a esta espécie de trabalhos pela Estação Agronómica Nacional, que tomou sobre si o en­ cargo da realização da Carta dos Solos do Continente Português.

As primeiras cartas dos solos das regiões de Santarém e de Eivas, elaboradas pelo Departamento de solos daquela Estação, consti­ tuem já uma valiosa contribuição para o estudo dos solos portugueses e são, pela orientação que revelam, segura garantia de que os trabalhos já efectuados e persistentemente continuados, prosseguirão em ritmo sempre crescente.

Estas cartas baseadas nos conceitos pedológicos modernos e obe­ decendo nas suas linhas gerais ao sistema americano de classificação dos solos, foram antecedidas de outros reconhecimentos agrológicos, feitos segundo a mesma orientação, e que embora com finalidades prá­ ticas determinadas, podem fornecer importante contribuição para ela­ boração das cartas dos solos das regiões onde foram efectuadas.

Refiro-me aos trabalhos últimamente efectuados pela Junta de Colonização Interna com vista ao estudo do aproveitamento de baldios,

0) Comunicação à l.a Secção — Solo — do I Congresso Nacional de Ciências Agrárias, Lisboa, 1943.

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em várias regiões do País, nomeadamente na Beira e na zona pliocé- nica de Pegões e da Península de Setúbal, e também aos estudos agro- lógicos efectuados pela Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrí­ cola, onde pela primeira vez se ensaiaram em Portugal os métodos americanos de classificação de solos com a introdução das noções de

«série» e «tipo» e a sua representação cartográfica.

A aplicação deste método de estudo, sobretudo pela consideração do exame do perfil, revelou-se desde logo de uma alta importância, não tanto, neste caso particular, pelo que da evolução genética se podia apreciar nos solos estudados, quase sempre aluviões de formação re­ cente, mas pela contribuição importantíssima que o conhecimento da natureza e propriedades das camadas inferiores, prestava em estudos destinados à resolução de problemas de Hidráulica Agrícola.

Anteriormente, baseando-se ainda nos métodos clássicos de reco­ nhecimentos agrológicos apoiados fundamentalmente na origem geo-lito- lógica do solo, a extinta Estação Agrária Central efectuou vários estu­ dos agrológicos no Ribatejo, em Colares e na Serra de Serpa, dos quais alguns não chegaram a ser publicados.

* *

*

Os trabalhos que acabo de referir apesar de disseminados por várias zonas do País, estão ainda muito longe de abranger parcelas importantes do seu território, mas revelam já alguns aspectos interes­ santes dos caracteres dos nossos solos e do papel relativo que na sua formação desempenham os factores rocha-mãe, relevo, clima e vege­

tação, que agora me proponho analisar.

Os primeiros destes factores, rocha-mãe e relevo, como elementos primários da modelação do solo, são indubitavelmente factores de pri­ mordial importância no jogo de acções que em última análise condu­ zem à formação do solo.

É evidente que apesar do seu papel passivo os seus caracteres se transmitirão tanto mais indelevelmente ao solo, quanto mais moderada ou dificultada for a acção dos agentes activos dessa transformação: o

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Este conceito que é evidentemente geral, leva-nos a admitir uma gradação de influências relativas dos dois grupos de factores em presença:

1. ° — O clima nas suas modalidades extremas influindo como agente activo, por excelência, da formação do solo, na dis­ tribuição em traços largos dos «grandes grupos de solos)). Deve ser considerado pela acção directa e indirecta que exerce na intensidade dos fenómenos da formação do solo, e pela sua influência na vegetação.

2. ° — A rocha-mãe (dentro das grandes zonas climáticas) consti­ tuindo, pela sua diferente constituição, pontos de partida diversos com resistências variáveis à acção dos agen­ tes activos da pedogénese. Será responsável por certos caracteres diferenciais das terras e tanto mais quanto mais longe estiver a fase actual da sua evolução do seu estado de completa maturidade.

3. ° — Finalmente, as pequenas variantes de intensidade dos fenó­

menos microclimáticos, do relevo e da vegetação, origi­

nando as diferenciações pedológicas em solos provenientes da mesma rocha-mãe e formados sob condições climáticas gerais, idênticas.

Posta assim ordenadamente a acção dos factores que contribuem para a formação e desenvolvimento do solo, analisemos, em primeiro lugar, as condições climáticas, chuvas e temperaturas, que caracteri- zam o nosso País, e verifiquemos se as suas variações são de molde a justificar, só por si, a existência de solos nitidamente ectodinamomór- ficos, evolucionando em sentidos pedogénicos distintos.

Apesar do seu relativo desenvolvimento em latitude, o continente português tem uma extensão territorial bastante reduzida e embora dis­ pondo de condições climáticas variadas, pela influência do relevo oro­ gráfico, não comporta variações térmicas extremas de grande amplitude. Estas, dum modo geral em toda a extensão do País, não descem abaixo dos valores médios mensais de 2o,4 (média de Janeiro, na Serra da Estrela a 1384 m de altitude) e de 3o, 1 (média de Janeiro em

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Montalegre, a 1027 m de altitude); e não ultrapassam os máximos de 24°,7 e 24°,8 (médias de Julho respectivamente em Moncorvo e Campo Maior).

Em quase toda a orla litoral, as oscilações térmicas anuais têm amplitudes que pouco variam ao redor de 12° ao passo que nas zonas interiores, de carácter ma is continental, estas oscilações não vão de 17°.

No que respeita às chuvas, as diferenças são mais acentuadas, pois que às quedas pluviométricas da ordem dos 400 e 500 mm anuais, que se registam no litoral do Algarve e na «terra quente» de Trás-os- -Montes, se opõem alturas de chuva de 1500, 2000 e 2500 nmi anuais, como sucede nas zonas montanhosas do Minho e da Serra da Estrela.

A variação realmente notável que estes números traduzem não é porém tão importante nos seus efeitos, como em primeira impressão poderá julgar-se.

Efectivamente deve notar-se que em Portugal, como em toda a zona mediterrânica, dominam as chuvas na estação fria, ao contrário do que sucede na Europa Central e em quase todas as outras regiões do Globo. O grande aumento da altura anual de chuvas que se verifica no nosso território quando subimos em altitude e em latitude, deve-se sobretudo a um acréscimo de pluviosidade no inverno, porque os carac­ teres do verão, estação quente e seca, mantêm-se sensivelmente os mes­ mos de norte a sul de Portugal.

Quere dizer, aquela impressionante variação da pluviosidade anual, não deve tomar-se como representando a existência de regiões permanentemente húmidas pois resulta da maior ou menor altura de chuvas no período de inverno, que de resto é sempre, mesmo nas re­ giões mais meridionais do País, uma estação húmida e chuvosa.

O ano reparte-se assim, em dois períodos, um frio e chuvoso (semestre húmido da classificação do Prof. Ruy Mayer) e outro quente e seco (semestre seco da mesma classificação), este último notável pela intensidade de evaporação e ausência de chuvas.

Eis porque todas as pretendidas relações entre os caracteres do

clima expressos em totais ou médias anuais, e os tipos de solos (Regen-

faktoren de Lang, coeficiente de Meyer, índice de aridez de Martonne, etc.), de emprego discutível em qualquer região, são absolutamente inaplicáveis ao nosso caso.

Vem a propósito lembrar que o nosso País se encontra numa zona climática de transição onde as acçÕes do clima nos fenómenos

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de pedogénese também não podem ser bem definidas: Em vez dum processo preponderante da evolução do solo num determinado sentido, embora com intensidades diversas, há dois processos opostos que alter­ nadamente actuam: um na estação fria e chuvosa determinando fenó­ menos de podzolização com lavagem acentuada das camadas superio­ res, pouco ou nada contrariada pela evaporação; outro na estação

quente e seca em que o calor e evaporação intensos, provocando a desi­

dratação das camadas superiores do solo, criam condições de aridez que contrariam o fenómeno da podzolização pela inversão do processo de lavagem.

É certo que a resultante destas duas acções opostas pode incli- nar-se ma is para um ou para outro lado, mas também tem de se reconhe­ cer que da luta entre elas, ainda agravada pela decapitação dos solos por efeito da erosão nas regiões mais declivosas (precisamente as de maior queda pluviométrica), resulta sempre uma maior preponderância dos caracteres do material originário.

É este, pela sua maior ou menor permeabilidade, capacidade de retenção para água, presença ou ausência de calcáreo, etc., que deter­ mina qual o processo pedogénico dominante.

*

Interpretemos agora a luz das considerações anteriores os estudos agrológicos feitos no País.

Dentro das condições climáticas gerais que caracterizam as re­ giões estudadas, as quais, por abrangeTem áreas pouco extensas são necessariamente uniformes, não é ao clima, mas sim à rocha-mãe que se deve atribuir a responsabilidade do sentido da evolução pedogénica e a diferenciação que apresentam os solos na fase actual do seu desen­ volvimento.

Assim na zona miocénica de Santarém, onde o Departamento de Solos da Estação Agronómica Nacional concentrou a maior actividade dos seus estudos, não foram as variantes de clima que determinaram as diferenciações pedológicas encontradas, mas muito simplesmente a natureza arenosa, argilosa ou calcárea do material originário.

Com efeito só assim se explica que, sob o impulso dum clima não diferenciado, a evolução pedológica se desse simultâneamente no

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sentido da formação de solos podzólicos, das terras castanhas ou solos pardos de floresta e dos solos vermelhos mais ou menos podzolizados.

Pela mesma razão, segundo a observação do Prof. Botelho da Costa, as areias pliocénicas de Pegões dão origem a solos de tipo niti­ damente podzólico, apesar de situados já bastante fora da zona climá­ tica característica desses solos.

Também na reduzida área da freguesia de Colares, que agrolò- gicamente foi estudada pela antiga Secção de Estudos Fisiográficos da extinta Estação Agrária Central através do prisma geo-litológico dos clássicos estudos agrológicos, se encontram sob condições climáticas idênticas, pelo menos, tantos solos distintos quantas as variantes lito- lógieas do material que lhes deu origem, por sinal numerosíssimas.

Aí se encontram, lado a lado, constituindo um verdadeiro mos­ truário do notável papel da rocha-mãe na diferenciação dos solos, terras derivadas de rochas graníticas, sieníticas, dioríticas, porfiríticas, cal- cáreas, argilosas, arenosas, etc., em que a coincidência das manchas agrológicas com a ossatura geo-litológica é tão notável que basta em muitos casos o exame, a distância, do vigor e aspecto da vegetação espontânea, conjuntamente com certos aspectos morfológicos do terreno (cor, textura, relevo, etc.) para adivinhar variações na natureza do

substratum.

Assim, nesta região, em todos os pontos onde a rocha diorítica ou gábrica é responsável pela formação do solo, as terras acusam no­ tável fertilidade e reconhecem-se de longe pelo vigor da sua vegetação (manchas de Monserrate, da encosta de Colares, de Almoçageme, do Farol da Roca, da Peninha, etc.).

A estrutura granulosa, a cor castanha escura levemente esver­ deada que resulta não só da sua constituição mineral rica em composto de ferro e de magnésio, como também do seu elevado teor em matéria orgânica (4 a 10 %), e o vigor da sua vegetação, são de tal modo ca- racterísticos que bem evidenciam o seu parentesco com os solos da mesma origem que se encontram nos arredores de Beja, Eivas e Campo Maior embora formados em condições climáticas sensivelmente dife­ rentes.

Como na classificação americana usada entre nós a série corres­ ponde a um agrupamento de solos com perfis semelhantes quanto à

natureza, espessura e sucessão de horizontes formados a partir de ma­ teriais originários semelhantes, etc., pode-se concluir que esta última

condição, implicando um fundamento geo-litológico para a caracteriza­ ção da série, vem ao encontro do ponto de vista que acabo de defender.

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Por outro lado, a mesma íntima relação entre a natureza da rocha-mãe e os caracteres do solo parece verificar-se noutros países do ocidente europeu e nomeadamente na Grã-Bretanha (segundo G. W. Robinson) e na França (segundo Demolon e Agaffonof), o que a meu ver mostra que lá como cá a carta litológica ou das rochas-mães é agrològicamente mais significativa do que uma carta de grandes gru­

pos, quando não haja possibilidade de uma diferenciação pormeno­

rizada das séries.

* * *

Concluindo, desejo acentuar que com as considerações que acabo de fazer de modo algum pretendo apear o clima do grande pedestal em que o colocaram os edafologistas paladinos dos modernos conceitos pedológicos e que se justifica pelo notável e fundamental papel que este desempenha na formação do solo.

Julgo porém conveniente, pelo menos em relação ao nosso País, corrigir a ideia do clima, factor total, apagando as influências de todos os outros factores, pois esta não corresponde, na fase actual da evolução dos nossos solos, ao papel que realmente lhe pertence, e equivale a negar a acção não menos evidente de um outro factor da formação do solo: o factor geológico, rocha-mãe.

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