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Análise do Vocabulário Político em Documentos do Século XIX

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Academic year: 2021

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Análise do Vocabulário Político em Documentos do

Século XIX

Ana Jaci Mendes Souza CARNEIRO* Resumo: O presente trabalho tem como objeto de estudo duas correspondências

pessoais trocadas entre políticos no final do século XIX. Estes documentos pessoais integram o corpus da pesquisa “Documentação de Feira de Santana: um trabalho lingüístico-filológico”. Nestes textos, percebe-se que as mudanças lingüísticas estão intimamente ligadas aos processos e às modificações sócio-culturais de uma sociedade. É importante observar que uma língua, seja ela qual for, não se realiza de maneira uniforme no território em que é usada, causando com isso o aparecimento de variações, sejam estas de ordem geográfica, profissional, etária ou social. A partir da edição semidiplomática destes dois documentos: 1 – Correspondência pessoal datada de: Rio Vermelho (Salvador), 17 de março de 1899; 2 – Correspondência pessoal datada de Rio (de Janeiro), 9 de novembro de 1899, far-se-á a análise das ocorrências lexicais próprias da classe política. As correspondências foram trocadas entre dois políticos que, apesar de terem vivido no século XIX, deixaram marcas na história não apenas da cidade de Feira de Santana como na do Estado da Bahia, visto que um deles – Severino Vieira – foi governador do estado o outro – José Freire de Lima – foi prefeito de Feira de Santana. O estudo do vocabulário de uma determinada categoria profissional revela o uso de expressões típicas, pois a comunicação entre especialistas de uma determinada área se desenvolve através de suas próprias convenções lingüísticas. Neste sentido, apresentar-se-á o glossário político, o que representa uma contribuição para aqueles que se apóiam sobre áreas especiais.

Palavras-chave: Edição Semidiplomática; Vocabulário; Semântica.

Resumen: El presente trabajo tiene como objeto de estudio dos correspondencias

personales permutadas entre políticos en el final del siglo XIX. Estos documentos integran el corpus de la pesquisa “Documentación de Feira de Santana: un trabajo lingüístico-filológico”. En estos textos, se percibe que los cambios lingüísticos están íntimamente relacionados a los procesos y las modificaciones socio culturales de una sociedad. Es importante observar que una lengua, cualquier que sea ella, no se realiza de manera uniforme en el territorio que es utilizada, causando con eso o aparecimiento de variaciones, sean estas de ordenen geográfica, profesional, de edad o social. A partir de la edición semidiplomática de esos dos documentos: 1 – Correspondencia personal fechada de: Rio Vermelho (Salvador), 17 de marzo de 1899; 2 – Correspondencia personal fechada de Rio (de Janeiro), 9 de noviembre de 1899, se hará el análisis de las ocurrencias lexicales propias de la clase política. Las correspondencias fueron cambiadas entre dos políticos que, a pesar de haber vivido en el siglo XIX, dejaran huellas en la historia no apenas de la ciudad de Feira de Santana como en la historia del Estado de la Bahia, visto que un de ellos – Severino Vieira – fue gobernador de estado e el otro – José Freire de Lima – fue alcalde de Feira de Santana. El estudio del vocabulario de una determinada categoría

*

Graduada em Letras com Espanhol pela Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS. Membro do grupo de pesquisa “Edição de Textos” (Diretório dos Grupos de Pesquisa – CNPq). Trabalho realizado sob a orientação da Profª. Dr.ª Rita de Cássia Ribeiro de Queiroz.

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profesional revela el uso de expresiones típicas, pues la comunicación entre especialistas de una determinada área se desenvuelve a través de sus propias convenciones lingüísticas. En este sentido, se presentará el glosario político, lo que representa una contribución para aquellos que se apoyan sobre áreas especiales.

Palabras-llave: Edición Semidiplomática; Vocabulario; Semántica.

1 INTRODUÇÃO

O surgimento da escrita trouxe para o homem a oportunidade de ampliar sua comunicação porém, com o decorrer do tempo surge a necessidade de preservá-la e é a partir desta necessidade que aparecem as bibliotecas como um modo não apenas de guardar estes documentos como também uma forma de organizá-los. As mais antigas bibliotecas surgiram na Mesopotamia e no Egito e suas coleções eram formadas por placas de argila e conjuntos de documentos em papiro, e poucos eram os que tinham acesso a estes documentos.

Na alta Idade Média, as bibliotecas ficavam nos mosteiros e conventos e lá os manuscritos eram conservados, lidos, copiados, traduzidos e ilustrados por eruditos que lá trabalhavam. Porém, com o passar do tempo surgiram bibliotecas abertas à visitação pública e isto ocorreu a partir do momento em que os escritos passaram a ser produzidos em grande escala dando assim, a oportunidade a todos que quisessem aumentar seus conhecimentos nas mais diversas áreas.

Se por um lado a produção de livros em grande escala trouxe inúmeros benefícios aos homens, por outro, os manuscritos mais antigos foram de certa forma esquecidos e com isso, muitos documentos antigos se perderam devido à falta de preservação. Por isso, o trabalho do filólogo é tão importante para a sociedade, pois, é através das edições de documentos antigos que a sociedade pode voltar a ter acesso a informações de extrema importância no que diz respeito à sua história, pois, é sabido que toda escrita traz uma carga muito grande da história de um povo.

A partir da análise de duas correspondências pessoais datadas do final do século XIX, observar-se-ão as mudanças ocorridas no vocabulário político daquele século, fazendo um paralelo com o atual.

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2 AS CORRESPONDÊNCIAS PESSOAIS

Estas correspondências pessoais pertencem ao Acervo do Monsenhor Galvão, sob a guarda do Museu Casa do Sertão, órgão da Universidade Estadual de Feira de Santana. Documentos relativos ao período compreendido entre os séculos XVII e XX, ricos em informações não apenas para professores e alunos da área de Letras como também para aqueles que se interessam pela história, pois, traz informações preciosas sobre o desenvolvimento político e social da cidade.

3 DESCRIÇÃO DOS DOCUMENTOS

3.1 CARTA DO RIO VERMELHO, 17 DE MARÇO DE 1899

Escrita em tinta preta, em letra humanística cursiva, em única coluna, em papel de linho medindo 226mm X 175mm. Linhas da mancha escrita: fólio 1rº - 15; fólio 1vº - 16; fólio 2rº - 17; fólio 2vº - 11. No fólio 1rº, no ângulo superior esquerdo, há o carimbo do emitente, na margem superior números ordinais escritos posteriormente e na margem esquerda carimbo também colocado posteriormente. O documento está em bom estado de conservação, apresentando rasuras apenas no fólio 2vº nas últimas linhas da mancha escrita e desgaste nas bordas superiores e inferiores.

3.2 CARTA DO RIO, 9 DE NOVEMBRO DE 1899

Escrita em tinta preta, em letra humanística cursiva, em única coluna, em papel de linho medindo 155mm X 80mm. Linhas da mancha escrita: fólio 1rº - 12; fólio 1vº - 15; fólio 2rº - 16; fólio 2vº - 20. Foi utilizado papel timbrado, localizado no ângulo superior esquerdo, do Gabinete do Ministro da Indústria. À margem superior, aparecem números colocados posteriormente e à margem esquerda, carimbo também colocado posteriormente. O documento apresenta bom estado de conservação, faltando apenas um pedaço da margem inferior direita do primeiro fólio.

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4 TRANSCRIÇÃO DOS DOCUMENTOS

Apresentar-se-á, a seguir, a transcrição semidiplomática dos manuscritos, com a intenção de mostrar o vocabulário político comum na escrita do século XIX.

fl 1rº

Rio Vermelho, 17 de março de 99

Ilustríssimo Senhor Freitas

Estimo a continuação de seu

bem estar em companhia de sua Excelentíssima 5 Familia.

Constando-me que você tem tem propagado que vou fixar a mi- nha residencia aqui na Capital onde me acho por encommudos 10 de saude, e que, por isso, tenho

de fazer escolha de quem me

substitua na futura Intendencia que você não concordará com

a minha escolha de candida- 15 to para o dito cargo e neste

fl 1vº

Caso você se proporá, não con-sentindo em eleição feita a bico de penna!

Admira-me muito disso 5 quando voce sabe mais de que

ninguem, que nunca fisemos eleição por tão deprimente sis- tema e muito mais ainda da sua transformação e das

10 suas dezarrasoadas pretenções, quando vivemos sempre na melhor harmonia. Eu considero isso como uma verdadeira indisciplina partidaria, mas as opiniões, muitas vezes um- 15 dão-se por vaidade ou interesses

mal entendidos e por isso venho

(5)

fl 2rº

por meio desta exigir-lhe toda a franqueza, para como chefe de partido nessa localidade, tomar providen- cias que o cazo merece. Sou 5 patriota e só almejo o bem e o pro-

gresso da minha terra, para o que tenho emprega[do] todas as minhas forças e a minha boa vontade,

co[m]o você e todos os nosso amigos 10 são testemunhas, e quando por circuns-

tancias outras, deixa de continuar a prestar os meus serviços na Inten- dencia, Deus há de permittir, que possa faser uma escolha de candidato 15 a esse cargo de confiança popular

que continuará, quando investido do cargo nas minhas ideias e propos[tas]

fl 2vº

que é o progresso dessa terra.

Conseguintemente, entendo que amigo algum deixará de concordar comigo, não podendo como não posso, admitir 5 emquanto investido do cargo de chefe

politico, que alguem, por ameaças queira impor-[me].

Seja franco e [...] Sem mais

10 Seo (...) obrigado

José Freire de Lima

fl 1rº

Rio 9 de novembro de 1899.

Meu Prezado Amigo Coronel Ruy

Muita saude e felecida- de cordialmente appete 5 ço-lhe e a sua Excelentíssima

Familia a quem respeito- Samente visito –

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solicitando suas noti- 10 cias e as que possam

interessar a nossa terra. O nosso amigo Vianna

fl 1vº

em conversa aqui commigo manifestou-se sempre avesso ás olygarchias – Deu-me a perceber que eu é que tinha 5 direito de ser indicado para

succedelo = Bondade d’elle; nunca me julguei com tal direito e agora muito menos que as cousas ahi cada vez 10 se difficultam mais –

Entretanto, falava elle tambem Em consultar a opinião

dos municipios, ideia que parecendo-me muito acerta- 15 da, não posso deixar de

fl 2rº

applaudir – Já foram com_ sultados os municipios d’es as [...]? Como pensão, elles? Se não foram consultados, qual 5 a sua previsão?

Confio na sinceridade de sua discreção para faser-lhe uma confidencia – Não apoio ser governador da Bahia; mas 10 voto para que só o seja

cidadão capaz moral e in_ telectualmente e que tenho a consciencia da propria res ponsabilidade. Não creio que 15 o Vianna me faça uma sur

presa, mas se o fiser, rompo,

fl 2vº

sejam quais forem as conse quencias aterando meu humil- de nome na lucta.

Não creio que isso succeda, mas 5 devendo estar previnido quero

que esteja de tudo inteirados os amigos em que confio –

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O que pensa o amigo a respeito? Dê-me sua opinião franca, não 10 [va] ficando pesar nenhum da sua Franquesa, perque não sou um as pirante. Só do que faço ponto de honra é da sua discreção.

Se achar meios e conveniencia 15 Dê a entender alguma cousa ao nosso amigo José Freire e diga- me as impressões d’elle.

Desponha do amigo affe[tuosamente] e obrig [...]

20 Severino Vieira

5 ANÁLISE DO VOCABULÁRIO POLÍTICO

Durante a análise foram feitas comparações e investigações em dicionários etimológicos a respeito do vocabulário encontrado para uma melhor compreensão da mensagem escrita. Nos documentos analisados encontram-se termos como: Intendencia, Olygarchias, aterando, conseguintemente e expressões como: eleição feita a bico de penna, e ponto de honra.

Para uma melhor compreensão, estas palavras e expressões serão mostradas dentro de seu contexto e seus respectivos significados:

Aterando – De a e terar, no sentido de puxar (do francês tirer), lançar, (do espanhol, tirar)

“Não creio que o Vianna me faça uma surpresa, mas se o fiser, rompo, sejam quais forem as consequencias aterando meu humilde nome na lucta”.

Olygarchias – governo de poucas pessoas / do latim oligarchia.

Contexto: “em conversa aqui commigo manifestou-se sempre avesso ás olygarchias”.

Ponto – do latim punctu, picada. Um ponto é um sinal deixado por uma picada. Honra – verbo; conferir honra, respeitar, dignificar, dar crédito a.

→ Os dois vocábulos juntos, no contexto da carta, trazem o significado: “fazer questão de”.

Contexto: “Só do que faço ponto de honra é da sua discreção”.

Intendencia – 1813, exercer vigilância, superintender (do francês indendence)

→ Intendencia era o termo utilizado para se referir à Prefeitura e Intendente era o prefeito da

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Contexto: “...por isso, tenho de fazer escolha de quem me substitua na futura Intendencia”.

Eleição feita a bico de penna → neste caso refere-se a uma escolha feita sem uma eleição de

fato mas, por indicação.

Contexto: “...que você não concordará com a minha escolha de candidato para o dito cargo e neste caso você se proporá, não consentindo em eleição feita a bico de penna!

Conseguintemente - idéia de seguir.

Contexto: “Conseguintemente, entendo que amigo algum deixará de concordar comigo...”

Como se trata de uma edição semidiplomática foi respeitada a escrita original do manuscrito. Neste tipo de edição é permitido desdobrar abreviaturas, e estas foram desdobradas para facilitar o entendimento. Faz-se necessário destacá-las do texto para que fique claro que houve alterações do editor. Os sinais diacríticos foram respeitados e não foi acrescentado nenhum outro que não constasse no original.

Por se tratar de correspondências trocadas entre políticos do século XIX, percebe-se nelas as usuais intrigas políticas que marcam a história de nosso país. Desde este período já existiam os complôs e acordos para beneficiar um determinado partido ou, como é bastante perceptível nas duas cartas, um grande desejo pela satisfação dos próprios interesses.

No campo do vocabulário político, ao compará-los com o atual, percebe-se que houve um processo de transformação e que alguns dos termos muito utilizados naquela época já não constam mais no vocabulário atual, como é o caso de intendencia, oligarchyas, ponto de honra, etc.

6 CONCLUSÃO

Através de estudos feitos em documentos antigos, percebe-se que o conhecimento das condições lingüísticas e extra-lingüísticas que caracterizam a história de uma língua é de grande utilidade para uma melhor compreensão do dinamismo que é inerente à linguagem e isso ocorre porque a história de uma língua está intimamente ligada à história do seu povo e aos acontecimentos de natureza social e política. É importante destacar que documentos como estes trazem um grande leque de oportunidade de estudos e que esta análise vocabular não esgota todas as possibilidades pois, através dos mesmos podem ser feitos outros tipos de estudo como análise do discurso, análise sócio-cultural, além de tantas outras que existem nas mais diversas áreas como história, política, literatura, direito, etc.

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REFERÊNCIAS

ACIOLI,Vera Lúcia Costa. A escrita no Brasil colônia: um guia para a leitura de documentos manuscritos. Recife: Ed.da UFPE/Massangana, 1994.

AULETE, F.J.C. Dicionário contemporâneo da língua portuguesa. Lisboa, 1881.

BECHARA,Evanildo. Moderna gramática portuguesa. Rio de Janeiro. Ed. Lucerna, 2002.

BOTTERO, Jean ; MORRISON Ken et al. Cultura, pensamento e escrita. São Paulo: Ática,1995.

CUNHA, A.G. Dicionário etimológico Nova Fronteira da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Século XXI, o dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro. Nova Fronteira, 1999.

MACHADO, J. Dicionário etimológico da língua portuguesa. 3. ed. Lisboa: Livros Horizonte, 1977.

QUEIROZ, Rita C. R. de. Edição diplomática de documentos históricos feirenses. In:

Estudios de lingüística española, v. 13, 2001.

Referências

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