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Aplicabilidade das circunstâncias agravantes legais gerais e especiais nos crimes contra a ordem tributária

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(1)Revista de Direito Vol. XI, Nº. 14, Ano 2008. José Mário Queiroz Regina Faculdade Comunitária de Campinas unidade 1 advocaciahr@sigmanet.com.br. APLICABILIDADE DAS CIRCUNSTÂNCIAS AGRAVANTES LEGAIS GERAIS E ESPECIAIS NOS CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. RESUMO O presente artigo faz uma análise sobre a aplicação das circunstâncias agravantes judiciais e legais, gerais e especiais nos crimes contra a ordem tributária. Traçando um panorama histórico da tipificação da evasão fiscal no nosso ordenamento jurídico, focaliza os tipos penais descritos nos artigos 1º e 2º da Lei nº. 8.137/90 e, através da análise da sistematização da aplicação da pena na sua forma trifásica, define quais circunstâncias agravantes, previstas no nosso ordenamento jurídico de forma geral e de forma especial efetivamente estão à disposição do julgador na aplicação da pena aos crimes contra a ordem tributária praticados por particulares. Palavras-Chave: Direito Penal Tributário, crime contra a ordem tributária, circunstâncias agravantes.. ABSTRACT The present article analyses the application of judicial and legal, general and special aggravating circumstances in tax crimes. Described in a historical timeline and typifying tax evasion in our juridical system, it focuses on the criminal conduct described in the 1st and 2nd articles of Law no. 8.137/90. In addition, through the analysis of the tri-phase sentencing systematics, defines which aggravating circumstances, stated generally and specifically in our juridical system, are effectively at the disposal of all judges while sentencing of tax crimes committed by private citizens. Keywords: Criminal Tax Law, tax crime, aggravating circumstances.. Anhanguera Educacional S.A. Correspondência/Contato Alameda Maria Tereza, 2000 Valinhos, São Paulo CEP. 13.278-181 rc.ipade@unianhanguera.edu.br Coordenação Instituto de Pesquisas Aplicadas e Desenvolvimento Educacional - IPADE Artigo Original Recebido em: 07/05/2008 Avaliado em: 10/06/2008 Publicação: 24 de outubro de 2008 31.

(2) 32. Aplicabilidade das circunstâncias agravantes legais gerais e especiais nos crimes contra a ordem tributária. 1.. INTRODUÇÃO A convergência de dois ramos do direito público de maior intromissão na vida privada, um a cercear seu patrimônio, o Direito Tributário, outro a sua liberdade, o Direito Penal, em ambos a atuar o mais radical poder discricionário estatal que se sobrepõe à vida dos particulares de forma imperativa, é que se debruça a preocupação de se esquadrinhar claramente as garantias e prerrogativas do cidadão brasileiro face à nova e crescente batalha do poder público na proteção desse bem jurídico coletivo de titularidade difusa. Se por um lado, no moderno direito penal, a tutela a bem jurídico é condição de culpabilidade, não há mais que se falar em ofensa direta à arrecadação estatal, tampouco considerar a Fazenda Pública como ente abstrato a ser protegido a qualquer custo. O bem jurídico protegido pelos crimes contra a ordem tributária incide sobre o dever de lealdade do cidadão para com o Estado em relação à obrigação tributária e a instrumentalização desse Estado na consecução do ideal constitucional de Estado Social. A legitimidade constitucional para a tutela da ordem tributária radica no fato de que todos os recursos arrecadados se destinam a assegurar a finalidade inerente ao Estado democrático e social de Direito, de modo a propiciar melhores condições de vida a todos (v.g., tratamento de água e esgoto, criação de áreas de lazer, saúde, educação). É exatamente característica do Estado social promover e garantir a assistência e a solidariedade social. (PRADO, 2004, p. 401-402).. Por outro lado, também, os direito e garantias fundamentais de caráter constitucional afastam a sanha e a voracidade do Estado em ultrapassar o sinal vermelho e invadir áreas de proteção pétreas, duramente conquistadas. Os princípios limitadores do Direito Penal assegurados constitucionalmente, vigentes no artigo 5º da Constituição, têm a função de orientar o legislador ordinário para a adoção de um sistema de controle penal voltado para os direitos humanos, embasado em um Direito Penal da culpabilidade, um Direito Penal mínimo e garantista. (PINTO, 2001, p. 106).. Da análise das virtudes e defeitos da incriminação da evasão fiscal tratada na Lei nº. 8.137/90 e da aplicação das agravantes legais gerais previstas no ordenamento penal, e especiais previstas na referida lei, é que se movimenta o presente trabalho, no intuito de auxiliar na correta exegese dos institutos penais envolvidos.. Revista de Direito • Vol. XI, Nº. 14, Ano 2008 • p. 31-47.

(3) José Mário Queiroz Regina. 2.. ESCOPO HISTÓRICO DOS CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. 2.1. As Primeiras Iniciativas Contra a Evasão Fiscal A criminalização da evasão fiscal teve início quando se percebe que as sanções civis e administrativas até então a ela aplicadas, por si sós não davam conta de conter o crescente desenvolvimento dessa prática que se agigantava no Brasil. No início, seguindo a idéia dominante de aproveitar-se do texto penal, tentouse equiparar ilícitos tributários aos crimes de falsidade ideológica (art. 299º, do CP) o que foi rechaçado pelo próprio Poder Judiciário1. Algumas iniciativas legais esporádicas e pontuais, tais como o advento da Lei nº. 4.357/64, que passou a considerar como objetos de apropriação indébita (art. 168º, do CP) os valores descontados de terceiros, pelas fontes pagadoras, sempre que não carreados para a Fazenda Pública ou pela Lei nº. 4.502/64 que impunha penalidades à sonegação fiscal enquanto circunstâncias qualificadoras, sem lhes considerar figuras penais autônomas, também não lograram o êxito almejado, qual seja instrumentalizar a persecução penal à crescente evasão fiscal.. 2.2. Crimes de Sonegação Fiscal A primeira lei brasileira a erigir a evasão fiscal como ilícito penal e que foi um marco no nosso Direito, é a Lei nº. 4.729, de 14 de julho de 1965 que cria o crime de sonegação fiscal. Iniciativa original do Pres. João Goulart, de confessada inspiração no Código Penal do Min. Nelson Hungria, depois de ter recebido um substitutivo do Dep. Ulysses Guimarães, foi, enfim, aprovado pelo Congresso Nacional no regime especial do Ato Institucional numa iniciativa do então Pres. Castelo Branco. Estava definido o crime de sonegação fiscal. Os incisos I e II do artigo primeiro descreviam as formas de evasão fiscal através da prática de condutas por parte do contribuinte, em operações diretamente ligadas ao lançamento tributário. Os incisos III e IV cuidavam dos atos dos contribuintes sobre documentos que podiam servir no lançamento para a estimativa do tributo.. 1 “As declarações das partes contratantes, na escritura, atribuindo ao imóvel valor mais baixo do que realmente pago, não configuram sequer em tese o delito do artigo 299º, do Código Penal” (RT 273/100). “A sonegação tributária, embora enquadrável na descrição ampla do falso ideológico, tem sido considerada figura atípica. O que se verifica no Direito Penal Brasileiro é que, quase sempre, o ilícito tributário se apresenta como ilícito penal quando há norma incriminadora própria para lhe dar configuração típica” (RT 285/ 71 e 72).. Revista de Direito • Vol. XI, Nº. 14, Ano 2008 • p. 31-47. 33.

(4) 34. Aplicabilidade das circunstâncias agravantes legais gerais e especiais nos crimes contra a ordem tributária. Os demais artigos inovavam em alguns pontos ao instituir a co-autoria ou participação nos crimes societários; a extinção da punibilidade pelo pagamento; a exata aplicação da lei no tempo; a concentração da matéria; entre outras. A pena aplicada na Lei nº. 4.729/65, considerada por muitos como branda, previa a detenção, de seis meses a dois anos e multa de duas a cinco vezes o valor do tributo.. 2.3. Crimes Contra a Ordem Tributária - Conteúdo da Lei nº. 8.137/90 Esse quadro somente foi modificado com o advento da Lei nº. 8.137, de 27 de dezembro de 1990 que, embora não tenha revogado expressamente a lei anterior, a aplicação da regra geral estampada no artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil (Dec.-Lei nº. 4.657/42) solucionou eventual conflito aparente das duas leis, já que a lei nova regulou inteiramente a matéria, revogando implicitamente a Lei nº. 4.729/65. De resto, a Lei nº. 8.137/90 regulou integralmente a matéria dos crimes contra a ordem tributária, pois, além de definir tipos penais, dispôs sobre multas e responsabilidades dos agentes, representação criminal, dando-lhes tratamento tão abrangente e exaustivo que só nos permite concluir que a lei anterior encontra-se revogada. (COSTA JÚNIOR, 1995, p. 100).. A lei nova cunhou um nome novo para o crime de sonegação fiscal, agora denominado crime contra a ordem tributária. Justificou-se a alteração em função da lei que, além de abarcar o crime em comento, simultaneamente criou os crimes contra a ordem econômica e crimes contra a relação de consumo. Nota-se um avanço na técnica legislativa. Ao instituir um crime multinuclear a descrição do fato punível ficou muito mais precisa. Na nova lei os verbos, introduzidos no seu caput, suprimir ou reduzir remeteram a obrigatoriedade do efetivo lançamento do crédito tributário como condição à correta persecução penal. Só aí, complementase o tipo penal com o segundo verbo nuclear incluído nas diversas condutas elencadas nos cinco incisos do artigo primeiro. É da conjugação dos dois verbos nucleares que o tipo se aperfeiçoa. Já o artigo segundo não foi objeto da mesma boa técnica, levando a doutrina a acalorados debates acerca da sua real incidência. A confusão estabeleceu-se a partir da redação do seu caput quando estabelece que “constitui crime da mesma natureza” e segue elencando em alguns dos seus cinco incisos condutas muito assemelhadas àquelas instituídas no artigo primeiro.. Revista de Direito • Vol. XI, Nº. 14, Ano 2008 • p. 31-47.

(5) José Mário Queiroz Regina. Na verdade, o artigo segundo introduzia no direito brasileiro um crime novo, de natureza diferente daquele do artigo primeiro. Enquanto este estabelece um crime de dano cuja conduta almejava um fim que era o de reduzir ou suprimir tributo, o artigo segundo estabelece um crime de mera conduta, não ensejando aquele resultado. Daí porque as penas aplicadas a um e a outro são completamente diferentes. Enquanto a pena prevista no artigo primeiro é de dois a cinco anos de reclusão e multa, o artigo segundo apenas com detenção de seis meses a dois anos e multa o seu infrator. O artigo terceiro da Lei nº. 8.137/90 trata do crime funcional contra a ordem tributária perpetrados por funcionários públicos no exercício de sua função ou em razão dela, diretamente, conforme inciso I ou de forma mediata, conforme incisos II e III, aplicando-se-lhes pena mais grave aos incisos I e II e menos grave, porém ainda bastante elevada, ao inciso III. Dos artigos 4º ao 7º estão definidos os crimes contra a ordem econômica e contra as relações de consumo. O artigo 8º quantifica os dias-multa e seus valores a serem aplicados aos crimes contra a ordem tributária e o artigo 9º prevê a conversão das penas de detenção e reclusão em penas pecuniárias aos crimes contra a ordem econômica e contra as relações de consumo, neste caso excluídos os crimes contra a ordem tributária. Os problemas começam a surgir a partir das disposições gerais da Lei nº. 8.137/90, dos artigos 11º ao 16º porque ao tratar de três tipos penais distintos essas disposições não são claras quanto a sua incidência, já que por vezes fica evidente serem apenas aplicáveis a algum dos tipos penais; em outras sua aplicação parece atingir a todos indiscriminadamente. Nosso estudo concentra a análise dos tipos penais expressos nos artigos 1º e 2º da Lei nº. 8.137/90, ou seja, dos crimes contra a ordem tributária praticados por particulares e da aplicação de suas penas com as agravantes legais gerais previstos no nosso ordenamento penal e com as agravantes legais especiais previstas no artigo 12º da lei em comento.. As figuras penais tributárias previstas no artigo 1º da Lei nº. 8.137/90 A conduta típica descrita no artigo 1º, caput, consiste em suprimir, que significa omitir, deixar de recolher o que deveria ter sido pago, e em reduzir, que significa diminuir, restringir o quantum a ser recolhido, de tributo, ou contribuição social e qualquer acessó-. Revista de Direito • Vol. XI, Nº. 14, Ano 2008 • p. 31-47. 35.

(6) 36. Aplicabilidade das circunstâncias agravantes legais gerais e especiais nos crimes contra a ordem tributária. rio, conceitos normativos que nos remete forçosamente ao Direito Tributário, que irá explicá-los e defini-los. Assim, se a norma penal, para tipificar uma conduta, se utiliza de conceitos normativos hauridos do Direito Tributário, é esta disciplina que deverá ser consultada para precisar o alcance da norma. Em suma, é o Direito Tributário que deverá explicar e definir o que é tributo, contribuição social ou sujeito passivo de obrigação, com vistas à tipificação do crime contra a ordem tributária. (COSTA JÚNIOR, 1995, p. 101).. Outro aspecto relevante a interpretar o alcance das expressões supressão ou redução propostos no seu caput é o efetivo lançamento tributário como condição de procedibilidade para a persecução penal. Por tais razões, a infração à legislação tributária é pressuposto para a ocorrência do crime, daí por que é necessário que antes de tudo tenha ocorrido o lançamento tributário eficaz. (ANDRADE FILHO, 1995, p. 99).. Após acalorados debates entre doutrina e parte da jurisprudência, a questão da procedibilidade da ação penal face ao esgotamento da via administrativa restou pacificado diante desse posicionamento tanto pela nossa Corte Suprema quando pelo E. 2. STJ.. Para a correta tipificação penal, não basta simplesmente à apresentação do resultado supressão ou redução de tributo, este resultado deve se ligar a um meio executório que o legislador relaciona em diversas hipóteses previstas nos incisos do artigo 1º da Lei nº. 8.137/90. Com isso, o tipo da sonegação fiscal dissocia-se em duas ações (momentos), a falsidade ou fraude, prevista nos incisos do art. 1º, e a sonegação propriamente dita, constante do caput do artigo. O texto fala literalmente dessas condutas como meios executivos da sonegação, aludindo a que esta se perfaça mediante aquelas. (SILVA, 1998, p. 183).. As diversas fraudes e falsidades materiais e ideológicas previstas nos incisos do artigo 1º tratam de cercar as possíveis condutas-meio a que o agente-contribuinte possa engendrar para realizar o fim que tanto almeja, qual seja o resultado lesivo ao erário público. Convém salientar que o tipo em análise é de ação múltipla ou de conteúdo variado, pois, não obstante seja perpetrada pelo agente mais de uma das condutas fraudulentas descritas nos incisos do dispositivo, ter-se-á apenas um delito. Desse modo, o que identifica cada crime não é o número de comportamentos reali-. 2. Ementa STJ - HC n°. 83.414-1/RS: “Habeas Corpus. Penal. Tributário. Crime de supressão de tributo (Art. 1º da Lei nº. 8.137/1990). Natureza Jurídica. Esgotamento da via administrativa. Prescrição. Ordem concedida. a) Na linha do julgamento do HC 81.611 (rel. Min. Sepúlveda Pertence, Plenário), as crimes definidos no art. 1º da Lei 8.137/1990 são materiais, somente se consumando com o lançamento definitivo. b) Se está pendente recurso administrativo que discute o débito tributário perante as autoridades fazendárias, ainda não há crime, porquanto ‘tributo’ é elemento normativo do tipo. c) Em conseqüência, não há falar-se em início do lapso prescricional, que somente se iniciará com a consumação do delito, nos termos do art. 111º, I, do Código Penal.”. Revista de Direito • Vol. XI, Nº. 14, Ano 2008 • p. 31-47.

(7) José Mário Queiroz Regina. zados, mas o de objetivos materiais sobre os quais recaem tais comportamentos. (PRADO, 2004, p. 413).. O inciso I versa sobre a obrigação tributária acessória, assim entendida a obrigação de prestar as informações que na forma e no conteúdo que a lei tributária exige e que sejam verdadeiras com o fim de balizar o cálculo dos tributos. O inciso II tem como objetivo garantir aos livros fiscais a credibilidade aos seus lançamentos. A conduta típica do inciso III consubstancia-se nos núcleos verbais falsificar, que significa formação de uma cópia de documento verdadeiro ou a formação de um documento que não corresponda a nenhum outro verdadeiro, ou adulteração ou supressão de partes do documento de modo a alterar o seu sentido original. O inciso IV tenta cercar toda a cadeia do comércio das chamadas notas frias, tipificando o agente que elabora, distribui, fornece, emite e utiliza conscientemente documento falso. Por fim, o inciso V tipifica a omissão do dever legal de emissão de nota fiscal. Merece destaque a presença do parágrafo único do artigo 1º uma vez que se apresenta como um corpo estranho. Embora faça remissão direta ao inciso V, não guarda com ele nenhuma relação. Parece tratar-se de dispositivo autônomo, que não guarda relação com o inciso V que o precede. Aqui não se cogita da recusa em apresentar nota fiscal ou documento equivalente, relativos à venda de mercadorias ou prestação de serviço. Cogita-se de recusa diversa à exigência da autoridade fazendária durante os trabalhos de fiscalização. (COSTA JÚNIOR, 1995, p. 120).. Parece-nos que a intenção do legislador, ao fazer tal remissão, foi a de agregar ao fato-espécie o conteúdo finalístico do caput, ou seja, tal conduta associada à final supressão ou redução de tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, já que o seu conteúdo revela um crime de mera conduta, ou seja, desobediência a atos praticados pela fiscalização fazendária. Nota-se, ainda, que a exigência fiscal descrita não está limitada à Lei, ficando ao livre arbítrio do agente fiscal, conferindo-lhe poderes discricionários incomensuráveis. Fazendo nossa, a conclusão do Prof. Juary C. Silva: Abstemo-nos de comentar esse dispositivo porque como analisado antes, entendemo-lo de todo inoperante, por evidente inconstitucionalidade, visto que defere à autoridade fazendária a definição de elementos do tipo, importando num recuo ao Direito Penal de antes da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (França, em 26-8-1789) e de todos os textos declaratórios dos direitos humanos, a teor de secular praxe da civilização ocidental, na qual nos inserimos, malgrados esporádicos surtos de autoritarismo. Como esse dispositivo foi baixado em pleno regime de Estado Democrático de Direito, ele se choca frontalmente com a Constituição que a demonstração do fato afigura-se dispensável. (SILVA, 1998, p. 217).. Revista de Direito • Vol. XI, Nº. 14, Ano 2008 • p. 31-47. 37.

(8) 38. Aplicabilidade das circunstâncias agravantes legais gerais e especiais nos crimes contra a ordem tributária. As figuras penais tributárias previstas no artigo 2º da Lei nº. 8.137/90 Preliminarmente é importante destacar que este artigo, além da péssima técnica legislativa na definição de seus tipos penais, levando os doutrinadores a discussões exaustivas, padece de uma verdadeira revogação branca, já que em pesquisa jurisprudencial estadual e federal, em todas as unidades da federação, não se localizou nenhuma discussão acerca da eventual aplicação desse artigo na História Penal Brasileira. Exceção ao período entre a promulgação da Lei nº. 8.137/90 e da Lei nº. 8.212/91, esta sobre a organização da Seguridade Social que prescreveu em seu artigo 95º os crimes de apropriação indébita previdenciária, revogando este tipo de contribuição social do alcance do artigo 2º, II, da Lei nº. 8.137/90. Nesse período de cerca de seis meses é que se encontram, por ordem e graça do incansável trabalho da procuradoria da previdência social, inúmeras decisões judiciais federais em primeira e segunda instância discutindo a aplicação desse instituto. Depois da retirada das contribuições previdenciárias do alcance do artigo 2º, II, da Lei nº. 8.137/90, limitando a sua aplicação ao IPI – Imposto sobre Produto Industrializado e ao Imposto de Renda Retido na Fonte não se localizou nenhuma denúncia levada ao judiciário, juntando-se à real inutilização dos demais incisos deste artigo. Seja pelo desinteresse dos Representantes dos Ministérios Públicos Estaduais e Federal, em virtude de prazo prescricional muito raso, seja pelas suas próprias indefinições congênitas. Fato é que estamos diante de uma verdadeira norma penal sem uso. Independente disso, o artigo 2º encontra-se em vigor no ordenamento jurídico e passamos a analisar os tipos penais que descreve. O inciso I, como já referido neste trabalho, no subitem 2.3 - Crime Contra a Ordem Tributária - Conteúdo da Lei nº. 8.137/90, é um crime formal de mera conduta já que através da fraude ou falsificação material ou ideológica, comete o crime o agente-contribuinte que tenta eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo. Assim, o resultado lesivo ao erário público não é elemento constitutivo do tipo. O delito em epígrafe é de mera atividade, porque, embora haja a indicação de resultado (para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo), não se exige a ocorrência deste último para a sua consumação, sendo suficiente a prestação da declaração falsa, a omissão de declaração ou o emprego de outra fraude com o fim de suprimir ou reduzir o tributo devido. (PRADO, 2004, p. 439).. O inciso II, instituiu o crime de apropriação indébita fiscal, desligada da apropriação indébita previdenciária que, a partir da Lei nº. 9.983/00, tomou assento no artigo 168º-A do Código Penal. Sua aplicação ficou restrita aos demais tributos que o a-. Revista de Direito • Vol. XI, Nº. 14, Ano 2008 • p. 31-47.

(9) José Mário Queiroz Regina. gente, na condição de substituto tributário, cobra de terceiro e deixa de repassar aos cofres públicos. De natureza omissiva própria para a consumação deste delito também ficou pacificado na jurisprudência o entendimento do prévio lançamento eficaz do crédito tributário correspondente. Os incisos III e IV prendem-se ao instituto do incentivo fiscal que é o subsídio outorgado pelo Estado, na forma de renúncia fiscal, em troca de investimento em atividades de seu interesse. Comete o delito o agente que, mediante fraude, desviar para si ou utilizar de forma ilegal o valor dedutível ou deduzido nessa condição. No inciso V o legislador tratou da fraude contábil perpetrada através da informática, valendo-se do enorme progresso experimentado nesse setor e que tornou-se uma ferramenta valiosa na consecução de todo o controle das obrigações acessórias fiscais. Comete o delito o agente que se utiliza ou divulga o programa de processamento de dados de forma fraudulenta a reduzir ou suprimir tributos. A pena aplicada aos crimes previstos neste artigo são bem mais brandas do que as aplicadas ao artigo antecedente, daí, talvez, o desinteresse que esses tipos penais acabaram por apresentar na prática judiciária brasileira.. 3.. APLICAÇÃO TRIFÁSICA DA PENA NO DIREITO PENAL BRASILEIRO O problema deste estudo, que analisa a incidência de agravantes gerais e especiais nos crimes contra a ordem tributária, passa obrigatoriamente pela aplicação da pena no nosso ordenamento jurídico penal, onde está inserido como espécie. A aplicação da pena, de escopo constitucional pétreo, conforme artigo 5º, XLVI, da CF, vem regulado no artigo 59º do Código Penal, donde se extrai a sua essência. No Código de 1940, porém, instituiu-se um critério em que o juiz exerce relativo arbítrio na fixação da pena, dosando-a de acordo com diversas circunstâncias entre um mínimo e um máximo cominadas abstratamente a cada delito, possibilitando ao julgador a faculdade controlada de escolher a sanção mais adequada ao delinqüente sem esquecer a gravidade objetiva do crime ou as suas conseqüências particulares. Esse critério tem por base o estabelecimento de determinadas circunstâncias que tornam o fato mais ou menos grave. (MIRABETE, 1990, p. 289).. Essas circunstâncias agravam o crime sem lhes alterar a essência e podem ser judiciais ou legais. As primeiras se relacionam com a previsão do artigo 59º e balizam o julgador, primeiro na existência concreta do ilícito e, segundo, na análise da culpabili-. Revista de Direito • Vol. XI, Nº. 14, Ano 2008 • p. 31-47. 39.

(10) 40. Aplicabilidade das circunstâncias agravantes legais gerais e especiais nos crimes contra a ordem tributária. dade do agente em todos os aspectos que cercam sua personalidade, seus motivos, circunstâncias e conseqüências do crime. Tanto quanto a culpabilidade, a nosso juízo, o bem jurídico coloca-se como fundamentador, limitador ou excluidor da pena. Não poderá haver pena sem que se lese um bem jurídico, nem a resposta poderá exceder à intensidade de lesão ao mesmo, sendo caso até mesmo de dispensa de pena se apresentar a sanção desnecessária para a tutela de referido bem. A conduta formalmente ajustada ao tipo penal, em oposição ao ordenamento jurídico, deverá considerar-se como irrelevante penalmente se não ferir o objeto de tutela presente na norma. (AZEVEDO, 1998, p. 41).. 3.1. Sistema de agravamento de pena no Direito Penal brasileiro A par da descrição do fato típico e das circunstâncias judiciais, existem ainda as circunstâncias legais que, de modo genérico ou de modo especial, exigem a verificação de alguns fatos que cercam a realização de um crime ou a qualidade do agente criminoso e que podem evidenciar maior crueldade ou nocividade, em virtude do qual a lei determina a aplicação de pena mais severa. Em muitos casos as circunstâncias judiciais e legais são excludentes entre si, quando tal circunstância constitui elemento essencial do tipo, não havendo motivo para a agravação da pena, sob pena de o julgador incorrer no bis in idem. No nosso direito pátrio adotou-se a fixação taxativa das circunstâncias legais, limitando-se o juiz, na aplicação da pena, às circunstâncias expressamente elencadas nos textos legais. Há, pois, dois tipos de circunstâncias legais no direito penal brasileiro: as gerais e as especiais. As primeiras, de caráter genérico, indicativo e aberto, porque aplicam-se a todo o conjunto de tipos criminais, previstos no Código Penal e nas leis esparsas, ficam à volta do tipo, sem nele penetrar, sua presença ou ausência não lhes alteram a estrutura, cujos elementos constitutivos vêm descritos no modelo legal, e dizem respeito àquelas previstas na parte geral do Código Penal, especialmente nos artigos 61º e 62º, sendo na maioria das vezes denominadas pela doutrina como agravantes. Já as circunstâncias legais especiais, de aplicação específica, estão previstas na parte especial do mesmo diploma legal e nas diversas leis esparsas quando o tipo penal assim o exige. Apresentam-se como elementares, quando correspondem a elementos específicos do crime, chamadas pela doutrina de causas de aumento ou diminuição da pena, ou qualificadoras que são circunstâncias legais especiais do crime, não são modificadoras apenas da pena, na verdade, juntam-se ao tipo para constituir novas. Revista de Direito • Vol. XI, Nº. 14, Ano 2008 • p. 31-47.

(11) José Mário Queiroz Regina. qualificativas do tipo-base, de penetração no tipo, atribuindo posição diferenciada, segundo a sanção cominada, da disposição dos fatos típicos. Interpreta a doutrina que os verbos aumentar e diminuir, utilizados pelo legislador, importam causa de aumento e diminuição, com as margens penais avançando ou recuando os limites legais, enquanto os verbos agravar ou atenuar dizem respeito a hipóteses de endurecimento ou abrandamento da sanção dentro das margens previamente delimitadas no tipo penal. (AZEVEDO, 1998, p. 57).. Por criar um tipo novo e especial o tipo penal qualificado parte de pena mínima e máxima diferente do tipo-base e, depois, se processa como este. Tendo em vista que o presente estudo foca a aplicação de circunstâncias agravantes gerais e especiais nos crimes contra a ordem tributária e que a Lei nº. 8.137/90 não prevê nenhum tipo qualificado, seguiremos estudando a aplicação de agravantes gerais e agravantes especiais que no caso do artigo 12º da referida lei, trata-se de causa de aumento de pena. O critério trifásico da aplicação da pena no direito brasileiro ficou estabelecido no artigo 68º, caput, do Código Penal que determinou o caminho a ser perseguido pelo julgador para a correta consideração de todas as circunstâncias que cercam o fato atípico. Dessa forma, o juiz deverá fixar a pena base tendo em vista apenas as circunstâncias judiciais (culpabilidade, antecedentes, etc.). Em seguida levará em conta as circunstâncias agravantes e atenuantes, aumentando ou diminuindo a pena em quantidade que fica a seu prudente arbítrio e dando ênfase às circunstâncias preponderantes. Por fim, sobre este último resultado, aplicará os aumentos e diminuições previstos nas causas gerais e especiais nas proporções previstas nos respectivos dispositivos legais, inclusive a redução referente à tentativa, quando for o caso. (MIRABETE, 1990, p. 309).. 4.. SISTEMA DE AGRAVAMENTO DE PENA NOS CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA Muito embora a Lei nº. 8.137/90 seja silente quanto à aplicação subsidiária do Código Penal, a própria lei penal, em seu artigo 12º, dirime qualquer controvérsia a esse respeito tendo em vista que ali se estabelece a aplicação obrigatória das regras da parte geral do Código Penal a toda norma incriminadora, ou seja, criadora de tipos penais extravagantes ao próprio código, e que não regulem especificamente as questões gerais ali tratadas. O Direito Penal Tributário não pode representar ramo jurídico autônomo, a uma, porque não possui individualização legislativa; a duas, porque não está dotado de uma sistemática de normas e princípios gerais, valendo-se daqueles alterados no Direito Penal comum; a três, por que, inexistindo normas genéricas baixadas pelo legislador penal tributário, aplicam-se as do Código Penal, tal como se as infrações de natureza tributária estivessem contidas na própria codificação penal. (SILVA, 1998, p. 61).. Revista de Direito • Vol. XI, Nº. 14, Ano 2008 • p. 31-47. 41.

(12) 42. Aplicabilidade das circunstâncias agravantes legais gerais e especiais nos crimes contra a ordem tributária. Assim, a Lei nº. 8.137/90, por não dar expresso tratamento novo e diverso a questões gerais tratadas na primeira parte do código penal, as circunstâncias agravantes gerais previstas naquele diploma legal são perfeitamente aplicáveis aos crimes previstos nos artigos 1º e 2º da Lei nº. 8.137/90. Porém, dada a sua natureza peculiar, o que se indaga no presente estudo é se serão todas as circunstâncias gerais previstas do Código Penal aptas a serem aplicadas pelo julgador nos crimes contra a ordem tributária.. 4.1. Circunstâncias Agravantes Gerais nos Crimes Contra a Ordem Tributária As circunstâncias agravantes gerais estão previstas em rol taxativo nos artigos 61º e 62º do Código Penal e estabelecem que essas condições especiais sempre agravam a pena, obrigando ao julgador, sempre que presentes, à sua aplicação, ressalvadas as circunstâncias elementares que já estão contidas no tipo e foram consideradas pelo legislador na fixação da pena mínima e máxima e por constituírem circunstâncias judiciais valoradas pelo julgador no momento da fixação da pena-base, de outra forma haveria o bis in idem. No processo de individualização da pena, deve o juiz, fixada a pena-base, considerar as atenuantes e as agravantes legais. Trata-se da segunda etapa daquele processo na qual o objetivo básico é o da quantificação em termos punitivos, das circunstâncias legais, para as quais o legislador omitiu uma prévia cominação. É evidente, por isso, que a avaliação de cada circunstância e a determinação do respectivo quantum de pena a acrescer ou a reduzir ficam na dependência do prudente arbítrio do juiz que, no entanto , está sempre obrigado a dar motivos de sua decisão . Além disso, na sua atuação não está dotado de um poder ilimitado. Nenhuma acréscimo ou diminuição de pena pode superar o máximo ou ficar aquém do mínimo legal, sendo certo que, apesar de não expresso, está subentendido que as quantidades de penas relativas às agravantes e às atenuantes não podem extravasar os limites punitivos do tipo. (FRANCO, 1990, p. 342).. O inciso I do artigo 61º refere-se ao instituto da reincidência, melhor esclarecido nos artigos 63º e 64º do mesmo diploma legal e que dizem respeito ao criminoso não primário, ou seja, na data da sentença ou decisão que aprecia algum benefício, tem condenação anterior irrecorrível. Sua aplicação aos crimes contra a ordem tributária são plenamente aceitáveis já que poderá o agente-contribuinte ter sido condenado anteriormente por decisão transitada e, com isso, influenciar o julgador na aplicação da pena. O inciso II do mesmo artigo prevê nas suas alíneas, diversas condições que não se adequam aos crimes contra a ordem tributária já que, por ser um crime próprio cuja vítima será sempre a fazenda pública, as qualidades do ofendido, presentes nas a-. Revista de Direito • Vol. XI, Nº. 14, Ano 2008 • p. 31-47.

(13) José Mário Queiroz Regina. líneas “c”, “e”, “f”, “h”, “i”, não podem gerar qualquer efeito; as situações incompatíveis com a práxis administrativa e contábil, presentes nas alíneas “d”, “j” e “l” são de impossível aplicação; e as alíneas “a”, “b” e “g” prevêem circunstâncias que já estão contidas nos elementos do tipo. O artigo 62º do Código Penal acrescenta mais quatro circunstâncias agravantes em rol taxativo. No inciso I surgem as figuras da promoção, organização e direção da atividade criminosa que significa o autor intelectual, aquele que, com antecedência, elabora o plano de atividade, que articula e fiscaliza a atividade delitiva. Ora, os crimes contra a ordem tributária exigem, para sua consecução, uma sofisticada sistemática administrativa e contábil, a envolver decisões, elaborações e distribuições de tarefas entre os vários setores envolvidos na práxis tributária, seja da pessoa jurídica, seja da pessoa física, portanto, plenamente aplicável aos crimes contra a ordem tributária a agravante geral prevista neste inciso. O inciso II, trata do induzimento ou coação à execução material do crime, pouco importando tratar-se de coação física ou moral, resistível ou irresistível, em todas ao coator cabe a incidência do gravame. Também plenamente aplicável aos crimes contra a ordem tributária já que o assédio moral no ambiente empresarial, seja contra funcionários, fornecedores ou consumidores, não raro podem ter como objeto a evasão fiscal, abarcando, também, o previsto no inciso III que trata da mesma coação, apenas acrescida da relação de autoridade. O inciso IV também não pode ser afastado da incidência sobre os crimes contra a ordem tributária já que não raro os frutos financeiros obtidos através da evasão fiscal poderão ser objeto de negociações clandestinas entre os envolvidos na cadeia delitiva. Assim, quando da aplicação da pena nos crimes contra a ordem tributária previstos nos artigos 1º e 2º da Lei nº. 8.137/90, na segunda fase prevista no comando do artigo 68º do Código Penal, o julgador deverá considerar as agravantes gerais previstas no inciso I do artigo 61º do Código Penal e em todos os incisos do artigo 62º, do mesmo diploma legal.. Revista de Direito • Vol. XI, Nº. 14, Ano 2008 • p. 31-47. 43.

(14) 44. Aplicabilidade das circunstâncias agravantes legais gerais e especiais nos crimes contra a ordem tributária. 4.2. Circunstâncias Agravantes Especiais nos Crimes Contra a Ordem Tributária A Lei nº. 8.137/90 traz, em seu artigo 12º, incisos I a III, circunstâncias legais especiais que podem aumentar de 1/3 até a metade as penas previstas nos artigos 1º e 2º do mesmo diploma legal, além dos demais tipos penais carreados na mesma lei e não analisados no presente estudo. Inicialmente é importante esclarecer tratar-se de causa de aumento de pena já que autorizam um aumento ou diminuição de pena em quantidade fixa ou dentro de limites variáveis. Não se confundindo com as circunstâncias agravantes ou atenuantes, pois, enquanto estas atuam dentro dos limites cominados pelo tipo, as causa de aumento e de diminuição podem acarretar a superação do limite de pena ou a fixação desta aquém do limite mínimo (FRANCO, 1990). À primeira vista, estando nas disposições gerais da lei que prevê, além dos crimes contra a ordem tributária, outras modalidades delituosas, a saber, crimes contra a ordem econômica e contra as relações de consumo, as hipóteses elencadas em seus três incisos parecem gravames dirigidos a estes e não àqueles. De reconhecer que as hipóteses ocorrerão, antes, em relação aos crimes previstos nos artigos 4º e 7º da lei, que protegem a ordem econômica e as relações de consumo. Mas na eventualidade de virem a ocorrer quando da prática de crimes previstos pelos seus artigos 1º e 2º, deverão tais circunstâncias ser levadas em conta para o fim de permitir a elevação da pena de seus autores de um terço até metade. (DECOMAIN, 1994, p. 146).. A doutrina vem digladiando-se a respeito da real aplicação do dispositivo em comento, já que a péssima técnica legislativa adotada acaba por roubar-lhe validade. A utilização da expressão podem agravar no caput do artigo 12º, da Lei nº. 8.137/90, já destoa da técnica legislativa geral do Direito Penal. As agravantes previstas nos artigos 61º e 62º do Código Penal são de aplicação obrigatória já que ali se adotou a expressão sempre agravam. Nosso entendimento é que o poder previsto no artigo é uma faculdade do juiz a ser por ele considerado no caso concreto, conforme preceitua o artigo 68º do Código Penal. Neste caso, não estaria o juiz adstrito à sua aplicação. Ressalta-se ainda que nenhuma das circunstâncias previstas nos incisos do artigo 12 acarreta aumento obrigatório da pena, tratando-se o seu reconhecimento e a elevação da pena dele decorrente, de simples faculdade atribuída pela lei ao juiz. É o que se conclui da redação do artigo, ao afirmar que as circunstâncias elencadas em seus incisos podem (e não devem) implicar aumento de pena dentro dos limites previstos. (DECOMAIN, 1994, p. 147).. O inciso I considera o gravame quando o crime ocasionar grave dano à coletividade. Para sua correta interpretação devemos fixar uma linha divisória entre o dano. Revista de Direito • Vol. XI, Nº. 14, Ano 2008 • p. 31-47.

(15) José Mário Queiroz Regina. genérico ao bem jurídico esculpido no tipo penal e o outro dano que escapa do conteúdo elementar do tipo, merecendo tratamento especial. O critério diferenciador, contudo, há de colher a essência das causas de aumento e diminuição. O fato de o legislador haver-lhe atribuído quantificação punitiva variável de modo a alterar os extremos mínimos e máximos da pena não resume um arbítrio ou capricho, mas consulta as finalidades da sanção penal. (AZEVEDO, 1998, p. 97).. Portanto, quis o legislador aplicar o gravame quando o bem jurídico tutelado pela norma for atingido de forma mais violenta do que o elementar, qual seja, a redução ou supressão de tributos e contribuições sociais e seus acessórios que devem ser anormalmente gravosos à sociedade. Para muitos autores o dano ao erário público deve ser de tal monta a impedir o Estado Social de promover e garantir a assistência e a solidariedade social, o que nos parece demasiado petulante e de difícil mensuração ao julgador no momento da aplicação da pena. Se por outro lado, conforme postulado na Introdução deste trabalho, entendemos que o bem jurídico protegido pelos crimes contra a ordem tributária incide sobre o dever de lealdade do cidadão para com o Estado em relação à obrigação tributária e a instrumentalização desse Estado na consecução do ideal constitucional de Estado Social, o valor do montante sonegado não fere mais ou menos o bem jurídico protegido, nesse sentido, também iníqua a sua aplicação. Certamente se analisado frente aos demais crimes previstos no mesmo diploma legal, qual seja, crimes contra a ordem econômica ou contra as relações de consumo, sua existência e aplicabilidade farão mais sentido. Não melhor é a situação do inciso II quando postula a aplicação do gravame “se o crime for cometido por servidor público no exercício de suas funções”, já que a lei prevê especialmente, no seu artigo 3º, os crimes contra a ordem tributária praticados por funcionários públicos. Ora, a eles o legislador já aplicou pena substancialmente maior do que ao particular, claro, se o bem jurídico é o dever de lealdade do cidadão para com o Estado, que dirá o dever de lealdade do funcionário público? Já foi dito neste trabalho que se a circunstância já está contida no tipo como elemento normativo, considerada, portanto, como circunstância judicial, não pode, em duplicidade ser objeto de agravação, ou circunstância legal, sob pena de se constituir um bis in idem. Também não assiste melhor sorte ao inciso III já que prescreve a agravação da pena se o crime envolver comércio ou prestação de serviço de bem essencial à vida. E-. Revista de Direito • Vol. XI, Nº. 14, Ano 2008 • p. 31-47. 45.

(16) 46. Aplicabilidade das circunstâncias agravantes legais gerais e especiais nos crimes contra a ordem tributária. videntemente que o dispositivo não se enquadra nos tipos penais previstos nos artigos 1º e 2º, uma vez que não guardam nenhuma relação com bens essenciais à vida. Certamente o legislador mirou os crimes contra as relações de consumo. Assim, as circunstâncias legais especiais previstas no artigo 12º, da Lei nº. 8.137/90 não se aplicam aos crimes contra a ordem tributária praticados por particulares previstos nos artigos 1º e 2º do mesmo diploma legal.. 5.. CONCLUSÃO O presente estudo analisa a aplicabilidade das circunstâncias agravantes aos crimes contra a ordem tributária praticados por particulares que passaram a vigorar no nosso ordenamento jurídico a partir do advento da Lei nº. 8.137, de 27 de dezembro de 1990, que revogou a anterior Lei nº. 4.729, de 14 de julho de 1965, primeira a erigir a evasão fiscal como crime autônomo, nela denominado crime de sonegação fiscal. Por tratar-se de normas penais em branco, seu conteúdo deve perpassar pelo Direito Tributário que irá definir os diversos conceitos normativos utilizados pelo legislador nas descrições tipológicas, assim, chegando-se a correta definição dos tipos penais ali previstos. Além da descrição dos tipos penais em comento, foi necessária a análise da sistematização da aplicação trifásica da pena no direito penal brasileiro, especialmente nas considerações pelo julgador das circunstâncias agravantes judiciais, previstas nos elementos do tipo (primeira fase), legais gerais, previstas na parte geral do ordenamento penal (segunda fase) e legais especiais, previstas no ordenamento próprio (terceira fase). Assim, pôde-se aferir quais agravantes nas três fases da aplicação da pena atingem o agente-contribuinte. As circunstâncias agravantes judiciais elementares do tipo previsto nos artigos 1º e 2º estão ligados aos elementos objetivos do resultado finalístico perpetrado por meio das condutas descritas nos diversos incisos e aos elementos subjetivos da análise da culpabilidade do agente, ambos a apresentar lesão direta ao bem jurídico tutelado pela norma que é o dever de lealdade do cidadão para com o Estado em relação à obrigação tributária e a instrumentalização desse Estado na consecução do ideal constitucional de Estado Social.. Revista de Direito • Vol. XI, Nº. 14, Ano 2008 • p. 31-47.

(17) José Mário Queiroz Regina. As circunstâncias agravantes legais gerais estão previstas na Parte Geral do Código Penal que foram recepcionados plenamente pela nova lei e estão previstos em rol taxativo nos artigos 61º e 62º desse diploma legal. Sua incidência aos crimes contra a ordem tributária, porém, não se aplicam in totum, excluindo-se deste rol as circunstâncias previstas no inciso II do artigo 61º, do Código Penal. As circunstâncias legais especiais, previstas nas disposições gerais da Lei nº. 8.137/90, artigo 12º, não se aplicam aos crimes previstos nos artigos 1º e 2º do mesmo diploma legal, uma vez que da sua péssima redação legislativa, afluem gravames que apenas se enquadram nos outros delitos estabelecidos na mesma lei, qual sejam, crimes contra a ordem econômica e crimes contra a relação de consumo.. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDRADE FILHO, Edmar O. Direito Penal Tributário: crimes contra a ordem tributária. São Paulo: Atlas, 1995. AZEVEDO, David T. de. Dosimetria da pena: causas de aumento e diminuição. São Paulo: Malheiros, 1998. COSTA JÚNIOR, Paulo José da; DENARI, Zelmo. Infrações tributárias e delitos fiscais. São Paulo: Saraiva, 1995. DECOMAIN, Pedro Roberto. Crimes Contra a Ordem Tributária. Florianópolis: Obra Jurídica, 1994. FRANCO, Alberto S. et al. Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990. MIRABETE, Júlio F. Manual de Direito Penal. São Paulo: Atlas, 1990. PINTO, Emerson de L. A criminalidade econômico-tributária: a (des)ordem da lei e a lei da (des)ordem, por uma (re)legitimação do Direito Penal do Estado Democrático de Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. PRADO, Luiz R. Direito Penal Econômico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004 SILVA, Juary C. Elementos de Direito Penal Tributário. São Paulo: Saraiva, 1998.. Revista de Direito • Vol. XI, Nº. 14, Ano 2008 • p. 31-47. 47.

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