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A relação do presbitério com o bispo diocesano

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Academic year: 2021

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Introdução

Não deixa de ser estranho – e, por isso, sintomático – que um leigo, mesmo sendo teólogo, seja convocado a falar sobre a relação entre os presbíteros e o bispo. De facto, essa relação parece situar-se, à primeira vista pelo menos, no âmbito restrito da vida eclesiástica, em certo sentido clerical, como muitas vezes se verifica na prática: o tema essencial de conversa entre presbíteros são os bispos e a precupação fundamental dos bispos são os (seus) presbíteros. Que tem um leigo a ver com essa relação aparentemente circular e interna aos ministérios ordenados? E que tem com isso a ver um leigo que, mesmo sendo teólogo, não é especialista em Eclesiologia nem em Direito Canónico?

É na resposta a esta primeira questão que eu gostaria de explorar o sintoma implicado na convocação de um leigo para falar sobre o assunto. Ou seja, esse sintoma parece mostrar que a relação do presbítero com o bispo é assunto também respeitante ao laicado, o mesmo seja dizer, a toda a comunidade eclesial. Porque não se trata de mero assunto interno, mais ou menos secundário, apenas significativo para o quotidiano da vida dos atingidos1. O estatuto dessa relação não é, de facto, o estatuto da relação entre um chefe e um empregado, em todas as suas variantes – nem sequer é o estatuto da relação particular entre dois amigos.

Antes de mais, relação entre presbítero e bispo é essencial para a identidade fundamental de um e de outro. Ao mesmo tempo, a identidade de ambos está dependente da sua relação com a comunidade cristã. Porque, quer o bispo quer o presbítero, existem para a comunidade cristã e não para si mesmos, num eventual círculo fechado sobre cada indivíduo ou sobre uma espécie de corporação clerical. Nesse sentido, a importância da relação entre ambos é determinada pela importância

1 Prescindo, aqui, da referência e discussão histórica da concepção do episcopado como função

meramente jurídica, eventualmente exercida por leigos – como no caso de muitos bispos príncipes, na Europa medieval (donde resulta a nomenclatura ainda actual, em alemão, do Weihbischof [bispo auxiliar], que, em realidade, significa «bispo ordenado», para o distinguir do titular da sede, que não era ordenado), ou então de abadessas con jurisdição episcopal (inclusive, com uso de mitra e báculo...) sobre os presbíteros ligados à respectiva abadia.

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que essa relação possui para a comunidade cristã e para a sua identidade – para os leigos, portanto. De facto, há bispos e presbíteros porque são essencias para as comunidades cristãs, não porque alguns cristãos gostam de ser e aceitam ser presbíteros e bispos.

E essa importância está ligada à especificidade dos ministérios do bispo e do presbítero, que poderíamos concentrar no serviço à comunidade, para que esta seja a articulação da unidade na diversidade, na relação fundamental com a sua fonte, a sua única cabeça: Deus, em Jesus Cristo, pela força do Espírito. Ou seja, em realidade, o presbítero não vive para o bispo nem este para o presbítero, pelo menos do ponto de vista fundamental. Ambos vivem para a comunidade, mesmo do ponto de vista concreto. E ambos servem a comunidade, para que esta viva para Cristo e para o seu envio: para a missão no mundo em que habita. Nesse sentido, a marca de toda a comunidade cristã é o não viver para si mesma mas, a partir de um envio que lhe vem de fora de si – mesmo que se faça ouvir apenas no seu interior –, o ser eviada para o mundo que é diferente de si. Ou seja, a comunidade cristã está aberta, é transcendida para os dois lados: para a origem e para a finalidade. E os ministérios do bispo e do presbítero são ministérios de serviço à manutenção dessa abertura, sem a qual a comunidade deixa de ser cristã e se torna num grupo meramente humano, como outro qualquer, com melhor ou pior organização, com mais ou menos eficácia.

Se o ser do bispo e do presbítero reside nesse serviço, eles são imediatamente para a comunidade e o mesmo acontece com a sua relação mútua. Nesse sentido, um leigo – em representação da comunidade cristã em geral – tem tudo a ver com a relação entre presbítero e bispo. Também do ponto de vista concreto, pois o apelo àquilo que devem ser esses ministérios vem da própria Igreja – não do capricho de cada cristão ou de cada comunidade, mas do próprio Deus, porque o apelo de Deus é para viver em função da comunidade, para que esta viva em função do envio ao mundo e, desse modo, em função de Deus e do seu projecto criador.

Pressuposto este enquadramento e, até certo ponto, a legitimação da minha intervenção sobre este tema, convém salientar que, como se trata, aqui, de falar do ministério presbiteral, a abordagem seguirá nessa perspectiva. Para esse ministério, haverá que considerar, pelo menos, as seguintes dimensões da relação ao bispo diocesano: quanto à origem do ministério (por que se é chamado a partir de outro) e

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quanto á sua finalidade (porque se é enviado para outros), o que terá implicações sobre o modo de realização, incluindo na relação aqui em causa.

Ainda como consideração prévia fundamental, é preciso concentrar-se na estrutura sacramental e mediadora de todo o ministério. É no dinamismo das mediações que deve ser enquadrada a mediação de pessoas concretas e dos ministérios que exercem. A mediação do ministério cristão não é simplesmente a do sacerdote (como o Levita do Antigo Testamento ou o sacerdote de outras religiões), qual intermediário quase sagrado entre Deus e o homem, mas o princípio sacramental, pelo qual um modo de acção humana se torna símbolo-real e eficaz de uma outra acção, não humana. Assim sendo, nem a acção do presbítero nem a do bispo, nem a mútua relação, são por si mesmas nem para si mesmas – não são as pessoas em causa que estão em questão, mas precisamente o que representam, o que tornam presente, Aquilo/Aquele de que são mediação. Os ministérios ditinguem-se pelo modo dessa mediação. E todos os ministérios estão, nesse modo de ser, relacionados uns com os outros – porque todos são, em última instância, mediação do mesmo Deus e do mesmo projecto salvífico, no interior da comunidade cristã e para o mundo inteiro.

A base de tudo é o sacerdócio de Cristo, tornado sacramentalmente activo no sacerdócio comum de todos os fiéis, através do baptismo. A função do ministério ordenado é, precisamente, a de relacionar, visivelmente, o sacerdócio comum dos fiéis com o sacerdócio de Cristo, dado que este é o único fundamento daquele. Para que a actividade dos fiéis não se fixe em si própria e no emaranhado imanente das suas organizações e actividades, deverá assumir-se como participação no sacerdócio de Cristo. Essa referência a um fundamento fora de si deve ser dada visivelmente, isto é, sacramentalmente, ou seja, numa mediação específica. É essa, como vimos, a função do ministério ordenado.

E porque o sacerdócio de Cristo se orienta para a unidade dos humanos com Deus e entre si, então o serviço eclesial que corporiza a relação a esse sacerdócio fontal é um serviço da unidade.

É enquanto serviço à identidade cristã da comunidade – do secerdócio comum dos fiéis – e enquanto serviço à unidade da comunidade cristã, e mesmo de todos os humanos, que o ministério presbiteral se deve relacionar com o ministério episcopal, pelo menos nas dimensões acima referidas. Considerar essa relação fora do horizonte destas características básicas do ministério é desviá-la do essencial, para questões que,

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podendo ser importantes, não deixam de depender das circunstâncias pessoais e sócio-culturais.

1. Origem do ministério

A primeira mediação ministerial na Igreja foi, sem dúvida, a dos apóstolos2. A fundamentação dessa função primordial reside no testemunho da Ressurreição e na prática do seguimento, núcleos do kerigma inicial. Porque o primeiro ministério – e todo o ministério – assenta nesse testemunho e nessa prática, que são fonte da fé e, do mesmo modo, fonte da vida comunitária (da communio) e fonte do envio (da missio) – ou seja, fonte da Igreja.

Outros ministérios, com saliência para o dos diáconos, aparecem já testemunhados no Novo Testamento. Nesse contexto surge também o ministério dos

episcopoi, que não era muito diferente do dos presbyteroi, ambos correspondendo ao

governo ou à liderança colegial das comunidades.

Só mais tarde – seguindo uma linha ministerial referida à prática do apóstolo itinerante, fundador de comunidades e garantia da relação dessas comunidades com a Igreja universal – é que se faz a ligação explícita do ministério do episcopos com o dos apóstolos – dando-lhe, assim, um estatuto único e fundamental na comunidade eclesial – fazendo derivar o ministério do presbítero mais deste ministério episcopal que da comunidade propriamente dita e do seu governo colegial. A dimensão do governo ou liderança interna da comunidade cede espaço à dimensão da representação da verdadeira fonte e identidade dessa comunidade. Ou seja, tornou-se cada vez mais importante (já nas denominadas Cartas Pastorais e devido ao aumento de desvios doutrinais), para a salvaguarda da identidade cristã das comunidades, a relação à tradição apostólica, garantida pelo bispo. Nesse sentido, o ministério do presbítero passou a ser entendido como mediação in loco desse ministério episcopal (já em Inácio de Antioquia, por exemplo), estando dele intimamente dependente e, por isso, constituindo garantia de fidelidade da comunidade à sua identidade cristã, pela relação ao primordial garante humano visível dessa identidade, que é o bispo. Longe ficou a ideia do grupo dos episcopoi e dos presbyteroi como grupo coordenador da vida de uma comunidade fundada por um apóstolo itinerante e em relação viva com ele.

2 Para o que se segue, ver: Cf.: J. BLANK, Priester/Bischof, in: P. EICHER (Ed.), Neues Handbuch

theologischer Grundbegriffe, vol. 3, München: Kösel 1985, 417ss; K.BERGER /W.BEINERT, Episkopat,

in: K.RAHNER (ed.), Herders Theologisches Taschenlexikon, vol. 2, Freiburg i. Br.: Herder, 1972,

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Não interessa, aqui, discutir qual o modo mais adequado de compreender estes ministérios e a sua relação. Aliás, penso que poderíamos conjugar um e outro modos, sem termos que os assumir como alternativa. De facto, na Igreja pós-apostólica torna-se cada vez mais importante uma mediação visível da apostolicidade, para evitar a fragmentarização sectária da Igreja; por outro lado, a base da vida cristã é a comunidade, com os seus carismas, entre os quais se salientam os que passaram depois a ser assumidos como ministérios ordenados.

Mas, se são ordenados, quem assume o papel mediador ou sacramental de ordenante? Certamente, o ministério que torna presente e visível a apostolicidade – porque é o ministério que garante a relação à fonte, ao kerigma originário, ao anúncio da boa nova e do próprio Cristo, garantindo a relação ao testemunho originário e fontal. Assim sendo, o episcopos torna-se o minitério da relação à origem e da unificação de todos, na relação a uma mesma e única origem. Passa a ser o vigilante, enquanto governante e enquanto responsável pela correcta identidade cristã de todos.

Nem sempre isso se torna claro, no modo actual de acesso ao presbiterado. É certo que a palavra final cabe ao bispo diocesano, representando esse facto o chamamento que precede a decisão. Mas tudo parece concentrar-se na decisão do candidato, como se o presbiterado resultasse simplesmente e em absoluto de uma opção pessoal. O modelo, segundo o qual o bispo escolhia, nas comunidades, alguém para ser ordenado presbítero, interpelando-o surpreendentemente a tal, acabou por ser ofuscado com a orientação, para o presbiterado, já dos adolescentes que entravam para o seminário menor. O presbiterado assume, aí, muito mais a aparência de um trajecto de iniciativa pessoal, com uma finalidade pessoal de auto-realização, que apenas precisa de uma confirmação ou autorização, da parte do bispo – e que, em muitos casos, nem precisaria de uma comunidade real para ser o que é.

Nesse sentido e para recuperar com clareza o facto de se tratar de um chamamento, um apelo que o próprio Deus dirige, através das necessidades da comunidade e por mediação do ministério do bispo, não será aconselhável que os seminários actuais sejam, cada vez mais, espaços e tempos de formação cristã e discernimento, para todos os cristãos, a partir de cujo contexto a Igreja diocesana, representada no seu bispo, poderá chamar alguns para o presbitério, eventualmente não todos? Não tornaria isso mais visível o facto de o presbítero responder a uma vocação de Deus – não dele – mediada pela comunidade eclesial, mais do que a um projecto de

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vida simplesmente pessoal? E não se adequa isso mais a um situação em que os seminários menores já não parecem viáveis? Há já dioceses onde o «recrutamento» de seminaristas maiores se faz, sobretudo, a partir de escolas católicas orientadas para uma formação vasta, também cristã, dos seus alunos, sem específica e explícta orientação para o presbiterado. Ou então, a partir do interior da vida das paróquias, que são escolas de formação cristã e onde alguns cristãos podem ser chamados, literalmente – podendo responder positiva ou negativamente?

Convém ter noção de que a estrutura da origem do ministério numa alteridade precedente – aquele que chama e envia – não se aplica, apenas, à relação do presbiterado com o episcopado. De facto, se o bispo é, para o presbítero, a presença visível de um chamamento que o precede e o envia, originando o seu ministério, esse chamamento vem do próprio Deus, em Jesus Cristo. Nesse sentido, também o ministério episcopal está orientado para uma origem que o precede. Por isso, o bispo não é, em si mesmo, princípio da Igreja e do ministério. Ele está, simplesmente, ao serviço da visibilidade desse princípio. E ele próprio terá uma referência visível a essa origem anterior a si mesmo: precisamente a visibilidade do colégio episcopal, em certo sentido representado visivelmente pelo bispo de Roma. E o bispo de Roma, sendo bispo também, acolhe visivelmente a alteridade da origem do seu ministério precisamente ao recebê-lo de outros bispos.

Interessantemente, os bispos que elegem o bispo de Roma são membros do seu presbitério, isto é, em realidade são presbíteros. O que parece apontar para certa relação circular, quanto à origem, entre episcopado e presbiterado. Seja como for, essa circularidade só aparece visivelmente no caso do bispo de Roma – e de modo tão difuso, que já nem é visível, pois os presbíteros, no caso, são todos bispos e cardeais. No caso dos outros bispos, o episcopado recebe-se pela imposição das mãos dos outros bispos. Esses são, pois, a presença sacramental – real-simbólica – da verdadeira origem do ministério episcopal, que é exclusivamente Cristo.

Mas um ministério não é determinado apenas pelas sua origem, senão também, em igual grau, pela sua finalidade, pela causa final, se utilizarmos a nomenclatura clássica.

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2. Finalidade do ministério

A segunda questão que nos ocupa centra-se, então, na relação entre presbítero e bispo, quanto à finalidade do ministério presbiteral. Vimos, acima, que o ministério presbiteral, tal como o episcopal, é o ministério da unidade e da indentidade da comunidade cristã. Ou seja, o presbítero é a incarnação sacramental visível, no seu ser e no seu agir, da referência da comunidade a Cristo cabeça, como único fundamento da sua existência. Tradicionalmente diz-se que ele é representante de Cristo, cabeça da Igreja. Mas a nomenclatura da «representação» pode originar equívocos.

De facto, se consideramos que ser representante de Cristo cabeça é tornar-se cabeça visível da comunidade, isso com facilidade levará ao absolutismo da pessoa do presbítero, que deixará de mostrar a verdadeira e única cabeça da Igreja, fixando esse estatuto em si mesmo. O presbítero torna-se, então, auto-céfalo, vivendo em função da sua realização pessoal e da afirmação da sua autoridade. Com isso, nega o seu próprio ministério, porque nega a sua finalidade. Porque o ministério é sacramental, ou seja, aquilo que deve tornar visível é, precisamente, o facto de não ser ele a cabeça e, desse modo, orientar a comunidade para a sua verdadeira fonte e verdadeira missão. Mas isso só o pode realizar, se ele mesmo se orientar para Cristo, única cabeça da Igreja e, por isso, também do ministério.

Ou seja, o presbítero não desempenhará a sua tarefa, o seu serviço, não se adequará à finalidade do seu ministério, se não agir de modo sacramental, isto é, se não enviar para outro que o precede, tornando eficazmente visível o facto de não ser ele que age na comunidade e no mundo, mas apenas o próprio Deus. Ora, se continuarmos no dinamismo sacramental, para o qual é necessário uma visibilidade que torne presente e visível uma invisibilidade, então poderemos dizer que o modo visível de o presbítero realizar a orientação da comunidade para a sua verdadeira fonte é na referência a alguém que o descentraliza de si mesmo. E se esse descentramento se realizasse simplesmente em relação à comunidade – o que é, sem dúvida, importante – correria o risco de ser mera extensão dos desejos e dos mandatos da própria comunidade, não desempenhando assim o seu ministério, que é o de descentrar a comunidade de si mesma. Como tal, o descentramento do próprio presbítero, em relação a si mesmo, torna mais visível e eficaz o descentramento da comunidade, na medida em que se refere, essencialmente, a um outro, que não é ele mesmo nem é a comunidade. Esse outro é Cristo e a visibilidade dessa referência dá-se na relação ao bispo. Essa relação torna-se

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sacramento de uma outra relação mais originária, pois o bispo não é o próprio Cristo. Desse modo, o presbítero, sendo fiel à finalidade do seu ministério, precisamente na relação permanente com o seu bispo, ao mesmo tempo que evita tornar-se auto-céfalo, evita também a cedência à tentação de auto-cefalia de todas as comunidades.

Mas, como vimos, o descentramento do presbítero é duplo. Porque ele refere-se ao bispo, em nome de toda a comunidade de que é ministro; e refere-se à comunidade, em nome do bispo, de quem é ministro também. Não porque tudo fique fechado numa estrutura hierárquica da Igreja, que começa no bispo e acaba na comunidade – ou vice-versa, consoante as perspectivas. Mas porque esse é um dinamismo sacramental, que representa visivelmente a verdadeira referência de todos – a referência a Cristo. Assim, o bispo é, para o presbítero e, por este, para a comunidade, a presença da referência a Cristo, como verdadeira fonte da Igreja; e a comunidade é, para o presbítero e, por este, para o bispo, a referência a Cristo, como seu corpo vivo, animado pelo Espírito. Assim, um bispo e um presbítero que não sejam para a comunidade, não são para Cristo, mas para si mesmos. E uma comunidade sem referência a um presbítero e ao bispo, também não é para Cristo, mas para si mesma. É nessa medida que o presbítero serve a comunidade, relacionando-se com o bispo; e, em certo sentido, serve o bispo, relacionando-se com a comunidade, pois permite ao bispo a realização do seu ministério, que é servir Cristo na Igreja e a Igreja em Cristo, não directamente e apenas o governo dos presbíteros.

Ou seja, quanto à finalidade do ministério presbiteral, o bispo é a principal garantia de que esse ministério seja exercido na fidelidade à sua identidade. A principal perversão dessa identidade seria, precisamente, orientar a vocação presbiteral para o próprio presbítero, que se fixaria egoisticamente no seu ministério como simples caminho para auto-realização e auto-salvação individuais. Mas isso seria a negação do próprio ministério, que só é quando for serviço.

Mas também poderíamos dizer que, pelo menos nas circuntâncias concretas em que vivemos, o presbítero também é, para o bispo, a possibilidade de realização do seu ministério. Isso, não propriamente porque, desse modo, o bispo terá presbíteros para governar, mas antes porque o presbítero permite que o ministério episcopal não se perverta, também, em auto-afirmação autoritária de si mesmo, descentrando-o de si, em direcção à comunidade eclesial e, por essa via, em direcção a Deus, pela Igreja. Porque

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a Igreja, no seu todo, é a principal mediadora de Deus, mesmo para os seus membros, incluindo os ministérios ordenados.

Um bispo sem presbíteros, ou tem uma relação directa com a sua comunidade diocesana, ou é uma espécie de bispo sem Igreja – isto é, sem razão de ser; um presbítero sem bispo não passará de um senhor absoluto ou de um escravo dominado por eventuais forças internas da sua própria comunidade. O bispo liberta o presbítero, para ser ele mesmo, sendo totalmente o seu próprio ministério; o presbítero liberta o bispo para o seu serviço específico e, como tal, para a sua identidade. Ambos libertam a comunidade da sua autofixação sectária e idolátrica; a comunidade liberta ambos de se fixarem no círculo fechado de uma classe clerical auto-suficiente.

É no dinamismo permanente – por vezes carregado de tensões, como é normal – destas múltiplas relações que a Igreja, na diversidade dos seus ministérios, é liberta pelo Espírito para a sua própria identidade, que é a identidade de comunidade de crentes enviados ao mundo, para anunciar e praticar a Boa Nova Salvífica. Como tal, a relação do presbítero com o bispo é, no leque de todas estas relações, absolutamente essencial: para ele mesmo, para o seu bispo e para toda a comunidade cristã, no interior da qual ambos se encontram e cuja missão fundamental partilham: ser enviados ao mundo, para que o mundo creia e, acreditando, seja salvo por Deus. Nesse sentido, todos os cristãos e todos os ministérios da Igreja são irmãos, pois partilham a mesma identidade fundamental: a identidade de baptizados chamados a constituir a communio eclesial, para a missio que permanentemente nos interpela. Não somos a partir de nós nem somos para nós – isso nos une e isso nos distingue, nas relações que estabelecemos entre os ministérios que aceitamos incarnar.

Referências

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