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III Jornadas de Língua Portuguesa e Culturas Lusófonas. da Europa Central e de Leste. Atas. Universidade Eötvös Loránd de Budapeste

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III Jornadas de Língua Portuguesa e Culturas Lusófonas

da Europa Central e de Leste

Atas

Universidade Eötvös Loránd de Budapeste

29 de novembro – 1 de dezembro de 2012

Organização e revisão: Patrícia Infante da Câmara

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2 As Atas reproduzem textos escritos ao abrigo do Novo Acordo Ortográfico, com ligeiras alterações – de pendor uniformizante – aos propostos pelos autores aquando da realização do colóquio.

© Patrícia Infante da Câmara

© Centro de Língua Portuguesa do Camões, I.P. em Budapeste

© Departamento de Português da Universidade Eötvös Loránd de Budapeste © Textos: Autores

© Capa: Nuno ‘Azelpds’ Almeida ISBN 978-963-12-0391-2

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116 Vesela CHERGOVA, Universidade de Sófia Sveti Kliment Ohridski

O papel da transposição nas relações categoriais

Resumo: O processo da transposição está estreitamente vinculado ao conceito de oposição funcional nas relações categoriais, consistindo na capacidade de os membros intensivos (i.e., portadores de maior carga semântica) de uma oposição gramatical assumirem os valores semânticos do membro extensivo em determinados contextos. Daí, o forte efeito expressivo da transposição que, no âmbito das relações categoriais, é capaz de se traduzir num instrumento para a formação de novos conteúdos gramaticais, para os quais a língua concreta não formalizou instrumento morfológico específico. É nessa perspetiva que se aborda a análise de certas funções dos gramemas (morfemas categoriais) de Imperfeito, Futuro do Pretérito e Futuro Simples do Indicativo, no sistema verbal do Português contemporâneo.

1. Introdução

Esta comunicação visa esclarecer o potencial expressivo e construtivo de um processo que decorre no discurso, mas está motivado pela natureza opositiva das unidades de língua na perspetiva da linguística estrutural europeia, funcional e sincrónica, que nos parece a metodologia mais eficiente para identificar a componente semântica a cada nível de estruturação linguística – combinando parâmetros cognitivos, lógico-mentais e expressivos enquanto designação, significação e sentido (Coseriu 1978: 134-147, Vucheva 2006: 27-58), a nível universal, histórico e individual da linguagem (Coseriu 1990: 244-257). O estruturalismo analítico/funcional, a que nos referimos, baseia-se nos seguintes princípios fundamentais (Coseriu 1990: 175; 1978: 222-229): funcionalidade (que trabalha com o conceito de valor invariante e comutação das unidades de língua), oposição (que consiste na análise metodológica dos traços distintivos), sistematicidade (que identifica a estrutura dos sistemas linguísticos) e neutralização (que estuda os contextos discursivos em que determinadas oposições funcionais, ao perderem o traço distintivo, ficam suprimidas).

1.1. Os tipos de oposição funcional (Kanchev 1986: 54–55; Lopes 1995: 140–146; Tláskal 2006: 131-132) foram determinados por Troubetzkoy (1976, Principes de phonologie, Paris, Klincksieck) para as relações na fonologia, resultando válidos e aplicáveis para a estruturação das categorias tanto na morfologia quanto na lexemática. A oposição funcional revela as relações a nível fonológico, morfológico e lexical, constituindo os subsistemas para cada um

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117 desses níveis. Supõe uma relação baseada num contínuo de conteúdo partilhado pelas unidades linguísticas que, no entanto, se distinguem graças a uma diferença semântica mínima, que é o traço distintivo. Assim, de acordo com a natureza do traço distintivo, identificam-se, em seguida, três tipos de oposições citadas.

1.1.1. A oposição gradual dá-se nos casos em que um traço distintivo se apresenta em dimensão e intensidade diferentes numa série de unidades linguísticas. Em fonologia (Tláskal 2006: 132), é o caso da oposição entre as vogais não nasais [a] > [ɛ] > [e] > [i] revelada pelo traço acústico [(+compacto) –difuso > ±difuso > +difuso (+agudo)], ou entre as vogais não nasais [a] > [ɔ] > [o] > [u] baseada no mesmo traço acústico [(+compacto) –difuso > ±difuso > +difuso (+grave)]. Em morfologia e lexemática, é a oposição funcional em que se sustenta a categoria Grau dos adjetivos e muitas oposições lexemáticas como, por exemplo, a do campo lexical dos adjetivos de apreciação térmica (Vilela 1994: 36).

1.1.2. A oposição equipolente traduz-se na oposição de dois traços diferentes, onde cada um dos elementos que integram a oposição são marcados, ou seja, levam carga semântica específica. Oposição deste tipo podemos encontrar na fonologia (Tláskal 2006: 132), entre a consoante [b] – [oclusiva, bilabial, não nasal, vozeada, compacta] – e a consoante [t] – [oclusiva, dental, não nasal, não vozeada, difusa, aguda] – no par mínimo [bela <> tela]. Pela sua natureza e com objetivos metodológicos, este tipo de oposição pode ver-se representado como uma relação privativa /b/ (oclusiva, bilabial) ÷ /t/ (oclusiva, não bilabial). Talvez, por isso mesmo, não se encontre nas relações opositivas do sistema morfológico, mas é altamente aplicável às oposições lexemáticas, por exemplo, no campo lexical dos adjetivos de cor (Vilela 1994: 36).

1.1.3. A oposição privativa baseia-se num traço funcional que está presente numa das unidades linguísticas e ausente na outra. Deste tipo é a oposição fonológica entre a consoante [b] – [oclusiva, bilabial, não nasal, vozeada, compacta] – e a consoante [p] – [oclusiva, bilabial, não nasal, não vozeada, compacta] – no par mínimo [bala <> pala]. Privativas são quase todas as oposições categoriais morfológicas, tanto no sistema nominal como no verbal (com a exceção acima mencionada para a categoria Grau), e uma grande parte das oposições lexemáticas (Vilela 1994: 35-36) como as que se dão em [alto (–) <> baixo (+) > altura] ou [pai (–) <> mãe (+) > os pais], etc.

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118 1.2. Os processos de neutralização e transposição que nos interessam estão relacionados, basicamente, com o tipo de oposição privativa. Por isso, dedicar-lhes-emos mais atenção.

As oposições privativas costumam ser binárias, quer dizer, compostas por dois elementos funcionais, onde aquele que possui o traço distintivo também é portador da carga semântica, i.e. do conteúdo específico que atua como marca funcional da oposição e justifica a existência de uma categoria gramatical ou lexical. Essa sua natureza identifica-o como

elemento intensivo (ou marcado) dentro da oposição funcional. Por outro lado, o elemento

opositivo que não possui ou está privado do traço distintivo tem menor carga semântica, está menos especificado e, por isso mesmo, normalmente carece de instrumentos morfológicos (morfemas categoriais, estruturas analíticas) próprios. Repare-se na ausência ou escassez de gramemas de número singular e género masculino no sistema nominal, na ausência de recursos específicos para a realização dos valores de voz ativa ou dos processos de afirmação no sistema verbal, etc. Essa sua caraterística de leveza semântica identifica-o como elemento

extensivo (ou não marcado) dentro da oposição funcional. O elemento extensivo, por si só,

não justifica a existência de uma categoria gramatical ou lexical.

As relações funcionais acima descritas constituem fenómenos relacionados com a organização interna do sistema (Coseriu 1990: 282-290). No entanto, o seu potencial designativo e expressivo poderá desenvolver-se no discurso, na medida em que este represente uma norma coletiva (a compreender os usos consagrados, lexicalizados e de caráter redundante) e uma norma individual (consistindo no uso espontâneo, momentâneo, de expressividade individual que contém também os valores do sistema da língua e os da norma coletiva). Neste sentido, a neutralização e a transposição representam as supressões possíveis das oposições privativas na norma da língua e no discurso dos indivíduos falantes.

A neutralização, portanto, será um caso de supressão da oposição privativa, em que o elemento extensivo assume as funções do elemento intensivo, introduzindo-se no seu campo semântico (Coseriu 1990: 211-228). A função do Presente com valor de Futuro Simples representa um caso de neutralização da oposição privativa dentro da categoria Tempo no indicadivo entre [não posterioridade (–) / posterioridade (+)], penetrando a forma não posterior (Presente) o campo semântico da posterioridade (Futuro): Amanhã falo com o Jorge. Outro caso de neutralização é o daquela função do Presente que costuma ser designada de Presente Histórico. Neste caso, neutraliza a oposição privativa dentro da categoria Plano entre [não inatual (–) / inatual (+)], introduzindo-se a forma não inatual (Presente) no campo semântico da inatualidade (Imperfeito): Com um louvável espírito de continuidade, D.

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119 vez, será um caso de supressão da oposição privativa em direção inversa, quando o elemento intensivo assumir as funções do elemento extensivo, introduzindo-se no seu campo semântico (Vucheva 2008: 138-140).

Os efeitos da neutralização estão mais enraizados e lexicalizados na língua concreta, por serem também um deslocamento mais natural, posto que cada elemento extensivo tem a capacidade de assumir as funções do seu correlativo. Mesmo assim, “la forma usada por neutralización no repite el contenido de su correlato; ella aporta al discurso un matiz que deriva de su contenido funcional, ampliando el repertorio de medios linguísticos para expressar la relación temporal en cuestión” (Vucheva 2008: 139). Assim, resultado de uma neutralização será, por exemplo, o uso do Infinitivo Flexionado como sinónimo extensivo (ou seja, arquigramema) dos morfemas de Modo e Tempo em Português. Aliás, usos consagrados pelos linguístas de orientação gerativa Faria (1975) e Raposo (1975). São estes os casos de uso obrigatório do Conjuntivo ou do Indicativo que impedem a livre comutação dos dois gramemas e representam nitidamente um contexto de neutralização, em que a oposição funcional de Indicativo / Conjuntivo [não subjetividade (–) / subjetividade (+)] fica suprimida. Os efeitos da transposição, por sua vez, supõem maior esforço semântico, por ser este processo menos frequente mas “con mayores posibilidades expresivas” (Vucheva 2008: 140). Os valores transpositivos dos morfemas categoriais poderão, inclusivamente, ser interpretados como uma “metáfora categorial” (Boteva 2009: 56) e, portanto, podem produzir ora um efeito estilístico, ora um efeito de configuração de novos conteúdos categoriais. Aproveitamos para apresentar a seguir alguns casos de valores transpositivos de morfemas verbais em Português, cujo efeito nos parece basicamente estilístico:

• Uso transpositivo de gramemas conjuntivos no campo semântico dos seus correlativos extensivos do Indicativo (Chergova 2012: 161–163): Como eu objectasse, contratos são

contratos, decidiu outra coisa – [= objetei] (Abelaira 1981: 134). Rodrigues Lapa (1984:

210–211) chama a atenção a propósito do valor estilístico e das origens diacrónicas deste uso. • Uso transpositivo de formas imperativas em discurso não imperativo, designadas por Mangatcheva (2011: 62-63) como uso narrativo do Imperativo: Diz-me com quem andas, dir--te-ei quem és.

• Uso transpositivo de P.P.S – forma identificada pelo traço temporal [anterioridade (+), i.e. não posterioridade] – no campo semântico da posterioridade em discurso diretivo: Calou! [= Cale-se!] (Mangatcheva 2011: 80); Já te foste deitar! [= Deita-te já!]

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120 O efeito dos usos transpositivos relacionado com a configuração de novos conteúdos categoriais está elaborado de acordo com o princípio do “dualismo assimétrico” (Tláskal 1984: 237, visando Karcevski; Chergova 2009) ou o “princípio da compensação” (Gerdžikov 1984: 222–236). Nesta perspetiva, o processo da transposição funciona como mecanismo intralinguístico de geração de novos conteúdos que não possuem núcleo morfológico na língua concreta, aproveitando os gramemas já existentes na língua e as suas relações opositivas. Assim, determinadas formas morfológicas (sintéticas e/ou analíticas) podem chegar a participar em mais do que um paradigma categorial, o paradigma do seu valor invariante e o paradigma do seu valor transpositivo.

2. A transposição e os valores categoriais do Imperfeito do Indicativo

O valor modo-temporal invariante do Imperfeito do Indicativo português que o identifica e opõe ao resto dos morfemas categoriais indicativos pode ser apresentado pelo conjunto dos seguintes traços distintivos, que correspondem às categorias Modo, Perspetiva, Plano e Tempo (Coseriu 1976, Kanchev 2004, Vucheva 1995: 19-22, 2008: 139; Chergova 2012: 18-21; 2009: 201-202): [não subjetivo], [não retrospetivo, não prospetivo], [inatual], [não anterior, não posterior], que exemplificamos na tabela a seguir:

Tabela 1

Tempo [Anterioridade]

(+)

[Simultaneidade] (–) [Posterioridade] (+)

Plano inatual (+) M.Q.P.S. Imperfeito Futuro do Pretérito Plano não inatual (–) P.P.S. Presente Futuro Simples Perspetiva Perspetiva primária (–)

[não retrospetivo, não prospetivo] Valor modal básico [não subjetivo] (–)

2.1. Dentro do seu campo modo-temporal, este morfema categorial pode realizar os seguintes

valores distributivos de natureza basicamente aspetual, que se ativam na sua interferência com

os parâmetros lexicais, sintáticos e semânticos do contexto (Chergova 2008: 88):

• Durativo: Nesta altura levavam mais de meia hora de caminho, Belém não podia

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121 • Iterativo: Marçal Gacho respirou fundo, quando o tráfego se complicava na estrada,

o sogro, mais tarde ou mais cedo, acabava por tomar um desvio (Saramago 2000: 14).

• Semelfactivo: Era-me evidente que este oferecimento de Airhan tinha a marca de um

regateio (Carvalho 1994: 32).

• Habitual: Agora ela era uma senhora casada, com um homem que mal conhecia, mas

que prometia amá-la até ao fim da vida… (Vieira 1997: 14).

2.2. O Imperfeito do Indicativo regista também usos fora do seu campo semântico-funcional, penetrando as zonas significativas de outros gramemas modo-temporais. Este funcionamento de sinónimo temporal de outras unidades designamos de valor contextual, que se pode realizar ora por meio de neutralização, ora por meio de transposição. Sendo o elemento não marcado na categoria Tempo dentro do Plano da Inatualidade, o Imperfeito do Indicativo tem a possibilidade de neutralizar o M.Q.P.S. e o Futuro do Pretérito na função de seu sinónimo extensivo, mas aportando sempre o matiz do seu valor invariante. No entanto, os valores

contextuais por transposição marcam a capacidade deste gramema de funcionar como

sinónimo intensivo de outras unidades modo-temporais que aparecem como elementos não marcados nas respetivas oposições, nomeadamente, o Presente do Indicativo. Assim, os valores contextuais do Imperfeito do Indicativo são produto de uma transposição de Plano, ou seja, do seu campo semântico da inatualidade (+) o gramema passa a funcionar no campo semântico da não inatualidade (–), com valor temporal de simultaneidade e/ou posterioridade não inatual, ativando graças ao seu valor invariante novos valores estilísticos ou categoriais:

• Cortesia: Queria que me desse um conselho… (discurso direto [simultaneidade não inatual]) (RTP 27.07.2002).

• Condicionalidade: Se tivesse dinheiro (neste mesmo momento), comprava um carro

novo [simultaneidade não inatual com matiz de negação implícita da ação enunciada].

• Imperfeito de relembrar e de opinião inatual: Com quem é que disseste que a Maria

se ia casar? (Mateus et al. 1989: 248) / Fazia-te em Évora (Oliveira 1987: 81).

• Imperfeito prelúdico1: Amanhã vou ao médico, gostava que viesses comigo. Tu saías,

distraías-te, eu não ia sozinha (RTP 15.08.2006).

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122 3. A transposição e os valores categoriais do Futuro do Pretérito

O valor modo-temporal invariante do Futuro do Pretérito português (Ver Tabela 1) pode ser apresentado pelo conjunto dos seguintes traços distintivos: [não subjetivo], [não retrospetivo, não prospetivo], [inatual], [posterior].

3.1. Dentro do seu campo semântico, este morfema categorial pode expressar os seguintes

valores distributivos de natureza basicamente aspetual, que se ativam na sua interferência com

os parâmetros do lexema verbal e do contexto:

• Durativo: Quando, na noite seguinte, o viesse a conhecer, compreenderia que, afinal,

o que pairava nele era o ar indefinido (Pires 1998: 38).

• Semelfactivo: ...certo que não saberia o que perguntar quando o seu interlocutor se

calasse (Correia 1998: 33).

• Iterativo / Habitual: Se lhe tinham posto o alimento num prato, se não tinham

querido que ele o tomasse grosseiramente da lama do chão, então é porque a água também deveria ser bebida de recipiente próprio (Saramago 2000: 59).

3.2. O Futuro do Pretérito realiza os valores contextuais por transposição nos campos semânticos dos morfemas categoriais do Presente e Futuro Simples do Indicativo por meio das seguintes transposições:

• Transposição de Plano. O Futuro do Pretérito passa a expressar o valor transpositivo de posterioridade não inatual, ou seja, mantém o valor temporal de posterioridade, mas penetra no campo semântico do elemento extensivo da categoria Plano. Sendo sinónimo intensivo do Futuro Simples, acrescenta também um valor modal complementar de condicionalidade ou possibilidade pouco provável no que se refere à realização da ação enunciada: ...o chefe do departamento não perceberá se copiámos, e mesmo que percebesse,

não lhe daria importância (Saramago 2000: 73).

• Transposição de Plano e Tempo. O Futuro do Pretérito é capaz de realizar uma transposição ainda mais complexa, consistente na deslocação inversa de elemento intensivo para elemento extensivo, tanto na categoria Plano [do campo da inatualidade (+) passa a funcionar no da não inatualidade (–)] como na categoria Tempo [do campo da posterioridade (+) passa a funcionar no da não posterioridade (–)]. Assim, este gramema obtém a funcionalidade de sinónimo intensivo do Presente (simultaneidade não inatual), acrescentando também, graças ao seu conteúdo invariante, um valor modal complementar de condicionalidade e impossibilidade, ou seja, negação implícita da hipótese de realização da

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123 ação enunciada. Parece que na norma brasileira do Português, no campo semântico da simultaneidade não inatual – onde funciona também o Imperfeito do Indicativo com valor de cortesia ou condicionalidade –, predomina o uso transpositivo do Futuro do Pretérito, que terá adquirido a designação de condicional simples precisamente graças a esta função modal complementar: Explicando-me com mais clareza: ignorasse eu que outros homens desejam

comer ou fazer amor e sentiria idênticos desejos (Abelaira 1981: 2).

4. A transposição e os valores categoriais do Futuro Simples

O valor modo-temporal invariante do Futuro Simples português (Ver Tabela 1) – que o identifica e opõe ao resto dos morfemas categoriais indicativos – pode ser apresentado pelo conjunto dos seguintes traços distintivos: [não subjetivo], [não retrospetivo, não prospetivo], [não inatual], [posterior].

4.1. Dentro do seu campo semântico, este morfema categorial pode realizar os seguintes

valores distributivos de natureza basicamente aspetual, que se ativam na sua interferência com

os parâmetros contextuais:

• Durativo: Muitos acreditam piamente que será Grande e viverá longos anos… (Rocha 2006).

• Iterativo: Ao esboçar estas linhas não ignoro que virei a substituí-las por outras… (Abelaira 1981: 3).

• Semelfactivo: Há de ser um instante em que não se veja um pardal (…). Chegará. Hei

de distingui-lo no horizonte (JLP 2001: 7).

4.2. O Futuro Simples realiza valor contextual por transposição no campo semântico do Presente, a título de seu sinónimo intensivo, acrescentando também, graças ao seu conteúdo invariante, um valor modal complementar de conjetura ou possibilidade de realização da ação enunciada. Este seu valor é ativado apenas no campo semântico da simultaneidade não inatual: Lendo fica-se a saber quase tudo, Eu também acho, Algo portanto saberás, Agora já

não estou tão certa, Terás então de ler doutra maneira, (…) (Saramago 2000: 77); Dá até impressão que eu estou querendo aparecer nas revistas e nos jornais… Qual será a revista dele? (Celebridade, cap. 54, cena 1).

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124 5. Conclusões

• A maior parte dos valores modais epistémicos (probabilidade, possibilidade, condicionalidade) e pragmáticos (cortesia) são resultado de transposições nas categorias temporais de Plano e Tempo, baseadas no valor modal comum e básico [não subjetividade], precisamente por ser o Indicativo o elemento extensivo na oposição modal básica.

• Os gramemas modo-temporais não podem nem devem ser considerados “formas vazias”, posto que a sua semântica categorial permite a atribuição de novos valores modais aos gramemas já existentes na língua em determinados contextos discursivos ativados pela transposição.

• Os gramemas modo-temporais que acabamos de descrever configuram os recursos linguísticos para a expressão da modadlidade complementar, que representa a valorização secundária do conteúdo da proposição e do compromisso do falante com o grau de verdade no enunciado.

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