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(1)

COMO ESCREVER

O SEU PRIMEIRO

ARGUMENTO DE CINEMA

EM TRINTA DIAS

João Nunes

Carregue aqui para receber o meu outro ebook gratuito:

(2)

“Uma das coisas mais importantes

acerca de escrever o primeiro argumento

é o fato de realmente termos terminado

um argumento. Ter feito isso é uma etapa muito

importante — mesmo que ele seja uma porcaria.

Dá-nos uma certa confiança para seguir em frente

e fazê-lo outra vez.”

Charlie Kaufman

(3)

É possível escrever um guião em 30 dias? 4

O conteúdo deste livro 6

PRIMEIRA PARTE: O PLANO DE TRABALHOS 7

O plano de trabalhos 8

1º Passo: Brainstorming 9

2º Passo:Análise das ideias 10

3º Passo: Preparação 11

4º Passo: Escaleta 15

5º Passo: Escrita 16

6ºPasso: Reescrita 17

SEGUNDA PARTE: AS DICAS DE ESCRITA 18

Como avaliar o potencial da sua ideia 19

O seu protagonista é interessante? 20

Quais as consequências do fracasso do seu

protagonista? 22

Quem é o seu antagonista? 24

Já tem um título para o seu filme? 26

Já tem a sua escaleta? 30

Qual o Género do seu filme? 33

As primeiras dez páginas 42

Você não está a escrever um guião; está a escrever um

filme. 46

Conflito, conflito, conflito... 49

Surpresas, surpresas, surpresas… 52

Escolhas, escolhas, escolhas… 54

Como escrever uma boa cena 56

Elipses e ritmo narrativo. 59

Como gerir a informação? 62

Como escrever os Cabeçalhos? 65

Como escrever as Descrições? 69

Como escrever os Diálogos e Parênteses 72

Qual é o uso correto das Transições e Planos? 76

A reescrita 79

ANEXOS 82

ANEXO 1: Não tenho tempo para escrever 83

ANEXO 2: Recursos úteis 86

Sobre o autor 87

(4)

É possível escrever

um guião em 30 dias?

Não vou mentir: terminar um guião de 100 páginas em trinta dias não é a coisa mais fácil do mundo. Mas também não é impossível.

A prova de que isso pode ser feito foi o FrenesiDeEscrita 2013. Num artigo que escrevi em Abril de 2013, lancei um desafio aos leitores do blogue:

Quantos de vós estão dispostos a tentar escrever um guião de cinema completo durante o mês de Abril?

Sessenta e seis valentes inscreveram-se. Dezoito conseguiram terminar.

São dezoito guiões que não existiam antes neste mundo. E dezoito leitores que, a partir de agora, podem considerar-se guionistas.

Não menos importante: os restantes autores, mesmo não tendo terminado os seus guiões dentro dos trinta dias, avançaram substancialmente na sua escrita.

(5)

Com certeza irão completá-los. Se não for num mês, será então em dois ou três - ou nos que forem necessários.

O importante é que saíram das suas zonas de conforto e deram o primeiro passo para tornar os seus sonhos em realidade.

Para eles, que já o fizeram, e para si, que vai agora embarcar nesta aventura, os meus parabéns.

(6)

O conteúdo deste

livro

O objetivo de escrever um argumento de cinema em trinta dias é ambicioso. Para motivar e apoiar todos os participantes no Frenesi 2013 enviei-lhes ao longo do mês dicas diárias de escrita.

Este pequeno livro é uma compilação desses conselhos, revistos e um pouco aumentados.

Não pretende substituir um livro de guionismo, muito menos um curso ou oficina especializada. Mas pode servir como uma primeira introdução aos desafios da escrita para cinema.

No mínimo, acredito que vai despertar a sua curiosidade quanto a esta arte e ofício da escrita para cinema; idealmente, espero que o inspire a começar a escrever o seu primeiro argumento cinematográfico.

(7)

PRIMEIRA PARTE:

O PLANO DE

(8)

O plano de trabalhos

Se já tiver uma ideia e a estrutura básica da estória que quer escrever tudo fica mais fácil. A meta de escrever um guião em 30 dias representa pouco mais de 3 páginas por dia. Uma boa hora de trabalho permite-lhe alcançar esse objetivo diário.

Se ainda não tem a ideia ou a estrutura, só tem de esforçar-se um pouco mais. Siga os passos indicados no plano de trabalhos que descrevo a seguir e garanto-lhe que chegará ao fim com uma primeira versão de um guião cinematográfico.

Uma nota importante: o número de 100 páginas corresponde a um valor muito comum hoje em dia nos guiões para cinema. Mas qualquer número entre 90 e 120 páginas é considerado adequado.

Estes números pressupõem que os guiões estão escritos no formato correto, o que é fácil usando um software adequado, como indicado no anexo II deste livro.

(9)

1º Passo:

Brainstorming

Do dia 1 ao 4 faça um brainstorming diário de 1 hora à procura de ideias.

Não se autocritique nem se reprima; escreva todas as ideias que conseguir

imaginar. O objetivo não é a qualidade, mas sim a quantidade. Uma boa fonte de inspiração é o jornal do dia.

Um dos exercícios que costumo fazer nas minhas aulas de guião é distribuir jornais pelos alunos e pedir-lhes para escrever ideias baseadas nas notícias. Nunca faltam ideias.

(10)

2º Passo:Análise das

ideias

No dia 5 faça uma sessão de análise das ideias que reuniu.

Essa será a altura de ser crítico e exigente. Analise as suas ideias segundo os seguintes critérios:

•força do conceito;

•interesse dos personagens e do mundo ficcional onde se movem; •originalidade;

•potencial dramático.

O objetivo é escolher uma e apenas uma ideia — aquela que o vai ocupar durante o resto do mês.

(11)

3º Passo: Preparação

Nos dias 6 e 7 escreva a logline da sua ideia.

É um resumo da sua estória em poucas palavras, respondendo às seguintes

questões: quem é o protagonista, qual o seu objetivo e que obstáculos o impedem de o concretizar. A logline é a bússula que lhe permitirá manter o rumo nas fases seguintes.

Ao mesmo tempo comece a pensar no protagonista.

Quais as suas motivações e interesses, qual o seu arco de transformação. Pense também nos restantes personagens, e como se relacionam com ele.

Se for preciso faça alguma pesquisa.

Mas vamos ser honestos: é melhor escolher uma ideia que não exija muita investigação.

(12)

Cada estória passa por algumas etapas básicas que definem a sua estrutura. Para não ficar perdido no momento de passar à escrita deve ter uma ideia dos principais pontos de viragem da estória:

•qual é o incidente dramático que põe a narrativa em marcha - o gatilho;

•quando é que o seu protagonista se compromete definitivamente com o seu objetivo, dando início ao 2º ato;

•o que acontece mais ou menos a meio do guião que representa uma viragem ou escalada importante no conflito;

•qual o momento dramático que encerra o 2º ato e obriga o protagonista a dar tudo por tudo;

•qual é o clímax da estória, o obstáculo final e decisivo que o protagonista tem de enfrentar;

(13)

Estes elementos compõe o que se costuma designar por “paradigma” da estrutura em três atos.

Este paradigma foi introduzido por Syd Field no seu livro Screenplay - The

Foundations of Screenwriting, cuja leitura é recomendada a todos os guionistas. A estrutura em três atos é a base de praticamente todos os filmes escritos para Hollywood. Pode ser resumida no seguinte esquema:

(14)

Escreva cada um destes momentos num post-it, cole-o na parede e terá a estrutura essencial do seu guião já definida.

(15)

4º Passo: Escaleta

Do dia 8 ao 12 desenvolva a escaleta do seu guião.

A escaleta é uma lista dos principais momentos da sua estória, colocados na sequência em que aparecerão no guião.

Para um guião de cinema de 100 páginas, como o que tem de escrever, deverá definir cerca de 40 eventos.

Parta dos momentos-chave que definiu no ponto anterior e recheie os espaços entre eles.

Se quiser refrescar os conceitos básicos leia os artigos 20, 21, 22e 23 do meu curso de guião online.

(16)

5º Passo: Escrita

Dos dias 13 a 30, escreva.

Se seguiu este plano de trabalhos até ao momento tem 18 dias para terminar o seu guião. Isso significa que terá de escrever pouco mais de 5 páginas por dia.

Essas páginas deverão estar corretamente formatadas. A forma mais fácil de o

conseguir é usando um dos softwares (alguns deles gratuitos) indicados nos anexos deste livro.

Escrever cinco páginas não é nada que não se consiga fazer em duas horas de escrita intensa. O segredo é apenas um: sentar-se em frente do seu computador e meter mãos à obra.

E não venha com desculpas de que não tem tempo para escrever. Se o guião for a sua prioridade o tempo aparecerá.

(17)

6ºPasso: Reescrita

Na noite do 30º dia, celebre.

Terminou o seu guião, o que lhe dá o direito universalmente reconhecido de abrir uma garrafa de espumante.

É importante esclarecer que o objetivo deste ebook não é ter um final draft perfeito no fim dos trinta dias; apenas uma primeira versão, com todos os seus defeitos e limitações. Por muito apressada e cheia de problemas que essa primeira versão seja, será sempre melhor do que não ter nada.

Para tornar a sua primeira versão numa obra finalizada virá depois toda a fase de reescrita. Quando chegar a essa etapa pode guiar-se pelo ebook gratuito que disponibilizo aqui.

(18)

SEGUNDA PARTE:

AS DICAS DE

(19)

Como avaliar o

potencial da sua

ideia

Um bom filme do modelo clássico tem um protagonista ativo, com um objetivo claro e obstáculos progressivamente mais complicados no caminho da

concretização desse objetivo.

Uma forma de avaliar o potencial dramático do seu filme é fazer uma lista de todos os obstáculos e empecilhos de que se consegue lembrar.

Se conseguir, sem muita dificuldade, pensar em meia dúzia ou mais, é bom sinal. Se, pelo contrário, der voltas à cabeça e não se lembrar de mais do que um ou dois obstáculos, talvez a sua ideia não tenha grande potencial de conflito e, logo, de drama.

(20)

O seu protagonista é

interessante?

O seu protagonista, é suficientemente interessante para suportar o peso do guião que está a escrever?

Enredos, eventos, incidentes, cenas, desaparecem da memória; personagens fascinantes permanecem para sempre.

Certifique-se de que o seu protagonista tem uma personalidade própria, marcada, e bem distinta da sua. Não queira um personagem que seja apenas o seu alter ego. Uma maneira de o fazer é dar-lhe um TRAÇO ÚNICO, uma FALHA e um SEGREDO.

Um traço único - algo inesperado ou até paradoxal: o polícia que adora cozinhar, o

bandido que escreve sonetos nos tempos livres, a psicóloga que não se consegue livrar de pesadelos terríveis. Pode ser um traço físico, uma atitude, um hobby, mas será qualquer coisa que o torna mais memorável.

(21)

Uma falha - um defeito ou limitação inesperado que poderá ter algum efeito no

decurso da estória. Indiana Jones tem medo de cobras? Vamos lançá-lo num poço cheio delas.

Um segredo - personagens com segredos, que não revelam tudo à primeira vista,

são mais interessantes de acompanhar. São, também, mais interessantes de escrever.

(22)

Quais as

consequências do

fracasso do seu

protagonista?

Num filme de modelo clássico o protagonista tem um objetivo claro desde muito cedo, e corre atrás dele durante todo o tempo. O drama nasce dos obstáculos que surgem no seu caminho.

Mas não basta ter um objetivo. Este tem de ser relevante, e o fracasso tem de ter consequências sérias para o protagonista e para o mundo em que ele vive.

O objetivo de Indiana Jones nos Salteadores da Arca Perdida não é encontrar um artefato muito raro para colocar no museu da sua universidade; é encontrar a Arca da Aliança que, se cair na mão dos nazis, pode fazer pender os destinos do mundo para o lado do Mal.

(23)

O objetivo de Lincoln não é aprovar a verba para renovação dos jardins da Casa Branca; é aprovar a legislação que porá fim à escravatura e marcará toda a história dos Estados Unidos e do mundo.

O objetivo de Juno não é encontrar o par de sapatos perfeito para combinar com o casaco novo; é encontrar os pais perfeitos para o bebé que traz na barriga.

A falha em alcançar cada um destes objetivos tem consequências sérias para o protagonista e, por vezes, para o mundo em geral.

E o objetivo do seu protagonista - quais as consequências que ele sofrerá se não o conseguir concretizar?

(24)

Quem é o seu

antagonista?

Todos temos os nossos protagonistas favoritos. Salvo raras - e honrosas - excepções (Miles, de Sideways, estou a olhar para ti...) são personagens ativos, com objetivos importantes, que tomam as decisões difíceis mas necessárias para concretizar esses objetivos.

Mas quantas vezes não é o antagonista que nós recordamos em primeiro lugar ou, pelo menos, ao mesmo nível do protagonista. Por vezes até dão o título ao filme:

Terminator, Alien, Tubarão...

Certifique-se de que passa tanto tempo a pensar no seu antagonista como no seu protagonista.

Qual é o seu objectivo? Porque é que é importante para ele? O que o motiva? Quais as suas forças e fraquezas? Qual o seu plano, e que lógica há por trás dele? Qual é o seu passado? Quais os seus sonhos?

(25)

Certifique-se também de que sabe o que o seu antagonista está a fazer em cada momento da estória. Ele não pode entrar e sair apenas por sua conveniência. O que é que ele está a fazer durante o resto do tempo. Não entrou em hibernação, pois não?

Crie um antagonista à altura do seu protagonista e terá mais um ingrediente para uma estória de sucesso.

(26)

Já tem um título para

o seu filme?

Quando for exibido nas salas o filme que está a escrever há de ter um título. O ideal é que seja você a batizá-lo no guião.

Não é garantido que o nome que você escolher venha a ser adotado por toda a gente que ainda vai dar parecer sobre o assunto: produtor, realizador, até os

distribuidores, poderão ter outras opiniões. Mas você tem a oportunidade de dar o primeiro tiro, e muitas vezes é este que cola.

Vejamos os nomes de alguns dos candidatos ao Oscar 2013: Amour, Argo,

Beasts of the Southern Wild, Django Unchained, Les Misérables, Life of Pi, Lincoln, Silver Linings Playbook, Zero Dark Thirty, The Master, Flight, The Impossible, The Sessions, Brave, Frankenweenie, ParaNorman, The Pirates! Band of Misfits, Wreck-it Ralph, Anna Karenina, Mirror Mirror, Kon-Tiki, No, A Royal Affair, War Witch, Hitchcok, The Hobbit: An Unexpected Jorney, Skyfall, Moonrise Kingdom.

(27)

Que conclusões podemos tirar daqui:

•a maior parte dos títulos são muito curtos, uma ou duas palavras (Amour, Argo,

Flight, Lincoln, The Sessions, Anna Karenina, No...);

•muitos incluem o nome do protagonista (Django Unchained, Life of Pi, Lincoln,

ParaNorman, Hitchcock...) ou uma alusão direta a um personagem importante

(Brave, The Master, The Hobbit...);

•muitos referem um elemento importante da narrativa (Argo, Kon-Tiki, Mirror Mirror,

No...);

•outros escolhem uma referência ao universo ficcional do filme (Beasts of The

Southern Wild, Les Misérables, The Sessions, A Royal Affair...);

•finalmente, outros vão pelo caminho oposto, escolhendo um título misterioso e enigmático (Silver Linings Playbook, Zero Dark Thirty, SkyFall, Moonrise Kingdom...). Não precisa escolher o título do seu filme para começar a escrever.

(28)

Mas é bom que durante todo o mês vá pensando nisso e tomando notas dos títulos que lhe forem ocorrendo.

(29)

"Quando me sento para escrever já tenho uma lista de

todas as cenas, o que acontece em cada cena, e quantas

páginas prevejo que cada cena vai ocupar."

Paul Schrader

(30)

Já tem a sua

escaleta?

Há dois tipos de escritores: os que planificam a estória antes de escrever e os que partem à descoberta da estória conforme vão escrevendo.

Um dos caminhos não é necessariamente melhor do que o outro; o que funciona para um escritor, funciona - e ponto final.

Os guionistas profissionais, contudo, têm grande vantagem em pertencer ao primeiro grupo.

Em primeiro lugar, porque muitas vezes os seus trabalhos são encomendas, e os produtores querem sempre ver um tratamento antes de se comprometerem a encomendar o guião.

Depois, porque um guião tem uma dimensão limitada de mais ou menos 90 a 120 páginas. É muito mais fácil chegar ao fim dentro desses limites tendo feito um plano de trabalho antes.

(31)

Para o guionista esse plano de trabalho é a escaleta.

Uma escaleta é uma lista dos principais momentos de uma estória, ou seja, dos eventos dramáticas que impulsionam a estória para frente ou mudam o seu rumo bruscamente.

Não é preciso escrever uma linha da escaleta para cada cena, apenas para cada evento dramático.

Um determinado evento resumido numa linha da escaleta - João decide criar o

FrenesiDeEscrita - pode ser depois dividido no guião em várias cenas - João lê a notícia de que não vai haver ScriptFrenzy; João discute o assunto com um amigo guionista; João toma duche pensativo; João senta-se ao computador e escreve artigo anunciando o FrenesiDeEscrita.

Se faz parte dos seus planos escrever uma escaleta comece por definir os principais eventos dramáticos da sua estória.

(32)

•o incidente que perturba a sua estabilidade;

•o momento em que o protagonista se decide tomar a inciativa; •uma grande reviravolta que acontecerá no meio da estória; •o momento negro em que o protagonista quase desiste; •a sua decisão de dar o tudo por tudo;

•o confronto final com o seu antagonista; •e o fim da sua estória.

Com isso já terá oito eventos dramáticos, e um esboço de estrutura para a sua estória. Agora só falta encher os espaços vazios entre uns e outros.

Para um filme de longa metragem deve contar com cerca de quarenta eventos dramáticos.

Quantos eventos já identificou na sua estória? Faça a lista e estará perto de ter a sua escaleta.

(33)

Qual o Género do seu

filme?

Desde o tempo de Aristóteles que se classificam as obras de ficção por géneros. No caso do Ari, os géneros eram o Épico, a Tragédia e a Comédia, que tinham

definições algo diferentes das que usamos hoje.

Nos nossos dias a maior parte das obras de ficção, especialmente os filmes, também encaixam em géneros.

A classificação destes varia com os autores, mas alguns são facilmente

reconhecíveis e consensuais: o Drama, a Comédia, a Comédia Romântica, a

Aventura, o Terror, o Thriller, o Western, a Fantasia, a Ficção Científica, o Filme de Época, o Filme de Detectives, etc.

Há também subgéneros que se afirmam com alguma autonomia em certos

(34)

Os géneros são importantes porque carregam consigo uma série de convenções bem estabelecidas que correspondem a certas expectativas das audiências.

É preciso conhecer as convenções dos géneros para as respeitar, ou desrespeitar intencionalmente.

Por exemplo, durante muito tempo os zombies andavam devagar e de braços estendidos; nos filmes mais recentes temos assistido a uma vaga de zombies corredores. Antigamente eram mortos-vivos ressuscitados por algum fenómeno excepcional; hoje são pessoas comuns infetadas por vírus altamente contagiosos. Também é interessante conhecer bem as convenções dos géneros para os poder combinar entre si. Recentemente temos assistido a combinações estranhas,

recebidas com maior ou menor sucesso: western+ficção científica = Cowboys &

Aliens; vampiros+ romântico= Crepúsculo; histórico+vampiros= Abraham Lincoln: Caçador de Vampiros, etc.

Há ainda uma terceira possibilidade muito interessante: escrever o guião jogando com as convenções e as expectativas associadas ao género, para as subverter. É o

(35)

caso de filmes de sucesso como O Sexto Sentido, Scream ou A Casa na Floresta, e de um monte de comédias burras, como os Scary Movies e congéneres.

Se o seu filme encaixa dentro de um género - o Thriller de Psicopatas, por exemplo -, é importante ver as obras mais importantes desse género antes de começar a escrever.

Vê-las e estudá-las com atenção e respeito, não para copiar, mas para ter a certeza de que não defraudará desnecessariamente as expectativas dos seus espectadores.

(36)

Qual o Tema do seu

filme?

O Tema é provavelmente o mais mal entendido elemento do universo de uma estória. No entanto é também um dos mais importantes.

O que é, então, o Tema de uma estória? Talvez seja mais fácil começar por dizer o que o Tema não é.

Em primeiro lugar, não é o assunto explícito da estória, a sua temática. O Tema dos

Salteadores da Arca Perdida, a existir um, não é a luta contra os Nazis. O Tema de O Padrinho não é a luta das famílias da Mafia pelo poder.

Não é, também, a mensagem da estória, embora esteja mais próximo disso. Samuel Goldwin, um famoso chefe de estúdio americano, gostava de dizer, "Se querem

enviar uma mensagem vão aos Correios". O Tema é mais subtil do que a mensagem

(37)

O Tema não tem a mesma importância em todos os tipos de filme. Costuma ter mais peso em filmes dramáticos, que tocam questões morais e éticas importantes, e

menos relevância nos filmes de aventura e fantasia.

Finalmente, o Tema não é a premissa do filme. Normalmente até começamos a escrever sem ter uma ideia clara dos componentes temáticos do guião. Estes vão surgindo naturalmente no decurso da montagem da estória, da relação que se vai construindo entre os personagens e o enredo.

Para muitos autores, o Tema é um conceito moral, ético ou filosófico que o filme implicitamente discute. Nesse sentido, os Temas dos filmes acima mencionados talvez fossem a importância do indivíduo, nos Salteadores, e a primazia da lealdade no Padrinho.

Obviamente, estas interpretações serão sempre subjetivas e refletirão tanto do

intérprete como do objeto interpretado. Duas pessoas verão o mesmo filme e verão nele um Tema ou Temas diferentes, de acordo com a sua própria estrutura moral e

(38)

Por isso a minha visão do Tema toma esse aspecto em consideração.

Segundo John Truby, no livro The Anatomy of Story: 22 Steps to Becoming a Master Storyteller (que neste momento está em promoção para o Kindle) "O Tema

é a visão do autor de como agir no mundo. É a sua visão moral."

A minha interpretação do Tema aproxima-se desta:

O Tema é a razão verdadeira e profunda porque um autor se interessa por uma determinada estória e não por outras. É a projeção da visão de mundo do autor na sua estória.

Neste sentido o Tema é sempre uma opção inconsciente que tomamos no momento em que nos apaixonamos por uma certa premissa de estória, um

personagem ou uma ideia de enredo, e decididmos desenvolvê-la num guião. O processo de escrita vai limitar-se a revelá-lo, pouco a pouco, em camadas

sucessivas.

Não se preocupe em encontrar já o Tema do seu guião. Mas conforme o for escrevendo esteja atento a preocupações morais e éticas que esteja a aflorar.

(39)

Qual o Tom do seu

filme?

Aqui está outro conceito nem sempre bem entendido: o Tom de um filme. No entanto, é um conceito extremamente importante de compreender.

O Tom de um filme fica claramente definido nas primeiras páginas de um guião. A partir daí o guionista tem a responsabilidade de manter esse tom de forma

consistente. Caso não o faça corre o risco de confundir e alienar a sua audiência. Por exemplo, há filmes que misturam muito bem drama e comédia, como o Silver

Linnings Playbook. Mas isso fica claro desde os primeiros minutos de exibição, e o

espectador aceita sem problemas essa combinação.

Pelo contrário, um filme como Amour é quase totalmente desprovido de humor, o que os seus espectadores também entendem e aceitam sem problemas.

(40)

correriam sérios riscos de perder o envolvimento que tivessem até aí conseguido com os espectadores. O Tom faz pois parte do contrato implícito entre autores e público. Para tornar as coisas um pouco mais concretas podemos recorrer a um pequeno gráfico.

(41)

Usando dois eixos Leve - Pesado e Realista - Fantasista obtemos quatro

quadrantes nos quais podemos enquadrar praticamente todos os filmes de modelo clássico.

Em que quadrante enquadraria o seu filme?

(42)

As primeiras dez

páginas

Se os últimos minutos de um filme são fundamentais para o seu sucesso, as primeiras páginas são cruciais para o sucesso de um guião.

O final define em grande medida a opinião do espectador; o arranque determina quase por inteiro o interesse de um leitor — produtor, realizador, ator ou financiador. É pois muito importante pensar bem a cena ou sequência inicial de um guião,

fazendo com que ela transmita o máximo de informação sobre os componentes e o ADN do filme. Isso implica, normalmente, que essa sequência seja escrita e rescrita várias vezes, enquanto procuramos a forma ótima para agarrar o leitor/ espetador.

O que incluir?

Uma das regras de escrita de cinema é entrar numa cena o mais tarde possível, e sair dela o mais cedo que se consiga. Isto também se aplica às estórias; devemos

(43)

começar a nossa estória o mais perto possível do início da verdadeira ação, do caudal principal da narrativa.

Há mil maneiras de arrancar com uma estória. Temos apenas de escolher aquela que é mais relevante e atrativa para a nossa.

Os Condenados de Shawshank, por exemplo, começa apenas com Andy

embriagado, segurando numa pistola, enquanto assiste à traição conjugal da

mulher. O Padrinho começa com o casamento da filha do Don, incluindo uma longa cena entre o Don e o pobre cangalheiro Bonasera, em que ficamos a saber tudo o que precisamos sobre as relações de poder que vão estar em jogo ao longo do filme. 72 Horas começa com um jantar e uma discussão entre cunhadas. A Selva com um ataque de índios amazonenses a um acampamento no seringal, do qual se passa para a apresentação do protagonista Alberto. Juno começa com a

protagonista a beber quantidades desproporcionais de sumo. Sideways com Miles a procrastinar as suas obrigações na casa de banho. Todos começos diferentes, mas todos interessantes.

(44)

•apresentam o protagonista da estória; •mostram o mundo em que ele se move;

•dão uma ideia do género, tom, tema e estilo do filme;

•e conduzem à apresentação da questão dramática central da estória, de que falo a seguir.

O inciting incident, ou gatilho

O inciting incident, ou gatilho, é o primeiro momento dramaticamente importante do filme. É aquele evento chave que vem abanar o equilíbrio aparente do mundo original e colocar a questão dramática central que o filme vai passar a responder. Sem este incidente a estória não se colocaria em marcha.

Se Frodo Baggins não recebesse um certo anel para guardar, a sua vida continuaria calma e tranquila, e não haveria O Senhor dos Anéis; se Olive não fosse convocada para a final do Little Miss Sunshine a sua família continuaria calmamente

(45)

iria ser um d’Os Condenados de Shawshank; se Juno não descobrisse estar grávida continuaria a ser apenas mais uma adolescente normal na sua escola.

Linda Seger refere nos seus livros que, por vezes, não é fácil identificar um gatilho (a que ela chama catalizador) individual.

O despoletar da ação resulta, nesses casos, de um acumular de eventos e tensões, que causam a disrupção do equilíbrio original. Estes “catalizadores de situação”, como ela os define, são um pouco mais raros, mas constituem obviamente uma opção para qualquer guionista, desde que adequados à sua estória.

Conclusão

As primeiras dez páginas têm muito a dizer em pouco tempo.

Apesar de 30 dias ser muito pouco tempo para escrever um guião, certifique-se de que reserva pelo menos um dia para rever e polir as suas dez páginas iniciais.

(46)

Você não está a

escrever um guião;

está a escrever um

filme.

O cinema é um meio audiovisual. Quando estamos a escrever um guião temos de ter isso em conta: cinema é áudio mais visual.

O que isso significa é que temos de deixar cair todos os hábitos provenientes da literatura e privilegiar os que são específicos do meio cinema.

Muito resumidamente, e na prática, isto significa duas coisas.

Em primeiro lugar, só podemos escrever num guião aquilo que possa ser mostrado, por imagem e por som, num filme.

Parece óbvio, mas na realidade não o é. Quantos guiões já eu li em que são escritas frases como a seguinte:

(47)

Francisco olha para Sofia e recorda como ela estava linda no dia em que se conheceram.

Como é que mostramos isto num filme? É impossível, a não ser que nós o tornemos explícito de outra forma. Por exemplo:

Francisco olha para Sofia.

FLASHBACK - INT. FESTA - NOITE (1999)

Sofia, dez anos mais nova, dança animadamente no centro da sala. Francisco, encostado a uma parede, olha para ela, encantado.

Ao introduzir o flashback transformamos o recurso literário da frase inicial - uma introspecção - em algo que pode ser mostrado num filme.

(48)

Em segundo lugar, devemos sempre privilegiar as soluções visuais e auditivas específicas da linguagem cinematográfica antes de recorrer a outras. É o famoso

"show, don't tell" - "mostra, não contes".

Por exemplo, podemos ter um personagem a contar a outro como foi difícil

desativar o alarme do banco e entrar no cofre; ou podemos mostrar essa cena de grande tensão, sem um único diálogo. Qual opção acha que teria mais impacto numa sala de cinema?

Olhe para o seu guião e faça esta análise: escreveu alguma coisa que não possa ser mostrada em imagens ou sons? Escreveu alguma coisa que possa ser mostrada apenas em imagens ou sons?

(49)

Conflito, conflito,

conflito...

"— Hoje à tarde, saí de casa e fui à padaria.

Silêncio.

— E…?

— Mais nada. Foi isso. Saí de casa e fui à padaria."

Esta é, possivelmente, a estória mais chata do mundo. A não ser que…

…o protagonista sofra de agorafobia, doença psicológica que o mantém preso em casa há anos, como Sigourney Weaver em Copycat. Nesse caso sair de casa e ir à padaria pode ter sido uma luta titânica - contra si mesmo e os seus medos.

(50)

Um personagem tem um objetivo. Consegue-o sem luta. Ninguém liga.

O mesmo personagem tem o mesmo objetivo. Mas, desta vez, tem obstáculos no caminho. Conflito. Surpresas. Aqui, sim, as coisas aquecem.

Quais são os tipos de conflito que o seu protagonista pode encontrar? Com ele

mesmo? Com um opositor ou uma força antagónica? Com a sua família ou vizinhos? Com a sociedade? Com espíritos superiores?

Qualquer uma dessas forças - ou todas elas - podem ser antagonistas à altura do seu protagonista. Certifique-se apenas de que ele as encontra no caminho.

(51)

“Esqueça todas as regras que o Syd Field, Robert McKee

ou qualquer outro guru da escrita lhe ensinaram. Todas

menos uma: Nunca seja chato”.

David Mamet

(52)

Surpresas, surpresas,

surpresas…

O outro grande elemento do drama, além do conflito, são as surpresas.

Como David Mamet diz, a única obrigação do guionista é não ser chato. Ou seja, manter os espectadores curiosos sobre o que vai acontecer a seguir. Se não houver surpresas, se tudo for plano e previsível, isso será impossível. Filme sem surpresas não consegue prender o espectador.

Os nossos amigos gregos, a quem tanto devemos em termos de dramaturgia, já falavam nas peripateia - as peripécias. Segundo eles, tratavam-se dos eventos que, mantendo-se dentro do verossímil, imprimiam um rumo diferente e inesperado ao curso da narrativa. As nossas surpresas, portanto.

Alfred Hitchcock, nas entrevistas que deu a Truffaut, diz preferir o suspense à

(53)

De acordo com a sua teoria, é mais eficaz saber que há uma bomba que pode explodir a qualquer momento, do que vê-la simplesmente explodir.

Concordo com ele, mas…

…a apresentação da bomba, e da possibilidade da sua explosão, já foi só por si uma surpresa. Ao acrescentar o elemento de suspense estamos simplesmente a espremer todo o potencial dramático dessa surpresa.

E no seu guião, que surpresas existem que implicam uma mudança do rumo da estória? Se não houver nenhuma, onde poderia incluí-las?

(54)

Escolhas, escolhas,

escolhas…

No cinema, ao contrário da literatura, temos acesso muito limitado à introspeção dos nossos personagens. A única maneira de os conhecer é ver como se

comportam - o que dizem e o que fazem na sua realidade ficcional.

Para isso, para podermos revelar os seus comportamentos, temos de criar situações que os obriguem a agir. Mas, melhor ainda, é criar situações em que os obriguemos a fazer escolhas, pois é através dessas escolhas que mostramos quem eles

realmente são.

Se lançarmos um carro contra o nosso protagonista, forçamo-lo a agir, desviando-se do carro.

Se enviarmos um carro contra ele e a sua mulher, forçamo-lo a escolher entre dois cursos de acção: desviar-se sozinho, ou salvar a mulher primeiro, com risco da própria vida.

(55)

Mas se enviarmos dois carros, um contra a sua mulher e outro contra a sua mãe, criamos um dilema - uma escolha sem solução ótima.

Essa escolha difícil revelará ainda mais sobre ele.

Crie cenas que obriguem os seus personagens a fazer escolhas. Quanto mais difíceis forem, mais reveladoras de caráter serão, e o seu guião ganhará com isso.

(56)

Como escrever uma boa

cena

O guionista John August escreveu em tempos um artigo sobre como escrever uma cena. Ryan Rivard, um outro guionista, fez um infografismo inspirado nesse artigo

que teve bastante divulgação no Twitter.

Em suma, para escrever um guião cheio de boas cenas, deverá dar estes passos para cada uma delas:

•o que tem de acontecer nesta cena?

•qual a pior coisa que aconteceria se esta cena fosse omitida? •quem tem de estar nesta cena?

•onde é que esta cena pode ter lugar?

•qual a coisa mais surpreendente que poderia acontecer nesta cena? •é uma cena longa ou uma cena curta?

(57)

•de que três formas diferentes esta cena poderia começar? •imaginar esta cena a correr na nossa mente.

•escrever uma versão resumida. •escrever a versão longa.

•repetir 200 vezes (uma para cada cena do guião).

Pessoalmente, acho que falta um aspeto muito importante: o que muda na estória

com esta cena?

Se nada mudar, a nível do curso da trama ou da evolução emocional - mesmo que seja uma mudança muito pequena - então possivelmente a cena não faz falta e deve ser cortada.

A maior parte dos pontos referidos por John August são óbvios e não exigem grande explicação, mas chamo a atenção para o 4 e o 5.

(58)

Em televisão temos normalmente de usar os mesmos decores repetidamente. No cinema, pelo contrário, tentamos - dentro dos limites do razoável - reduzir ao mínimo as repetições dos cenários.

Quanto ao ponto 5 - Este é um exercício para fazer sempre, mas para aplicar apenas de vez em quando.

Como o próprio John August explica: "Dê a si próprio a oportunidade de fugir à

escaleta e considerar algumas possibilidades loucas. E se um carro rebentasse a parede? E se o herói se engasgasse e morresse? E se um miúdo vomitasse um dedo?"

Não é para usar estas possibilidades loucas em todas as cenas, obviamente. Mas se em algumas cenas do seu guião introduzir algum elemento completamente

inesperado, vai ganhar vivacidade e energia com isso.

Siga estes passos na escrita das suas cenas (ao fim de algum tempo eles tornam-se praticamente instintivos) e o seu guião só terá a ganhar.

(59)

Elipses e ritmo

narrativo.

Uma das principais regras na escrita de uma cena é "entrar tarde, sair cedo". Ou seja, começar a cena o mais perto possível do seu núcleo dramático e sair dela logo que a sua razão de ser esteja cumprida.

Para o fazermos recorremos normalmente à elipse narrativa, uma das principais ferramentas do guionista.

Segundo a definição da Wikipedia, suficiente para o nosso âmbito, "Em narrativa,

elipse é a exclusão, pelo narrador, de determinados acontecimentos diegéticos, dando origem a vazios narrativos, mais ou menos extensos. A elipse é um processo fundamental da técnica narrativa, pois nenhum narrador pode relatar com estrita fidelidade todos os pormenores da diegese".

(60)

O que é que a definição acima quer então dizer?

Se o nosso protagonista vai visitar a namorada - uma cena possível no seu mundo ficcional - nós não precisamos de mostrá-lo a pegar na chave do carro, sair de casa, descer as escadas, atravessar a rua, entrar no carro, ligar o carro, fazer uma

trajetória tipo Google Street View, estacionar o carro, sair do carro, tocar à

campainha, etc, etc. Com o trânsito que há normalmente, teríamos gasto metade do filme só nessa cena.

Em vez disso, podemos simplesmente passar dele a agarrar na chave do carro para ele a tocar a campainha. Ou, melhor ainda, cortar simplesmente para o nosso

personagem a fazer um café, já na cozinha da namorada.

No entanto, se a visita dele se destinasse a discutir um assunto delicado, poderíamos querer introduzir alguns planos do seu trajeto. Dessa forma introduziríamos um atraso artificial na estória, reduzindo o seu ritmo.

(61)

A elipse é, pois, uma espécie de potenciómetro que nos permite aumentar ou diminuir o ritmo de uma narrativa, acelerando ou atrasando a passagem de uma situação para outra.

O ritmo final de um filme será resultado das decisões do realizador e editor do filme na fase de montagem, manuseando cenas, aparando diálogos, cortando planos. Mas a definição desse ritmo começará sempre no guião que estamos a escrever. Que cenas ou momentos do seu guião pode cortar ou prolongar? Como é que isso afecta o ritmo narrativo da sua estória? Tenha consciência disso e dominará melhor a experiência dramática dos seus leitores/espectadores.

(62)

Como gerir a

informação?

Uma das principais tarefas de um guionista é gerir o fluxo de informação que passa entre os seus personagens e o leitor/espectador.

Há três situações possíveis:

•espectador e personagens sabem o mesmo; •o espectador sabe mais que os personagens;

•os personagens sabem mais do que o espectador.

Os primeiros dois casos ficam bem claros na situação que Hitchcock descrevia na sua distinção entre surpresa e suspense.

Se uma bomba explodir inesperadamente, há um efeito de surpresa tanto para os personagens, na estória, como para os espectadores, na audiência. A explosão da bomba é uma informação nova que nenhum dos dois possuía antes.

(63)

Pelo contrário, se nos for mostrada uma bomba debaixo da mesa dos personagens, sem eles o saberem, cria-se um efeito de suspense. Como espectadores sabemos mais do que os personagens, o que acentua o dramatismo da situação.

O terceiro caso é diferente - os personagens recebem alguma informação que não é passada ao espectador.

Por exemplo, no 3º ato de A Parte dos Anjos o protagonista explica aos amigos o seu plano para o clímax do filme. A cena começa com um diálogo normal mas depois passa a ser mostrada à distância, e deixamos de ouvir as suas palavras. Outro exemplo: no fim de Juno a protagonista escreve uma mensagem que vai deixar em casa dos pais adotivos do seu bebé. Nós sabemos que ela a escreveu, mas não o seu conteúdo.

Em ambos estes casos os personagens passam a ter uma informação de que nós não dispomos, o que aguça a nossa curiosidade e aumenta a expectativa sobre o que irá acontecer a seguir.

(64)

É claro que esta terceira situação só funciona se soubermos que os personagens têm uma informação que nós desconhecemos. Caso contrário, não se cria efeito de suspense; quando muito de surpresa, quando ela for revelada.

Parafraseando o secretário de Estado norte-americano, Donald Rumsfeld, "há as

coisas que sabemos que sabemos; há as coisas que sabemos que não sabemos; e há ainda as coisas que não sabemos que não sabemos".

(65)

Como escrever os

Cabeçalhos?

Começo hoje a explicar alguns aspetos formais da escrita de um guião. O seu resumo pode ser encontrado num infografismo que publiquei no blogue, a

Anatomia de um Guião.

Num guião de cinema uma cena é uma unidade dramática definida por um determinado local e período, sem quebras de tempo.

Se mudarmos de local devemos começar uma nova cena. Se houver uma passagem de tempo, mesmo que o local se mantenha, também devemos começar uma cena nova.

Como é que indicamos que há uma mudança de cena? Introduzindo um novo CABEÇALHO.

(66)

Contém três elementos essenciais:

deve começar indicando se é uma cena passada num interior ou exterior, INT. ou EXT.

deve indicar o local da cena, por exemplo CASA DE JOAQUIM - SALA

deve indicar o período do dia ou da noite, separado por um travessão - DIA ou NOITE

Por exemplo, são cabeçalhos válidos os seguintes: INT. CASA DE JOAQUIM - SALA - DIA

ou

EXT. ESCOLA - CAMPO DE FUTEBOL - NOITE

Também são válidos, e usados por vezes em Portugal e no Brasil, os cabeçalhos escritos numa outra ordem, como os seguintes:

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ou

EXT. NOITE - RUA Mas já não são válidos

INT - CAMPO DE FUTEBOL - CENA 10

(não tem ponto final depois do INT; não tem lógica um campo de futebol ser interior; e os números de cena, quando se indicam, não é dessa forma).

ou

EXTERIOR; Casa do Francisco; manhã

(deveria ser toda em maiúsculas; começar com EXT.; e usar um travessão em vez do segundo ponto e vírgula).

A escrita dos cabeçalhos tem mais algumas subtilezas que pode explorar num artigo que escrevi no blogue, incluindo o uso de Cabeçalhos Secundários. Mas 90% das situações são resolvidas como indicado.

(68)

Os softwares de escrita de guião, como o Final Draft, o CeltX ou o Trelby, resolvem automaticamente a formatação dos Cabeçalhos e restantes elementos.

Processadores de texto como o Word ou o Pages também podem ser usados, desde que se respeitem as convenções de formato.

(69)

Como escrever as

Descrições?

Cada nova cena começa com um Cabeçalho, como vimos ontem. O parágrafo seguinte, separado por uma linha vazia, deve sempre ser uma DESCRIÇÃO.

Descrição, ou Ação, são os parágrafos do guião onde se descreve o que pode ser visto ou ouvido no filme (com a exceção dos Diálogos, que têm outro tratamento). Isto inclui a descrição dos locais onde as cenas decorrem, dos adereços ou veículos, dos personagens, incluindo a sua aparência, dos efeitos especiais ou sonoros, etc. Também inclui a descrição das ações, comportamentos, gestos, movimentos dos personagens e outros elementos em cena.

Tudo o que deva ser visto ou ouvido no filme deve ser colocado nas Descrições. Os americanos têm uma frase para isso; "If it's not on the page, it's not on the stage" - se

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Algumas notas importantes quanto às Descrições:

•São escritas sempre na terceira pessoa do singular: Pedro olha. O carro despista-se. O cão ladra.

•Devem incluir apenas a informação necessária e suficiente para perceber o local, as pessoas, as relações e as ações. Informação em excesso pode tornar um guião muito difícil de ler; informação em falta pode torná-lo pouco apelativo.

•Sempre que um personagem é apresentado pela primeira vez num guião, o seu nome deve ser indicado em maiúsculas. Também é costume dedicar-lhe uma pequena descrição, tanto mais cuidada quanto mais importante ele for.

•Efeitos sonoros, efeitos especiais e alguns acessórios particularmente importantes também podem ser destacados em maiúsculas.

•Os parágrafos de Descrição são normalmente curtos, com duas ou três linhas, como demonstrei num artigo do blogue. Isto torna a leitura mais fácil e fluida. •Podemos dar a entender o ritmo de uma cena através da sucessão e do ritmo da

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Para terminar, vejamos uma pequena cena do meu guião O Pedido, composta apenas por Descrição.

INT. SALA - DIA

Jaime está na sala comum do seu pequeno apartamento, perto da mesa. Veste o seu fato bom, com uma gravata vistosa. É a sua melhor tentativa para ser elegante, mas não fica nem perto. Confere uma caixinha de veludo de ourivesaria e parece ficar satisfeito com o conteúdo.

Guarda a caixa no bolso e afasta uma das cadeiras da mesa. Depois sobe para cima da cadeira, equilibrando-se com alguma dificuldade. Desce e volta a subir, tentando dar elegância e dignidade ao movimento.

(72)

Como escrever os

Diálogos e Parênteses

Na maior parte dos filmes - mesmo nos mudos - os personagens falam. E, quando bem utilizados, os Diálogos são um elemento fundamental de um guião.

Bons diálogos têm algumas características em comum: •São elementos de ação, que fazem avançar a trama.

•São demonstrações de conflito, confrontos orais, que contribuem para a manutenção e escalada do drama.

•Fornecem novos desafios e informações.

•Não são óbvios e expositórios. Não estão na cena apenas para cumprir alguma função ou responder a alguma necessidade.

• São vivos, dinâmicos, interactivos, e variados. Contribuem para o ritmo e dinâmica das cenas.

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•Soam a verdadeiros, parecem retirados da vida real, embora quando analisados à lupa demonstrem ser uma construção rigorosa, económica e depurada.

•São adequados aos personagens que os falam; às suas características sociais, históricas, psicológicas.

•São cheios de segundos sentidos e interpretações paralelas, aquilo a que normalmente se chama o “subtexto”.

Em termos formais, para apresentar os diálogos num guião usam-se três elementos: os Personagens, Diálogos e Parênteses.

O elemento Personagem identifica quem fala; o elemento Diálogo identifica o que ele diz; e o elemento Parênteses dá indicações adicionais que não sejam óbvias da leitura do diálogo. Por exemplo, um tom especial (irónico) ou a quem se dirige a fala, quando há várias pessoas (para Rita).

(74)

PEDRO

Queres saber o que me aconteceu hoje?

RITA (irónica)

Mal posso esperar… PEDRO

(pausa)

Queres saber, ou não? RITA

(para a cozinha)

Paula, trazes-me um cafézinho? (para Pedro)

Estavas a dizer…?

(75)

•os Personagens começam a ser escritos a 9,25 cm da margem esquerda e alinham à esquerda (não são centrados na página);

•os Parênteses são escritos entre os 7,75cm da margem esquerda e os 7,25 da direita;

•os Diálogos estendem-se dos 6,5cm da margem esquerda a 6,5cm da direita. Os softwares de escrita de guião indicados no apêndice deste livro encarregam-se automaticamente de introduzir estas medidas. São a melhor solução para escrever um argumento.

(76)

Qual é o uso correto

das Transições e

Planos?

A resposta é fácil: o uso correto das Transições e Planos é o mínimo possível.

Quando procuramos na net guiões para ler muitas vezes encontramos os chamados

shooting scripts, ou guiões de rodagem.

São versões dos guiões que já foram reescritas de acordo com as indicações dos realizadores para servir de guia durante a rodagem do filme. Por isso incluem muitas indicações de câmara e de edição, como planos, movimentos, transições, etc.

Por exemplo, o guião de A rainha africana começa assim:

EXT. A NATIVE VILLAGE IN A CLEARING BETWEEN THE JUNGLE AND THE RIVER. LATE MORNING

(77)

As indicações de LONG SHOT, MEDIUM SHOT, CLOSER SHOT, REVERSE ANGLE,

DISSOLVE TO:, etc., sucedem-se nas páginas desse tipo de guiões, o que pode criar

a ideia de que é obrigação do guionista encher o guião com este tipo de informação.

Na realidade, é exatamente o contrário.

O tipo de guião que você vai escrever é o chamado guião literário. O seu objetivo é contar a estória do filme de uma forma envolvente, que transporte o leitor para dentro do universo dramático e o ajude a imaginar o filme.

Indicações de planos ou movimentos de câmara, paradoxalmente, têm o efeito contrário. Em vez de prender o leitor, quebram o fluxo da narrativa e afastam-no do

filme imaginado.

O tipo de direção que podemos fazer num guião é indireta e subjetiva. Por exemplo, se escrevermos

(78)

Não perca tempo a dar indicações de câmara no seu guião. Os leitores não gostam - e os realizadores também não.

(79)

A reescrita

Parabéns! Chegou ao fim do desafio que se propôs: escrever um guião em trinta

dias.

Talvez não o tenha terminado, e fique desanimado com isso. Mas não é para ficar. O importante é que já deu os primeiros passos e está no bom caminho. Agora é uma questão de não parar.

Se não foi em trinta dias, será em 60, ou 90, ou nos que forem necessários. Mas no fim terá a satisfação de ter transposto para o papel algo que só existia na sua

cabeça.

Como disse no primeiro artigo do FrenesiDeEscrita o objetivo deste desafio não é chegar ao fim com um final draft pronto a apresentar ao mundo, mas sim com uma primeira versão, normalmente cheia de erros e defeitos.

(80)

A fase seguinte será a reescrita, e só através dela poderá ter um guião digno de mostrar a produtores, realizadores, atores e outros leitores.

Como fazer a rescrita?

O ideal é trabalhar por etapas, começando do mais geral para o particular.

•Em primeiro lugar, deixe o guião repousar durante algum tempo, para conseguir o distanciamento necessário. Pode aproveitar esse período para fazer o seu registo. •Comece depois por rever o seu enredo e estrutura. Procure os pontos fracos, os

erros lógicos, os segmentos desnecessários ou mais aborrecidos, as falhas no encadeamento das cenas, etc.

•Em seguida siga o percurso de cada um dos personagens. Veja se esse percurso é lógico, se os seus comportamentos são consistentes, se as transformações (no caso de as haver) são compreensíveis e motivadas.

•Depois, passe para a análise das cenas individuais, da sua dinâmica interna, dos conflitos e tensões. Veja como estão escritas as descrições, se são visuais, se só

(81)

está a descrever o que pode ser visto ou ouvido, se a sua escrita é concreta mas também evocativa e inspiradora. É nesta fase que deve rever os diálogos,

assegurar-se de que eles são escorreitos e interessantes, e de que cada personagem tem uma voz própria e distinta.

•Finalmente, verifique se a formatação está certa e corrija as gralhas. Não descure este último aspecto — é uma das maneiras mais fáceis de dar um ar “profissional” ao seu guião.

Estas etapas são descritas com mais detalhe no ebook gratuito Como reescrever o

(82)
(83)

ANEXO 1: Não tenho

tempo para escrever

Quando acima referi o desafio do FrenesiDeEscrita — escrever 100 páginas de argumento nos 30 dias de Abril — destaquei que, para o conseguir, bastaria escrever três páginas e meio por dia.

Uma meta destas pode ser alcançada, sem demasiado esforço, reservando uma ou duas horas diárias para a escrita.

Mas muitos aspirantes a escritores afirmam ter uma vida demasiado ocupada para conseguir libertar tanto tempo todos os dias. Para alguns, até 30 minutos de escrita são impossíveis de encaixar na agenda totalmente preenchida.

É verdade que manter uma atividade criativa em paralelo com um emprego de tempo inteiro, e com as responsabilidades familiares e sociais, pode ser

(84)

Mas, como Laura Vanderkam destacou num artigo recente do Wall Street Journal, em vez de “não tenho tempo”, devemos ter a coragem de dizer simplesmente “isso não é uma prioridade para mim”.

Se calhar:

•escrever não é uma prioridade, mas estar com os amigos é;

•escrever não é uma prioridade, mas ter a casa impecavelmente limpa é;

•escrever não é uma prioridade, mas ver a nova temporada de Game of Thrones é; •escrever não é uma prioridade, mas dormir oito horas é;

•escrever não é uma prioridade, mas dar uma volta no shopping no intervalo do almoço é;

•escrever não é uma prioridade, mas ir ao ginásio é. E assim por diante.

(85)

Mudando as palavras, mudamos a nossa perspetiva sobre o assunto, olhando-o de uma maneira muito mais honesta: o tempo é igual para todos, as prioridades é que variam.

Quando escrever for realmente uma prioridade para si, alguma outra coisa deixará naturalmente de o ser. E o tempo necessário aparecerá — nem que sejam apenas 30 minutos por dia.

(86)

ANEXO 2: Recursos

úteis

Blogue do autor: http://joaonunes.com

Site Roteiro de Cinema

Software CeltX

Software Trelby

Software Fountain

Software Final Draft

Infografismo: Anatomia de um guião

Ebook de reescrita

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Sobre o autor

João Nunes é um autor, argumentista e publicitário

português que divide a sua vida entre Portugal, Brasil e Angola.

Conta com mais de 3500 minutos de ficção

audiovisual produzida, incluindo 6 longas metragens, 5 telefilmes, 10 curtas metragens e dezenas de

episódios de séries de televisão. Também escreveu e realizou a curta-metragem O Presente.

Exerceu durante muito tempo as funções de presidente da APAD — Associação Portuguesa de Argumentistas e Dramaturgos e é membro fundador da Academia Portuguesa de Cinema.

(88)

TRABALHOS PRODUZIDOS

Cinema

A Teia de Gelo - Longa-metragem, Cinemate

O Cônsul de Bordéus - Longa-metragem, Take 2000 Assalto ao Santa Maria - Longa-metragem, Take 2000 Julgamento - Longa-metragem, Stopline Films

Tiro no Escuro - Longa-metragem, MGN

A Selva — Longa-metragem, Costa do Castelo

Televisão

Uma Família Açoriana - Mini-série de 6 episódios, RTP O Dez — Série de curtas metragens, RTP

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Liberdade 21 — Série, vários episódios, RTP 29 Golpes — Telefilme, RTP

Inspector Max — Série, vários episódios, TVI Espírito da Lei — Série, vários episódios, SIC Amor Perdido — Telefilme, SIC

Mustang — Telefilme, SIC

Realização

O Presente — Curta metragem da série O Dez, RTP

Teatro

Animais de Palco Era uma vez… Jazz

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Direitos de consulta

e reprodução

Este documento foi escrito e produzido por João Nunes, e publicado gratuitamente no site

http://joaonunes.com.

O texto reflete apenas as opiniões do autor. Todos os direitos são reservados.

Pode ser impresso para uso e consulta particular, mas não pode ser vendido nem integrado em qualquer outro texto ou publicação.

Só pode ser distribuído após autorização do autor, obtida através do blogue.

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