• Nenhum resultado encontrado

A LUTA DE CLASSES NO CAPITALISMO EMERGENTE: A JUDICIALIZAÇÃO DO CONFLITO Angelo Antonio Puzipe Papim

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "A LUTA DE CLASSES NO CAPITALISMO EMERGENTE: A JUDICIALIZAÇÃO DO CONFLITO Angelo Antonio Puzipe Papim"

Copied!
12
0
0

Texto

(1)

A LUTA DE CLASSES NO CAPITALISMO EMERGENTE: A JUDICIALIZAÇÃO DO CONFLITO

Angelo Antonio Puzipe Papim

Resumo

O presente artigo aborda, sob o ponto de vista do materialismo histórico dialético, a transição do modo de produção feudalista para o modo de produção capitalista e as consequentes alterações ocorridas dentro da sociedade a partir das bases jurídicas que passaram a atuar como agente regulador de interesses de classe, que culminou com a regulamentação do uso da propriedade entre os possuidores e despossuídos. A judicialização do uso da propriedade visou como metra não a liberdade dos indivíduos na sociedade civil, mas a manutenção dos interesses privados da classe dominante. Condição que aferiu ao capitalismo de estado a condição legar para destituir do campesinato os direitos de utilizar os recursos naturais para sua subsistência. Assim, apresenta-se a análise de Marx sobre a luta de classes presente na conjuntura no caso de roubo de lenhas, que foi marcado pelo domínio do direito e de um estado burguês.

Palavras-chave: feudalismo, capitalismo, propriedade privada, luta de classe.

Introdução

A passagem do modo de produção feudalista para o modo de produção capitalista incorreu em alterações no tecido social e na forma como a sociedade civil passou a se organizar. Discute-se, no capitalismo, a dimensão daquilo que é público e privado a partir das bases jurídicas, sem considerar a realidade dos indivíduos e os costumes estabelecidos por eles sobre o uso das terras e seus recursos.

Com a alteração das regras que organizam as condutas sociais na estrutura capitalista, o limite entre o que é permitido e o que não é permitido fazer na sociedade civil liga-se a propriedade privada. Nessa nova configuração social o direito passa a mediar as relações e os interesses entre os indivíduos e o estado e não mais a partir de uma monarquia ou de Deus.

No capitalismo o conjunto de organizações e instituições cívicas determinam, através do direito e de leis impositivas, que se impõem aos indivíduos, direitos irrestritos aos proprietários, que favorecem cada vez mais o uso privado da propriedade; aferindo legalidade ao proprietário privado sobre o domínio absoluto da sua propriedade e a forma de explorá-lo.

Com o desmonte das organizações sociais mais próximas ao regime feudal, que assistia em grande medida as necessidades de indivíduos pauperizados, obrigam estes

(2)

últimos a sucumbir a nova estrutura social e a vender sua mão de obra no mercado de trabalho para assegurar a sua subsistência.

Sobre o regime do direito privado, há duas dimensões jurídicas sobre a propriedade privada, aqueles que a possuem e aqueles que não a possuem. O direito no capitalismo assegura uma dimensão jurídica maior para aqueles que possuem a propriedade do que para aqueles que não a possuem. Ocasionando uma atmosfera que favorece e legitima a exploração do trabalho por aquele que possui os meios de produção.

A racionalidade burguesa impõe a sociedade civil o regime do direito, que delega funções sociais a partir de contratos firmados entre o possuidor e o não possuidor da propriedade privada e dos meios de produção. Omite-se nessa conjuntura o acesso do despossuído ao bem que antes lhe era oferecido pela natureza, sem encargos, mas que agora precisa que o seu uso seja prescrito pelo proprietário.

Na atmosfera do direito burguês a função social entre o possuidor e despossuído só pode ser duas: ao despossuído compete a lei, que limita sua ação e acesso aos recursos na sociedade civil a mera venda de sua mão de obra para sobreviver; e ao possuidor, pela via do direito, cabe-lhe a segurança irrestrita de explorar a mão de obra que é vendida pelo despossuído. Realidade que Instaura no bojo da sociedade civil capitalista uma luta de classes.

O direito valida as regras para a exploração da mão de obra e as regras para o despossuído vender a sua mão de obra. O direito legaliza a classe e sua exploração. Por outro lado, longe das instâncias do direito, Marx enxerga na ciência o ápice para a racionalidade humana combater o excesso causado pelas leis embasadas no idealismo.

Como editor de jornal, Marx, munido com os primeiros avanços de seu método, o materialismo dialético, passa a analisar, a partir de categorias presente na realidade concreta, a mudança no contexto histórico provocada pela lei que proíbe o uso da madeira pelos camponeses. O presente texto tem por finalidade apresentar a análise de Marx sobre a luta de classes presente na conjuntura no caso de roubo de lenhas, que foi marcado pelo domínio do direito e de um estado burguês.

O método de Marx: ruptura com o idealismo filosófico

(3)

Engels afirma, no prefácio da 3ª edição de 1885, o objetivo principal das categorias que compõem o método de análise de marx. De acordo com Ele, o materialismo dialético visava

[...] descobrir a grande lei do movimento da história, a lei segundo a qual todas as lutas históricas travadas no âmbito político, religioso, filosófico ou em qualquer outro campo ideológico são de fato apenas a expressão mais ou menos nítida de lutas entre classes sociais, a lei segundo a qual a existência e, portanto, também as colisões entre essas classes são condicionadas, por sua vez, pelo grau de desenvolvimento da sua condição econômica, pelo modo da sua produção e pelo modo do seu intercâmbio condicionado pelo modo de produção (MARX, 2011, p. 22).

Assim, a análise materialista de Marx sobre a realidade do contexto do caso do roubo de lenha, já evidenciou para o jovem editor de jornal, o conflito de classe imposta pelo capitalismo emergente.

Marx destaca, naquele momento histórico, a centralização do poder nas mãos de uma minoria burguesa, que exercia sob retaliação judicial a dominação sobre a classe proletária, o campesinato. A fim de suspender o levante proletário e promover a sua obediência ao estado, o direito surge como arma de controle ideológico.

Para Hegel, o estado era, frente o estabelecimento da nova condição social, o espirito do tempo, ou seja, o máximo que a racionalidade humana conseguiria atingir. Em grande medida, o estado retiraria o poder das mãos de Deus e dos Monarcas para diluí-lo entre os indivíduos pertencentes a sociedade civil, tornando-os livres. A liberdade para Hegel relaciona-se ao estado e sua função social (ENGELS, 2011).

No entanto, Marx ao analisar a proposição política imposta pelo estado sobre o uso da terra, percebe que as leis desconsideram a realidade material e histórica daqueles indivíduos, que ela deveria servir para assegurar a sua liberdade, mas, no entanto, os aprisiona ao mercado de trabalho onde são forçados a vender a sua mão de obra para sobreviver.

Diante dessa realidade material, a qual Marx se depara enquanto jornalista, discorre:

[...] as relações jurídicas, bem como as formas do Estado, não podem ser explicadas por si mesmas, nem pela chamada evolução geral do espírito humano; essas relações têm, ao contrário, suas raízes nas condições materiais de existência, em suas totalidades, condições estas que Hegel, a exemplo dos ingleses e franceses do século XVIII, compreendia sob o nome de ‘sociedade civil’” (MARX, 2008, p. 47).

Marx quer explicar com isso que a sociedade civil não se é explicada ou é entendida pela filosofia, com alegorias abstratas de homens e de relações sociais; mas pelos meios de

(4)

produção no qual os homens estabelecem as relações sociais de troca. Não é pela ideia que a consciência humana e sua liberdade se configuram no homem, mas pela concretude de suas ações, pelo seu trabalho; é dada pela atividade humana que a consciência nasce.

Portanto, o estado para Marx não pode ser a máxima do espirito humano como propôs Hegel, pois o estado nega o próprio homem e a sua realidade, impondo-lhes leis que retiram seus direitos historicamente adquiridos. O real para Marx não se revela a uma mera explicação anti-dialética, causalista e mecânica, mas pela evolução histórica, que se preocupa em explicar os fenômenos do simples ao complexo; explicação que adquire forma no choque com outros homens, e não por objetivos ideias (ENGELS, 2011).

Portanto, como Vázquez (2007) descreve, o distanciamento temporal que o idealismo jurídico provoca entre as classes sociais no sistema capitalista emergente naquele período, distancia o homem da sua realidade material, processo que se caracteriza em alienação, ou seja, o estranhamento do sujeito ao produto de sua própria ação. Assim, o fruto do trabalho do homem o domina e o coage.

De acordo com Vázquez, Marx explica a alienação como uma consciência que se inverte. Nela:

O sujeito é ativo e com sua atividade cria o objeto; o objeto é um produto seu e, no entanto, o sujeito não se reconhece nele, lhe é estranho, alheio; e o objeto obtém um poder que por si não tem e se volta contra o sujeito, domina-o, convertendo-o em predicado seu (2007, p. 90).

O proletário, no sistema capitalista, é dependente do produto de seu trabalho e não ao contrário, pois é o homem que passa a servir aos meios de produção e não os meios de produção servir as necessidades do homem. Assim também o é com o estado e o direito na perspectiva capitalista, o homem passa a servir ao estado e ao direito, como se eles fossem algo em si e para si, existissem por si só, e não fossem produto da ação histórica do homem (MARCUSE, 1984).

A natureza dos fenômenos para Marx (2008) não se revela através da abstração pura, pelo espírito humano, definido como um jogo simbólico onde a lógica é o seu principal elemento. Para o materialismo de Marx, a relação material que os homens estabelecem nos meios de produção, característicos de cada época histórica, são os fatores que determinam as formas de governo, de sociedade, de homem; está é forja do espirito humano.

Para Marx:

A base real sobre a qual se eleva uma superestrutura jurídica e política e à qual correspondem formas sociais determinadas de consciência. O modo

(5)

de produção condiciona o processo de vida social, política e intelectual (2008, p. 47).

Dessa forma, diferente da proposição idealista de Hegel, para Marx “não é a consciência que determina o ser; ao contrário, é o ser social que determina sua consciência” (2008, p.47). Logo, o espírito humano advém da práxis do homem em seu meio ambiente e não de uma consciência pura, anterior ao trabalho, pois a consciência humana esta é sintoma com a práxis (VÁZQUEZ, 2007).

A práxis é uma categoria nevrálgica para se compreender o Materialista Dialético, pois tudo o que o homem possui e que caracteriza o seu espírito, como os pensamentos, as ideias, a moralidade e a ética, ou seja, a vontade humana, é histórica e resultado da interação com os meios de produção (MARX, 2008).

Dito isso, a consciência humana, para Marx, não possui uma existência intrínseca e imaterial, que antecede a ação do homem no meio social, ela só pode ser sintoma, síntese das relações com os meios de produção de determinada época histórica. Para o materialismo há uma primazia da matéria sobre o espírito humano, é ela que o conforma e não o contrário.

A premissa de Marx para se contrapor ao pensamento idealista da época consiste na tese de que a matéria exerce força sobre o homem e o molda a sua imagem e semelhança.

Essa tese Marx apresenta na crítica que faz a obra de Hegel sobre o direito.

Para Marx (2008) os meios de produção configuram o palco, a estrutura teatral que sinaliza aos homens os limites e as condições psíquicas, inclinações e desejos. São as relações materiais que imprimem na alma humana o seu espirito, a consciência. Pois, é apenas no ceio da sociedade civil que acontece e se desenvolve os meios de produção e como ele a cultura, tendo na figura humana o seu guardião.

Ao analisar a sociedade civil, destacou aos olhos Marx, sua natureza, incoerente as bases das filosofias do espírito. E sobre isso, destaca Marx:

Na produção social da própria existência, os homens entram em relações determinadas, necessárias, independentes de sua vontade, essas relações de produção correspondem a um grau determinado de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais (2008, p. 47).

Dessa forma, portanto, não pode ser o espirito apartado do lugar social, mas ancorado ao cenário de disputas pela sobrevivência, que o homem é forjado; pois, são os meios de produção que enredam as relações de poder e, em decorrência dessa disputa, o tecido social se fragmenta em classes que forçam os indivíduos a concorrem entre si. Dito isso, para Marx (2008), o processo histórico tenciona os meios de produção e as leis materiais que regem o

(6)

fenômeno social para um futuro; a sequência de fatos que constituem os fenômenos sociais pode ser compreendida através de seu desenvolvimento histórico.

Assim, para Marx (2008), a ciência não deveria reproduzir a aparência dos fenômenos, mas transformá-las a partir de sua condição material, pois para ele todos os fenômenos sociais possuem uma representação nos meios de produção, uma materialidade.

Logo, a consciência é tão matéria quanto qualquer outra atividade do corpo. E como resultado das relações materiais de produção, possui uma causalidade que pode ser observada, analisada e transformada.

A judicialização da madeira: a disputa de classes no sistema capitalista

Para Benjamin (1987), filósofo alemão do século XX, o homem, assim como Marx o define, é um ser histórico e a consciência de sua historicidade só se desenvolve quando a sua ação no mundo cessou e, com isso, ele depara-se com o resultado de sua atividade. Esta, então, surge a sua consciência como a síntese das relações materiais.

O formalismo jurídico que surge no estado racional como forma de elucidar a divergência social à luz de uma legislação engendra a sociedade civil em uma contradição, pois desconsidera as formas feudais de socialização da terra e de seu uso comuns, inclusive sobre a coleta de madeira.

De acordo com Bensaid, o judicialização da coleta de madeira acarreta ônus aos campesinos que precisam fazer uso dela para a sua sobrevivência. Assim:

Quando o homem, como sujeito individual e parte de um contrato, torna- se a medida das práticas sociais, a propriedade se define em relação a ele como propriedade privada (2017, p. 23).

O campesinato que antes podia fazer uso dos recursos florestais para a sua sobrevivência, pela nova base contratual capitalista, que desconsidera a realidade aquisitiva e social do desprovido, impõem-lhe novas condições de exploração que geram contradições para sua sobrevivência e que acabam produzindo uma pobreza artificial. A exploração moderna e judicialização do uso dos recursos naturais engendra no antagonismo entre o direito de propriedade burguesa e o direito à existência do proletário (BENSAID, 2017).

Marx (2017), ao utilizar com rigor seu método e provido de um conhecimento apurado da história daquele momento e do momento pretérito, conhecedor das leis comunais do período feudal, destaca a existência de classes sociais, e para a classe social burguesa

(7)

manter o poder e pôr fim ao uso tradicional da terra, emprega leis, que remontam a uma ancestralidade animal humana, que servem apenas para manter o privilégio.

Marx denomina as leis, que assegura o privilégio da minoria pertencentes a classe dominante, como costumes contrários ao direito. Declara que:

A data de seu nascimento remonta à época em que a história da humanidade é parte da história da natureza e, confirmando a saga egípcia, todos os deuses se ocultam em figuras de animais. A humanidade aparece dividas em raças de animais, cuja a relação não é de igualdade, mas de desigualdade, uma desigualdade fixada pelas leis (2017, p. 85).

A divisão da sociedade em classes deu a luta que elas empreendiam entre si contornos políticos, encenada de acordo com diretrizes históricas que solapava qualquer movimento revolucionário do proletário, que no capitalismo é naturalmente despossuído de direitos.

Sobre a natureza da judicialização o furto da madeira, Marx declara:

A natureza jurídica das coisas não pode, por conseguinte, guiar-se pela lei, mas a lei tem de guiar-se pela natureza jurídica das coisas. Porém, quando chama de furto de madeira um ato que nem chega a ser um delito de exploração de madeira, a lei mente e o pobre é sacrificado por uma mentira legal (2017, p. 81).

No capitalismo a propriedade é sempre externa ao homem e ela precisa ser assegurada por um processo legal, normativo; a ideia de que o homem livre é aquele que possui a si mesmo e o fruto do seu trabalho, perde-se no cenário da propriedade privada. O estado posiciona-se a favor do interesse privado ao invés de incarnar diante dele o interesse geral, incluindo o interesse do despossuído. Ele, o estado, posiciona-se para favorecer a classe dominante e não a racionalidade que assegura a vida e o bem-estar, como descreveu Hegel (MARX, 2017).

Na relação de trabalho capitalista impera a exploração de uma classe sobre a outra.

A diferença entre com as relações comunais do período feudal está na legalização da exploração por instrumentos judiciais, que lhes aferem legitimidade.

A exploração da força de trabalho depende da criação de uma demanda, que:

Assim como os trabalhadores dependem do mercado para vender sua força de trabalho como uma mercadoria, os capitalistas dependem dele para comprar a força de trabalho e também os meios de produção, e para realizarem os seus lucros através da venda de bens e serviços produzidos pelos trabalhadores (WOOD, 2017, p.6).

Para Marx (2007) a essência do capitalismo configura uma busca constante para legitimar a sua ideologia e mantê-la de forma hegemônica sobre as demais. Ele se fortalece mediante a estratégia de dividir a sociedade em classes.

(8)

Marx destacou a existência de duas grandes classes na sociedade capitalista, a burguesia e o proletário. Elas se chocam em seus interesses e se enfrentam diariamente e como decorrência desse conflito está a contradição, essência do capitalismo. As contradições são as estratégias do capital para manter a dominação e encobrir a consciência de classe (MARX, 2007).

Um dos instrumentos de dominação de classe mais importante para o capital é a alienação do proletário. Ela consiste em limitar a consciência do trabalhador de todo o processo de produção pelo qual a mercadoria passa na relação de produção. Assim, meios e fins aparecem para o proletário de forma fragmentada e inatingível (MARX, 2013).

Sem o controle sobre os modos de produção os trabalhadores perdem a consciência dos processos produtivos e, com o trabalho especializado, fragmentado em atividades cada vez mais especificas, perdem também a consciência de classe (MARX, 2005).

A alienação provoca a fissura na consciência do homem, e sem o recurso da razão, que apreende a totalidade da realidade histórica e a tensão das relações entre os meios e as forças de produção, a consciência do homem se perde em narrativas filosóficas, e com ela a capacidade de perceber quais são os vetores que impulsionam a luta de classe. A consciência de classe é um predicado necessário para alavancar a revolução, pois, enquanto a contradição ocorrer entre alienados, as relações de produção serão conservadas como elas são (COHEN, 2013).

O corporativismo que envolveu a assembleia que discutiu a lei referente ao roubo da madeira denotou uma questão de poder de classe, que visou o bem comum do burguês, e não o bem viver do proletário, despossuído e dependente dos recursos naturais para sobreviver.

Ao contrário do que deveria ser o estado, elemento de união da sociedade civil, ele se mostrou um instrumento de divisão entre estado e sociedade civil e manutenção dos interesses contratuais da classe dominante.

O direito e as leis, assim, asseguram o interesse privado. Tornam-se no capitalismo um instrumento ideológico que transforma aquele que viola suas leis, em um vilão, despossuído de sua humanidade e, por isso, precisa ser sentenciado, punido com a um rato, e, por fim, aprender o valor da propriedade privada frente a sua vida humana fragilizada pelo capital.

Ellen Woody: surgimento do capitalismo agrário

(9)

Tratando-se da gênese capitalista, muito se acredita que esse sistema tem seu início no decorrer do desenvolvimento dos centros urbanos. Ellen Woody aborda a questão originária do sistema, e afirma a imergência deste no meio rural, tendo como meio de produção inicial as terras, e seus proprietários como os primeiros capitalistas.

Sobre a origem, Ellen diz:

“A questão das suas origens, então, pode ser formulada da seguinte maneira: dado que os produtores foram explorados pelos apropriados por meios não-capitalistas durante milênios antes que o capitalismo surgisse, e dado que os mercados também existiram desde já tempos imemoriais praticamente em todos os lugares, como explicar o fato de que as relações produtores/apropriados passaram a ser dependentes do mercado? ” (Wood, 1998, p.15)

Quando se identifica onde ocorre a nova dinâmica social, pode-se explorar a situação é considerar os fatos.

Em suma, a agricultura inglesa do século XVI possuía os fatores que modificaram a economia daquele momento. Resultando no setor agrário mais produtivo de todos os tempos.

Em conjunto, proprietários e arrendatários passaram a trabalhar a questão de

“melhoramento, ” não no sentido de se tornar melhor, mas dando a palavra o sentido de lucro monetário. Neste discurso, Wood reflete: “pode ser útil refletir a respeito de uma sociedade na qual a palavra “melhorar” tem como raiz lucro monetário” (1998, p.19-20).

Assim, a palavra quando aplicada ao sentido da época, significava novas formas e concepções de propriedade; modificação dos costumes antigos do meio de produção, criando uma agricultura melhorada.

No começo as práticas agrícolas da época, tinham como objetivo a preservação, sustentação e subsistência da própria comunidade por meio de trocas. Nenhum dos meios desse sistema visava o lucro do senhor da propriedade. Para o povo a terra devia ser livre de produção com fins lucrativos.

Durante os séculos XVI e XVIII houveram mudanças, por assim dizer, capitalistas nos meios costumeiros de produção. A concepção de propriedade foi tomada por um sentido novo, um sentido capitalista, que basicamente tiravam os direitos antes refletidos no povo.

Esse processo resulta em disputas de terras que antes serviam ao meio comum, privatizando- a; Eliminação de direitos do uso da terra, e a restrição de camponeses ao uso das terras.

(10)

Assim, quando pessoas iam reclamar seus direitos; a solução do problema era resolvida tomando por base o sentido do melhoramento. Fazendo com que os reclamantes perdessem a causa.

A partir daí a propriedade também toma um novo sentido, e o que antes era natural ao homem, ganha o sentido de divino de tornar a terra produtiva e lucrativa, a fim de

“melhorá-la. ” Isso defende a ideia de que, o homem quando possui o objetivo de melhorar a terra, pode se apropriar dela. Daí surgem os cercamentos da terra, a delimitação da propriedade como meio de dizer a quem pertencem, processo este marcado por conflitos.

O nascimento do capitalismo agrário então, se tem como base o melhoramento, no sentido de obter lucro. As relações agrárias, em todo seu processo, têm como fundamento o lucro dos meios de produção, como forma de melhoramento.

Assim, a riqueza da Inglaterra passava a ser mais dependente de meios capitalistas.

Esse processo, marcado por conflitos e expropriação, reformulou a base inglesa, dando uma nova estrutura de relações mesmo no meio agrícola.

Considerações finais

Assim, para a análise de Marx, as variáveis sociais que levou campesinato a, forçosamente, vender a sua força de trabalho para assegurar a sua subsistência, dialeticamente se opôs ao idealismo de Hegel sobre o estado e sua função reguladora, pois o estado e as formas jurídicas que medeiam a vida na sociedade civil acabou se tornando um instrumento de perpetuação do status quo burguês.

Dessa forma, a alusão que Marx faz em sua obra: “Crítica da Filosofia do Direito de Hegel” sobre o conceito de Emancipação Humana e Emancipação Política na Alemanha, teria que suplantar o ideário burguês pelo ideário da classe trabalhadora como a fórmula verdadeira para emancipação o proletário do sistema legal de exploração e não apenas legitimar, em uma revolução política parcial, que assegurou a manutenção do interesse de uma pequena classe, a legitimidade do uso da propriedade privada.

À quebra do direito positivo praticado pelo Estado, que nada coincidem com a realidade vivida pela classe despossuída, seria, para Marx, a única fórmula para realizar a emancipação universal da sociedade para uma unidade onde o homem fosse o núcleo do estado e não o interesse particular de uma classe.

Dessa forma, a condição dos despossuídos é resultado de um capitalismo de classe que moldou, de maneira efetiva, o modo de vida daqueles que sequer tinham condições de

(11)

subsistência e muito menos plena consciência do movimento histórico ao qual estavam inseridos.

O sagaz pensamento de Rousseau em “O Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens”, nos faz alertar sobre a artimanhas e recursos que os homens em busca do poder são capazes de despender para estabelecer seu ideário a custas dos despossuídos, afirmando que: “O primeiro homem que, tendo erguido uma cerca em volta de seu terreno e proclamado - isto me pertence! – encontrou gente ingênua o suficiente para acreditar nele, foi o fundador da sociedade civil.”

Conclui-se, portanto, que a questão da propriedade privada no modo de produção capitalista encontra no estado e no direito o suporte para a legalização da exploração da força de trabalho por meio de leis positivas que desconsideram as leis consuetudinárias, oriundas dos costumes de um grupo social, leva ao aumento da desigualdade e alienação de classe.

Referências:

BENJAMIN, W. Magia e técnica, arte e política: Ensaios sobre literatura e história da cultura. 3ª Ed. Editora Brasiliense, 1987.

COHEN, G. A. A teoria da história de Karl Marx: uma defesa. São Paulo: Editora da Unicamp, 2013.

ENGELS, F. Do Socialismo utópico ao socialismo científico. Bauru: Edipro, 2011.

MARCUSE, H. Razão e Revolução: Hegel e o advento da teoria social. Editora: Paz e Terra, 1984.

MARX, K. O método na economia política. In: MARX, K. Contribuição à Crítica da Economia Política. 2ª edição, São Paulo: Expressão Popular, 2008.

_______. O capital: crítica da economia política. São Paulo: Boitempo, 2013.

_______. Os despossuídos: debates sobre a lei referente ao furto de madeira. 1ª ed., São Paulo: Boitempo, 2017.

MARX, K. Crítica da Filosofia do Direito de Hegel: Boitempo, 2015.

(12)

_______. A ideologia alemã: crítica da mais recente filosofia alemã em seus representantes Feuerbach, B. Bauer e Stirner, e do socialismo alemão em seus diferentes profetas (1845- 1846) / Karl Marx, Friedrich Engels. São Paulo: Boitempo, 2007.

VÁZQUEZ, A. S. A concepção da práxis em Feuebach. In: VÁZQUEZ, A. S. Filosofia da práxis. São Paulo: Expressão Popular 2007.

WOOD, E. M. As origens agrarias do capitalismo. Disponível em: <

https://www.ifch.unicamp.br/criticamarxista/arquivos_biblioteca/artigo66Artigo%202.pdf>

Acesso em: 17 junho de 2017.

Referências

Documentos relacionados