• Nenhum resultado encontrado

As Cidades Romanas - Pierre Grimal

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "As Cidades Romanas - Pierre Grimal"

Copied!
54
0
0

Texto

(1)

#

Tfe*xo

pj

RtsetNiKA

PIERRE

GRIMAL

AS

CIDADES

ROMANAS

I

o:

Título original: Les.villes romaines

*0

If)

© Presses Universitaires de France

Tradução: António LopesRodrigues

Revisão da tradução: Ruy Oliveira

CapadeEdições 70 Depósito Legal n.? 192275/03

ISBN9.72-44-1183-4

Todososdireitosreservadospara línguaportuguesa porEdições 70-Lisboa-Portugal

EDIÇÕES 70.LDA.

RuaLuciano Cordeiro, 123

-

2“Esq.”-1069-157LISBOA/Portugal Telef.: 213 190.240 •

Fax: 213 190249'. E-mail: edi.70@mail.telepac.pt

www.edicoes70.pt i

j

Estaobraestáprotegidapela lei Não pode serreproduzida notodoou em parte,qualquerque sejaomodo utilizado,

incluindo fotocópiaexerocópia, sem prévia autorizaçãodoEditor.

(2)

' ' : I

índice

:

I

Introdução 9 CapítuloI

Princípios geraisdourbanismoromano

CapítuloII

Odesenvolvimento urbanode Roma

...

17

37 Capítulo III

Osmonumentosurbanostípicos

Capítulo IV

Algumasgrandescidades

51

97

!

(3)

Introdução

I

!

ForamosRomanos que,nasprovíncias ocidentais doseu

Império, fundaramasprimeiras cidades.Se, noOriente, por alturasdaconquistaromana,existiam desde há muito cidades florescentes ou célebres, o mesmo não aconteciana Gália,

na Grã-Bretanha, nas margens do Reno, em Espanha [em

Portugal] enamaiorpartedaÁfrica.Não há dúvidadeque

aspopulações celtasouibéricasdispunham,narealidade,de

povoações (cujos vestígios foram encontrados e estudados

nanossaépoca),delocaisderefúgio geralmente instalados

emsítioelevadoseprotegidos por muralhas frequentemente construídasempedrasossa.No interiordorecinto,comose

podever emAlésia(Les Laumes),haviacabanasagrupadas

embairros rodeados deamplosespaçoslivres ondesereali¬

zavamosmercadosetalveztambémasassembleias políticas;

masestesconjuntos,nosquaisaimplantaçãodashabitações parecefrequentementenãoterobedecidoaqualquerordena¬ mento prévio, não constituíam ainda cidades dignas deste

nome. Aocupação romanaintroduziueimpôsnovosmodelos

quedeterminariam durante séculos o habitat humano.

Estaevolução torna-seperceptível,porexemplo, através

das descobrtas queacompanharamaexploraçãodoplanalto

de Ensérune,ameio-caminho entreNarbonaeMontpellier.

Aí,acima daplaníciebemcultivada,localizava-seumacidade

(4)

influên-V * * « •( •“ .• V * 9 t ' » \ • • *• *- •* « • •

(5)

INTRODUÇÃO

ASÇiPAPESROMANAS

1

cia

longínqua

dos

modelos

helénicos

importadospelos

ciantes dascolóniasgregasinstaladasnacostamediterrânica,

entreMarselhaeAmpurias,e cuja acção sefazsentirtambém

noutrossítioscomo, por exemplo, emGlanum(Saint-Rémy). No entanto, quandoNarbona(NarboMartius) foi fundada pelosRomanos,emfinaisdoséculo

dois

antesda nossa era,

aantiga cidadefortificadafoi

abandonada

emfavorda nova cidade.Épossívelqueesteabandonotenha sidoimpostopelos

conquistadores, pouco interessados emdeixar permanecer

imediaçõesda estrada que garantia assuascomunicações

:umaEspanhairrequieta,

a.

ameaçadeumacidadesobran¬

ceiranas mãosde populações

insuficientemente

pacificadas.

Mas tambémécerto que oatractivo exercidopor Narbona

teveasuainfluêncianestaevolução.Acidaderomana trazia

nãosóumnovo habitat,mastambémconcepçõesdestinadas

a revolucionaromodo de vida tradicionale a organização políticae socialde todaaregião.

Se, de facto, opoder militar dos povos subjugados por

Romafoiquebrantadopelaslegiões,foiacidaderomana que

-

pelo menosnas províncias ocidentais

-

assegurou a «ro-manização» do território conquistado. Os

Romanos

não se

deixaram induzir

em erro e serviram-se do seu urbanismo

como deum poderoso

instrumento

político. Tácito pôs na

boca do rebelde bretão Calgacus uma violenta invectiva

contraavida urbana quetransformavaprqfundamenteaalma

dosseuscompatriotasepoucoapoucoosacostumavaàescra¬

vidão. Mas todo este domínio não se deveu unicamente à

sedução do luxo, dosbanhos, deuma

alimentação

melhor,

do ócioà sombra dos vencedores. Além de

rísticaurbana namedidaemqueosseushabitantesconseguem criar nela os instrumentos deumavidacolectiva:santuários,

locais de reunião, edifícios oficiais de qualquer natureza, chafarizespúblicosonde cadaqualvem tiraraáguanecessária paraavidaepara o cultofamiliar.Porfim, oprópriosoloda

cidadeestáconsagradoaosdeuseseconstituiumlocalsacro,

insubstituível

eimutável.

Neste aspecto, as cidades romanas

-

e, muito particu¬

larmente, as que foramfundadas especificamente por cida¬

dãosromanos separadosda metrópoleeàsquaissedáo nome de colónias

-

sãouma imagemdeRoma. Reproduzemtão

fielmente quanto possível as instituições, os monumentos,

oscultosda cidade-mãe, aUrbs,aCidade porexcelência,e

encontramosem todaaparte,nos locais maisremotos das

províncias

mais longínquas, as

características

essenciais da

capital.

Romaencontra-senointeriordeuma fronteirasagrada

-aoqual se dá onome de pomerium

-

e o seu territórioestá

protegidopordivindades eritos quelhe são

característicos.

Mesmonotempoemqueocrescimento contínuodapopula¬

ção já havia feitoaprópria povoaçãoultrapassaremmuitoo

pomerium original, a Cidade não tinha o mesmo estatuto

religiosoe

administrativo

doterritório envolvente. Mantinha

uma

primazia

incontestadae era dela que emanava toda a

autoridade

legal.Assim,por exemplo,todos os anos os côn¬

sules, aotomaremposse, deviamsubiraoCapitólioonde pres¬

tavamjuramentoperanteJúpiter,o deus soberano daCidade.

Senãocumprissemestacerimónianãoficavamformalmente

investidos

da sua autoridade; e esta autoridade não era a

andoexercidadentro ou fora dacidade.Absoluto,

princípio,foradorecintourbano,opoder consular encon¬ tra-se limitado por regras

constitucionais

muitoprecisasno interiordele. Noregressoda suacampanha,umgeneralvito¬ rioso estáproibidodepassaros limites dopomeriumdurante

otempoquepretendercontinuara ser imperator, ou enquanto

aguarda,por exemplo,queoSenadoconsintaem ogalardoar as

honras do

triunfo.

Se,

mesmo inadvertidamente,

colo-

comer-nas

com

representar um

determinado

número de comodidades materiais, a cidade

romanaerasobretudoosímboloomnipresentede umsistema

religioso, socialepolítico queformavaaverdadeiraestrutura

daromanidade.

qu

mesma

em

Efectivamente,

para umromano

-

como, aliás, para um

grego - qualquer aglomeração humana não éuma cidade. Estanão seformapelapuraesimples junçãodehabitações

(6)

w

INTRODUÇÃO

ASCIDADES ROMANAS

da

cidade

exercem sobre osdo campouma

primazia

comparávelàquetêmoscidadãos romanossobreoshabitantes

das

províncias.

E éaeste

paralelismo

rigorosoentreRomae ascidades

provinciais

abase de toda ahistóriadascidades romanas.O urbanismonão é,então,umaarteabstractapura¬

mentetécnica.Oseuobjectivoédarumcorpo

material

aesta

realidade essencialmenteabstractaeespiritual queé acidade.

1

tantes

casse umpénointerior dopomerium perderiaa suadignidade

ejánãopodiaaspiraràentrada triunfal.

Estespreceitoseoutrossemelhantesprovamqueaprópria

noção decidade édeíndoleessencialmente religiosaeespi¬

ritual. As considerações materiais, autárquicas, estratégicas

eeconómicas sóvêmdepois.Aindaantesdeserumlocalde

refúgiooude prazer,acidade romana é umcentrosagradoe umcentrojurídico,oque é bastantesemelhante. Aimplantação

decolóniasnasprovínciasconquistadastemcomoobjectivo

ecomoefeitoacriaçãode «pontosestáveis»nointerior dos territórios anexados. Desconfia-se dos “pagãos”,dos aldeões,

dos agricultores, de todos aqueles queestãodispersoseque

não vivemnempensam segundo ascategoriasromanas.

Nem todasascidadesespalhadaspeloImpérioeramcoló¬ nias, ouseja,nemtodas foram originalmente povoadas por

cidadãos romanos.Muitasdelas, sobretudonoOriente ena

própriaItália,jáexistiamantesdaconquista,eRoma

tinha--selimitadoaimpôra suaautoridade à organização política anterior. Cadaumadascidades assim sujeitasaodomíniode Romaestavamobrigadas moralmente porumtratado quelhe

conferiaumestatutoparticular. Frequentemente as cidades conquistadas mantinhamumaautonomia bastante grandeem

relação a todos os assuntos locais e continuavam a dispor

dassuasassembleiaspolíticastradicionais. Omesmosucedia

com ascidadesindígenasque,no Ocidente, eramcriadas após

aconquista,mesmo sem ocontributo de cidadãos romanos.

Todavia, bem depressa essas cidades tenderam aadoptar o

modelodas colóniase aimitar as suasinstituições.Rapida¬

mentedeixou dehaver noImpério cidades quenãodispusessem

do seuSenado(aoqualsechamava ordem dos Decuriões), o

seucorpo eleitoralpopular, os seus magistrados agrupados

emcolégiosequecorrespondiamaos cônsules, aos censores

eaosedis de Roma.Assim,asprovíncias passaram pouco a

poucoaestarcompostasporummosaico de cidadesquecons¬

tituíamas suascélulas políticas. Cadacidadetemcomonúcleo

umaaglomeração queé ocentroadministrativoeàvoltadela umterritóriobastantevastoquelheestásubmetido.Os

habi-7

i

1

Desde quehámaisde um

século

se

constituiu

e afirmou uma

arqueologia

científica, onosso

conhecimento

das

cidades

romanas

desenvolveu-se

e clarificou-se paraalém de todas

as

expectativas.

Nãosepassaumano semquenovasdesco¬

bertasvenhamacrescentaralgunstraçosao

quadro:

vestígios

desenterrados

pelas escavações ou ummonumento liberto das construções

parasitas

queo

escondiam

oudesfiguravam

mostram-nos pouco apouco a

verdadeira

face das

cidades

antigas. Apercebemo-nosentão de que, por todo olado,se

encontramedifícios que senão são sempre

semelhantes

na

suaforma,sãopelo menosanálogospelasua intençãoepela

sua função.Nocentro,o

fo

rum,praça

pública,

comos seus

anexos: oCapitólio, templodareligiãooficial, acurie

onde

serealizamas

assembleias

dosDecuriões, e a basilique,sede

davidajudicial. Depois,umteatroou umanfiteatro(porvezes

ambos)paraos

espectãculos

eparaos jogos;

santuários

dedi¬ cadosadiversasdivindades;astermas,vastos

estabelecimen¬

tosdebanhosquedesempenham, comoveremos,umgrande

papelnavidasocial;osaquedutos,asfontesetodas asinsta¬

lações sanitárias

indispensáveis

aumagrupamentohumano relativamente vasto; finalmente, construções de

prestígio,

arcos do triunfo, colunas votivas e estátuas ondeoespírito

cívicoencontrava asua expressão,indicadoresda ambiçãoe

da emulação comuns..

Frequentementea cidade,fundadaemperíodode conquis¬

ta,no meio de uma

província ainda

turbulenta,

está

rodeada

13

(7)

!

INTRODUÇÃO

AS

CIDADES

ROMANAS

não serompeu a continuidade entre apovoação antiga e a

que nos édado conhecer.Acontece ainda frequentementeque

oplano moderno deixaentreverasformasgeraisdo urbanis¬

moromano.Deste modo, cidadescomoParis,Lião,Bordéus,

Tolosa,Turim,Florença, Veronaemuitasoutrasdevem asua

orientação geraleo desenhodecertosquarteirõesaoantigo núcleoromano. Istodeveserpara nósuma razãosuplementar para procurar discernirno terreno,por comparaçãocom os

locaisantigos mais conhecidos,estapré-históriadas cidades

modernas queseencontradissimuladasob as casas e ospavi¬

mentosdasnossas ruas.Seja qual foronossopontode vista,

verifica-sequea«cidaderomana»presidiunaorigemaeste

fenómeno quesecontaentreosmais importantesdahistória

ocidental:aformaçãodefortespovoamentosurbanos.Istoé

particularmente verdade nas províncias de língua latina, a oeste do Adriáticoe dogolfo Cirenaico, onde o urbanismo romano não teve que se sobrepor ao urbanismo grego ou

oriental. Èpor isso que limitaremos o nosso estudo a este

territóriono interior doqual subsistem aindaalgures vastas

obscuras segundo o

grau

de desenvolvimento das

pesquisasarqueológicas. EmAfrica, porexemplo,émaisfácil explorar as cidades antigas pois ninguém vemperturbar as

escavaçõesnumpaísonde atradição urbananãosemanteve

com amesma continuidadeque severificounaEuropa. Os

segredosdeLutécia,pelocontrário,continuamprofundamente

enterrados por baixo das diversas Paris que se sucederam através dos tempos.

Masoque desde já podemosperceber dascidades roma¬

nas,sejaqual forosítio ondeseencontrem,ésuficiente para

mostrarocunhopoderosodeixado por Romanosterritórios

queconstituíramo seuImpérioeaactualidadesempre activa da «romanidade».

demuralhas.E

mesmo

quando,maistarde,estasdefesas,tra¬

tadascompouco cuidado, foramsubmetidasatodaaespécie

de vandalismospor partedos constructores privados chega sempreummomentoemqueénecessário restaurá-las: quando

a pazromanaseviuameaçadae asinvasões bárbaras

reintro-duziramainsegurançanoImpério.

São estes os elementos da vida urbana. Há apenas um

pequeno númeroe a sua repetição em todas ascidades não

deixamde originar alguma monotonia.Noentanto,nãoima¬ ginemos ascidades romanastodas semelhantesentre si. As

cidades naprovíncia da Áfricanão apresentavam

aspectodascidadesnaGrãÿ-Bretanha.

Algumas

variações lo¬

caisintervinhameintroduziamalgumadiversidade.

Criaram--seestilosarquitectónicosmistoscom astradições indígenas

amodificarosmodelos clássicos importadospelosconstru¬ tores romanos. Isto toma-se evidente, principalmente, nos

edifíciosreligiosos.Verificá-mo-lotambémnas casasde habi¬ taçãomenossubmissasàs regrasoficiaisdoque osedifícios públicos. Masnãodemoramuitoaté que aprópriacidade se

aproxime de uma norma quase imutável à medida que se

adaptaaosprotótiposda capital.

Àscidadesromanas conheceramo seuapogeunosséculos

IeIIda nossa era.Foientão que sedesenvolverameatingiram

umamagnificência queé,paranós,dificilmenteconcebível.

Masestesséculos felizes foram seguidos de períodosde ins¬

tabilidadeede guerras que obrigaramascidades a

concentra-rem-seeaeliminaroselementosmaisvulneráveis. NaGália,

porexemplo,noúltimoterçodo século IIIvêmo-lasa

encer-rarem-senointerior de muralhas construídas apressadamente eapoiadas nos grandes monumentosexistentes. Anfiteatros

deparedesmaciças,túmulos,terraçosdos templos fornecem

sem grande custo elementos de defesa. Materiais impro¬

visados são retirados dos edifícios deixados fora do novo

recintoevotadosàdestruição.Formasseassim,nosprincípios

daIdade Médiae nomeiodomedoeda confusão, uma nova

cidadesobre umaparterestrita dacidade romana. Ainda mais

tarde, acidade medieval originaráacidade moderna.Assim,

o mesmo

(8)

Primeiro Capítulo

PRINCÍPIOS GERAIS DO URBANISMO ROMANO

Forçados, pelas exigências das suasconquistas,adesen¬ volver cidades já existentes ou a fundar outras novas, os

Romanos viram-se obrigadosaelaborarumaverdadeira dou¬

trina do urbanismo fornecendo apriori soluções uniformes

paratodos osproblemaspráticos..Talmostrou-se tantomais

necessárioquantofrequentementeasprimeiras pessoas envia¬

das como colonos eramantigossoldados, eles mesmospouco

capazesdeinventar,masdisciplinadosepersistentes. A

mão--de-obra indígenaeraabundantemasdesprovidadeformação profissional.Istofezcomqueseadoptassem técnicas simples

comoo empregomaciçodo cimento,mais rápidoemais fácil

do que aconstrução empedra de cantaria queerareservava

sobretudo para os acabamentosexteriores!Mas,mesmoantes

de construir os monumentos, é preciso planear a cidade, prever oseuordenamento geral, articularos seusdiferentes quarteirões, pôrnolugarpróprio os seus orgãos essenciais. Será que os fundadores, tal como o fazem os urbanistas modernos,estudavam sempre,minuciosamente, ascondições geográficas, demográficas,económicas,e seinspiravamno

clima, nalocalização,nas características geraisdo localou

daregião?Tantas precauções eramgeralmenteimpossíveis.

Eraprecisoandardepressae,uma vezdeterminadaalocali¬

zação da cidade futura, começara construção sem demora.

-Assim, os fundadores romanoscontentavam-se em aplicar umplanosimples,sempreomesmo,eque tinhaoméritode serfacilmente compreensível.

1

(9)

AS

CIDADES

ROMANAS PRINCÍPIOSGERAIS DO URBANISMO ROMANO

Uma cidade «normal», para os

Romanos, inscrevia-se

num

quadrado ou num rectângulo atravessado por duas vias

perpendiculares traçadas segundo osmedianos.Destes dois

eixos,um está orientado denortepara sul. Temo nome de

Cardo (o que quer dizer polo ou gonzô pois segue a linha

ideal em volta da qual parece rodar a abóboda celeste). O

eixoeste-oesteéodecumanus,termode significado obscuro,

provavelmenterelacionadocom o número dez(*), sem que

possamosdiscernir claramentequalarazão.Aquando da fun¬ dação,ofundador,que eraummagistrado oficialmenteencar¬

regadodesta missão(ou,frequentemente,naprática, um agri¬

mensorseuadjunto)determinava,emprimeiro lugar,alocali¬

zação adaraocentrodafuturacidade. Nesseponto,ondese

cruzarão o decumanus e o cardo, ele implanta a groma,

instrumento

deagrimensor destinadoadeterminar, por mira,

o traçadodo decumanus. Paraisso, começa por determinar exactidão onascerdo Soloque dáoOriente verdadeiro

nadata dafundação. Éfácil,em seguida,traçarocardo tirando

aperpendicular apartir do centro.Medem-se sobre os dois

eixos assim obtidosdistânciasiguaisapartir dasua

intersec-çãosegundoasuperfície que se pretende queacolónia tenha

e aíserão abertas asportas principais.Q traçado dorecinto

limitar-se-áamaterializaroquadrado de queocardoe ode¬

cumanus são osmedianos.Acidadeterá,assim,quatroportas,

em cada umdos pontos cardeais.Em seguida bastará

traçar asvias secundáriasemquadrícula.Obter-se-ão, desta

forma,osdecumanie oscardines secundáriosque são

respec-tivamente paralelos aos dois eixos principais. Os espaços assimdelimitados(as«casas»daquadrícula) serãodivididos

entreoshabitantes segundo

a

suacategoriae asuafunção.

Tal procedimento é, evidentemente, muito artificial só

sendo aplicável num terreno desocupado e sem acidentes muitomarcantes.Era aqueleaque recorriam, todasastardes,

osoficiaisencarregadosdeestabeleceroacampamentoonde

se acantonavamas tropas em campanha. Sobestepontode

vista,acolónia pode aparecercomo o merodesenvolvimento

do sistema do acampamento onde a disciplina militar tinha

formado os veteranos.As vantagenssãoevidentes: oslotes

atribuídosacadaum sãocomparáveisoque satisfazoespírito deigualdadeque impeleoscidadãosromanos. Além disso,

umapovoação deste género é fácil de defender dada a sua

forma regular constituindomesmo otipo própriodascolónias

militares estabelecidasemregiõesmalpacificadassendo por isso queencontramosos seus exemplos mais característicos

emÁfrica, nomeadamenteemTimgad (fig.1).Ali estendem--se vastas planícies nas cercanias dos montes Aures. Não havia anteriormente qualquer aldeia indígena nestaregião

de nómadas sendo a fundação da cidade romana a única milhasemilhasem redor.Osprincípios puderamseraplicados

com todoorigor. Timgadnão é,pelomenos na suaorigem, mais do queum vastocampo de cimentoepedra implantado definitivamentenumdospostos avançados do Império.

Erraríamos, noentanto,seacreditássemos queoplanoem

quadrículae origor geométrico das fundaçõesdestetipo se

explicaminteiramente peloespíritomilitar dos Romanos. A

realidade émuitomais complexa.Há, na fundação deuma

cidade,umelementoqueadisciplina militarnão saberiater emconta:nenhuma consideração práticajustificariaaorien¬

tação do decumanus. Esta só pode resultarde umaintenção

religiosaeébem verdade que a fundação de uma cidade é

umactosagrado. Osautores antigos descreveram-nos abun¬

dantemente oritualqueacompanhavaeste acto.Dizem-nos

como o próprio fundador, envergando uma toga ornada à

moda antiga, começa por seservir dosauspícios afim de se

assegurar, através de sinais visíveis, que os deuses não se

opõem àimplantaçãode umacidade nolocalescolhido. A

seguir,agarraosrabelos deumacharrua comarelhaembron¬

zepuxadapor uma bezerra e um tourobrancos e abre uma

valaatodaavolta dafutura cidadenolocalonde devemser

erigidas as muralhas. Toma muito cuidado por fazer que a

terra

remexida

pela relha

caia

para o

interior do

recinto

e,

com

uma

;

(*)Linha que vai deorienteparaocidente(falandodo trajectoaparentedo

(10)

PRINCÍPIOS GERAIS DO URBANISMOROMANO ASCIDADES ROMANAS

JL

-iPiiSiS

'§ÿÿ0

IS!

Egg

m

Z«-

e

&

J4

l 5

ii

-iJc

i

EEBHHSilí,,

U=45T

<ÿ5

(SHU®

mm&

X

if

tBL

;

tO

I

1<

a

s

tffl

4

SSsSj

SI

KJ

a

IS

igisuoaKa

±

sra

Eirsi

cm

ran

:

19

«1

llffiSE

ÍF

§a

3 -J

#*

Msli

i

SEE

! i

Twr

lx

*

s3

r>

s-1®

JM?

/

M

//

// :

a

o

cs£

&W

0 50 100 1>>

Fig. 1

.

-

Planta de Timgad

Segundo Ch. Courtois, Timgad(AntiqueThamugadi), Argel, s.d.

(1951)

Este, 10.Termas deNordeste, 11. Arcodito de Trajano, 12. Pequenas Termas doCentro, 13.Bairro Industrial,14. Grandes Termas doSul,15.

Pequenas Termas do Sul,16.Capitólio, 17. Termas doMercadode Sércio,

18.Mercado deSércio,19. Grandes Termas do Norte

1.Pequenas Termas do Norte, 2. Biblioteca pública, 3. Forum(vd.Fig. 9), 4. Teatro, 5. Templo de Ceres (?), 6.Templo de Mercúrio(?),7.

(11)

PRINCÍPIOS GERAIS DO URBANISMO ROMANO ASCIDADESROMANAS

atrás dele, os ajudantes recolhemos torrões queporventura

possamtercaído parao exteriorecolocam-nos ondeoritual

odetermina.Nolocal previstopara aspòrtas ofundadorle¬

vantaarelha para deixarumacessolivre dequalquerconsa¬

gração.

Quando

o fundador regressa aoponto de partida,a

cidadeestávirtualmente fundada.

O ritualda valateria sido praticado pelo próprio Rómulo emtornodaprimitiva Romaesabe-secomo.porter tentado

ridicularizá-lo,Remo, que tinha saltado deumpuloavalae

taludes emminiatura que a charrua acabara de formar, foi sovado mortalmente peloseuirmão. Oritualexplica-se muito bemporsi próprio. Temcomofinalidadesimbolizarafutura cidade em volta da qual a charrua comrelha de bronze (a

escolhaexclusivadeste metalremontaa umtempo emqueo

ferro aindanãoeracorrentementeutilizado)estabelece uma

linhadeprotecçãomágica. Daterrarevolvida pela relhaemer¬

gemasdivindadesinfernais queseapossamda valaeatornam

religiosamente intransponível. Todo aquele que nãotoma a

precaução deentrarnoterritório urbano pelasportas onde o

solo, deixado intacto, constituiuma protecçãoeficaz contra os deuses das profundezas, toma-se por isso mesmo sacer

[maldito]; fica devotado às divindades infernais edeve ser

rapidamente norto pois a mácula que assim contraiu é, de facto,umaameaçaparaacolectividade.SÓporsi,estacrença explicaavelhalendaque, nãosemescândalo,põe oassassínio deumirmãonaspróprias origens daCidade.

Este ritual dadelimitaçãodoterritóriourbanoeracomple¬

tado por doisoutrosrituais,ambos de consagração. Um era

destinado aosdeuses infernais.Numpontocentral da futura cidade era escavada uma fossa circular chamada mundus

(talvezporqueerasupostoreproduzir odesenhodaabóboda celesteque tinhaestenome) eondesedepositavam oferendas

«Aos deBaixo». Três vezespor ano, alaje quecobria esta

fossa era solenemente retirada. Nesses dias,suspendiam-se

todas asactividades oficiaisdacidade poisestando o mundus

abertoe acomunicaçãocomOsespíritos subterrâneos estabe¬

lecida,todo oempreendimento estaria votado aofracasso.

O último ritual tinha por objectivo pôrafutura cidade sob

aprotecção dos deuses do Alto e, emespecial,deuma tríade

compostapor Júpiter, JunoeMinervaaquemeradedicado

umtemplocomum,comtrêscapelas, que constituíaoCapi¬ tólio(ouseja,aCabeça) da cidade. Paraestarrigorosamente

conforme as regras, este santuário devia localizar-se num ponto alto para que os seus divinos hóspedes pudessem abarcarcom oolharamaior áreapossíveldacidade. Éuma

velhacrença,efortemente enraizada, queaprotecção deum

deussó seexerceeficazmentenaáreaque elepodever.Assim,

quandonãoerapossível edificar ocapitóliono alto de uma

colina,eleeraerigidosobreumpodiumalto, umterraçoarti¬ ficial que substituíaacolina.Frequentemente,estecapitólio

era construído na orla da praça principal, exactamente no centrodacolónia.

Vê-se, por conseguinte, que as indicações transmitidas

pelos Antigos sobreafundaçãodas cidadescompreendeduas

sériesdistintasdeprescrições:umapartetécnica,de purageo¬

metriae,poroutrolado,umritualdecaracterísticas arcaicas;

mas nadanos garante que estes dois elementos estivessem

primitivamenteligados.Estão-no, de facto, nas construções

efectuadasnaépocaclássica, masserá que foi sempre assim?

Aconsagração do soloeotraçado da vala mágicanãoimpli¬

cam,deforma alguma, por sisós,queacidade tenhaforçosa¬

mentede teraformadeumquadradoetodoo seu território serdivididocomo umaquadrícula pelarede de ruas. Háum

só ponto comum: a determinação de dois eixos orientados segundoas«linhasdeforça»do universotalcomo entãoera

concebido. É provável queestaparticularidadetenhapermi¬ tidointegrar numritualmais antigouma técnica que,emsi

mesma,nadatinha de sagrado.

Sejacomo for,osautoresantigossãounânimesemafirmar

que o ritual da fundação, no seu duplo aspecto, prático e

religioso,foiensinadoaosRomanospelo povoetruscoenada

leva aque se duvide desta afirmação. A tríade capitolina é

etruscacomoetruscossãoostemplos detriplacella(detrês

(12)

atríbuí-ASCIDADES ROMANAS PRINCÍPIOSGERAIS DO URBANISMO ROMANO da às

divindades

subterrâneas,asprecauçõesquese tomavam

contra elas numesforço de controlar e utilizar o seupoder maléfico, tudo isso faz pensar na demonologia etrusca tal

como avemos representada nas pinturas funerárias de

Tar-quínia,porexemplo. Onome de gromadadoao

instrumento

de agrimensor éumtermomuitoprovavelmente etrusco

oritualconservaelementospropriamente latinos, anteriores

àinfluênciaetrusca,esseselementos foram cobertosporestes apontodeteremficado

irreconhecíveis.

Defacto, verifica-seque duascidades,

indubitavelmente

etruscasequeremontamaosfins do séculoVIantesdanossa

era,apresentamjáascaracterísticasgeraisdas colónias

nas.Aprimeira éacidadedita deMarzabotto,nome do local

ondeforamfeitasas escavações mascujonomeantigonãoé

conhecido.Elevava-senumplanalto suavementeinclinado,

namargem do Reno,a25kmasudoeste de Bolonha. As

ruasdesenhavamumtabuleirodexadrez perfeitodeterminado

com todo origor. Os quarteirões delimitados pelos decumani

e pelos cardines têm todos umcomprimento de 165 me a

sualargura variaentreos40e os60m.As duas ruasprincipais atingemumalargura de 15m;asruas secundáriassão cerca

de três vezes mais estreitas. O Capitólio estáerigido

colina que dominaacidadee aí,entre váriosmonumentos

religiosos, foi descobertauma fossacónica cheia de restos

sacrificiaisenaqualépreciso, sem dúvida,ver um mundus. A cidade de Marzabotto é inegavelmenteetruscatendo sido

possivelmente fundada por colonos

vindos

da poderosa

Bolonhaetrusca ou de Chiusi e aí instaladospara vigiar o valedo Renoe odesfiladeirodos Apeninos. Foibrutalmente

destruídaemmeados do século V a.C.sebem quetenhamos

nela um testemunho exacto do que podia ser uma cidade

etruscanotempoem queestepovoatingirao apogeuda sua

civilização

edoseupoderio.

Aoutracidade éCápua.ACápuaantiganão seencontrava

local da moderna Cápua (que ocupa desde cerca

de856 d.C.odaCasilinumromana)mas nosítiodaactualS. Maria di CapuaVetere,nomeiode uma vastaplanície. Foi

fundada pelosEtruscoSaquando

da

suapenetraçãonaItália

meridional e,até ao fim,guardouos sinais doplanoque os

fundadores lhetinhamimpostooquetranspareceainda

artériasdopequenoburgomoderno cuja ruaprincipal,o

CorsoUmbertoI,

cobre

completamenteoantigo decumanus

maximus(fig.2)queatravessavaacidadedeoesteparaleste,

da Porta de Roma {Porta Romana) até à Porta Albana. O cardoprincipaldeveser

procurado

numa via

perpendicular

equidistante das muralhas estee oeste.Cardo edecumanus

cercaniasda actual PraçaS.Pedroe eralá queseencontrava,semdúvida, naAntiguidade,aCasaBranca

{Aedes Alba), sede do Senado da cidade. Outro ponto

importanteeraconstituído.pelaSeplasia,ocentrocomercial

ondeseinstalavamnomeadamenteosfabricantesdeperfumes

tãonumerososemCápua.EstapraçaeravizinhadoCapitólio

cujos altos monumentos dominavam a parte ocidental da

cidade (').

No entanto,se écerto que osEtruscos aplicaramde vez em quando,pelo menos na fundação das suas colónias, os

princípiosque virão a ser os.dourbanismo romanoprocede¬

ríamosmal,todavia,se partíssemosdoprincípiodeque todas

as cidadesetruscasforamconstruídassegundoumplanoem

quadrícula.Escavaçõesrecentes (2)mostram,porexemplo, queaetruscaVolsini cuja situação dominaaactualBolsena,

Itália central,nãoreproduziademaneiraalgumaoesquema

geométricodeCápua

e

deMarzabotto.Estavaconstruídanum terrenomuito irregular queapresentava umdesníveltotal de

200 m e abrangia quatro colinas distintas. Numa delas foi

descoberto um templo, datando, sem dúvida do séculoIII

a.C.,que pareceterabrigado uma tríade divinasemque até

aopresente

possamos

saberse eleconstituíaoúnico«Capi¬

tólio» da cidade. É

difícil

conceber que,emtais condições,e

em tal local, o desenho das ruas (que, de resto, ainda nos

seus nas

i

e se

I

I i cruzavam-se nas

í

roma-suas

!

numa

i

na

,1

nomesmo

(') J.Heurgon,Recherchessur...Capouepréromaine.Paris,1942,p. 124eseg.

(J) R. Bloch, «Volsinieç élrusqúeet romaine», em Mélanges de 1’Êcole

(13)

AS

CIDADES

ROMANAS

PRINCÍPIOSGERAIS DO URBANISMO ROMANO

driculado rigoroso. As outrasutilizamomelhor que podem

o local escolhido a fim de tirarem dele o melhor partido

possívelno quedizrespeitoàdefesa. Mesmoaos olhos dos

Etruscos, a cidade«quadrada»,com os seusdois eixos per¬

pendiculares,a suarede deruas emquadrículaeas suasquatro portasé apenasumideal de que é necessário aproximar-seo

mais possível dentro dos limites permitidos pelas necessi¬ dadespráticas.

Anfiteatro Portade

Vultumo PortaJúpiterde MOm

r

J Termas Porta deRoma Porta Albana

i

Casa Branca 1

1

!

*

Portade Juno

4=

Praça

[Seplásia

No interior da Itália central,ascidades regulares só apa¬

recem comoexcepção. Fora daszonassubmetidas à influência

etruscae, maistarde,àde Roma,nemsequer existem.Antes

davinda dos Romanos,ascidades dosmontanheses queocu¬

pavamosplanaltose asregiões interioresdos Apeninosnão

passavam de aldeias de pequena dimensão encostadas a

qualquertalude.Algunsrochedos ou uma falésia, constituíam umadefesanatural esó dificilmente tais refúgios mereciam

serchamadosdecidade. Atéumperíodo jábastanteavançado

como oinício danossa era,vastas regiõesmesmoàs portas

de Roma(asregiões dos Pelignos, dosVestinos, dos Marsos

e dos Marrucinos) não tinhamverdadeiras cidades.Mesmo

nosnossosdias, muitas povoações,nestasregiões,conservam

os mesmostraços.Visíveis de muitolonge,surgemempilha¬

dasno alto deumpico. O seuespaço encontra-serigorosa¬

menteestabelecidoeas suas ruas,estreitasesinuosas, fazem

maispensarnumlabirintodo quenabelíssimaordenaçãode

umquadriculado.

E, noentanto, estespequenosburgositalianossão,geral¬

mente,osherdeiros directosdeumacidaderomana.Masaía

fundaçãoromana nãofez mais do que seguiradisposiçãode

umaprimitivapovoação indígena de que conservouocapri¬

choso ordenamento. Trata-se frequentemente de «colónias

latinas» estabelecidasnumadata relativamenteantiga(entre

os

séculos IV e III

a.C.),

cujos

habitantes,

sem

serem

assi-i

i

'

*

j-

1

L

j.

j

í

__

i

Fig. 2.- Plantade Cápua antiga

A tracejado: traçadoteóricodasestradas antigas

Atraçocheio: traçadodas estradas modernas

SegundoJ.Heurgon,Capoueprérotnaine.yAcitado.

escapa)tenha podidoadaptar-seao quadriculado

impostopela teoria.Emtodo ocaso,aprópria muralhanão é rectangular

mas segue um trajecto irregular com

numerosas

aberturas

para

facilitar

a defesa sendo

de crer que à disposição das

ruasse adaptava aos

movimentos

do

terrenocomoainda agora

severificaem Vetulonia,outracidade

etruscaque, também

ela,não corresponde aosprincípios

do ritual.

Tanto

para as

cidades

etruscas comopara as

cidades ro¬

manasconvém,

evidentemente,

distinguir

entreas

fundações

estabelecidas

emplanície

Sóas primeiraspodemsersumetidas àqueseligam

disciplina

auma acrópole.deum

(14)

ASCIDADES ROMANAS PRINCÍPIOS GERAIS DO URBANISMOROMANO

milados

aos

cidadãos

romanos, beneficiavam de algumas

prerrogativasjurídicas. Durante muitotempo, asguarnições romanas permaneceram aí instaladas,aoabrigode surpresas

e foi só após o fimda segunda guerrapúnica (noinício do século IIa.C.) que osRomanos empreenderam a ocupação

da planície fundando cidades dotipogeométrico.As antigas

povoaçõesperderamentão a suaimportânciaemfavor das

suasrivaismaisfacilmente acessíveisesituadasmais próxi

das rotas comerciais. Não é menos verdade que, durante

séculos,existiu,naprópria Itália,umtipo decidadescomple¬

tamentedifererentesdascidadesetrusco-romanas,cidadelas

com acrópole,

cidades-fortalezas

que não têm nadade comum com as colónias «regulares» (3). Lá, as formas clássicas do

urbanismoromano tiveram,tantoparao bemcomopara o

mal, deseadaptar àscondiçõeslocais do que resultaramcom¬

promissos que deramàscidadesromanas da Itália central,o seucaráctertãopeculiar: Assis,naÚmbria, continuouencos¬

tada à suacolina; Tusculum (hojeFrascati),TiburePraeneste

(Tivoli ePalestrina),nohorizonte de Roma,conservamainda hojeumairregularidadeurbanísticaque testemunha

longínquas origens.

Aprópria concepção deumacidade«quadrada» estáem contrasteevidentecom as tendências de numerosascidades

italianasefoi preciso importá-lanamaiorparteda península

eimpô-lapela conquista. Muito gostaríamos desabercomo

é que ela nasceu mas, no que a tal serefere, temos de

reduzir aconjecturas.

Há cerca de oitenta anos, a atenção dos arqueólogos foi

atraídapor descobertas que derama sensação, por um mento,detrazerumasoluçãoparaoproblema.Tratava-sede

umasérie depovoaçõesremontandoa umperíodo quesees¬

tendiaentreofim dosegundomilénioe cercado século VIII

antesdanossaera(4).Estas«cidades»,deuma extensãogeral¬ mentemedíocre,estavamdisseminadasnapartemeridional

da planície do Pó

revelando-se

numerosas nas regiões de

Mântua, Parma e Modena onde ôs seus vestígios formam

camadas deterra especialmentericasemdetritos orgânicos

que oscamponesesusavam como estrume eàqualdavamo

nome de«terramara».Este nomeficou ligadoaestasaldeias

pré-históricasnasquais,durantemuitotempo,sepretendeu

ver cidades fundadas pelos antepassados dos Latinos no

decorrer dalenta migração que os trouxe daEuropacentral

até ao Lácio. Acreditou-se, com

efeito»

que as cabanas de

queelassecompunhamestavamdispostassegundoasregras

tradicionais das cidadescomdecumanusecardo.

Naverdade,osfactossãomuitomenosclaroseconvincen¬

tesdoque se disse. Aimaginaçãodosarqueólogos,noentu¬

siasmo dasprimeirasdescobertas,levou-os frequentemente

aelocubrarconclusõesprematurassendoumadelasade que

estaspobres estaçõesarqueológicas, limitadasaumaregião

bem definida da Itália setentrional, apresentam já todos os

elementos deumacidadeetruscaouromana.Sejacomo for,

ignoramos se as populações das terramare são os antepas¬

sados dosLatinos. Tudoleva acrer quenão e,de qualquer

forma, sóporumahipótesesemfundamentosepodeatribuir,

aestepovopré-históricode quesabemos poucomais doque

nada,oritualtãocomplexocomqueos Etruscos rodeavama

fundação das cidadeseque,evidentemente,seligavaatoda

umaconcepção,puramenteetrusca,douniverso.

Nãoé, sem dúvida, naprópriaItália queéprecisoprocurar

a origem da cidade «quadrada» mas no interior de todo o

mundo mediterrânico.Sabemosqueascidadesdeplantageo¬

métrica,muito semelhantés,graças ao seu traçadogeral, às

colóniasetruscas,surgiramnoOrientebemantesdafundação

deMarzabotto e Cápua. O mais tardar cerca dos finais do

século VI a.C.omesmoestilourbanojáse impuseranaJónia

e daí tinha irradiadoumpouco por toda a parte.

Quando

a

mo

as suas

nos

mo-:

(5)Porexemplo Norba,nasfaldas dosmontesLepinos. Cf. G.SchmiedteF. Castagnoli,em L‘Universo,XXXVII(1957),p.125-148.Ver tambémAlbaFucens

(F.deVisscher,F.deRuyt..., Lesfouillescl'Alba Fucens,Bruxelas, 1955). (4)Gosta Salund, LeTerremarc,Kund-Leipzig,1939,p.233eseguintes.

I

(15)

\

PRINCÍPIOSGERAIS DOURBANISMOROMANO ASCIDADESROMANAS

emHalicarnasso. Verifica-seemPriene queoplanorectan¬

gular, aplicado muito rigorosamente paraodesenhodas ruas,

não exerce qualquer influênciana disposição geral da mu¬

ralha,quecontornaacidadesemnenhum rigoreaproveitaa

configuração do terreno tal como em Volsini. O templo de

Atena Polis (adivindadeprotectoradacidade)eleva-senum

terraçoquedominaapraça central(aagora)maisoumenos

da mesmamaneiraque oCapitóliodeMarzabottodominava

orestodacidade.

Estesexemplosde cidades«regulares» fundadaspor

arqui-tectosgregosdeformaalgumaselimitamàsregiões orientais. Mesmo sem ser necessáriofalar deTurio,fundadabastante

tarde,verificamos queascolónias gregasdaCampânia,

Posi-cidade

de Mileto foi reconstruída, em 479 a.C., depois da sua destruição totalpelosPersas em494,os habitantes tra¬

çaramumapantacómpletamente nova,emquadrícula, sem

tomaremconsideraçãoo seuanteriorordenamento.E,já

ante-riormente,os mesmosMilesianos

tinham

adoptadoamesma

configuraçãopara a suacolónia de Olbia, no PontoEuxino

(o Mar Negro), que fora devastada

por

um incêndio e que

eles tiveram de reconstruir completamente. Nada se opõe,

assim,aqueosarquitectosetruscostenhamsofridoainfluên¬ cia jónica: o que é verdadeiro para a escultura, para a ce¬

râmica, para apinturae para amitologia pode ser também

verdadeiroparaourbanismo.AsrelaçõesentreaEtruriae as

regiões orientais eram tão estreitas que esta hipótese não apresenta,emsi, nadadeinverosímil.

Atradição, apoiadanumabreve passagem deAristóteles,

rendeemgeralhomenagemaoarquitecto HipódamodeMileto

queexerceu a suaactividade por meadosdoséculoV.C.,pela

invençãoedivulgaçãodoplano geométriconomundo grego.

Mas asdatas contradizem-se.

Quando

muito podeadmitir-se

que ele foioseuprincipal divulgadoreointrodutornaprópria Grécia (nomeadamente no Pireu) assim comonas colónias fundadasnessaépocacomo, por exemplo, Túrio,colóniade

Atenas na Itália meridional (fundada em 443) e talvez em

Olinto(naCalcídica,a umacentenadequilómetrosasudoeste

da actual Salónica). A partir dessa altura, o plano

«hipodâ-mico», como foichamado, torna-se. habitual na fundação e

reconstrução das cidades,triunfandonoperíodohelenístico.

As escavações italianas efectuadas em Camiro, na ilha de

Rodes,dão-nos a conhecer uma cidadedeste tipo:dominada

poruma acrópole arcaica, ondese agrupamossantuários,a

cidade ocupaumaencostaligeiramentecôncava queseesten¬

de até ao mar.Asruaslongitudinais seguemaslinhasdemaior

declive enquanto as transversais se estendem segundo as

curvasde nível.O conjunto dáaimpressãodeum vastoteatro

cuja cenaseriamoportoeo mar. A mesmadisposição geral

encontra-seemPriene,naÁsiaMenor(fig.3) que foi com¬

pletamente reconstruídanofimdoséculoIV a.C., bemcomo

i

1

j

: ACfíÓp0\.l '

&

m.'

y&BíJr

!

NflplSfSS-'ÿ

(I DE3 1313ÍM]

Fig.3.

-

Planta de Priene

(16)

ASCIDADES ROMANAS AS CIDADES ROMANAS

donia(actualPaestum, a suldeSalerno) e aprópriaNápoles

foram concebidas segundoumplano análogo. Demonstrou-se,defacto, queahelénicaNeapolis (Nápoles)erapercorrida

por três viasprincipais orientadas de leste paraoeste e que

intersectavam, aespaços regulares, as ruasperpendiculares semelhantes aos cardines. De igual modo, a muralha de Paestumapresentaquatroportasprincipaisnasquais termi¬

navamquatro ruasdispostas emcruz, comoéevidente.Ora,

nem emNápolesnem em Paestumpodiaterhavido,naaltura

da suafundação(cercados finaisdoséculo VIa.C.), amais

pequena influênciaetruscaquefosse. Omesmo sepodedizer noqueserefereaSelinunte,naSicília, que foi inteiramente

reconstruída nosúltimosanosdo século V a.C.

Os Etruscos encontraram-seentão, aquando dassuas in¬

cursõesnaCampânia,perantecidades geométricas cuja moda se iria generalizar. Temos um exemplo em Pompeios, esta

cidadedaCampânia quea erupção do Vesúvio,em79 d.C.,

fossilizou, por assim dizer, e nos entregou quase intacta.

Pompeiaapresenta,também ela,umplanoemquadrícula (fig.

4) que não está orientado segundo as regras da disciplina

etruscamascujoparentesconão é, por isso, menos evidente

com o das cidadesetrusco-romanas. Tem-se hoje acerteza,

diga-seoquesedisser,quePompeiosnuncaconheceuqual¬

quer «fase etrusca» por insignificante que fosse. Pompeios

foi fundada, nos finais do século VIa.C.,pelaspopulações

indígenas, os Oscos, expostos à influência cultural directa das colóniasgregas dasredondezas. Os fundadores, fiéisaos

métodos dos engenheiros gregos, começaram por cercar a

suacidade comumamuralha em pedra decantaria de tipo

inteiramente helénico (5). Asportasinstaladasnaalturapro¬

vamquearedede viasurbanas jáera,nas suasgrandes linhas,

a que devia permanecer até aofim.

2

::

O

ÍCl

o| O\ V i-.fc.

lAúm

«i

C3 £ </) 2

Si

it

I

°

d & n o2

II

O

li

I

m

I!

fell

!

[â Q.

ír

OCD g

li

I

J

u

o

n

i

3

M

1

•S =>

8o L rr

I8l

g

1

1

<3<-8 ' S "D

I

SISll

'A

M

O

«

1

ro "5Í

li

O

.

1

«ÿi

1

i

I

ill

||

“H

S

11ÿ1

1

s

a

a

I

|

If-

5 Sá

(4)Gosta Salund,LeTerremare,Kund-Leipzig,1939, p. 233 eseguintes.

(5)A. Maiuri,«StudieRicerche sulla Fortificazione di Pompei»,em

Monu-menti Antichi...,XXIII(1929), p. 113-286; Id„«Grecied EstruschiaPompei»,

emAttidella Reale Acc.d'ltalia, 1944,p.121-149.

|

5

33 32

(17)

PRINCÍPIOS GERAIS DOURBANISMO ROMANO PRINCÍPIOSGERAIS DOURBANISMOROMANO

A análise

destas diversas

questõespermite,sem dúvida,

entrever as origens doplano das colónias etrusco-romanas.

Pareceevidente que osexemplosfornecidos,naprópriaItália,

pelas colóniasgregas,contribuíram largamenteparaassegurar

oseu êxito.Seríamosmesmolevadosapensarnaturalmente

que, sob a sua forma tradicional, talcomo o encontramos

aplicadonas colóniasromanas fundadas, apartir do século

IV a.C., à beira-mar (nomeadamente em Óstia, vd. fig.5),

ele resulta deumcompromissoentreas exigênciasdo ritual

easinovaçõesdosarquiteçtosgregos.Pelo ritual explica-se

a proeminência dadá ao cardo e ao decumanusprincipais,

mastodoorestoresultadeumatécnica

que

nãotemnada de

anormal em Itália.Mesmonessestemposrecuados,astrocas

culturaisecomerciaisentreasduas metadesdo mundo

medi-terrânicoerammais importantesdo que,hojeem dia, somos

levadosacrer.Como todaa suacivilização,ourbanismode

Roma é oresultado de

uma

sínteses fecundae não odesen¬

volvimento autónomo de sabe-se lá que entidade mítica e

preexistente.

it

!?

lis

<

J

53

3=3

f#

Z-E

V

x'

r

,§ CM

n

tfi

c3.cS!

'V §

r

u.ca|

1

A-í

LOJ) 3

£

£

1ÿ|

=

SG

-

0

J

//

11/

;

5

.1

7

3

ill

>

1

III

!<JO»

IMã

u §* «

C-|í|Ç

!

w

Ê7 £ -8 foes

/

l

Í5ÍI

ía

j\

g)

m

:

''r

I

u5 % /

a

l

p

u

-"I

(18)

-;

SegundoCapítulo

ODESENVOLVIMENTOURBANO DE ROMA

Se é verdadeque ás colóniasromanas nãopassavam,na

ideia dosseus fundadores,deimagens da metrópole),temos

denosinterrogarsobreospróprios princípiosquepresidiram

à criaçãoe aodesenvolvimentourbanodeRoma.

Aí, os dados arqueológicos e os factos históricos ainda

estão longe de ser claros. Háuma tradição segundo a qual

Roma foi fundadacerca do séculoVIII(em753a.C.,segundo

acronologiageralmenteadoptada)por colonos latinos vindos

daregião de Alba (auma trintenade quilómetros a leste de

Roma),sobocomando de doisirmãos,RómuloeRemo,que

edificaram no Palatino uma aldeia de pastores. Admite-se

tambémque Rómulo, depoisdeterusadoosauspícios,traçou

em torno da colina a vala ritual e que esse foi o berço de

Roma. Depois, como outras aldeias se tinham igualmente

instalado nas colinas vizinhas, todas acabaram, pouco a

pouco, porconstituirumafederaçãocomocentroemterreno

«neutro», napequenaplanície,oumelhor dizendo,nofundo do vale ondehojeseencontraoForum. Uma muralhacons¬

truídaem volta das diferentes aglomerações e

abrangendo--as atodas teria entãoacabado por conferir a sua unidade à

nova cidade. Assim, convém situar noPalatino a primeira

Roma,a«Romaquadrada»,aúnica conformeao ritual eàs

regras dafundação (').

(') Sobreestesproblemas verR. Bloch,Lesorigines de Rome,colecção

«Quesais-je?», n° 216.

1

(19)

AS

CIDADES

ROMANAS O DESENVOLVIMENTO URBANO DE ROMA

Mas

esta

tradição

depara com

muitos

obstáculos. Com

certezaque existiuaaldeiadepastores.noPalatinovisto que aíforamencontradosvestígiosdassuascabanas. Emcontra¬

partida,nãoexiste nenhum vestígioindiscutívelda primitiva

alha que teriasidoconstruídapelosseushabitantestalvez

pelo lendário Rómulo em pessoa. Tem sido em vão que se

procuram asportasnaextremidadedoque deveriatersidoo

clecumanuseocardo.Émuitoprovávelque a «cidadepala¬ tina» sejaumalenda que apareceu tardiamentepor razõesde

oportunidade política. Não se descortina, de resto, mesmo

no âmago datradiçãoqueacabámosdeexpôr,comoé que as

populações latinas teriam podido, já nessa altura, pôr em

prática rituais cujocarácter etrusco éinegável. Oranós sa¬

bemos, nos dias dehoje-o que os historiadores romanos,

porpatriotismo,nembem nem mal tanto seesforçaram por

esconder-, queRoma teveumperíodoetrusconaaltura em

que reinavam osTarquínios,umséculoemeio depoisda data

tradicionalmenteatribuídaàprimeira fundação,sendoacolina etrusca, por excelência, não o Palatino mas o Capitolino

(oficialmente denominado Monte Tarpeio, ou «monte dos

Tarquínios») e a cidade «orientada» e regular encontra-se

precisamente, e ainda reconhecível, no sopé da colina. Foi noForum,naplanície,queRoma foi fundadacomocidade.

Aí, com efeito, foi mantida a memória de quatro portas

muito antigas que,naépocaclássica,não teriamcabimento

mas que testemunham umasituação mãisremota.Umadelas

abria-seanortedo Forum. EraaPorta deJanus.Asul, ficava

aPorta Romana.Aleste, a que era chamada,naépocaclássica, a«Trave daIrmã»(poralusãoálenda dos Horácios.Foi por ali que o jovemHorácio, assassino de sua irmã, entrarana

Cidade efoi aí queterásidopurificadoapósasuaabsolvição

pelopovo). A oeste,umaporta «maldita», de mau augúrio,

alcandorada, poressa razão, numrochedoinacessível,noiní¬

cioda encostado Capitolinoequeestavasempre aberta, se

bem queninguémapudessefranquear,de ondeo seunome

de PortaPandana, a«Porta aberta». O decumanusera a rua

que viria mais tarde a ser a Via Sacra e o cardo uma via

transversal que, na época clássica, seprolongava, anorte,

pela Argileta, e, a sul, pela «Rua dos Etruscos», o Viscus

Tuscus.

Muito provavelmente foi assimque Roma começou:coló¬

niaetrusca,simplesmercadodominadoevigiado pelaguar¬

niçãoacantonadanasalturas do Capitolino. Aíseencontraram

pela primeiravez, emtomodoscomerciantes vindos daItália central e meridional, os habitantes das aldeias espalhadas pelas colinas vizinhas. Osal constituía, sem dúvida, um dos

principaisobjectosdo comércio,talcomoosprodutos fabri¬

cadosimportados do SuledaEtrúria.Depois,cercadosfinais

do século VIa.C.,quandoopoderioetrusco,fragilizado,se

confinou aonortedo Tibre, opovoromanoadquiriuainde¬

pendênciaeRomatornou-seumacidade autónoma.

Foi mais ou menos nessaépocaqueosseus reis construí¬

ram avastamuralha atribuídaaumdeles,Sérvio,eque ultra¬

passavalargamente oslimitesdaprópriapovoação.O«muro

Serviano» abrange,com efeito, as setecolinas tradicionais,

ouseja, além dos trêsmontes-Capitolino, PalatinoeAventino

-mais quatrocabeços alongados que,emboa verdade, não são mais do que prolongamentos do planalto Esquilino, e

quese chamavamQuirinal,Viminal,OppiuseCélio(fig. 6).

A disposição geral destas fortificações lembra a que já en¬

contrámos emVolsini.

Quer

num quer noutro caso trata-se

de defender um terreno cortado por pequenos vales tendo em conta apenas as necessidades militares.Há,por conse¬

guinte,umdivórcio totalentreacidade religiosa, fechadano

interior do seupomerium (2), e a cidade militar demarcada por uma cintura de muralhas de dimensões consideráveis.

Entre as duas ficaaverdadeira povoação, instaladanas en¬

costas, concentrada ao longodos caminhos que conduzem docentroparaas portas.Bemdepressadistinguimososquar¬

teirões em vias de formação: os patrícios habitam natural¬

mente oPalatino ouas alturasdo

Quirinal.

A arraia-miúda

amontoa-se no estreito vale de Subura entre o Viminal e o

mur

(20)

A ASCIDADES

ROMANAS

O DESENVOLVIMENTO URBANODE ROMA

A velhacidade orientada, totalmente orlada, continua a

ser ocentrodacidade. Éláque ficao Forwn

-

apraça pública

-

onde sãoconvocadas periodicamenteasassembleiaspopu¬

lares que serealizamnorecinto doComitium,especialmente

dedicadoàAssembleia eleitoral do povo romano. Não muito longe estáaCuria,o localhabitual de reunião doSenado.O

restodapraça está cheio de lojas:uma fiada, anorte,as

Ta-bemae Novae(ouLojasNovas),umaoutra,asul, asTabemae Veteres (as Lojas Antigas). Primitivamente, era no Forum

que serealizava oprincipalmercado,para a carne eparao

peixe. Pouco a pouco, aí se instalaram outras actividades

comerciais e, naépoca clássica, encontramos aí exclusiva¬

mentecambistas, ourives e.comerciantes depreciosidades.

Os mercados devíveresrecuaram e agruparam-se imediata¬

menteanortedo velhoForum.

OForumnãofoi a únicapartede Romaquepermaneceu

livrede construções.Mesmono interiordasmuralhas, o longo

vale que seestende entre oPalatino c o Aventinochamado

Valedo Grande Circo{CircusMaximus)ficou reservado para

acelebraçãodedeterminados jogosenomeadamentepara as

corridas de cavalos, um dos

rituais

mais antigosda prática

romana. Alémdisso, mesmoaopédas muralhas,imediata¬

mente a norte do Capitolino havia uma grande planície, a

mais vasta do local,que uminterdito religiosos excluía da

Cidade: consagradoaòdeus da guerratinhaonomedeCampo

de Marte {CampusMartius). Limitada a sul pela muralha

quecoroavaaabruptaescarpado Capitolinoe,depois,ado

Quirinal, terminava, a oeste, na margem dorio e, anorte e

nordeste,juntoaosprimeiros declivesdoOuteirodas hortas

(actualmente o Pincio). A lendapretende que essaplanície

pertenceu aos últimos reis de Romaeque, apósa expulsão

dos tiranos, foi«nacionalizada»,ouseja,dedicada exclusiva¬

mente aoserviçodaçolectividade. Era lá que seagrupavam

ossoldados eque os.jovens faziama aprendizagemdavida

militar.

Quando

aevoluçãodasinstituições republicanaslevou

osRomanosaconsideraremcomoamaisimportantee aúnica

eficaz das suas assembleias populares a que agrupava os

*ÿ soo 1000mI

.1

vÇ: Planíciedo Vaticano XSr rtaSVW£g, roÿa

dr

m

(m

& Campo de

vp

Marte \\

\\

\

Ar Capltoliqrtf

A

g

RUM OppjuS VLATII 'mal

4l

«!?//

*

% L » 'ENTI

1

YJt

"

m

"i

wt

Fig. 6

-

Planta de Roma

Oppius. São sobretudoos plebeus que habitam o Aventino

cujaposiçãopouco central o votoudurante muito tempo a

só receber umapopulaçãomuitadispersa.Nadepressãoentre

oCapitolinoeoPalatino, duasruascomerciais,o Vicus

Ju-gariuseo Vicus Tuscus,estãoladeadasporlojasequitandas

ondetrabalhamos artesãos.Nas margens do Tibre

encontram--seas feiras,nolocalondeacampamosboieiroseondede¬

sembarcamosmarinheirosque sobemorio.Aí estãoo«mer¬

cado dosbois»{ForumBoarium), o«mercado das hortaliças»

{ForumHortus)e,embreve, aparecerá oportode Roma,o

Emporium.

I

(21)

ODESENVOLVIMENTO URBANO DEROMA

ASCIDADESROMANAS

territórios situados na margem direita do Tibre. Este

últimodesenvolvimentosó seproduziutardiamente.Sebem

que Roma seja,nosnossos dias, umacidadefluvial, oTibre

parece,primitivamente,ter sidomais factordeatrasodoque

dedesenvolvimento. A primeiraponteconstruída pelos Ro¬

manos por cima das suas águas tinha apenas como função

permitir

um acesso fácil ao bastião avançado de defesa instaladonoalto dacolina Janículo: inteiramentede madeira,

podiaserrapidamente destruídaem casodealerta.Durante

séculos, aolongo de todootempoemqueosEtruscos foram

senhores da margem direita,Romapermaneceu obstinada¬

mente fiel à protecção que o rio lhe proporcionava e não poderia ser,de forma alguma, considerada, pelomenos nas suasorigens,como uma«cidade-ponte». Ocoraçãoda Cidade estánoForumenãonorio.

cidadãos

em centúrias, era no Campo de Martequesereali¬ zavamasreuniõescenturiaiseque,por conseguinte, se pro¬

cedia às eleições e à votação das

leis.

Dessemodo,o velho Comitium foi abandonado no momento preciso em que se tomoudemasiadopequeno paracomportaracrescentemulti¬

dão decidadãos.

A cidade republicana articula-se e ordena-se,então,

voltadoForum. Oplano«orientado» deixadeserperceptível. O cardoeo deeumanusperdem-se sobolajedo da praçae,

pouco a pouco,começaa desenhar-seumplano emestrela.

As ruas,divergindoapartirdasquatro portasprimitivas, diri¬

gem-separaasdo recinto serviano(*) edesenhamumarede

radialquepassaráaser,apartirdaí,aestruturadacidade. Na

Porta deJanus nascem duasviasprincipais,a Vicus Longus

(a Rua Comprida) que atinge a Porta Colina seguindo os

declives do

Quirinal

e, daí, se dirige para a região sabina;

depois,aRuadeSuburaque,subidooEsquilino dá acesso à

região latina,pelaPorta Esquilina.Na extremidade oriental

do deeumanus liga-se,como era dc esperar, arua que leva,

pela Porta Capena, ao antigo santuário federal dos montes Albanosonde, todososanos,umaprocissão conduzida pelos

mais altos magistrados ia, aquando daSFeriaeLatinae(festas emhonrade Júpiter),ofereceraJúpiterumsacrifíciosolene. A estas estradas primitivas embrevesejuntaram outras

novas, à medidaqueaumentavamasrelações deRoma

asregiões vizinhas. Foi ocaso, para onorte,da Via Lata (a

Rua Larga), queatravessavaoCampo deMartee quemais

não era do que o trajecto urbano da estrada (chamada Via

Maminia,do nomedoseuconstructor)que punha Roma

comunicaçãocom as suasprimeiras conquistas setentrionais.

Para sul, a Estrada de

Óstia

(Via Ostiensis) que nascia

porto deRoma, contornava o Aventino e se dirigia para o

mar.Finalmente,aparecendobastante maistarde,asestradas

queatravessavamorio,nosopédoCapitolino,e penetravam

nos

!

em

Nointeriordarede formadapelas grandesvias,osedifícios públicoseprivados desenvolveram-se durante muitotempo

que sepudesse discernir umplano bemdefinido.Não

parece que Roma,nos séculos V ouIV antes danossa era,

tenha sido dividida em «quarteirões» regulares. Todavia,

desdeoiníciodesteperíodo,vislumbra-seumatentativa para ordenarocentrodaCidade.

Oprimeiro esforçoincidiuna drenagemdo Forum.Para estefundodovale convergiam todas as águas provenientes

das colinas e,por vezes,também ascheiasdo Tibre sejun¬

tavam ao pântano. Para secar apraça foi aberto um canal,

primeiro acéu abertoe depois

-

talvez apartir do século II

a.C.,talvez maistarde-dissimuladosob umasólidacobertura

abobadada.EraaCloacaMaxima, ograndeesgotode Roma

cujos restos ainda subsistem. Um lajedo cobria o solo da

praçaehouve apreocupaçãodelhe dar umaformaregular.

Apartirdoséculo V a.C.,renunciou-seaorientá-losegundo

0

antigo

deeumanus

que

não

seguia

uma

linha

natural

do

i

sem

com

cm

no

ORecinto rodeado por fortesmuralhasmandadas construirporSérvioTúlio,

(22)

]

AS

CIDADES

ROMANA?

ODESENVOLVIMENTO URBANODE ROMA

terreno e tomou-se como base o sopé do

Capitólio

(fig.7).

Aconstruçãodo templo deSaturnobem comoadoTemplo

de Castor

indicam

o

delineamento

do

conjunto e põem as

primeiras

balizas,

mas é sóno

início

do séculoIIa.C.que se

recomeçou

o lado norte dapraça quando se

começaram

a

edificar as grandes «basílicas». Com aBasílica Emiliana,o

Forumficatal qualo vemosagora,umvastoconjuntomonu¬

mental de planta sensivelmente rectangular (mas já não

«orientado»,ecom o novo alinhamento fazendoumângulo

notável com a mais antiga Via Sacra) que domina os dois

picosdomonteCapitolino.Asul,opicoCapitoliumpropria¬

mentedito,coroado pelo Templo deJúpiter OptimusMaxi¬

mus,centroe símbolodopoderioromano:anorte,o Arx(a

Cidadela), com o templo dc Juno Moneta. No princípio do séculoI a.C.,o ditador Sil.aligou0 Capitolium e oArx por

umsoberbo monumentoque deucomo queuma fachadaao

conjunto da colina e um «pano de fundo» ao Forum. Este

monumento chamado Tabularium, pois se destinava a con¬

servar os arquivos oficiais (as tabulae), chegou até nós. E

sobre os seus enormes envasamentos que Miguel Angelo

apoiaráos seuspalácios:

A últimaetapa no arranjo da praça foi a construção por

César da imensa Basílica Juliana destinada aproporcionar,

parasul,umasimetriacomaBasílicaEmilianae,daíemdiante

eaté aofimdoImpério,oForumpermaneceu inalterado.

Vê-se quão lentamente evoluiu o centro da Cidade. Até

ao fim da República, o urbanismo romano permaneceu

bastante atrasado não apenas relativamente ao das cidades

orientais mas também ao das cidades da Itália meridional.

Só em 54 a.C. é que foi inaugurado o primeiro teatro em

pedraconstruídoemRoma. Claro que. desde há mais de dois

séculos, todosos anos oprogramadosjogos incluía diversas

representações teatrais, mas umvelhocostumedeterminava

que as comédias e as tragédias fossem representadas em

teatros de madeira que se desmontavam depois das festas.

Pompeio, o Grande, sentiu-se súficientemente forte para

desprezar aresistência deum

Senado

tradicionalistaecons¬

truiu noCampo deMarte um teatro semelhante aos que, já

desde há muito tempo, existiamnascidades da Itália meri¬

dional. Menos de dez anos mais tarde, César projectava

construir um segundo mas a morte impediu-o de consumar

taldesidério.É Augusto,seu filhoadoptivo,quemretomao

: 0ÿ3

m

H

_Arcu# •V* 2A co Z

*

CC 22 00

NE

;

fno=

W

ZnC m -<

O Z o o !ÿ?-!, o § 'O 5U

.

£ -3 § -§-2 2 2

M

maslk

c > !

'

o.íçassí

!*í

ilÿJ

r—

sis

li

J

£ -S

I

. ' O t- -3-a. V n<%

ífS? //m

ri¬

ll

a

M

ê

-ÿs

m

ff

X

iii|

1

“o:

f e

>r*Mt

W/'

TO* "IPOWTICUS*" MARCARI TARIA

A• «a o so m.t

::

___1n \—rn

*

II

j.»C°KfTANTIWI 0 10 20 30VO 44 45

(23)

ODESENVOLVIMENTO URBANO DEROMA

AS CIDADES ROMANAS

Augusto,pararemediarisso,tentouencontrarterrenospara

construçãonolongínquoplanalto dos Esquilose,para isso,

acaboucom ovelho cemitérioqueexistianoexteriorda mu¬

ralha servianaoquefoiopiorquepodiafazer. De imediato,

alguns grandes senhores(entreosquaisMecenas,parentede

Augusto,deuoexemplo) construíram aí magníficos palácios;

todavia os Ésquilos ficavam demasiado longe do centro e

tornaram-se sobretudo um bairro de parques e jardins. A

grandemole doshabitantes teve de continuar aencaixar-se

emprédios que procuravam compensaremalturaoquelhes faltavaemsuperfície.Estas insulae apareciamemtodos os

sítios possíveis: nas escarpas abruptas do Capitolino oudo

Quirinal

e naspartesdoCampodeMarte que acabarampor serabandonadasoucedidas aosparticulares.Asantigas forti¬ ficações foram destruídas paradar lugar ahabitações. Toda¬ via, apesar de todosestes esforços,Roma continuou, atéao fim,a serdemasiado pequena.

ComoImpérioe aconstituiçãodeumpoder forte

tomava--sepossívelactuarmais eficazmentesobreaCidade. Também osImperadoresnão sepouparamaesforços paraa embelezar e dar à vida públicaumenquadramento digno da grandeza

romana.Mas é sobretudono centroque a sua acção incide.

Assim,oForumJulium,ou Forumde César,serviu-lhesde

modelo tornando-se o primeiro de uma série de conjuntos monumentais, comunicantesentresi, quesedesignam sobo nomecolectivode Foraimperiais(fig.8). Nelesseenglobam

aspraças, deformasdiversas,construídas sucessivamente por

Augusto,Vespasiano,Domiciano,NervaeTrajano.Nocentro

de cada umaelevava-seumtemploconsagrado àdivindade

queopríncipehonrava comumadevoção particular.Emvolta

de cada uma, as colunatas ofereciam aos passeantes, aos

ociosos,aos comerciantes,tantosombracomoabrigocontra

asintempéries.Os anexos foram transformadosemsalas de

conferênciasoude leituras públicas,bibliotecas,escritórios afectos a diversos serviços oficiais. O mais recente destes

Fora

,

oForumerigidopara Trajano pelo arquitecto

Apolo-doro de

Damasco,

foi completado por

um

hemiciclo

para o

projectoeoexecuta,passadosvinteanos,dedicandooedifício

àmemóriado seuprópriosobrinho,ojovem Marcelo.

O problema principal que então se passa a pôr aos

Romanosé menos odeconstruiredifíciospúblicos doque o de encontrar espaços livres.Roma tinhapermanecido

pequena cidade aomesmo tempo que se tornava capital de

umimenso Império.Onúmero dos seus cidadãos tinhacres¬

cido

desmesuradamente

masosinstrumentosda vidapública

continuavam ainda,no fimdaRepública, a ser aquilo que

eramdois séculosantes.O velho Fórumestavaatravancado; número semprecrescentede processos era apresentado aos tribunais que reuniamao ar livre,na praça pública. As duasbasílicasjánãoeramsuficientespara acolhervisitantes

ehomensde negócios. Assim, desde que seassenhoreoudo

poder,Césarapressou-seadelinear uravastoplano de urba¬ nismo.Verificandoqueoproblema seriafacilmenteresolvido

se seaceitassevoltaraignorarovelhointerditoeaocupar o

CampodeMarte,oditadordecidiudesviarocursodo Tibre

efazê-lopassar nosopé da colina Vaticana. Desse modoseria

anexadauma grandeplanície ondesecriariaumnovo«Cam¬

po deMarte». O antigoseriainteiramenteconstruído aosabor

dasnecessidadesdosparticulares.Alémdisso,oantigo Forum seria reforçado com um outro, niaís moderno, concebido segundoomodelodas agorai\aspraças públicas) das cidades

gregas.

Aindaosúltimos combatesem Áfricáe emEspanhanão

tinham terminadoejáoprojectoestavaemvias deexecução.

Césarmandaracomprar por

elevadíssimo

preçoos terrenos

privadosnas vizinhanças do Fórum.Começou-se

leitoartificialparadesviarorio. Mas, depoisdos Idos de

Março,oque haviademaisoriginalnoplano,a anexação da

planíciedoVaticanoea«recuperação»doCampodeMarte,

foi abandonada sob opretextodeescrúpulos religiosos.Ape¬ nas seefectuoua construçãodo novo Forum terminado por Augusto queodedicou à memória do seupai adoptivo.No

entanto, oproblemaprincipalnãoficararesolvido:Roma con¬

tinuavaaterfaltadeespaço.

uma um

!

í aescavar um :

Referências

Documentos relacionados

Não poderá ser eleito Diretor quem já tiver completado 75 (setenta e cinco) anos na data da eleição. 8º - ATRIBUIÇÕES E PODERES DOS DIRETORES – Dois Diretores quaisquer,

Descrição: Acompanhamento de atividades presenciais em polo de educação a distância do Programa. Universidade Aberta do Brasil

Realizou-se estudo do tipo ecológico com o objetivo de investigar o perfil sociodemográfico e epidemiológico, a frequência de casos, os indicadores epidemiológicos

A maneira expositiva das manifestações patológicas evidencia a formação de fissuras devido a movimentação térmica das paredes, Figura 9, que não foram dimensionadas com

O cenário atual das políticas públicas de saúde, como a criação dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família em 2008, tem favorecido a ampliação das ações fonoaudiológicas no

Graças ao apoio do diretor da Faculdade, da Rede de Museus e em especial da Pro Reitoria de Extensão, o CEMEMOR tem ampliado e mantido suas atividades junto

De seguida, vamos adaptar a nossa demonstrac¸ ˜ao da f ´ormula de M ¨untz, partindo de outras transformadas aritm ´eticas diferentes da transformada de M ¨obius, para dedu-

O presente trabalho tem por objetivo pesquisar dados do Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC), especificamente do Campus Canoinhas, sobre a gestão de patrimônio no tocante