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Atualidades em perda gestacional de repetição: definição, diagnóstico e propedêutica

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Atualidades em perda

gestacional de repetição:

definição, diagnóstico

e propedêutica

Current guidelines for recurrent

pregnancy loss: definition, diagnostic

tests and investigation

Elaine Cristina Fontes de Oliveira1, Claudia Navarro Carvalho Duarte Lemos1, Inês Katerina

Damasceno Cavallo1

RESUMO

Classicamente, a perda gestacional de repetição (PGR) é a ocorrência de três ou mais perdas consecutivas antes de 20 semanas de gestação. Entretanto, as dire-trizes para definição, propedêutica e tratamento são controversas. As causas de PGR podem ser multifatoriais e incluem alterações anatômicas do útero, distúrbios endócrinos, alterações imunológicas, infecções, alterações genéticas, obesidade materna, entre outras. Entretanto, na maioria dos casos, a causa de PGR é desco-nhecida. Os protocolos para o diagnóstico de PGR variam muito e são direcionados à pesquisa de possíveis fatores causais. Neste artigo foi realizada uma revisão e comparação das últimas diretrizes para diagnóstico e propedêutica das causas de PGR da Sociedade Europeia de Reprodução Humana e Embriologia (ESHRE), da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva (ASRM) e do Royal College of

Obs-tetricians and Gynaecologists (RCOG). ABSTRACT

Recurrent pregnancy loss (RPL) is traditionally defined by the occurrence of three or more consecutive losses before 20 weeks of gestation. The guidelines for definition, investigations and treatments are controversial. The causes of RPL can be multifacto-rial and includes structural uterine anomalies, endocrine alterations, immunological dysfunction, infections, genetic anomalies, maternal obesity, among others. However, in most cases the cause of RPL is unknown. The diagnosis protocols of RPL vary wi-dely and causal factors are the major goal. In this article, we review and compare the latest RPL diagnosis and investigations guidelines, including the European Society for Human Reproduction and Embryology (ESHRE), American Society for Reproductive Medicine (ASRM) and the UK Royal College of Obstetricians and Gynaecologists (RCOG).

INTRODUÇÃO

Perda gestacional de repetição (PGR) é um tema muito estudado, porém falta consenso sobre seu diagnóstico e manejo. As diretrizes para definição, exa-mes propedêuticos e tratamento variam entre as diferentes sociedades. Em 2018, a Sociedade Europeia de Reprodução Humana e Embriologia (ESHRE) atualizou suas diretrizes, enquanto as últimas atualizações da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva (ASRM) e do Royal College of

Obstetri-cians and Gynaecologists (RCOG) datam de 2013 e 2011, respectivamente.(1-3)

Neste artigo, faremos uma revisão das diretrizes existentes sobre PGR, abor-dando definição e possíveis fatores causais.

Descritores

Aborto; Aborto habitual; Aborto espontâneo; Trombofilia; Obesidade; Protocolos Keywords

Abortion; Habitual abortion; Spontaneous abortion;

Thrombophilia; Obesity; Protocols

Submetido: 04/04/2020 Aceito: 21/09/2020

1. Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil. Conflito de interesses:

Nada a declarar. Como citar:

Oliveira EC, Lemos CN, Cavallo IK. Atualidades em perda gestacional de repetição: definição, diagnóstico e propedêutica. Femina.

2020;48(11):699-704. Autor correspondente:

Elaine Cristina Fontes de Oliveira Av. Pres. Antônio Carlos, 6.627, Pampulha, 31270-901, Belo Horizonte, MG, Brasil.

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CONCEITO E ETIOLOGIA

A PGR afeta cerca de 3% dos casais que estão tentan-do conceber, quantentan-do se consideram, pelo menos, duas perdas, e cerca de 1% com mais de três perdas.(4,5) É

de-finida classicamente como três ou mais perdas gesta-cionais consecutivas antes de 20 semanas de gestação, incluindo gravidezes espontâneas e após técnicas de reprodução assistida, excluindo-se gestações molares e ectópicas e falhas de implantação.(6) A definição de PGR

varia conforme a referência utilizada, dependendo do número de perdas, época da perda e tipo de gravidez avaliada (Quadro 1).

O desenvolvimento embrionário inicial é impactado diretamente por diferentes fatores, consequentemente a PGR possui etiologias múltiplas, com vários fatores contribuintes.(8,9) Algumas mulheres não terão nenhuma

anormalidade identificável, além de aneuploidias em-brionárias. Essas pacientes são saudáveis, com prope-dêutica normal, sendo classificadas como PGR de causa inexplicada.(5) Correspondem a cerca de 50% dos casos

e representam um grupo bastante heterogêneo, no qual algumas terão perdas atribuíveis somente ao acaso, en-quanto outras apresentarão possíveis patologias, ain-da não identificaain-das com os protocolos investigativos atuais. Possíveis fatores causais incluem anomalias cro-mossômicas no casal, trombofilias maternas, dades uterinas estruturais, disfunção imune, anormali-dades endocrinológicas e fatores ambientais.(4,10-12)

DIAGNÓSTICO E PROPEDÊUTICA

O diagnóstico etiológico da PGR baseia-se na anamne-se, exame físico e exames complementares. A avaliação de mulheres saudáveis após uma única perda gestacio-nal não é recomendada, pois, em geral, trata-se de um evento esporádico. Na anamnese, devemos investigar:

idade da paciente, padrão e trimestre da perda gesta-cional, presença de embrião ou feto vivo, complicações, achados ultrassonográficos, resultados anatomopatoló-gicos e cariótipo da perda. Pesquisar exposição ambien-tal a toxinas e drogas ilícitas, uso de álcool, cigarro e cafeína, além de infecções ginecológicas ou obstétricas anteriores. Deve-se também investigar fatores associa-dos a síndrome do anticorpo antifosfolípide (SAAF), con-sanguinidade do casal, história familiar de PGR, assim como exames e tratamentos anteriores. O exame físico deve incluir avaliação tireoidiana (aumento ou presença de bócio), avaliação das mamas (galactorreia), verifica-ção da presença de hirsutismo e índice de massa corpo-ral (IMC). No exame pélvico, avaliamos cérvix, volume e contorno uterino, presença de leiomiomas e outras alte-rações mullerinas. Os exames complementares a serem solicitados variam de acordo com as diferentes entida-des internacionais e estão resumidos no quadro 2.(13,14)

ANORMALIDADES GENÉTICAS

As causas genéticas de PGR incluem as doenças gênicas específicas e as alterações cromossômicas. Estas po-dem ser pesquisadas no casal ou no concepto, sendo responsáveis por 70% dos abortamentos precoces, es-pecialmente em pacientes com idade mais avançada.(4)

Apesar de ser a principal causa diagnosticada de aborta-mento, a ocorrência de alterações cromossômicas pode ser ao acaso. A ASRM recomenda a realização rotineira do cariótipo do casal, enquanto a ESHRE não recomen-da.(1,2) A análise genética dos restos gestacionais não é

indicada pela ASRM, nem pela ESHRE. Entretanto, essa análise pode ser elucidativa, pois, após o diagnóstico de aneuploidia no concepto, nenhuma avaliação adicional ou tratamento seriam recomendados, porque a causa da perda seria conhecida.(1,2) O RCOG recomenda a

reali-Quadro 1. Definição de perda gestacional de repetição

ESHRE 2017 ASRM 2013 RCOG 2011

Tipo de gravidez Inclui gestações espontâneas e após TRA. Exclui gestação bioquímica, gravidez ectópica e gravidez molar.

Inclui apenas gravidez clínica. Inclui todas as gravidezes, até mesmo as bioquímicas.

Semanas de gestação Até 24 semanas Antes da viabilidade fetal Até 24 semanas

Recorrência 2 perdas 2 perdas 3 perdas

Consecutivas Não Sim Sim

Fonte: ESHRE Guideline Group on RPL, Bender Atik R, Christiansen OB, Elson J, Kolte AM, Lewis S, Middeldorp S, et al. ESHRE guideline: recurrent pregnancy

loss. Hum Reprod Open. 2018;2018(2):hoy004.(1) Practice Committee of the American Society for Reproductive Medicine. Evaluation and treatment of recurrent

pregnancy loss: a committee opinion. Fertil Steril. 2012;98(5):1103-13.(2) Royal College of Obstetricians and Gynaecologists. Recurrent miscarriage, investigation

and treatment of couples. London: RCOG; 2011. (Greentop Guideline; no. 17).(3) Kolte AM, Bernardi LA, Christiansen OB, Quenby S, Farquharson RG, Goddijn M, et al.

Terminology for pregnancy loss prior viability: a consensus statement from the ESHRE early pregnancy special interest group. Hum Reprod. 2015;30(3):495-8.(7)

ESHRE: Sociedade Europeia de Reprodução Humana e Embriologia; ASRM: Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva; RCOG: Royal College of Obstetricians

and Gynaecologists; TRA: técnicas de reprodução assistida. Gravidezes clínicas: aquelas documentadas por meio de sinais ultrassonográficos ou histopatológicos

de gestação, não incluindo gestação ectópica e molar. Gestações bioquímicas: aquelas diagnosticadas apenas pela elevação sérica de beta-hCG, que se interrompe mais precocemente.

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zação da análise citogenética dos restos embrionários a partir da terceira perda. Se o resultado for translocação não balanceada, indica-se, também, avaliar o cariótipo dos pais.(3) Caso seja solicitado o cariótipo do concepto,

devemos utilizar a metodologia de array-CGH, devido ao menor risco de contaminação cruzada com o material materno.(1)

ANORMALIDADES UTERINAS

As anormalidades anatômicas uterinas estão associa-das principalmente às perassocia-das de segundo trimestre. A incidência média de anomalias congênitas uterinas é de 4,3% em mulheres férteis e de 12,6% em mulheres com

PGR.(4) O útero septado é a anomalia mais comumente

relacionada à PGR, sendo descrita taxa de abortamento de até 65% nesses casos. O septo é composto de teci-do fibromuscular, pobremente vascularizateci-do, que com-promete a decídua e o desenvolvimento placentário.(15)

Outras anormalidades congênitas, como útero didelfo, bicorno e unicorno, estão relacionadas a perdas tardias e partos prematuros, mas não à PGR.(4) O trauma

intrau-terino resultante de curetagem endometrial, aspiração manual intrauterina ou endometrite pode resultar em desenvolvimento de aderências intrauterinas (siné-quias), que variam de mínima a completa obstrução da cavidade endometrial. O termo “síndrome de Asherman”

Quadro 2. Investigação de PGR de acordo com entidades internacionais

ESHRE (2017) ASRM (2013) RCOG (2011)

Investigação geral História médica,

obstétrica e familiar História médica relacionada à PGR, estilo de vida

-Cariótipo dos pais Não recomendado de rotina Recomendado Recomendado apenas após

cariótipo do concepto com diagnóstico de translocação não balanceada

Cariótipo dos produtos

da concepção Pode ser usado apenas para fins elucidativos; preferir CGH-array

Pode ser útil Recomendado a

partir da terceira perda

Pesquisa de trombofilia Não recomendado de rotina Realizar apenas em

protocolos de pesquisa ou na presença de outros fatores de risco para trombofilia

Não recomendado Recomendado apenas em protocolos de pesquisas e se história pessoal ou familiar de trombose sem fator de risco associado

Recomenda-se pesquisa do fator V de Leiden, fator II e proteína S em mulheres com perdas de 2º trimestre

Hiper-homocisteinemia Não recomendado Não cita Não cita

Pesquisa de SAAF Anticardiolipina IgG e IgM + anticoagulante lúpico + antibeta-2-glicoproteína-I IgG e IgM podem ser realizados

Anticardiolipina IgG e IgM + anticoagulante lúpico + antibeta-2-glicoproteína-I IgG e IgM

Anticardiolipina IgG e IgM + anticoagulante lúpico em 2 ocasiões com 12 semanas de intervalo Endocrinologia TSH e anti-TPO; dosar T4

se exames alterados TSH, prolactina, hemoglobina glicada Não cita Avaliação da anatomia uterina Ultrassom 3D Histerossonografia, HSG

ou histeroscopia US pélvico; se alteração uterina: histeroscopia, laparoscopia ou US 3D Fator masculino Fragmentação de DNA do

SPTZ pode ser considerado Fragmentação de DNA do SPTZ: não recomendado

-Vitamina D Não recomendado Não recomendado

-Testes de reserva ovariana Não recomendado Não recomendado

-Deficiência lútea Não recomendado Não recomendado

Causas infecciosas Não recomendado Não recomendado

-Fonte: Youssef A, Vermeulen N, Lashley EELO, Goddijn M, van der Hoorn MLP. Comparison and appraisal of (inter)national recurrent pregnancy loss guidelines.

Reprod Biomed Online. 2019;39(3):497-503.(13) Kutteh W. Review of current guidelines for recurrent pregnancy loss: new strategies for optimal evaluation of women

who may be superfertile. Semin Perinatol. 2019;43(2):105-15.(14)

SAAF: síndrome do anticorpo antifosfolípide; IgG: imunoglobulina G; IgM: imonoglobulina M; TSH: hormônio estimulante da tireoide; anti-TPO: anticorpos antiperoxidase; US: ultrassom; US 3D: ultrassom tridimensional; HSG: histerossalpingografia; SPTZ: espermatozoide.

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é usado para aderências intrauterinas completas, asso-ciadas à oligomenorreia ou à amenorreia.(4) As sinéquias

podem resultar em perda fetal devido a um endomé-trio insuficiente para suportar o desenvolvimento pla-centário.(6) Não existem dúvidas do papel do leiomioma

submucoso na etiologia da PGR e de que miomas sub-serosos e intramurais pequenos, que não distorcem a cavidade, não se associam à PGR. A controvérsia existe em relação aos grandes miomas intramurais e seu im-pacto na evolução das gestações.(12,15,16) A incompetência

istmocervical é uma anomalia congênita ou adquirida associada à PGR, principalmente de segundo trimestre. O diagnóstico é baseado na presença de dilatação indo-lor da cérvix, por incapacidade do colo uterino de reter a gestação. Pode associar-se a anomalias congênitas como útero bicorno ou septado, mas, em geral, existe o histórico de trauma cirúrgico da cérvix por conização, cirurgias de alta frequência, dilatação cervical para cure-tagem uterina ou lacerações obstétricas.(10,15,16) Todas as

mulheres com PGR devem realizar algum tipo de avalia-ção uterina. A ASRM recomenda a histerossonografia ou histerossalpingografia como exames iniciais, enquanto a ESHRE orienta a ultrassonografia tridimensional (US 3D). O RCOG indica inicialmente apenas a ultrassonografia pélvica, mas, na suspeita de alterações uterinas, podem ser realizados exames complementares, como histeros-copia, laparoscopia e US 3D.(1-3) A ressonância magnética

ou US 3D são úteis na definição do contorno uterino ex-terno, permitindo o diagnóstico diferencial entre útero bicorno e útero septado, além de avaliar a presença e a localização exata de miomas. Na presença de malforma-ção mulleriana, deve-se avaliar o trato urinário, pois é comum a presença de malformações associadas.

FATORES HORMONAIS

A presença de ovários micropolicísticos à US não é fator preditivo de perda gestacional em mulheres normovula-tórias que engravidam espontaneamente.(17) Já mulheres

com a síndrome dos ovários policísticos (SOP) parecem apresentar maior incidência de abortamento.(18) A

re-sistência à insulina também parece ser fator de risco isolado para perda gestacional. O controle glicêmico inadequado aumenta o risco de aborto espontâneo, que é reduzido quando a mulher se torna euglicêmi-ca pré-conceptual. Diabetes bem controlado não euglicêmi-causa PGR.(4,5,18) A hiperprolactinemia pode estar associada à

PGR devido a alterações no eixo hipotálamo-hipofisá-rio-ovariano, resultando em prejuízo da foliculogênese e maturação oocitária e/ou encurtamento da fase lú-tea.(4,6,17) A ESHRE não recomenda o rastreamento

rotinei-ro para SOP nem dosagem de glicemia e insulina de je-jum. A dosagem de prolactina é recomendada apenas na presença de sinais clínicos de hiperprolactinemia.(1) Já a

ASRM recomenda dosagens de hemoglobina glicada e prolactina rotineiramente.(2) O hipotireoidismo clínico e

subclínico não tratados associam-se a maiores taxas de

PGR.(18,19) Alguns estudos mostraram que gestantes

por-tadoras de anticorpos antiperoxidase (TPO) apresentam incidência elevada de abortamento.(19) Entretanto,

ou-tros autores consideram controversa essa associação.(17)

A dosagem de hormônio estimulador da tireoide (TSH) está recomendada em todas as pacientes com PGR, e devem ser considerados normais níveis iguais ou abaixo de 2,5 mIU/mL.(4,17,18,20) Já a dosagem rotineira do anti-TPO

é recomendada apenas pela ESHRE, que também orien-ta a dosagem de T4 quando TSH e/ou anti-TPO estão alterados.(1,2)

DEFEITO DE FASE LÚTEA

Não há modalidade diagnóstica internacionalmente aceita para o defeito de fase lútea.(19) Apesar de o

da-tamento histológico do endométrio ser historicamente considerado padrão-ouro no seu diagnóstico, a acurácia desse método é questionável devido à grande variabi-lidade inter e intraobservador. Os níveis séricos de pro-gesterona apresentam grandes flutuações durante o dia, o que compromete seu uso para diagnóstico. A dosagem seriada de progesterona sérica parece ser a mais útil e viável, sendo realizada por duas vezes após o 20º dia do ciclo.(17) A mensuração de progesterona na fase lútea

é considerada anormal se os valores estiverem abaixo de 10 ng/mL.(15) A ESHRE e a ASRM não recomendam sua

investigação.(1,2)

SÍNDROME DO ANTICORPO

ANTIFOSFOLÍPIDE (SAAF)

A pesquisa mais aprofundada da presença de anticor-pos antifosfolípides, que têm sabidamente vários efei-tos deletérios no trofoblasto, poderia diagnosticar essa síndrome em até 42% das pacientes com PGR.(4,17) Os

cri-térios de SAAF estão descritos no quadro 3.(21)

A ESHRE recomenda a triagem para SAAF por meio da realização das dosagens de anticorpo anticardiolipina IgG e IgM e anticoagulante lúpico.(1) Já a ASRM

recomen-da a dosagem de antibeta-2-glicoproteína-I IgG e IgM, além dos dois primeiros exames. O RCOG recomenda dosar anticorpos anticardiolipina e anticogulante lú-pico em duas ocasiões, com 12 semanas de intervalo entre elas.(2,3)

TROMBOFILIAS HEREDITÁRIAS

A ESHRE não indica a pesquisa rotineira de nenhuma trombofilia hereditária em pacientes com PGR.(1,17,22,23)

Para a ASRM, a pesquisa deve ser realizada em pacien-tes com história prévia de tromboembolismo em situa-ções sem risco ou que tenham parentes sabidamente portadores de trombofilia.(4) Nesses casos, indica-se a

pesquisa do fator V de Leiden, mutação da protrombina, proteína C, proteína S e antitrombina III. A mutação da metilenotetra-hidrofolato redutase (MTHRF) não deve ser realizada rotineiramente.(22,23) A dosagem de

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homo-cisteína também não é recomendada.(1) O RCOG

reco-menda as dosagens do fator V de Leiden, da protrom-bina e proteína S apenas em mulheres com perdas de segundo trimestre.(3)

INFECÇÕES

Nenhum patógeno foi indicado como causador de PGR, não havendo nenhuma recomendação para exames es-pecíficos nesse grupo de mulheres.(4,22) A presença de

va-ginose bacteriana durante o primeiro trimestre da gra-videz é fator de risco para abortamento tardio e parto prematuro.(15)

DEFEITO ENDOMETRIAL PRIMÁRIO

Estudos morfológicos e imunoistoquímicos sugerem que um defeito endometrial primário poderia estar pre-sente em pacientes com PGR. A expressão aumentada de citocinas pré-implantação poderia ser responsável pela implantação de embriões de pior qualidade, au-mentando a chance de perda gestacional.(4) Possíveis

causas do defeito de receptividade endometrial e os biomarcadores para avaliação endometrial ainda estão sendo pesquisados.(6)

DISFUNÇÃO ALOIMUNE

Durante a gestação, o sistema imune materno sofre al-terações imunes locais e sistêmicas para tolerar o con-cepto semialogênico. O papel da aloimunidade na PGR ainda permanece controverso, com estudos inconsis-tentes e não reproduzíveis.(22,23)

OBESIDADE

Mulheres com IMC acima de 30 kg/m2 têm risco 20%

maior de abortamento espontâneo e três vezes maior de apresentarem PGR.(15,19) A associação com a resistência

à insulina também contribui para aumentar o risco.(4,15)

FATORES AMBIENTAIS

Dados sugerem que a ingestão de cafeína acima de 300 mg por dia e o consumo de álcool em altas doses au-mentam significativamente o risco de abortamento, mas não existem evidências concretas sobre sua relação com PGR.(4,10,22) O tabagismo possui um efeito direto na

fun-ção do trofoblasto e tem associafun-ção dose-dependente com risco de abortamento. O uso de cocaína confere um risco independente de perda gestacional, enquanto o álcool apresenta efeitos adversos na fertilidade e no desenvolvimento fetal.(4,17,22)

FATORES PSICOLÓGICOS

Pacientes com PGR têm predisposição a sentimentos de raiva, depressão, ansiedade, culpa e tristeza.(4) O fato de

o suporte psicológico, chamado tender loving care, me-lhorar as taxas de gravidez sugere um papel dos fatores psicológicos na PGR.(13,24) Apesar de o stress estar

asso-ciado à PGR, não existe nenhuma evidência de que ele é causa direta de perda gestacional.(1)

FATOR MASCULINO

A contribuição do fator masculino para PGR não está clara. Com exceção do cariótipo, não existe outro

tes-Quadro 3. Critérios de classificação da síndrome de anticorpos antifosfolípides – Consenso internacional – Critérios de Sapporo(21)

Diagnóstico confirmado: presença de 1 critério clínico + 1 critério laboratorial Critérios clínicos:

1. Trombose vascular

2. Morbidade gestacional

Uma ou mais mortes inexplicadas de feto morfologicamente

normal após a 10a semana de gestação

Um ou mais partos prematuros de recém-nascido morfologicamente normal antes de 34 semanas de gestação, por causa de pré-eclâmpsia grave ou eclâmpsia ou insuficiência placentária

Três ou mais abortamentos antes de 10 semanas de gestação, após a exclusão de alterações morfológicas e hormonais maternas e cromossômicas maternas e paternas

Critérios laboratoriais:

1. Presença de anticoagulante lúpico no plasma em 2 ocasiões, com pelo menos 12 semanas de intervalo 2. Presença de anticorpo anticardiolipina IgG e IgM no plasma em titulação média ou

alta em duas ou mais ocasiões, com pelo menos 12 semanas de intervalo

3. Presença de anticorpo antibeta-2-glicoproteína IgG ou IgM no soro plasma em titulação média ou alta em duas ou mais ocasiões, com pelo menos 12 semanas de intervalo

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te diagnóstico recomendado para o parceiro. Embora a fragmentação do DNA espermático tenha sido implica-da em PGR, ela não é rotineiramente indicaimplica-da. A frag-mentação do DNA resulta de múltiplos mecanismos, incluindo exposição ambiental, varicocele, alterações genéticas e epigenéticas, que resultam em possível dano ao DNA espermático.(25)

CONCLUSÃO

A PGR é um tema controverso, sem protocolo definitivo de investigação. Cada serviço deve avaliar suas possibi-lidades e traçar um plano que melhor atenda suas pa-cientes, considerando as recomendações das entidades internacionais.

REFERÊNCIAS

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Referências

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