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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS CAMPUS ARAPIRACA ENFERMAGEM - BACHARELADO DANÚBIA DOS REIS AMORIM

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS CAMPUS ARAPIRACA

ENFERMAGEM - BACHARELADO

DANÚBIA DOS REIS AMORIM

A PERCEPÇÃO DAS MULHERES EM SITUAÇÃO DE RUA SOBRE A VIVÊNCIA DA GESTAÇÃO

ARAPIRACA 2019

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A percepção das mulheres em situação de rua sobre a vivência da gestação

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Alagoas Campus Arapiraca, para obtenção do título de Bacharel em Enfermagem.

Orientadora: Prof. Ma. Nirliane Ribeiro Barbosa

Arapiraca 2019

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A PERCEPÇÃO DAS MULHERES EM SITUAÇÃO DE RUA SOBRE A VIVÊNCIA DA GESTAÇÃO

THE PERCEPTION OF WOMEN IN STREET SITUATION ON THE LIVING OF GESTURE

1Danúbia dos Reis Amorim 2Nirliane Ribeiro Barbosa

RESUMO: O presente estudo analisou a percepção das mulheres em situação de rua sobre a vivência da gestação. Trata-se de uma pesquisa qualitativa descritiva. A coleta de dados ocorreu através de entrevistas semiestruturadas e os resultados foram categorizados segundo Bardin, sendo estes: Categoria A: Reação à gravidez em situação de rua: aceitação ou desejo?; Categoria B: Gestação em situação de rua: possibilidade para mudança dos hábitos; Categoria C: Relação mãe-filho(a): Convivência rompida X Continuidade do vínculo. Na Categoria A, algumas mulheres relatam que a gravidez foi de difícil aceitação e, quando desejada, o anseio partia do pai da criança; já outras demostram felicidade com a descoberta. Na Categoria B, se que a gravidez transformou a vida das entrevistadas. Já na Categoria C, verificou-se o deverificou-sejo de acompanhar o crescimento do filho. Portanto, apesar do impacto gerado pela descoberta da gestação, os sentimentos negativos foram substituídos por felicidade e manutenção do vínculo.

Palavras-chave: Mulheres. Pessoas em situação de Rua. Gravidez.

ABSTRACT: The present study analyzed the perception of the women in the street situation about the gestation experience. This is a descriptive qualitative research. Data were collected through semi-structured interviews and the results were categorized according to Bardin: Category A: Reaction to pregnancy in a street situation: acceptance or desire? Category B: Gestation in street situation: possibility to change habits; Category C: Mother-child relationship: Broken relationship X Continuity of bonding. In Category A, some women report that pregnancy was difficult to accept, and when desired, the yearning arose from the child's father; others already show happiness with the discovery. In Category B, it was verified that the pregnancy transformed the lives of the interviewees. Already in Category C, there was the desire to follow the growth of the child. Therefore, despite the impact generated by the discovery of gestation, negative feelings were replaced by happiness and maintenance of the bond.

Keywords: Women. People in the street situation. Pregnancy.

INTRODUÇÃO

Para fins desse estudo, a definição para a população em situação de rua segue o conceito estabelecido pelo Decreto Presidencial nº 7.053, de 23 de dezembro de 2009 que a classifica como grupo populacional em condição de pobreza extrema, com interrupção ou fragilidade dos vínculos familiares e ausência de moradia convencional regular(1).

1 Autora. Acadêmica de Enfermagem pela Universidade Federal de Alagoas/Campus Arapiraca;

danubiia.amorim@gmail.com

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O Manual Sobre O Cuidado À Saúde Junto A População Em Situação De Rua traz um censo realizado pelo Governo Federal em 2007 que sugere que entre os principais motivos pelos quais essas pessoas passaram a utilizar as ruas como espaço de convivência e moradia referiam-se aos problemas de alcoolismo e/ou drogas (35,5%); dereferiam-semprego (29,8%); e desavenças com familiares (29,1%); e, dos entrevistados no censo, 71,3% citaram pelo menos um desses três motivos, que a pesquisa destaca que podem estar correlacionados entre si ou um ser consequência do outro(2).

Além disso, a existência de pessoas nessa condição também é consequência do sistema capitalista adotado pela sociedade brasileira que necessita da desigualdade entre as classes sociais para continuar seu funcionamento. Nesse contexto, o sistema capitalista produziu novas formas de subsistência para as camadas mais pobres da população, mas não foi capaz de proporcionar espaço para todas as pessoas(3:65). Dessa forma, as ruas, antes espaço de expressão de loucura, rebeldia, ou de renúncia filosófica ou religiosa, passam a atingir em maior escala aqueles que gozam de saúde mental, mas que não conseguiram inserir-se nos espaços de produção capitalista(3:65).

Ademais, a deficiência de políticas públicas que busquem mudar a qualidade de vida dessas pessoas acaba por naturalizar o fenômeno. “[...] As visões estigmatizantes da sociedade civil e também do Estado, sobre a população em situação de rua costumam restringir-se às pulsões assistencialistas, paternalistas, autoritárias e de higienização social”(4:4), não sendo satisfatória na reinserção dessa parcela populacional no mercado de trabalho, nas famílias e na oferta de condições dignas de vida.

Essa deficiência de políticas ofertadas pelo Estado para mudar a realidade social brasileira pode ser observada com a criação tardia dos serviços de Consultório de Rua e dos Centros Especializados Para A População Em Situação de Rua, que só ocorreu no início de 2010, visando contribuir para a redução das violações dos direitos socioassistenciais, a construção de novos projetos de vida e a garantia de proteção social às famílias e indivíduos(5). Somado a isso, ao analisar esse público, é notório a precariedade de estudos e dados referentes ao mesmo, tornando-o desconhecido perante a sociedade. Essa população não está inclusa no censo demográfico do IBGE e os dados obtidos são frutos de uma única pesquisa nacional realizada no ano de 2008 pelo Ministério do Desenvolvimento Social, no entanto, foi realizado somente com 71 municípios brasileiros e ateve-se exclusivamente aos adultos. Os dados apontam que a maior parcela dos indivíduos nessas condições é pertencente ao gênero masculino, representando cerca de 82% e encontra-se na faixa etária entre 25 e 44 anos(5).

O maior número de homens nas ruas pode ser compreendido pelo fato de que a população feminina encontra mais oportunidades de moradia que eles, como com a própria família e em empregos domésticos. No entanto, sendo menores quantitativamente, essas mulheres carregam um histórico comum de violência, perdas precoces e a permanência na rua atravessada por fragilidades e pela prática frequente do sexo, muitas vezes sem a utilização de métodos contraceptivos e, como consequência, há a recorrência de gestações(6).

Quando se encontra diante da gravidez, a gestante pode apresentar sentimentos diversos como dúvida, medo, insegurança, felicidade, realização e mudança de vida. A reação diante da gestação irá depender também do contexto que ela está vivendo, pois, fatores sociais, econômicos, familiares e a situação conjugal poderão influenciar na resposta da mulher(7). “[...] A grávida desprovida de um lar pode sentir-se fragilizada para enfrentar o mundo e para determinar seu futuro” (7:23), no entanto, precisa ter habilidade para perceber e aceitar ajuda para tornar-se uma boa mãe(7).

Nesse contexto, o fato de não possuírem residência fixa, um endereço de referência, possuir, em sua maioria, baixo nível de escolaridade e a ausência de documentos dificultam o acesso das mulheres em situação de rua aos serviços de saúde, colocando a mãe e o bebê em risco. Diante do quadro, o Manual sobre o Cuidado à Saúde Junto à População em Situação de

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Rua do Ministério da Saúde, elencou alguns exemplos de riscos que essas gestantes estão sujeitas, tais como: a ausência de pré-natal adequado, as infecções sexualmente transmissíveis (ISTs), uso prévio de álcool e outras drogas, relações sexuais desprotegidas, idade gestacional incerta, riscos de violências sexuais e agressões físicas, alimentação escassa, higiene inadequada, etc.(2). “[...] Existe uma forte evidência de que, em famílias de baixo nível socioeconômico, os fatores de risco são agravados, levando a concluir que o baixo nível socioeconômico está relacionado com perfil de risco mais alto para as mães e as crianças”(8:106). O reconhecimento das vulnerabilidades apresenta-se como perspectiva de renovação das práticas de cuidado para além do risco de adoecer, especialmente na promoção da saúde, contribuindo para a construção de intervenções intersetoriais dinâmicas e aplicáveis. Desse modo, há possibilidade de construir uma vivência positiva desse

processo tanto para a mãe quanto para o bebê, visto que a relação mãe-filho é estabelecida desde a gestação até o nascimento(8).

Assim, embora haja trabalhos com essa população, estudos sobre mulheres que já tiveram filhos ou que vivem o processo gestacional em situação de rua são raros. Somado a isso, dentre os outros motivos que impulsionaram a construção da presente pesquisa foi a necessidade de atividades práticas destinadas a população em situação de vulnerabilidade, durante a formação acadêmica dos cursos de enfermagem das universidades. Além disso, a ausência de consultórios de rua e de albergues que abriguem mulheres nessas condições no município de Arapiraca-AL chamam a atenção de quem busca analisar a realidade desse público.

Portanto, o objetivo desse estudo é analisar a percepção de mulheres em situação de rua sobre a vivência da gravidez, através do seguinte questionamento: qual a percepção das mulheres em situação de rua sobre a vivência da gestação?

MÉTODO

Trata-se de um estudo de abordagem qualitativa descritiva. As amostras selecionadas foram mulheres em situação de rua que já possuem filhos ou que estavam passando pelo processo gestacional no momento da pesquisa. Foram definidos os seguintes critérios de exclusão: mulheres que não aceitaram participar da pesquisa; mulheres em situação de rua que não apresentaram condições clínicas ou mentais e aquelas menores de 18 anos.

No entanto, por tratar-se da população feminina em situação de rua, seria difícil localizá-la e abordá-localizá-la nos espaços públicos, visto que não possui, em sua maioria, endereços residenciais fixos, sendo necessário um local que garantisse a privacidade para a realização das entrevistas destinadas a coleta de dados. Assim, foi escolhido o Centro Especializado Para A População Em Situação de Rua (Centro POP), localizado no município de Arapiraca-AL que atende indivíduos tanto do sexo masculino quanto feminino que fazem das ruas seu local de convivência, sendo a coleta de dados realizada após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Alagoas, com o Parecer de N° 2.826.907.

Os dados foram coletados entre os meses de setembro e novembro de 2018, através de um roteiro semiestruturado destinado às mulheres que já possuíam filhos e outro destinado àquelas que estavam gestantes no momento da pesquisa. Os roteiros estavam organizados em três blocos: o primeiro contendo informações gerais sobre as entrevistadas; o segundo abordando dados obstétricos e; o último contendo perguntas reflexivas sobre a percepção das mulheres de rua sobre a vivência da gestação, como por exemplo, os sentimentos gerados com a descoberta da gravidez, como elas imaginavam o futuro do filho, como interpretavam o papel de ser mãe e se elas engravidariam novamente da criança se pudessem voltar no tempo.

Assim, foi necessário um momento anterior à coleta de dados no qual a autora apresentou-se aos sujeitos do estudo e aos profissionais, explicando os objetivos da pesquisa

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com a finalidade de transmitir segurança e para que acreditassem na importância da mesma e sentissem confiança em compartilhar suas histórias.

Dessa forma, as entrevistas foram direcionadas pela autora da pesquisa, acadêmica de enfermagem da Universidade Federal de Alagoas que, até o momento, nunca manteve um contato tão próximo com a população em situação de rua; sendo gravadas em formato mp3 com a devida autorização, a fim de garantir a fidedignidade dos resultados e, logo após, foram transcritas no programa Microsoft Word. As entrevistas apresentaram variações nas suas durações, visto que algumas mulheres costumavam expressar-se mais e outras menos, com tempos que transcorreram entre 5 e 11 minutos.

A coleta de dados foi encerrada quando as mulheres que frequentavam o Centro POP já haviam sido entrevistadas e começaram a repetir-se. Cabe destacar que não houve necessidade de refazer nenhuma entrevista e utilizou-se de pseudônimos para manter a privacidade das participantes.

Assim, após a transcrição, as falas foram analisadas seguindo a Teoria de Análise de Conteúdo de Bardin, que constitui-se basicamente de três regras: leitura aprofundada do material coletado, categorização dos resultados de acordo com trechos das falas e interpretação das informações(9).

RESULTADOS

Do total de nove entrevistas realizadas, sete foram com mulheres que já tinham filhos, uma já havia engravidado anteriormente e estava grávida pela sexta vez e, a outra estava vivenciando sua primeira gestação no momento da pesquisa. Do total de onze mulheres abordadas, duas recusaram-se a participar do estudo.

Assim, primeiramente, através das informações gerais e dos dados obstétricos obtidos com os roteiros, foi possível fazer um recorte da realidade por meio de uma breve análise do perfil da população. Do total de entrevistadas, as idades variaram entre 23 e 43 anos, sendo a maior parte pertencentes a faixa etária entre 25 e 29 anos. Há um predomínio de mulheres com baixa escolaridade (55,5%, n=5) e que estão em situação de rua por um tempo estimado de até dois anos (55,5%, n=5). No que refere-se ao estado civil, verificou-se um predomínio de mulheres que declararam conviver em união estável com o parceiro ou consideravam-se casadas (66,66%, n=6). Ademais, a grande parcela das entrevistadas apresenta algum vício em drogas lícitas como bebidas alcóolicas e cigarros ou ilícitas (88,88%, n=8), sendo comum o uso crack e maconha.

Tratando-se de medidas preventivas de infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) e de gravidez, o número de mulheres que não fazem uso de métodos contraceptivos é bastante elevado, observando-se que a média de filhos entre as entrevistadas correspondem a cerca de 2 gestações, sendo relatado nas entrevistas situação de mulheres que passaram por pelo menos um processo de perda gestacional.

Tratando-se da percepção das mulheres em situação de rua sobre a vivência da gestação, os dados foram organizados, analisados e tratados de acordo com análise de conteúdo de Bardin, emergindo três categorias: Categoria A: Reação à gravidez em situação de rua: aceitação ou desejo?; Categoria B: Gestação em situação de rua: possibilidade para mudança de hábitos; e, Categoria C: Relação mãe-filho(a): Convivência rompida X Continuidade do vínculo. Seguem abaixo seus respectivos resultados:

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Normal, quem não gostou muito foi o pai, ‘né’? [...]E nem minha família queria [o filho]. [...] novinha mulher, como é que deseja ter filho novinha? Eu quase morro do meu menino, muita dor. (Margarida)

Fiquei triste! [...] Ele [Parceiro] ficou feliz. (Jasmim)

Feliz, ‘né’? [...]’Pra’ ele [Parceiro], ele queria ter o filho. (Capitu)

Feliz, e eu vou ficar triste, é? [...]. O desejo é mais do meu marido, nem é tanto meu. [...] Ave maria, ele [Parceiro] quase morre de tanta alegria! (Hortência - Gestante)

Fiquei alegre, ‘né’? [...] O marido reagiu meio ruim, a primeira [filha] mulher. (Violeta) Não, no começo eu não desejei não, mas depois… quando eu vi a barriga crescendo, aí deu vontade de ficar com eles [filhos], mas no começo eu não quis ter eles não, não vou mentir ‘pra’ lhe agradar. Ele [parceiro] mandou eu tomar remédio ‘pra’ abortar, porque depois eu descobri que ele era casado. (Virgínia)

Eu fiquei feliz. [...] Só de ouvir o coração dele [filho], eu fiquei tão feliz. [...] Ele [Parceiro] ‘tá’ feliz, porque nós ‘desejava’, ‘né’? Eu pensava que não podia antes [engravidar]. (Maia – Gestante)

Categoria B: Gestação em situação de rua: possibilidade para mudança dos hábitos

Mulher, eu acho sei lá...O de responsabilidade, ‘né’? [...] Mudou tudo! (Margarida)

Muitas coisas [mudaram], me tornei mais feliz. [...] A pessoa só é feliz quando é mãe. (Violeta) Porque antes eu não tinha amor a minha vida, mas agora eu não vou mentir não, porque eu tenho amor a minha vida. Meu filho é o que dá esperança de viver, não vou mentir. (Virgínia) Ela me fez me sentir especial, são meus filhos. [...] agora eu sei o que é amor de verdade, amor só de mãe mesmo. [...] ser mãe é bom, ‘né’? É coisa de Deus. (Melissa)

Ah! Desperta muitas coisas, porque me livrou assim, veio em uma hora boa, porque eu ‘tava’ virando uma viciada em cachaça e agora eu já não quero mais, até o cigarro eu estou largando mais. Eu quero mesmo é um cantinho ’pra mim’ ficar morando e ser feliz, porque viver na rua cansa, pense, a pessoa não consegue nem dormir direito, pense! [...] Depois que eu ganhar ele [filho], quero arrumar um trabalho, sair das ruas, viver em rua não é vida ‘pra’ ninguém não. (Maia - Gestante)

Categoria C: Relação mãe-filho(a): Convivência rompida X Continuidade do vínculo Assim que ele nasceu [...] Eu entreguei ele [Filho] ‘pra’ minha mãe criar, mas continuei visitando ele. (Rosa)

Às vezes eu visito [filho]. [...] Acho que eles [filhos] são revoltados comigo! (Margarida) Categoria A: Reação à gravidez em situação de rua: aceitação ou desejo?

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Vou ficar [com o filho]. Deus me livre mandar alguém criar. [...] Mexa comigo mas não mexa com meus filhos. (Hortência- Gestante)

Meus filhos eram ‘pra’ estar comigo! (Violeta)

Porque assim, a pessoa se sente mal porque não ‘tá’ perto dele [filho], porque eu não vi ele andar, eu não vi ele crescendo, porque foi muita coisa pra mim conseguir meu filho. Logo quando ele nasceu, o Conselho tirou ele de mim! Quando ele era Recém-Nascido, lá vai eu de resguardo correr atrás dele, já fiquei em fundação, já fiquei em duas casas de passagem, já fui atrás de Fórum, já fui ‘pra’ juiz, já fui pra muita coisa tentando conseguir meu filho de volta e agora quando ele completou um ano foi que eu perdi ele pra minha mãe. [...] Criei meu filho até um ano, no sofrimento, na rua, dormia na casa de uma amiga as vezes, as vezes dormia na rua, mas criei meu filho até um ano. [...] após o parto o conselho tomou, eu de resguardo tive que correr atrás do meu filho, não tive resguardo, meu resguardo foi quebrado. (Virgínia) Meus filhos me amam, isso eu tenho certeza! (Melissa)

Quero sim continuar com meu filho! (Maia - Gestante)

DISCUSSÃO

A análise do perfil da população entrevistada permite inferir que a maioria se encontra em idade fértil e produtiva e, poderiam estar inseridas no mercado de trabalho e com uma qualidade melhor de vida, se houvessem políticas públicas eficazes que busquem reduzir os índices de marginalização. No entanto, o baixo nível de escolaridade, a falta de moradia e de documentos e os vícios em drogas lícitas ou ilícitas acabam por dificultar seu acesso ao mercado de trabalho. Dessa forma, o uso de substâncias psicoativas se impõe como uma estratégia de subsistência, capaz de ampliar a alienação acerca da situação de rua(10).

Em relação ao estado civil das entrevistadas, foi visto que a maioria vive em união estável com o companheiro ou declararam-se casadas. Esse resultado pode ser reflexo de que a união com uma pessoa do sexo masculino pode ser vista como sinônimo de proteção para sobreviver nas ruas, mas ao mesmo tempo acaba tornando-as submissas à realização das vontades do parceiro.

Ademais, a ausência do serviço de Consultório De Rua no município estudado e a ausência de residência fixa dificultam o acesso dessa população aos serviços de saúde e a captação pelos agentes comunitários de saúde, sendo comum que essa população só procure o auxílio do Centro POP para direcioná-los quando o problema já está instalado. Além disso, a falta de educação em saúde destinada a essa população, a falta de orientação sexual e reprodutiva, o despreparo dos profissionais em lidar com esse público e a ausência de acompanhamento pré-natal refletem na recorrência de gravidez nessas mulheres e no alto índice de perda gestacional. Somado a isso, os intervalos curtos entre uma gestação e outra trazem riscos clínicos, obstétricos e neonatais.

Assim, através dos resultados obtidos com as entrevistas, buscou-se reconstruir a experiência dessas mulheres em situação de rua sobre sua vivência da gestação. Apesar de conviverem no mesmo ambiente, possuírem realidades parecidas, cada mulher vive a experiência da gestação de forma diversa uma das outras, sendo que algumas vezes as realidades entrelaçam-se e em outras distanciam-se.

Confirmada a gravidez, a mulher, o parceiro e os familiares, podem vivenciar diferentes reações diante da novidade que dependerão muito do contexto na qual as pessoas envolvidas estão inseridas, tendo em vista que a gestação poderá ter sido planejada e desejada ou não(7). Assim, apesar das mudanças físicas e hormonais serem parecidas em todas as mulheres

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grávidas, os fatores emocionais, econômicos e sociais acabam por desencadear diferentes sentimentos diante da descoberta.

Dessa forma, na Categoria A, Reação à gravidez em situação de rua: aceitação ou desejo?, a proximidade das falas destacou as reações que afloraram com a descoberta da gestação. Foram observadas emoções distintas que emergiram com a chegada de um filho, visto que enquanto houve mulheres que relataram que a gravidez despertou sentimentos de alegria e realização, para outras, a tristeza ficou evidenciada e o desejo da gravidez reflete uma satisfação do parceiro. Ademais, pode-se perceber que algumas mulheres não obtiveram apoio da família e/ou do parceiro e cogitaram recorrer a medidas abortivas para interromper a gestação. Essa realidade deve-se ao fato de que a gravidez é um momento de transformações nas mais diversas esferas e, tratando-se de mulheres em situação de rua, a preocupação acaba por conturbar a experiência da gestação, visto que agora, além de buscar formas de sobrevivência para manter-se, terão que buscar meios de sustento para o filho. Somado a isso, as relações familiares fragilizadas e a ausência de acompanhamento psicológico fragilizam ainda mais esse processo.

Um fator importante para obter um bom desenvolvimento da gravidez é a presença familiar antes, durante e após a gestação, pois pode atuar como apoio econômico e psicológico(11). A família tem papel fundamental nesse processo pois contribui para a diminuição da ansiedade, angústia e medo diante do processo da maternidade(7). Ademais, a falta do cônjuge relaciona-se com a baixa adesão ao pré-natal para gestantes, tanto adolescentes como adultas(11).

Não obstante, é notável através das falas, que a maior parte das mulheres em situação de rua que foram entrevistadas não planejaram engravidar. Assim, a gestação não planejada, o pensamento em abortar, o fato de perceber a gravidez como de alto risco, ter tido três ou mais gestações e os eventos estressantes são fatores que podem levar a mulher a uma menor autoestima e ineficácia na adoção do papel materno(12).

Na Categoria B, Gestação em situação de rua: possibilidade para mudança dos hábitos, as falas evidenciam as transformações tanto de pensamentos como de atitudes que o desenrolar da gestação trouxe. Pode-se observar, portanto, que apesar da insegurança que a novidade da gravidez despertou, seu progresso deu espaço para os sentimentos de responsabilidade e busca pela transformação de realidade, sendo citadas frases como: “[...] me tornei mais feliz”, “[...] agora eu sei o que é amor de verdade”, “[...] é coisa de Deus”. Assim, a percepção de que um ser está desenvolvendo-se em seu ventre possibilita às gestantes vivenciarem sentimentos de poder e, nessa perspectiva, a gestação é representada como um fenômeno que vai além da função reprodutiva, comumente associada a algo divino e sublime(12). Ademais, a superproteção, o cuidado, a preocupação são coisas que vão aparecendo no transcorrer dos dias, além da euforia e do cansaço que também ficam presentes(13).

Além disso, houve relatos de que com a gravidez, os vícios foram postos de lado e criou-se o decriou-sejo de que os filhos não permaneçam incriou-seridos no mesmo contexto social que elas. Entretanto, houve aquelas que não souberam explicar o que a gestação modificou na sua vida, reafirmando que o desejo de gerar a criança era do parceiro e, por fim, algumas relataram sentimentos de medo de perder o filho, já que vivenciaram perdas gestacionais anteriormente. Em uma gestação de risco, o temor da perda pode fazer-se mais presente, visto que existe uma noção de fragilidade da vida que pode terminar a qualquer momento, com a percepção de que tanto a gestante pode gerar vida quanto abrigar a morte dentro de si(13).

Na categoria C, Relação Mãe-filho: Convivência rompida X Continuidade do vínculo, observou-se que em todas as mulheres foi despertado o sentimento de impotência com a situação na qual encontram-se, posto que a única saída para sobreviver e garantir o desenvolvimento do filho foi entregá-lo para a família, tornando assim, os vínculos afetivos fragilizados e desencadeando o sentimento de angústia por não poder acompanhar o

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crescimento da criança, apesar do desejo de continuar mantendo contato estar bastante explícito. Tal fato reflete que a base da relação mãe-bebê, após o nascimento, pode ser determinada desde a gestação(13).

No entanto, por viverem em situação de rua, o Conselho Tutelar considera mais prudente retirar essas crianças das ruas e colocarem em abrigos ou entregá-las a algum responsável que apresente uma condição financeira mais estável, visando garantir o direito à moradia e uma melhor qualidade de vida, conforme estabelece o Capítulo II, Artigo 6º da Constituição Federal Brasileira de 1988(14). Porém, as ações imediatistas de separação das mães de seus filhos, nessas condições, sem o devido acompanhamento e análise de cada caso, ferem os direitos básicos, tais como o de autonomia das mulheres e o de convivência familiar que lhes são assegurados(15). Nesse contexto, convém destacar a precariedade de estudos que envolvam a população em situação de rua, em especial aqueles que envolvam mulheres e gestantes. Ademais, cabe salientar a dificuldade em abordar as participantes do estudo, visto que não possuem endereço fixo e não são assíduas no Centro POP do município de Arapiraca-AL. Por fim, também foi possível observar a resistência inicial dessas mulheres para participarem da pesquisa, visto que, por viverem em situação de rua, sentem-se ameaçadas por pessoas desconhecidas que buscam estabelecer algum tipo de proximidade e, como mecanismo de defesa, tendem a se afastar e sentem dificuldade em expressar suas emoções e experiências, respondendo aos questionamentos de forma objetiva.

CONCLUSÃO

O estudo concluiu que, apesar dos sentimentos de incerteza gerados nas mulheres em situação de rua no momento da descoberta da gravidez, esses foram substituídos pelos de responsabilidade e alegria com o desenrolar da gestação. No entanto, percebe-se o sentimento de impotência em querer acompanhar o crescimento do filho e a ausência de condições para criá-lo, tendo que entregá-lo para que outras pessoas cuidem.

Portanto, esse estudo contribuiu para a reflexão de como mulheres em situação de rua vivenciam o processo gestacional, a forma de assistência que esse público recebe e para despertar o interesse na sociedade e do Estado para que busquem estratégias que minimizem a angústia e a ansiedade vivenciada por esse público durante a gravidez. Ademais, cabe destacar a necessidade da implantação do Consultório de Rua e criação de albergues no município de Arapiraca-AL que acolham mulheres em situação de rua para pernoitar, visto que na região, só existem abrigos destinados a população masculina. Por fim, os resultados serão devolvidos à instituição na qual a pesquisa foi realizada para que essa disponha de dados consistentes sobre o público em questão e busquem formas de fortalecer uma assistência integral a essas mulheres. REFERÊNCIAS

1BRASIL, Decreto Presidencial Nº 7.053, de 23 de Dezembro de 2009. Institui a Política Nacional para a População em Situação de Rua e seu Comitê Inter setorial de

Acompanhamento e Monitoramento, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, Seção 1. Disponível em

:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d7053.htm. Acesso em: 10 jul 2019.

2BRASIL, Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Manual sobre o cuidado à saúde junto à população em situação de rua. Brasília: Ministério da Saúde, 2012. Disponível em:

http://189.28.128.100/dab/docs/publicacoes/geral/manual_cuidado_populalcao_rua.pdf. Acesso em: 08 jun. 2019.

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3 SANTOS, V. B. D. Mulheres em vivência de rua e a integralidade do cuidado em saúde. 2014. 110 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia) - Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, Rio Grande do Sul, 2014.

4 BRASIL. Governo Federal. Política Nacional para Inclusão Social da População em Situação de Rua. Brasília: DF: Governo Federal, 2008. Disponível em:

http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/cao_civel/acoes_afirmativas/inclusaooutros/aa_div ersos/Pol.Nacional-Morad.Rua.pdf. Acesso em: 10 jun. 2019.

5 BARBOSA, J. C. G. Implementação das políticas públicas voltadas para a população em situação de rua: desafios e aprendizados. 120 f. Dissertação (Mestrado em Economia) - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Brasília, DF, 2018.

6 ALMEIDA, D. J. R. D.; QUADROS, L. C. T. A pedra que pariu: Narrativas e práticas de aproximação de gestantes em situação de rua e usuárias de crack na cidade do Rio de Janeiro. Pesquisas e Práticas Psicossociais, São João Del Rei, v. 11, n. 1, p.225-237, 2016.

7 REIS, S. E. H..A vivência de mulheres grávidas moradoras em uma instituição social de saúde. 135 f. Tese (Doutorado em Enfermagem) - Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, Universidade de São Paulo, USP, São Paulo, 2007.

8 VASCONCELOS, A. A.; ALBUQUERQUE, I. M. N.; RIBEIRO, M. A. et al. Perfil das gestantes em situação de vulnerabilidade acompanhadas pela estratégia Trevo de quatro folhas, Sobral/CE. Rev. Bras. Pesq. Saúde, Vitória, v.3, n.19, p.100-108, set. 2017. 9 BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977. Tradução de Luís Antero Reto e Augusto Pinheiro.

10 CAMPOS, L. C. M.; OLIVEIRA, J. F.; PORCINO, C. et al. Representações sociais de pessoas em situação de rua sobre morador de rua que usa drogas. Rev Baiana Enferm. v.33, p.267 -278, 2019.

11 COSTA, S. L. D.; VIDA, C. P. D. C.; GAMA, I. A. et al. Gestantes em situação de rua no município de Santos, SP: reflexões e desafios para as políticas públicas. Saúde e Sociedade, v. 24, n.3, p.1089-1102, set. 2015.

12 LEITE, M. G.; RODRIGUES, D. P.; SOUSA, A. A. S. D. et al. Sentimentos advindos da maternidade: revelações de um grupo de gestantes. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 19, n. 1, p. 115-124, mar. 2014.

13 PIO, D.A.M.; CAPEL, M. D. S. Os significados do cuidado na gestação. São Paulo:

Revista Psicologia e Saúde, v.7, n.1, p.74-81, jun. 2015.

14 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federal do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988.

15 BRASIL. Ministério da Saúde. Nota Técnica Conjunta N° 001 – SAS E SGEP. Diretrizes e Fluxograma para a atenção integral à saúde das mulheres e das adolescentes em

situação de rua e/ou usuárias de crack/outras drogas e seus filhos recém-nascidos. 2015. Disponível em: http://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2015/outubro/08/Nota-t--cnica--diretrizes-e-fluxograma-mulher-sit-rua.pdf. Acesso em: 29 jun. 2019.

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Referências

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