MEMÓRIAS DO MAGISTÉRIO: IDEALIZAÇÃO DO PASSADO E EXERCÍCIO DA PROFISSÃO NO PRESENTE

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Texto integrante dos Anais do XX Encontro Regional de História: História e Liberdade. ANPUH/SP – UNESP-Franca. 06 a 10 de setembro de 2010. Cd-Rom.

MEMÓRIAS DO MAGISTÉRIO: IDEALIZAÇÃO DO PASSADO E EXERCÍCIO DA PROFISSÃO NO PRESENTE

Débora Menengotti Ferreira

Sérgio César da Fonseca (orientador) Programa Ensinar com Pesquisa Projeto em andamento

Palavras-chave: memória – docência - história da educação

1. Introdução

“Memórias do magistério: idealização do passado e exercício da profissão no presente” é o tema do projeto financiado pelo Programa Ensinar com Pesquisa, da Pró-Reitoria de Graduação. Em linhas gerais, o objetivo maior deste estudo é confrontar a memória do exercício do magistério no passado com as concepções do presente que avaliam o exercício dessa atividade atualmente. Para que esse confronto de concepções seja possível faz-se necessário ir ao encontro de professores que, segundo o recorte temático e cronológico deste projeto, atuaram nas décadas de 1960 e 1970 na educação pré-escolar e primária pública em Ribeirão Preto, e, também, de alunos do curso de Pedagogia, que, em relação aos primeiros, estão mais próximos do contato com o exercício no magistério no tempo presente em razão dos estágios curriculares e por já exercerem algum tipo de atividade em ambiente escolar, a exemplo dos estágios remunerados.

Trata-se, portanto, de aproximar duas gerações, uma delas atuante num tempo em que a educação infantil iniciava em Ribeirão Preto, a exemplo dos Parques Infantis criados na cidade durante a década de 1950, e a outra prestes a se credenciar a atuar no magistério num cenário pós-LDB de 1996. Um dos meios para colocar em contato duas gerações é a memória produzida pelo grupo de professores que já percorreu os caminhos da educação infantil; outro meio são os documentos que remetem às condições em que esse processo aconteceu - as vicissitudes, os avanços e os limites presentes na produção da rede municipal de pré-escolas e escolas primárias. Com isso, memória e documento passam a representam duas vias de acesso à experiência da produção da educação infantil e primária pública na cidade.

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Haveria, portanto, expressões materiais e mentais da memória, equivalendo as primeiras ao binômio documento/monumento de Jacques Le Goff (1994), enquanto que as outras teriam nas imagens, no imaginário, nas idéias, nas narrativas orais, alguns de seus exemplos. Os documentos seriam os “materiais da memória”, equivalentes à “uma montagem consciente ou inconsciente, da história, da época, das sociedades” que os produziram (LE GOFF, 1994, p.547). Para Le Goff o documento adquire esse estatuto por ser escolha do historiador, ao passo que o monumento “tem como características, o ligar-se ao poder de perpetuação, voluntária ou involuntária, das sociedades históricas”, tonando-se “um legado à memória coletiva” (LE GOFF, 1994, p. 536).

A reconstrução do passado, trazida para o presenta, deve funcionar “a partir de dados ou de noções comuns”, segundo Halbwachs (2006, p. 39), “que estejam em nosso espírito e também no dos outros”. Essas memórias compartilhadas, escreveu Halbwachs (2006, p. 39), “estão sempre passando” do sujeito para o grupo e vice-versa, “o que será possível somente se tiverem feito parte e continuarem fazendo parte de uma mesma sociedade, de um mesmo grupo”.

Desde que a educação passou a ter a escola como seu quase exclusivo espaço de realização nas sociedades contemporâneas, os prédios escolares e sua arquitetura, os livros, os materiais escolares, entre outros objetos, podem ser aproximados do conceito de documento/monumento de Le Goff, bem como as lembranças instituídas por gerações de professores, seus relatos e os acréscimos de outros agentes escolares seriam comparáveis à forma como Halbwachs conceituou a memória coletiva.

E quem são os destinatários das memórias instituídas pelos documentos e monumentos e pelos grupos? Tangenciando a generalidade de uma resposta possível a esta questão, no caso tratado por este projeto, certamente as novas gerações de professores que saem dos cursos de formação e ingressam na atividade docente estarão em contato com certas expressões da memória, seja pelas idealizações de seus colegas com mais tempo na profissão, ou a própria história instituída pelos órgãos oficiais.

2. Justificativa

Considerando os objetivos do Programa Ensinar com Pesquisa, cuja finalidade “é contribuir para o desenvolvimento do conhecimento no campo do ensino de graduação e investir no desenvolvimento das competências docentes e discentes no campo do ensino e da pesquisa”, este projeto pretende cumprir com esse propósito ao

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fazer do aluno de graduação, especialmente de licenciatura, participante de uma investigação que tem como objeto de estudo a memória do magistério em comparação com as impressões sobre o exercício dessa profissão no presente.

Ainda que o curso de Pedagogia contemple diversos períodos e temas próprios do campo da História da Educação, inclusive do Brasil e de sua educação infantil, deve-se reconhecer que o contato com os processos históricos formadores do lugar, do contexto social e temporal próximo dos alunos, onde atuam, inclusive, possa trazer acréscimos importantes à formação de futuros professores. Vale considerar, então, que trazer para dentro do período de formação de futuros professores a memória do magistério na localidade ensejaria o reconhecimento da historicidade da profissão, do percurso de sua produção, dos limites e ganhos do seu exercício no passado e na atualidade.

Por considerar o depoimento de professores como material de estudo, essa pesquisa recorta do conteúdo das entrevistas determinadas representações da escola e do magistério no passado que os idealizam como organizados, época de respeito dos professores pelos alunos e de importância e reconhecimento social da profissão.

Em razão das questões que pontuam trajetória histórica do magistério na educação pré-escolar e primária no Brasil, com suas repercussões na história da educação desses dois níveis em Ribeirão Preto, um projeto como este pretende cotejar as imagens do exercício do magistério num período de formação e afirmação da rede municipal pública de educação infantil e fundamental com a percepção que alunos prestes a ingressarem nesse campo profissional possuem. Trata-se, portanto, de comparar a história de um grupo que participou da produção do campo profissional com o modo como os novos ingressantes entendem o que é ser professor nesse mesmo ambiente no momento atual. E, uma vez que esta pesquisa resulte em produções escritas, será possível levar para dentro do período de formação dos estudantes do curso de Pedagogia da FFCLRP-USP estes elementos formadores da identidade da profissão docente que, por sua vez, são localizáveis tanto na documentação quanto na memória de professores.

3. Objetivos

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- Cotejar a memória do exercício do magistério durante a formação da rede municipal de escolas de educação infantil e primária públicas na cidade de Ribeirão Preto, durante as décadas de 1960 e 1970, com as perspectivas que alunos concluintes do curso de Pedagogia da FFCLRP-USP possuem a respeito da atividade docente no passado e na atualidade;

3.2. Objetivos específicos

- Estudar as características do processo histórico de formação da rede municipal de escolas de educação infantil e primárias da cidade de Ribeirão Preto através da documentação guardada no Arquivo Público e Histórico;

- Resgatar a memória desse processo histórico contata por um grupo de agentes ativos nesse processo, os professores que atuaram na educação infantil e primária durante as décadas de 1960 e 1970;

- Analisar o modo como alunos concluintes do curso de Pedagogia da FFCLRP-USP concebem a atividade docente no passado e na atualidade.

4. Metodologia

O projeto ora proposto pretende viabilizar-se durante a execução de três grupos integrados de ações: a pesquisa documental, as entrevistas semidirigidas com o grupo de professores atuantes nas décadas de 1960 e 1970 e o levantamento e entrevistas semidirigidas com o grupo de alunos.

A primeira razão para que a pesquisa documental conste como recurso metodológico neste trabalho não se restringe apenas à preparação de temas para o roteiro de entrevistas com os professores. A pesquisa documental serve neste estudo ao duplo objetivo de: 1) apurar aspectos históricos identificáveis nos registros documentais, uma espécie de memória material, e; 2) preparar um elenco de temas e questões destinados a balizar a entrevista com os professores. O Arquivo Público e Histórico de Ribeirão Preto será a principal fonte de dados.

Para a seleção de sujeitos que atuaram como professores durante a década de 1960 e 1970, os contatos coletados do Arquivo serão acrescentados os contatos obtidos na Secretaria Municipal de Educação. Posteriormente, as entrevistas serão realizadas para o levantamento das impressões que o exercício do magistério deixou em cada profissional.

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Considerando a definição de Turato (2008) de que todas as entrevistas são dotadas, em geral, de uma estrutura e que nas pesquisas qualitativas é usual o recurso à forma semidirigida, junto da intenção de estudar a memória de um conjunto de pessoas sobre determinado processo histórico, justifica-se recorrer a essa ferramenta de pesquisa.

Em seguida, junto aos alunos das turmas dos dois últimos semestres do curso, as ações metodológicas iniciam por: 1) um levantamento de informações junto ao setor responsável pelos estágios curriculares do curso de Pedagogia da FFCLRP, com o fim de reunir informações a respeito do contingente de alunos que realizam esses estágios, quantos estão para se formar e as condições em que esta atividade acontece; 2) a seguir, de posse dessas informações, será preparado um roteiro de questões para serem verificadas informalmente, na forma de uma entrevista de aculturação, junto a uma amostra de sujeitos desse grupo, entre cinco e oito, de sorte a encerrar esses contatos à medida que as informações obtidas esclarecerem aspectos necessários à preparação de um questionário composto por um conjunto de questões fechadas com alternativas para escolha; 3) para a aplicação do questionário, assim como em todas as fases do contato com este grupo, os alunos serão convidados a colaborar com a resposta a este instrumento. Considerando que as turmas do curso de Pedagogia são compostas por cinqüenta alunos, o objetivo nesta fase é contar com as resposta espontâneas, isto é, aquelas devolvidas pelos sujeitos que atenderam ao convite. Portanto, a expectativa sobre o número inicial desse grupo na fase da aplicação dos questionários é de cinqüenta sujeitos, com a previsão de que esse contingente diminua em razão da verificação de quantos alunos estão de fato realizando estágios e em vias de concluir o curso combinada com a devolução voluntária dos questionários pelos respondentes. É importante lembrar que nos questionários não haverá identificação dos respondentes. Uma vez aplicado este instrumento, as respostas serão agrupadas em tendências, ou seja, segundo a média dos aspectos aos quais os sujeitos fizeram alusão nas suas escolhas; 4) por fim, a sistematização das respostas dos questionários fornecerá elementos para a preparação do roteiro de entrevistas – estruturadas e semidirigidas - com uma amostra de sujeitos desse grupo, no mínimo 5 e no máximo 8, seguindo o critério aplicado ao grupo anterior no qual parte-se de um número mínimo de participantes com a perspectiva de encerrar essa fase à medida que as entrevistas apresentarem repetições significativas em seu conteúdo.

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Realizadas as três ações metodológicas, a análise qualitativa dos dados será iniciada. A opção por essa análise se justifica pela prioridade atribuída às produções mentais dos sujeitos participantes, às suas idéias e impressões sobre determinados fatos e processos. Logo, para atingir os objetivos propostos nesta pesquisa está o previsto o seguinte percurso de análise: 1) os dados obtidos através das entrevistas com os dois grupos de sujeitos serão submetidos à leitura flutuante do conjunto das transcrições, como sugere Turato (2008), primeiro do grupo de professores e, em seguida, do grupo de alunos, sob o fim de constituir uma primeira impressão do material sem privilegiar ainda qualquer aspecto; 2) essa etapa de leitura prévia do material bruto, ou pré-analise como define Bardin (1995), será sucedida pelo processo de apontamento das ênfases, reiterações e omissões. No caso das entrevistas com professores, interessa perceber nos seus depoimentos como se vêem dentro de um processo histórico e como reconstituem sua atividade profissional e educativa num determinado tempo e espaço. Quanto aos alunos de Pedagogia, o objetivo é apontar suas perspectiva sobre o ingresso no campo de atuação e sobre como concebem o exercício da profissão no presente. Pelo fato da entrevista ser o instrumento aplicado para sondar essas duas produções mentais de dois grupos de sujeitos, esses elementos serão depreendidos do discurso transcrito; 3) para tanto, os depoimentos em estado bruto, após a leitura flutuante, serão lapidados na forma de categorias e subcategorias. Essa etapa é definida por Bardin (1995) como o momento em que as partes do conjunto são classificadas de acordo com critérios de diferenciação e reagrupamento. Turato (2008) explica que esse processo deve ocorrer conforme parâmetros de repetição e relevância, a partir dos quais são definidas as categorias localizadas no discurso transcrito dos sujeitos.

5. Resultados

6. Referências

BARDIN, Laurence. Análise do conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1995. HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Centauro, 2006.

LE GOFF, Jacques. Documento/monumento. In: ______. História e memória. Campinas: Editora da UNICAMP, 1994. p. 535-549.

TURATO, Egberto Ribeiro. Tratado da metodologia da pesquisa clínico-qualitativa. 3a ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.