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Aula 07. O estresse como

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Aula 07

O estresse cOmO

dOençA dO trAbAlhO

e trAnstOrnOs de

AdAptAçãO (F43.-)

O estresse é classificado pela CID-10 na categoria F43 – reação a estresse grave e transtornos de ajustamento e tem sido apontado como um dos riscos mais sérios ao bem-estar psicossocial do indivíduo (Rossi, p. 9) e um dos principais fatores de redução da qualidade de vida no trabalho (Cruz, 2008, p. 17). Além disso, é reconhecido como causador de prejuí-zo de bilhões de dólares1 às organizações em razão do aumento dos gastos com atendimento médico e afastamento2, bem como em razão da diminuição da eficácia dos funcionários (Jex e outros, p.103; Papalia e Olds, p. 455) e tem atingido pelo menos 40 milhões de trabalhadores somente na União Européia e 70% dos trabalhadores brasileiros ssmar e Ferreira, 2008, p. 21-22).

Essa categoria tem por base duas influências causais: a) um evento de vida excepcio-nalmente estressante produzindo uma reação aguda de estresse; ou b) uma mudança de vida significativa levando a circunstâncias desagradáveis continuadas que resultam em um trans-torno de ajustamento (CID-10, 1993, p. 143). Importante registrar que o evento estressante ou contínuo desprazer de circunstâncias é fator causal primário e determinante e o transtorno não teria ocorrido sem seu impacto (idem) e se esse estresse for intenso, freqüente e prolon-gado, pode devastar a saúde mental e física do indivíduo.

1 - Pesquisas apontam que os custos estimados com danos e doenças relacionados com estresse atingiram US$200 bilhões por ano em pedi-dos de compensação, despesas médicas, seguro saúde, absenteísmo e perda de produtividade (Papalia e Olds, p. 455). Outro trabalho aponta que esses custos giram em torno de 300 bilhões de dólares por ano (Straub, p. 132).

2 - Estudos conduzidos em países da União Européia evidenciam que de 50 a 60% das ausências no trabalho se devem ao estresse (Assmar e Ferreira, 2008, p. 22).

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Por óbvio que se o fator estressante for relacionado com o ambiente social do tra-balho, estaremos diante do estresse como doença do tratra-balho, pois o Brasil adotou sistema “misto” e “aberto” de classificação de doenças do trabalho, não se limitando apenas àquelas já expressamente consignadas em lista (Decreto 3.048/99).

Para a classificação F43.0 da CID-10 está registrado um transtorno transitório de gravidade significativa, o qual se desenvolve em um indivíduo (usualmente aparecem dentro de minutos do impacto do estímulo ou evento estressante) sem qualquer outro transtorno mental aparente em resposta à excepcional estresse físico e/ou mental e usualmente diminui dentro de horas (frequentemente dentro de horas) ou dias (dois ou três dias). Nesse caso de estresse agudo, o evento estressor pode ser uma experiência traumática esmagadora, envol-vendo séria ameaça à segurança ou integridade física do paciente ou de pessoa por ele amada (por exemplo, acidente de trabalho), bem como pode ser considerada uma mudança inusual-mente súbita e ameaçadora na posição social e/ou relações do indivíduo (por exemplo, amea-ças de desemprego ou rebaixamento de função com redução salarial) (CID-10, 1993, p. 144). Nesse caso, a vulnerabilidade do indivíduo e capacidade de adaptação desempenham um papel na ocorrência e gravidade das reações agudas a estresse (CID-10, p.144). Porém, não se pode olvidar o que já foi registrado acima, no sentido de que o evento estressante é fator causal e determinante do transtorno. Portanto, se esse evento ocorre no ambiente do trabalho possui clara relação de causalidade com o transtorno depressivo, independente-mente da estrutura de personalidade do trabalhador. Isso porque estudos têm demonstrado que trabalhadores expostos a uma combinação de alta pressão com pouca autonomia ou controle, e que tenham pouco orgulho pelo trabalho, conflito com supervisores, subordinados e colegas, possuem três vezes mais chances de ter problemas de hipertensão e alteração nos músculos cardíacos que muitas vezes precedem enfartes (Papalia e Olds, p. 455).

As diretrizes diagnósticas incluem conexão temporal imediata e clara entre o impac-to do evenimpac-to estressor e o início dos sinimpac-tomas, os quais, em adição ao estado inicial de aimpac-tor- ator-doamento, mostram depressão, ansiedade, raiva, desespero, hiperatividade e retraimento (CID-10, p. 144-145). Eis aqui um dos elementos a serem considerados para definição do nexo de causalidade entre o transtorno e o trabalho, ou seja, a presença de um evento estres-sante ou experiência traumática, bem como uma mudança súbita e ameaçadora no trabalho pode ser considerado um fator etiológico no desencadeamento dessa patologia e, por-tanto, estar relacionada ao trabalho.

Segundo Hans Selye (Limonge França e Rodrigues, p. 29), o estresse é o termo utili-zado para denominar o “conjunto de reações que um organismo desenvolve ao ser submetido a uma situação que exige esforço de adaptação”, mas não é sempre negativo. Pelo contrá-rio, há o estresse positivo (eustresse) que nos motiva a sobreviver, desenvolver habilidades, buscar alternativas, reagir e mudar. E há também o estresse que, em excesso, pode ser desa-gradável, nocivo, ameaçador e que pode romper o equilíbrio biopsicossocial, prejudicando a saúde do trabalhador (distresse) (Jex, p. 105; Limonge França e Rodrigues, p. 31; Tamayo,

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p. 333; Benevides-Pereira, p. 30). Para Selye, o estresse é o conjunto de reações fisiológicas e hormonais que se produz no organismo como resposta a uma agressão ou emergência, de forma a adaptar-se às novas circunstâncias, podendo variar em três níveis, desde o estresse como mero alarme para a luta ou fuga, passando para a resistência e, por fim, para a terceira e última fase que é a exaustão, ou seja, a patologia (Benevides-Pereira, 2002, p. 29).

A primeira fase acima referida é a reação de alarme; a segunda a de resistência e a terceira a de exaustão. A reação de alarme é a preparação para luta ou fuga, na qual ocorreu um aumentode freqüência cardíaca e da pressão arterial. A atividade adrenal e as funções car-diovascular e respiratória aumentam rapidamente. Ocorre nessa fase aumento da freqüência cardíaca, da pressão arterial, da freqüência respiratória, da concentração de glóbulos verme-lhos, da concentração de açúcar no sangue, redistribuição do sangue, dilatação dos brônquios, da pupila e ansiedade (Straub, 2005; Limonge França e Rodrigues, 2007).

Na segunda fase – da resistência – que ocorre caso o agente estressor mantenha sua ação, a excitação fisiológica permanece alta, ocorrendo um decréscimo na capacidade do in-divíduo de enfrentar eventos e problemas cotidianos. As pessoas ficam irritadas, impacientes e cada vez mais vulneráveis a problemas de saúde. Nesse fase pode ocorrer ulcerações no aparelho digestivo, irritabilidade, insônia, mudanças de humor, deminuição do desejo sexual e atrofia de algumas estruturas relacionadas á produção de células do sangue (Straub, 2005; Limonge França e Rodrigues, 2007).

Por fim, na terceira fase, a de exaustão, pode ocorrer falha dos mecanismos de adap-tação, esgotamento por sobrecarga fisiológica e morte do organismo. Maior suscetibilidade às doenças, reações alérgicas, hipertensão, resfriados comuns e doenças mais sérias causas por deficiências imunológicas (Straub, 2005; Limonge França e Rodrigues, 2007).

Segundo Straub (2005), numerosos estudos reforçam a idéia básica de Hans Selye de que o estresse prolongado causa problemas para o corpo. Podem surgir problemas físicos, tais como: músculos tensos ou rígidos, dores de cabeça, erupções de pele, cansaço, vômi-tos, fragilidade, hipertensão, perda ou ganho de peso, suores, problemas estomacais, náuseas e reações alérgicas; problemas psicológicos, tais como: ansiedade, dificuldades de memória, ressentimento, raiva, fadiga, incapacidade de relaxar, depressão, raiva ou pouca concentração; podem surgir também problemas comportamentais, tais como: inquietação, problemas para dormir, mudanças em hábitos alimentares, choro, punhos cerrados, tempera-mento agressivo, fuga de tarefas, consumo de substâncias entorpecentes ou fuga de relacio-namentos (Straub, 2005, p.105).

Também segundo Jex (p. 105), o estresse pode causar conseqüências fisiológicas (risco aumentado de doenças cardiovasculares, insônia, sintomas psicossomáticos), psicoló-gicas (frustração, ansiedade, atitudes negativas em relação ao trabalho) e compor-tamentais (absenteísmo, comportamentos contraproducentes, uso de drogas e álcool), bem como pode disparar uma série de reações ao sistema nervoso, endócrino, imunológico e sis-tema límbico (Limonge França e Rodrigues, p. 33).

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É certo que essas condições não representam condições inevitáveis ao estresse e nem a presença desses sintomas indica que o estresse seja a causa. Todavia, são elementos a serem considerados na avaliação das condições de trabalho e no exame pericial para reconhecimen-to da existência ou inexistência do nexo de causalidade entre o estresse e o trabalho. De acordo com Roberto Moraes Cruz (2008, p. 17) o termo estresse no trabalho se refere ao produto de reações fisiológicas e psicológicas do indivíduo em situações de trabalho, vivenciadas pelo trabalhador como desagradável e ameaçadoras ao seu bem-estar, segurança e estima. É uma manifestação da tensão nos ambientes organizacionais. Os estres-sores do ambiente do trabalho (já referidos no tópico referente aos impactos da organização do trabalho sobre a saúde do trabalhador) se persistentes, criam um campo favorável à elaboração de doenças ocupacionais e processos de afastamento do trabalho (Cruz, 2008, p. 18).

Assmar e Ferreira (2008), também se referem ao estresse laboral como um processo e também como o conjunto de reações físicas e psíquicas provocadas pela vivência de condições adversas no ambiente organizacional. Para Magnólia Mendes (2008, p. 166), o estresse é um “fenômeno resultante de uma tensão acumulada em função do contínuo e inten-so esforço do indivíduo para adaptar-se às demandas internas ou externas que lhes são impostas pelas dimensões da organização, das condições e das relações sociais de trabalho”.

Segundo Straub (2005, p. 116/117), a palavra estresse pode ser entendida como estí-mulo (p. ex. sobrecarga de trabalho) ou como resposta a uma situação (diante da sobrecarga o trabalhador fica estressado), ou seja, é definida como um processo pelo qual alguém percebe e responde a eventos que são julgados como desafiadores ou ameaçadores. Há, portanto, que se distinguir os estímulos estressantes do próprio estresse. Aqueles são elementos que vêm interferir no equilíbrio homeostático do organismo. O estresse, por sua vez, é a resposta a este estímulo, isto é, necessidade de se aumentar o ajusta adaptativo para retornar ao estado de equilíbrio. Os agentes agressores, segundo Benevides-Pereira (2002, p. 27) podem ser: a) físicos: ruído, frio ou calor intenso e/ou persistente, acidentes, fome, dor etc; b) cognitivos: iminência ou vivência de um assalto, discussão, seleção a um emprego etc; e, c) emocionais: perda, medo, ira ou acontecimentos em que o componente afetivo se faça mais proeminente.

Quando se trata de um ambiente organizacional agressivo, sem justiça organizacio-nal, cultura da organização prejudicial à estima dos trabalhadores, baixo poder de contro-le sobre o trabalho, ambiente físico agressivo (barulho excessivo, vibrações, temperaturas baixas etc), sobrecarga de trabalho, conflito e ambigüidade de papéis, sabotagens, castigos, humilhações, e sendo essas condições permanentes no ambiente laboral, tratam-se de tensões externas que requerem do indivíduo um esforço contínuo para adaptação, razão pela qual poderá estar sujeito às conseqüências desse processo que pode ser o adoecimento físico e mental. O intenso e contínuo esforço para adaptar-se às persistentes condições agressivas da organização do trabalho é que poderá conduzir (processo) o trabalhador à incapacitação la-borativa, decorrente da depressão grave, configurando-se a doença do trabalho. Conforme se

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disse no início desse trabalho, “o ser humano é capaz de adaptar-se ao meio ambiente desfavorável, mas esta adaptação não acontece impunemente” (Lennart Levy, citado por Li-menge França e Rodrigues, 2007, p. 41). O esforço para essa adaptação, com vistas a suportar o ambiente estressante da organização do trabalho, pode conduzir o trabalhador a um estado de estresse que poderá afetar sua saúde e seu bem estar físico, mental ou social, afetando, inclusive, sua relação familiar.

Assmar e Ferreira (2008), apontam um minucioso estudo sobre as fontes de estresse ocupacional. Segundo esses autores, o ambiente físico pode ter as se-guintes características estressoras: barulho excessivo, ambiente pouco ou excessivamente iluminado, locais sujeitos a vibrações, temperaturas muito altas ou baixas, trabalho que ofe-recem riscos à própria segurança do trabalhador. Como sobrecarga do trabalho, apontaram: excesso ou falta de trabalho, tempo inadequado para completar o trabalho, turnos longos de trabalho, poucos períodos de descanso e trabalho pesado. No controle sobre o trabalho, apontaram: ausência de autoridade para tomar decisões sobre suas próprias tarefas. Os con-flitos de papéis também são fatores estressores, ou seja, obrigação de seguir ordens, obriga-ção de desempenhar ao mesmo tempo várias funções. Ambigüidade de papéis é a ausência de uma descrição clara do trabalho a ser realizado, falta de clareza sobre o alcance de suas responsabilidades, e sobre os objetivos da função. Apontaram ainda como fontes de estresse a falta de oportunidades de expor seus problemas, falta de apoio dos colegas, superiores e subordinados, falta de tempo para dedicação à família por causa do trabalho, falta de segu-rança no emprego, pouca estabilidade e falta de oportunidades. Sobre as características da organização, indicaram como estressores a não participação na tomada de decisões, regras e procedimentos muito formalizados, falta de reconhecimento e valorização no emprego, ausência de recompensas, uso do poder para satisfação de interesses pessoais, sabotagem dos colegas em benefício próprio (Ferreira e Assmar, 2008, p. 25, 34 e 49).

Segundo Tamayo (2008, p. 367) numerosas pesquisas mostram que uma das fontes mais freqüente e poderosa de estresse ocupacional é a falta de autonomia do trabalhador no exercício de suas funções. Também apontou esse mesmo autor que os valores organiza-cionais influenciam no estresse dos trabalhadores. Organizações que adotam valores como autonomia, preocupação com a coletividade e realização, tiveram trabalhadores com menor nível de estresse. Pelo contrário, as organizações que enfatizam a conformidade como valor possuem trabalhadores com maior nível de estresse.

Para Straub (2005, p. 133 e seguintes), são fatores estressantes relacionados com o trabalho, a sobrecarga de trabalho, a sobrecarga de papéis, o esgotamento, a falta de controle sobre o trabalho, ambigüidade de papéis (ocorre quando os trabalhadores não tem certeza sobre o seu trabalho ou dos padrões utilizados para avaliar seu desempenho), turno de reve-zamento, perda do emprego e assédio sexual.

Um exemplo de como a organização pode afetar a saúde do trabalhador, dentre ou-tros, foi citado por Ferreira e Assmar (2008) ao indicaram o caso de Joaquim, que “é um

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vendedor de uma cadeia de lojas de departamento que adotou recentemente a prática de relatórios trimestrais de produtividade como parte de sua política de promoções, o que tem levado seus antigos colegas a fazer de tudo para “passar por cima dos outros” e, assim, obter melhores índices de produtividade, de modo a garantir suas promoções. Os empregados que, como Joaquim, não conseguem conviver com esse nível de competição, já começam a sentir os primeiros sintomas de estresse, tais como dores de cabeça, insônia, falta de vontade de ir para o trabalho, etc”. Nesse caso, resta claro que fatores da organização do trabalho influen-ciam a saúde mental e física do trabalhador.

É verdade que, segundo Abrahão e Cruz (2008, p. 110), é raro encontrar uma relação unívoca entre causas e efeitos e que o estresse também se refere à percepção que o indivíduo tem de um estressor e, dependendo da resposta do indivíduo, um mesmo estímulo estressor poderá ser visto como um distress (processo adaptativo inadequado) ou como um eustress (indivíduo reage bem ao estímulo estressante) (Limonge França e Rodrigues, p. 32). Nessa hipótese, o ambiente de trabalho e sua organização não teria nenhuma responsabilidade sobre a patologia daí surgida, pois o que vale é a interpretação que cada um tem dos eventos da vida, ainda que estressantes. Entretanto, não é menos certo que alguns estímulos estressantes, relacionados ao trabalho, são vistos como agressivos por um número elevado de pessoas e a ciência tem reconhecido como causadores de desequilíbrios psicológicos, comportamentais e físicos. É o caso do exemplo de Joaquim acima citado e também das organizações do traba-lho em que ocorram, por exemplo, sobrecarga do trabatraba-lho, jornadas exaustivas, ameaças de desemprego, enfim, circunstâncias relativas às condições de trabalho já referidas nos tópicos precedentes. Ora, no exemplo citado de Joaquim e nos ambiente de trabalho em que estejam presentes esses estímulos estressores, não se pode deixar de responsabilizar o ambiente de trabalho e suas condições como responsáveis pelos transtornos daí decorrentes, pois, como se viu acima, o evento estressante ou contínuo desprazer é fator causal primário e determinante e o transtorno não teria ocorrido sem seu impacto.

Além disso, como se viu no tópico referente à proteção à saúde dos trabalhadores, cabe ao empregador adaptar o trabalho às condições psico-físicas de seus trabalhadores e adotar medidas individuais e coletivas de proteção à saúde e segurança do trabalhador. Por-tanto, ainda que alguns trabalhadores submetidos às mesmas condições laborais não adoe-çam, nada impede que, por força legislativa, se reconheça como doença do trabalho aquelas doenças mentais adquiridas pelos trabalhadores no ambiente laboral, pois o mesmo ocorre com as doenças do sistema músculo-esqueléticos. Nem todos trabalhadores submetidos a trabalho monótono, repetitivo, sem pausas para descanso, sem revezamento de funções, ad-quirem essas doenças músculo-esqueléticas, mas aqueles que sofrem desses transtornos têm reconhecida a relação de causalidade e a responsabilidade civil do empregador pelos danos daí decorrentes, se for o caso.

Em conclusão, portanto, se pode afirmar que uma vez presentes certas condições (ou circunstâncias, como diz a CID-10 e Decreto 3.048/99) especiais relativas ao trabalho,

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ou seja, se constatadas a presença dos fatores etiológicos relacionados ao estresse acima relatados, essas condições ou esses fatores podem ser elementos etiológicos para o desen-cadeamento da depressão nos trabalhadores, com reconhecimento do nexo de causalidade entre o trabalho e o transtorno mental, independentemente dessas condições não estarem expressamente previstas nos Anexos ao Decreto 3.048/90 e ainda que não estejam relacio-nadas a substâncias físicas normalmente vinculadas a esse transtorno, pois, como já se disse mais de uma vez, o Brasil adotou o sistema “misto”, de cláusulas abertas, que não impede a inclusão, como doença do trabalho, de outras doenças não relacionadas no anexo I do Decreto 3.048/99.

Isso porque a Lista B, do Anexo I, do Decreto 3.048, de 06.5.1999, no Grupo V, da CID-10, relacionado aos transtornos mentais e do comportamento relacionados com o trabalho, aponta como doença do trabalho as reações ao stress grave e transtornos de adapta-ção (F43.-), apontando como agentes etiológicos ou fatores de risco de natureza ocupacional “outras dificuldades físicas e mentais relacionadas com o trabalho: reações após acidente do trabalho grave ou catastrófico, ou após assalto no trabalho (Z56.63), bem como circunstância relativa às condições de trabalho (Y96)”. O item da CID-10 Z56 refere-se aos problemas relacionados a emprego e desemprego e o item Y96, da CID-10 refere-se a circunstâncias relativas às condições de trabalho4.

Veja-se que a própria norma já aponta aspectos acima relacionados que também são tidos como agentes etiológicos ou fatores de risco de natureza ocupacional, razão pela qual também com base na norma regulamentar se pode reconhecer a existência de nexo de causa-lidade entre esses fatores e o trabalho, pois nada mais são do que circunstâncias relativas às condições de trabalho prejudiciais à saúde física e mental do trabalhador.

Estresse pós-traumático (F43.1)

No tocante ao estresse pós-traumático, o Anexo II – Lista B, do Decreto 3.048/99, elenca como doença relacionada ao trabalho o estado de stress pós-traumático (F43.1), apon-tando como agentes etiológicos ou fatores de risco de natureza ocupacional “outras dificul-dades físicas e mentais relacionadas com o trabalho: reação após acidente do trabalho grave ou catastrófico, ou após assalto no trabalho (Z56.6)5” e “circunstância relativa ás condições de trabalho (Y96)”.

3 - Para a classificação Z56 a CID-10 refere-se a problemas relacionados com o emprego e com o desemprego, apontando como subitens os seguintes: Z56.0 desemprego não especificado; Z56.1 mudança de emprego; Z56.2 ameaça de perda de emprego; Z56.3 ritmo de trabalho penoso; Z56.4 desacordo com patrão e colegas de trabalho; Z56.5 má adaptação ao trabalho – condições difíceis de trabalho; Z56.6 outras dificuldades físicas e mentais relacionadas ao trabalho; Z56.7 outros problemas e os não especificados relacionados com o emprego. 4 - Obtido em http://www.datasus.gov.br/cid10/v2008/webhelp/cid10.htm. Acesso em 10.08.2009.

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O evento pós-traumático surge como resposta tardia e/ou protraída a um evento ou situação estressante (de curta ou longa duração) de uma natureza excepcionalmente ameaça-dora ou catastrófica, a qual provavelmente causa angústia invasiva em quase todas as pessoas (p. ex. desastre natural ou feito pelo homem, combate, acidente sério, testemunhar a morte violenta de outros ou ser vítima de tortura, terrorismo, estupro ou outro crime). Fatores pre-disponentes, tais como traços de personalidade ou história prévia de doença neurótica, podem baixar o limiar para o desenvolvimento da síndrome ou agravar seu curso, mas não são neces-sários nem suficientes para explicar sua ocorrência (CID-10, p. 145).

Registra-se desde já que, segundo a ciência médica, já indicada pela Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento da CID-10 e, portanto, já adotada pela nossa legislação (Decreto 3.048/99 que cita essa classificação) os fatores predisponentes (tal como traço de personalidade, trauma na infância, mudanças de vida recente, consumo recente e ex-cessivo de álcool) não são necessários nem suficientes para explicar a ocorrência do estresse pós-traumático, mas apenas podem exercer influência no seu desenvolvimento (Kaplan, p. 575). Pelo contrário, Seligmann-Silva (p. 1165), afirma que Dejours considera que esta sín-drome seria o único quadro psicopatológico especificamente originado pelo trabalho, isto é, o único que apenas pode ser causado pelo trabalho.

Portanto, é despropositada a afirmação feita em Acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região que reformou sentença de primeira instância, sob fundamento de que não se tem explicação para a síndrome pós-traumática, pois “o empregado poderia ter senvolvido o transtorno de estresse pós-traumático em decorrência de fatores alheios ao de-sempenho do seu trabalho na empresa. Cumpre não olvidar que nem sempre é possível haver clareza sobre quais acontecimentos da vida levaram a pessoa a ficar deprimida. Tanto é assim que comumente ouvimos comentários do tipo tal pessoa tem tudo que alguém desejaria ter: família, filhos, um bom trabalho, realização profissional e mesmo assim desenvolve um qua-dro depressivo, sem qualquer motivo aparente” (ver autos de nº 01166.2006.022.24.00-3, em trâmite perante o E.TRT da 24ª Região6). No caso em questão, o transtorno pós-traumático não requer fatores predisponentes para seu desenvolvimento, pois o evento é fator primário e determinante para o transtorno e não teria acontecido sem sua ocorrência. Veja-se que na hipótese desses autos o trabalhador comprovou ter trabalhado em sobrecarga de trabalho, es-tresse e traumas presenciados durante o vínculo empregatício. Além disso, ficou comprovado que o trabalhador presenciou seu colega de trabalho há muitos anos, a quem considerava seu “irmão”, preso grudado na rede de alta tensão por duas horas, sem poder socorrê-lo. Se não bastasse outros trabalhadores também sofreram acidentes com a rede de energia de alta tensão, tendo sofrido seqüelas físicas e psicológicas. Em perícia médica foi concluído que o autor era portador de transtorno de estresse pós-traumático (F 43.1) e comorbidades rela-cionadas a transtorno de ansiedade generalizada (F41.1), transtorno depressivo recorrente (F 33.2) e transtorno de abuso de substâncias (F 10 + F17).

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Síndrome de Burnout, ou síndrome do esgotamento profissional (Z73.0)

O Anexo II, do Decreto 3.048/99, no Grupo V, da CID-10 – Transtornos Mentais e do Comportamento Relacionados com o Trabalho, elenca como doença mental, no item XII, a Sensação de Estar Acabado, ou “síndrome de Burn-Out”, Síndrome do Esgotamento Profis-sional. Nesse item, o legislador regulamentar apontou como agentes etiológicos ou fatores de risco de natureza ocupacional o ritmo de trabalho penoso (Z56.3) e outras dificuldades físicas e mentais relacionadas com o trabalho (Z56.6). Na classificação dos Transtornos Mentais e do Comportamento (CID-10) o item Z73 refere-se a “problemas relacionados a dificuldades de gerenciamento da própria vida”, tendo como subitens: Z73.0 Sensação de estar “acabado”; Z73.1

Acentuação de traços de personalidade, inclui padrão de comportamento tipo A; Z73.2 Falta de descanso ou lazer; Z73.3 Estresse, não classificado em outros locais; Z73.4 Habilidades sociais inadequadas, não classificadas em outros locais; e, Z73.5 Conflito de papel social, não classificado em outros locais.

Para a classificação Z56 (indicada como agente etiológico ou fator de risco de natu-reza ocupacional para a síndrome de burnout), a CID-10 refere-se a problemas relacionados com o emprego e com o desemprego, apontando como subitens os seguintes: Z56.0 desem-prego não especificado; Z56.1 mudança de emdesem-prego; Z56.2 ameaça de perda de emdesem-prego; Z56.3 ritmo de trabalho penoso; Z56.4 desacordo com patrão e colegas de trabalho; Z56.5 má adaptação ao trabalho – condições difíceis de trabalho; Z56.6 outras dificuldades físicas e mentais relacionadas ao trabalho; Z56.7 outros problemas e os não especificados relacio-nados com o emprego.

Portanto, para caracterização da síndrome de Burn-out, ou simplesmente Burnout (Benevides-Pereira, p. 21), como doença do trabalho, é necessário verificar se estão presentes ritmo de trabalho penoso e outras dificuldades físicas e mentais relacionadas ao trabalho.

Para se elucidar sobre o termo é necessário constar que se trata de um termo de origem inglesa que se refere àquilo, ou aquele, que se deixou de funcionar por absoluta falta de energia e não tem mais condições de desempenho físico ou mental (Benevides-Pereira, p. 21). Significa queimar-se ou destruir-se pelo fogo, pois pretende transmitir a ideia de que as pessoas acometidas por esse transtorno podem sentir-se consumidas ou queimadas pelo seu trabalho (M.R. Tamayo, 2002, p. 76). Segundo Maslach (2005, p. 41), o burnout é uma sín-drome psicológica que envolve uma reação prolongada aos estressores interpessoais crônicos e possuem três dimensões: exaustão avassaladora, sensação de ceticismo e desligamento do trabalho e sensação de ineficácia e falta de realização.

Os exemplos relacionados à síndrome de burnout sempre relacionam a fadiga extre-ma, perda do idealismo e da paixão pelo próprio trabalho, estado de indiferença, cinismo, de-silusão, exaustão, humor depressivo, dureza e distanciamento, especialmente com pacientes

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(M.R. Tamayo, p. 77).

Segundo Ana Maria T. Benevides-Pereira (2002), a adoção desse vocábulo foi utili-zado por Schaufeli brandley em 1969 ao propor nova estrutura organizacional a fim de conter o fenômeno psicológico que acomete trabalhadores assistenciais, tendo se referido a staff Burnout. Portanto, ao contrário do que sustentado por alguns doutrinadores, não foi Herbert J. Freundenberger o primeiro a utilizar esse termo, porém, não se deixa de se creditar a este a propagação e o interesse que se seguiu no meio científico a partir de seus escritos em 1970 (Benevides-Pereira, p. 21). Esse pesquisador observou que, após o primeiro ano de ser-viço, o comportamento de um grupo de voluntários se caracterizava pela diminuição gradual da energia e pela perda de motivação e do comprometimento, além de sintomas psíquicos e físicos: sensação de exaustão e fadiga, raiva, irritação, frustração, tremor, falta de ar, dores de cabeça, distúrbios gastrointestinais etc (Benevides-Pereira, 2002, p. 77).

Essa síndrome inicialmente foi atribuída aos profissionais de serviços humanos (en-fermeiros, médicos, psiquiatras, assistentes sociais, advogados, psicólogos, professores, pro-fissões religiosas), por isso, foi também chamado de Síndrome do Assistente Desassistido ou Síndrome do Cuidador Desassistido (Benevides-Pereira, 2002, p. 33; Magnólia Mendes e Cruz,2004, p. 46; Maslach, 2005, p. 42; Seligmann-Silva, 2005, p. 1163). A maior parte dos estudos diz respeito a pessoas que, ao longo de anos de profissão, persistiram em tentar a solução de problemas humanos (dor, sofrimento em geral, miséria, injustiça), atuando com grande empenho, de forma geralmente intensiva e auto-exigente, sacrificando a vida pessoal (Seligmann-Silva,2005, p. 1163).

A sintomatologia do burnout subdivide-se em físicos, comportamentais, psíquicos e defensivos. Os sintomas físicos são: fadiga constante e progressiva, distúrbios do sono, dores musculares e osteomusculares, cefaléias, enxaquecas, perturbações gastrointestinais, imuno-deficiência, transtornos cardiovasculares, distúrbios do sistema respiratório, disfunções-sexuais e alterações menstruais nas mulheres. Os sintomas psíquicos podem apresentar: falta de atenção e concentração, alterações da memória, lentificação do pensamento, sentimento de alienação, sentimento de solidão, impaciência, sentimento de insuficiência, baixa auto--estima, labilidade emocional, desânimo, depressão, desconfiança, paranóia. Os sintomas comportamentais podem ser: negligência ou excesso de escrúpulo, irritabilidade, incremento da agressividade, incapacidade para relaxar, dificuldade de aceitação de mudanças, perda de iniciativa, aumento do consumo de substâncias, comportamento de alto risco e suicídio. Os sintomas defensivos são: tendência ao isolamento, sentimento de impotência, perda do inte-resse pelo trabalho (ou até pelo lazer), absenteísmo, ironia e cinismo (Benevides-Pereira, p. 44).

Para Seligmann-Silva (2005, p. 1163), o trabalhador com síndrome de burnout sente como se tivesse sido atingido um estado de saturação emocional na qual não é mais possível suportar o encontro com a necessidade de outra pessoa, pois agora é o próprio profissional quem está num estado que, muitas vezes, é de desespero.

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As variáveis responsáveis pelo burnout abrangem características pessoais, caracte-rísticas do trabalho, organizacionais e sociais. Para se diagnosticar essa síndrome, por-tanto, é necessário que o perito judicial observe as características pessoais do trabalhador, ou seja, sua idade, sexo, nível educacional, existência de filhos, personalidade, motivação e ide-alismo, por exemplo. Também é necessário observar as características do trabalho em relação ao tipo de ocupação, profissão, tempo na instituição, sobrecarga de trabalho, turnos, conflito e ambigüidade de papéis, controle, pressão, possibilidade de progresso etc. Os aspectos orga-nizacionais também são imprescindíveis, como já se disse, e são: o ambiente físico, mudanças organizacionais, normas, clima, burocracia, autonomia, recompensas e segurança. Por fim, também devem ser consideradas as características sociais, ou seja, a exis-tência ou não de suporte social e familiar, a cultura e o prestígio (Benevides-Pereira, p. 69).

Embora o surgimento do burnout deva-se, em grande parte, à natureza do trabalho e não às características individuais do funcionário (Maslach, 2005, p. 20007), pode-se afir-mar, contudo, que há variáveis pessoais e situacionais que determinam o burnout. Segundo Maslach (2005), há seis domínios principais relativos aos fatores de risco organizacionais, quais sejam: carga de trabalho, controle, recompensa, comunidade, justiça e valores. Esses aspectos também já foram abordados no tópico supra, referente às influências da organização do trabalho na saúde dos trabalhadores. Basta acrescentar que há um desequilíbrio ou in-compatibilidade clara entre as exigências do trabalho e a capacidade do indivíduo de atender essas exigências. Isso ocorre pelas conseqüências do mundo contemporâneo, que em razão das novas tecnologias, capitalismo selvagem e globalização, cada vez mais são majoradas as exigências sobre o desempenho e produtividade dos trabalhadores. A falta de controle indica que os trabalhadores não possuem arbítrio pessoal e autonomia em seu trabalho, mas não responsabilizados por algo sobre o que não têm controle. Recompensas insuficientes ocorrem quando os trabalhadores não recebem reconhecimento e apreciação pelo que estão fazendo, ou seja, eles não têm nenhum retorno sobre seus esforços. A ruptura na comunidade ocorre justamente quando os trabalhadores mais precisam, pois somente são reconhecidos quan-do produzem. Ao contrário, quanquan-do aquan-doecem são ignoraquan-dos e não recebem apoio social. A percepção de que não há justiça e igualdade no local de trabalho também é um fator de risco organizacional para o burnout. Sentimentos de injustiça e tratamento desigual podem gerar emoções intensas e ter uma grande importância psicológica (Maslach, 2005; Assmar e Ferrei-ra, p. 281). Por fim, Maslach (2005), também aponta como fator de risco organizacional para o burnout os conflitos de valor, que ocorrem quando as pessoas trabalham em uma situação na qual há um conflito entre os valores pessoais e da organização. Por exemplo, pessoas cujos valores pessoas dizem que é errado mentir podem se encontrar em um emprego onde mentir torne-se necessário para o sucesso. Os conflitos psicológicos daí decorrentes, permitirá facilmente a instalação da síndrome de burnout (Maslach, 2005, p. 50).

Para avaliação dos danos decorrentes da síndrome de burnout também se devem considerar as conseqüências daí advindas, que podem ser prejuízos não só no trabalho, mas

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também sociais e organizacionais. Podem ocorrer isolamentos e divórcio, pois nem sempre a família suporta o incremento dos sintomas já descritos (Benevides-Pereira, p. 70-71). Além disso, os trabalhadores que sofrem de burnout foram avaliados por seus cônjuges de forma mais negativa, sendo que eles próprios relataram que seu trabalho tinha um impacto negativo sobre sua família e seu casamento fora avaliado de forma insatisfatória (Maslach, 2005, p. 45). Portanto, para avaliação das conseqüências da síndrome de burnout sobre a saúde do trabalhador não se poderá considerar aspectos apenas físicos e mentais, mas também sociais, pois tal patologia interfere na relação familiar.

Interessante registrar que ocorre uma unanimidade entre os pesquisadores ao assi-nalarem a influência direta do mundo do trabalho como condição para determinação desta síndrome. Ana M.T.Benevides-Pereira, cita a seguinte afirmação de Malasch: “Burnout é uma experiência individual específica do contexto do trabalho” (p. 33). Christina Maslach (2005, p.47) também afirmou que a conclusão de vários estudos quanto aos fatores de risco para a síndrome de burnout é a de que esse transtorno deve-se, em grande parte, à natureza do trabalho e não às características do funcionário individual.

Portanto, resta evidente que uma vez constatada a síndrome do esgotamento pro-fissional (Burnout) estará configurada a existência de nexo de causalidade entre o trabalho e esta psicopatologia, ou seja, o burnout não é um problema do indivíduo, mas sim do lugar onde ele trabalha (Magnólia Mendes e Cruz, 2004, p. 47, ao citar Maslach e Leiter).

A diferença entre estresse e burnout tem sido objeto de controvérsias. Alguns – redu-cionistas – sustentam que tratam-se do mesmo fenômeno, pois a exaustão emocional também faz parte do estresse, que envolve desgaste, cansaço e falta de energia. Porém, os defensores da diferenciação entre estresse e burnout sustentam que esta síndrome abrange componentes de esgotamento (exaustão) e também aspectos atitudinais (despersonalização ou cinismo) e de auto- avaliação (baixa realização pessoal ou ineficácia) (M. R. Tamayo, p. 98).

Segundo M. R. Tamayo (p. 99) e Ana Maria T. Benevides-Pereira (p. 72-72), o ins-trumento MBI – Maslach Burnout Inventory, é o questionário auto-aplicável mais utilizado para avaliação do burnout. Dos seus 22 itens, 9 são relativos à dimensão exaustão emocional, 5 relativos à dimensão despersonalização, 8 relativos à dimensão realização profissional, sendo considerado em burnout uma pessoa que revele altas pontuações nessas dimensões. O caráter multidimensional analisado nesse inventário é indicador da diferença entre estresse e burnout, pois este é uma resposta multidimensional ao estresse, caracterizada por compor-tamentos e atitudes negativos em relação aos clientes, ao trabalho e à organização, que não são contemplados pela concepção tradicional do estresse (M.R.Tamayo, p. 99). Ademais, segundo Ana M. T. Benevides-Pereira (p. 45), o burnout é a resposta a um estado prolongado de estresse, que ocorre pela cronificação deste. Ao contrário do estresse, que pode apresentar aspectos positivos ou negativos, o burnout tem sempre aspecto negativo (distresse). Além disso, ao contrário das reações agudas ao estresse, que se desenvolvem em resposta a inci-dentes críticos específicos, o burnout é uma reação cumulativa a estressores ocupacionais

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contínuos (Maslach, 2005, p. 42).

A exaustão emocional se refere à sensação de esgotamento tanto físico quanto men-tal, ao sentimento de não dispor de mais energia para absolutamente nada. O trabalhador torna-se pouco generoso, insensível aos problemas. Demonstra pessimismo e sensação de ter chagado ao limite das possibilidades, ficando pouco tolerantes, facilmente irritáveis, “nervo-sos”, “amargos”, no ambiente do trabalho e até mesmo fora dele, como familiares e amigos. As principais fontes desta exaustão são a sobrecarga de trabalho e o conflito pessoal no trabalho. A despersonalização é o desenvolvimento do distanciamento emocional que se exacerba. Não significa que o indivíduo deixou de ter sua personalidade, mas que esta sofreu ou vem sofrendo alterações, levando o profissional a um contato frio e impessoal com os usuários de seus serviços (alunos, pacientes, clientes etc), passando a denotar atitudes ne-gativas, de cinismo e ironia em relação às pessoas e indiferença ao que pode vir a acontecer aos demais, ou seja, perde os aspectos humanitários na interação interpessoal. Com a des-personalização o trabalhador perde a capacidade de identificação e de empatia, passando a tratar as pessoas como “coisas” ou “objetos”. O trabalhador deixa de tentar fazer o seu melhor para fazer apenas o “mínimo necessário”. A reduzida realização profissional eviden-cia o sentimento de insatisfação com as atividades laborais que vem realizando, sentimento de insuficiência, baixa auto-estima, fracasso profissional, desmotivação, revelando baixa eficiência no trabalho. Passam a ter uma consideração negativa de si mesmos e dos outros (Benevides-Pereira, 2002, p. 35; Limonge-França e Rodrigues, p. 53/54; Maslach, 2005, p. 42).p. 55):

Eis um exemplo típico de burnout, citado por Limonge-França e Rodrigues (2007, “Sinto-me impotente ao lidar com os alunos, pois é algo semelhante a remar contra a maré. Às vezes é possível observar algum esforço por parte de alguns, mas não há retorno, pois as deficiências de aprendizagem e as barreiras são muito grandes. No total de alunos, 50% são totalmente apáticos, os outros 50% até têm esforço, mas não possuem base, não absorvem. Não vejo resultado em meu trabalho, sendo que os alunos da noite conseguem ser ainda piores. Estou sendo muito sincera, não consigo encontrar nenhum tipo de satisfação no magistério. Ao sair para o trabalho, consigo perceber apenas o sentimento de obrigação, é como o gado que sai para pastar e de-pois volta para casa”.

A análise do nexo de causalidade entre a síndrome de estar acabado, ou esgotamen-to profissional, ou ainda síndrome de burnout, não é tão simples como se pode parecer do Decreto 3.048/99 que elenca apenas o ritmo de trabalho penoso e outras dificuldades físicas e mentais relacionadas com o trabalho. Para esse mister é necessário, como já se disse no tó-pico da causalidade, que se analise todos os fatores desencadeadores do burnout relacionados às características pessoais do trabalhador, das características organizacionais, das caracterís-ticas do trabalho e das caracteríscaracterís-ticas sociais que envolvem o modo de viver do trabalhador. Sem essa análise que deverá ser feita por profissionais multidisciplinares, não se terá fundamento seguro para se reconhecer ou afastar o nexo de causalidade entre esse transtorno

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Referências

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