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COMPREENSÃO DO VALOR POSICIONAL DO SISTEMA DE NUMERAÇÃO DECIMAL: SIGNIFICANTES E SIGNIFICADO

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Academic year: 2021

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Célia Finck Brandt Universidade Estadual de Ponta Grossa Idemar Vizolli Universidade do Vale do Itajaí RESUMO

O presente estudo compreendeu a replicação de uma prova proposta por KAMII (1992) e foi aplicada a uma criança do 2o ciclo do ensino fundamental e a um adulto em fase de alfabetização. Buscamos investigar a compreensão do valor posicional presente na estrutura do Sistema de Numeração Decimal, a partir da atribuição de significação aos dígitos da representação de quantidades, com a utilização do numeral arábico. Tomamos por referência a teoria de representações de Vergnaud (1993), para analisar as respostas dadas pelos sujeitos às diferentes tarefas que compõem a prova e o método clínico-crítico, para conduzir e fazer a análise interpretativa dos desempenhos e condutas dos sujeitos. Utilizamos categorizações já levantadas por outros pesquisadores para situar os perfis de condutas identificados e avaliar a compreensão do valor posicional que os sujeitos possuem. Apresentamos alguns dados empíricos e analisamos as representações simbólicas que são carregadas de sentidos atribuídos pelo sujeito em sua relação com as situações e os significantes. Buscamos nos dados empíricos, os esquemas evocados pelos sujeitos que permitiram a identificação do sentido atribuído à situação e aos significantes. Estes esquemas foram revelados em suas condutas, suas formas de se organizar e em suas formas de atribuir significados aos símbolos. Os resultados encontrados basearam-se na análise das diversas representações utilizadas pelos sujeitos ao contar, desenhar, escrever o numeral representativo da quantidade e na atribuição de significados aos dígitos da representação. Os resultados nos permitiram afirmar que em relação à quantificação e sua representação, existem diversos aspectos a serem considerados: relativos à contagem; à inclusão; e as relações entre significantes e significados.

PALAVRAS CHAVE: valor posicional, sistema de numeração, significantes e significados.

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1. Introdução

Investigar a construção do conceito do sistema de numeração decimal (SND) em crianças e adultos em fase de alfabetização, possibilita-nos identificar aspectos relevantes à aprendizagem da estrutura, da contagem e da quantificação de quantidades contínuas ou discretas. Nesse estudo replicamos uma prova proposta por Kamii (1992), prova esta que foi aplicada por ROSS (1986, apud KAMII, 1992) a crianças americanas, por SILVERN (1988, apud KAMII, 1992) a crianças do leste do Alabama e por Teixeira (1996) a crianças de 6-7 anos de curso preparatório da região parisiense. Os valores apresentados nas provas foram: 16; 54 e 25. A nossa prova compreenderá além destes valores outros, que serão justificados frente às categorias que estabelecemos.

Para investigar a compreensão do valor posicional de crianças que freqüentam as séries iniciais do ensino fundamental e de adultos em fase de alfabetização, analisamos as notações (escrita e desenho) feitas para a representação de quantidades.

2. PROCEDIMENTOS DE COLETA DE DADOS

A prova previamente selecionada e organizada, foi aplicada aos dois sujeitos, em entrevista clínico-crítica, para conduzir as provas e proceder a análise interpretativa dos desempenhos e condutas dos sujeitos. Face à limitação deste trabalho, não descrevermos o método clínico-crítico proposto por Piaget, no entanto sugere-se a leitura das obras de Delval (2002), Carraher (1994). A leitura de algumas obras de Piaget permite identificar a caracterização do método e as reformulações que o mesmo sofreu no desenvolvimento das diversas pesquisas por ele desenvolvidas.

O processo de análise não trata da comparação de resultados entre os sujeitos, mas da natureza de suas respostas em termos de categorias ou formas de compreensão. Para tanto, tomamos como referência categorias já encontradas por outros pesquisadores, como KAMII (1992) e TEIXERA (1996). As categorias elencadas foram adaptadas para fazer a análise interpretativa dos dados desta investigação.

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2.1 - Procedimentos de coleta de dados: provas para investigação da compreensão do valor posicional

A seguir apresentamos a prova que consiste na atribuição de significados aos dígitos de um numeral representativo de quantidades, com suas diversas tarefas e as categorias para análise dos dados concernentes: à compreensão do valor posicional presente na estrutura do SND; à compreensão das notações numéricas; à forma de representação de quantidades, pelos sujeitos da pesquisa, com seus registros escritos e desenhos.

Tarefa 1

- Apresentou-se quinze fichas para os sujeitos e pediu-se para que contassem as fichas, anotando as estratégias utilizadas e escrevessem o numeral representativo da quantidade. A seguir pediu-se que eles circulassem o número de fichas correspondentes ao dígito 1 e ao dígito 5 da representação. Tarefa 2

- Entregou-se aos sujeitos cartões nos quais estavam escritos os numerais 24 e 36 e pediu-se para que eles separassem conjuntos de fichas que equivalessem à quantidade dos numerais. A seguir solicitou-se para que circulassem a quantidade de fichas que correspondiam ao 2 do 24 e ao 3 do 36.

Tarefa 3

- Solicitou-se aos sujeitos para que contassem as figuras dos desenhos a seguir, e escrevessem o numeral que correspondia à quantidade contada, destacando nos desenhos, a quantidade de figuras que correspondiam a cada dígito do numeral.

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c)

2.2 Categorias para análise

O conjunto de dados relativos às respostas, procedimentos e argumentos apresentados pelos sujeitos às tarefas da prova, foi analisado segundo as categorias estabelecidas a seguir. Tais categorias foram utilizadas para todos os numerais apresentados na prova (12,15, 24, 36, 28 e 84).

1. O numeral como um todo representa toda a quantidade, porém, cada dígito tem um significado de acordo com os agrupamentos de dezenas ou unidades, sendo que o sujeito tem uma visão parcial sobre como isto funciona, isto é o valor posicional atribuído a cada dígito isoladamente é incompleto ou inconsistente. Exemplos:

a. O sujeito não se incomoda em atribuir significado para as fichas que sobram e não foram circuladas.

b. O sujeito procura atribuir significado às fichas que sobraram e não foram circuladas.

c. Ambos os dígitos significam unidades. Exemplo: o sujeito circula uma ficha para o 1 do quinze e cinco fichas para o 5 do quinze;

d. Ambos os dígitos representam unidades e os objetos são contados duas vezes. Exemplo: o sujeito circula o 1 para o 1 do quinze e volta a incluí-lo para a contagem dos 5 do quinze.

2. Os dígitos da representação representam centenas, dezenas e unidades de acordo com a posição do dígito na representação. O sujeito identifica no signo numérico os referenciais do código numérico (base, reagrupamentos e quantidade referida pelos algarismos).

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Os diálogos travados com R(9;3) E S(48;1) revelam suas condutas na tarefa 1 da prova ao contar e representar a quantidade 15 e as fichas circuladas representativas dos dígitos da representação escrita.

Condutas de R(9;3)

E – Vou te dar umas fichinhas para você contar pra mim. Conta pra mim, por favor?

R – (Conta um a um) Uma, duas ... quinze. Tem quinze.

E – Tem quinze. Escreva pra mim esse 15, no papel.

R – Escreve o número 15.

E – Você desenha elas no papel, por favor?

R – Desenha as quinze fichinhas.

E – Agora esse quinze que você escreveu aqui, eu vou fazer um risquinho em volta dessa parte (circula o 1 do 15). Você é capaz de dizer quantos fichinhas dessas que você desenhou representam esse número que eu circulei?

R – Uma.

E – Então circule no desenho pra mim.

R – (Circulou uma fichinha do desenho).

E – Agora eu vou circular essa outra parte do nº 15 (circula o 5). Eu quero que circule o nº de fichinhas dessas que você desenhou. Você sabe o que significa essa parte?

R – Sei. Cinco.

E – Então circule pra mim. R – (circula 5 fichinhas).

E – Essas que sobraram não tem nada a ver com esse nº aqui? (Apontando para o 15).

R – Não. E - Por quê?

R – Porque já acabou esse valor. Já gastou todas.

Condutas de S(48;1)

E – Seu S. temos algumas fichinhas e eu gostaria que o senhor as contasse.

S – Conta as fichinhas uma a uma (um, dois, ..., quinze).

E – Eu gostaria que o senhor escrevesse esse número no papel. S – (Escreve o número 15).

E – O senhor desenharia essa quantidade de fichinhas?

S – Desenhar as bolinhas? E – Sim.

S – Pode ser meio quadradinhas? (Desenha as quinze fichinhas e confere contando-as uma a uma)

E – Pode! Isso não é problema!

Agora eu gostaria que o senhor destacasse, aqui no desenho (indicando o desenho das fichinhas), essa parte do quinze (circula o 1). S – (Destaca a primeira ficha).

E – Eu gostaria que o senhor destacasse a segunda parte do quinze (circula o 5).

S – (Destaca cinco fichas, contando com a que já havia destacado).

E – Qual era o número que a gente tinha aqui (indicando para o número quinze).

S – Quinze.

E – O que significa este “um” do quinze? (apontando para o 1 do 15). S – Que um sozinho faz “um”, mais o 5 faz 15.

E - Quando o senhor destacou, aqui no desenho das fichinhas, o senhor

destacou uma fichinha correspondente ao “um” do 15.

Depois o senhor destacou 5 fichinhas correspondendo ao 5 do 15. Porque que sobraram estas outras fichinhas, aqui no desenho?

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parte de nenhum dos números.

E – E se eu lhe disser que essas fichinhas que sobraram fazem parte do número quinze. O que o senhor me diz?

S – Que pode sobrar.

E – Como que o senhor acha que pode?

S – Pode porque se contar mais 15 dá 30.

A conduta de R(9;3) revela a utilização da contagem para avaliação da quantidade e o respeito aos princípios lógicos da contagem, demonstrando que o seu desempenho se caracteriza por uma competência que o leva a quantificar corretamente. Podendo falar sobre o que fez, o sujeito consegue expressar como ele percebe a forma de quantificar uma coleção de objetos. Ao ter que lançar mão de um registro desta quantificação ele utiliza em primeiro lugar a notação arábica escrita que corresponde à sua formulação verbal. Quando da solicitação do desenho, o sujeito lança mão da correspondência biunívoca que também esta na base da quantificação. Isto pôde se observado em cada pontinho colocado dentro das fichinhas desenhadas. Esta análise ideográfica é que permite identificar as condutas específicas utilizadas para o registro: notação escrita, desenho e formulação verbal. Neste procedimento identifica-se na atividade de contagem a associação de cada palavra utilizada na formulação verbal a um objeto da coleção, numa correspondência um para um. Porém, para destacar a quantidade de fichas correspondentes aos dígitos da representação percebemos, na conduta do sujeito, que suas hipóteses não estão de acordo com as convenções e com as regras do sistema de numeração. Neste confronto cognitivo que lança em jogo o aspecto operativo, saindo do figurativo, que é transitório e estático, a criança passa a lidar com transformações entre estados e tem que lançar mão de invenções que são de natureza empírica: um objeto corresponde a uma ficha do conjunto de fichas desenhadas ou dispostas em sua frente. Seu conhecimento prévio do número, advindo de uma transmissão social, foi integrado e transformado para a formulação da hipótese. Em todos os momentos a criança lançou mão deste conhecimento social para quantificar, escrever números e realizar operações aritméticas de adição, subtração, multiplicação e divisão. Nunca teve que refletir ou pensar sobre os dígitos

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da notação escrita e sobre sua significação. Podemos analisar o erro levando em consideração as características morfossintáticas..

Esta criança não apresenta um erro sintático, em se tratando de notação arábica escrita, pois não escreve 105 para representar o 15 e nem um erro léxico escrevendo 51 ao invés de 15. Porém, ao circular somente um objeto como representativo do 1 do 15, ela revela a sua incapacidade de processar relações entre os dígitos da representação e a quantidade de fichas correspondentes. Mas este erro só pode ser detectado a partir do momento em que o sujeito for solicitado a identificar a quantidade de objetos correspondentes a cada dígito da representação. Foi esta tarefa específica da prova que nos permitiu identificar este tipo de erro.

A representação semântica da notação arábica escrita não está explicitada na formulação verbal 15, isto é, não está explicitado que 15 é (1 x 10) + 5. Para esta trans-codificação seria necessário que neste primeiro nível a criança estivesse compreendendo o conhecimento de que este 1 vale 1 x 10. A criança fragmentou a notação escrita estabelecendo um sentido para ela, não levando em conta as regras do sistema de numeração. Ela justapõe ou compacta os dígitos da representação sem levar em conta estas regras. Segundo Sinclair et al (1990), as atividades de ler, escrever e manipular números escritos, não repousam sobre a estrutura multiplicativa do sistema de numeração. Quando a criança tem que explicitar o significado atribuído a cada dígito da representação, e verbalizar sobre isto, é possível investigar quais hipóteses, princípios ou regras, ela construiu para dar sentido a este tipo de registro particular.

Na conduta desta criança pôde-se identificar tipos de notação diferentes aos quais ela lançou mão para representar as quantidades: a formulação verbal, a notação arábica escrita (um só número representando a coleção) e o desenho. As diversas notações utilizadas pela criança compreendem aspectos do sistema numérico, tal como identificado por Sinclair et al (1990). Concordamos com esses autores que o conhecimento dos algarismos não é suficiente para a utilização de grafias de maneira apropriada. A utilização de uma única grafia revela a presença da pluralidade de objetos idênticos, a cardinalidade e a ordinalidade da coleção, já estabelecidas pela criança. Ainda existe, porém, uma centração na posição do dígito, visto que cada dígito ainda corresponde a um objeto da coleção. Não há a compreensão da composição multiplicativa e, por esta razão, ela circula 1 ficha para

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o 1 do 15 e 5 fichas para o 5 do 15. Esta centração não permite que a criança atribua significado ás fichas que sobram na representação por desenho.

Para as demais quantidades apresentadas a partir de um numeral escrito num cartão as mesmas condutas são identificadas.

Vergnaud (1989; 1990; 1993), nos coloca que na conceitualização do real há um homomorfismo entre os significantes e os significados e que esta relação, nas situações, não é imediatamente nítida porque os constituintes da língua natural ou algébrica são somente identificados pela sua significação. No sistema escrito existem propriedades que representam o significado, no caso, as regras do sistema de notação arábica escrita são as propriedades que representam a quantificação (o significado). Estas regras compreendem as composições aditivas e multiplicativas. As propriedades não são as mesmas para a formulação verbal (princípios lógicos de contagem) e que também se relacionam com o significado (a quantificação). Nem para a representação, por desenhos, que coloca em jogo a correspondência biunívoca. No sistema de notação arábica escrita são necessárias operações de pensamento diferentes das necessárias para a formulação verbal e para as representações por desenhos, de modo que possam receber as significações veiculadas pelas formas simbólicas.

Segundo o autor, são os significantes e os significados que dão sentido aos conceitos matemáticos, mas o sentido não está nem nas situações, nem nas palavras e nem nos símbolos matemáticos. As representações simbólicas são carregadas de sentidos atribuídos pelo sujeito em sua relação com as situações e os significantes. São os esquemas evocados, pela criança, por esta situação e pelos significantes, que permitem a identificação do sentido atribuído à situação e aos significantes. Estes esquemas são revelados nas suas condutas, nas suas formas de se organizar e nas suas formas de atribuir significados aos símbolos.

Encontramos como resultados, após a análise das condutas desta criança, frente às categorias elencadas, que para R(9;3): na representação escrita, os numerais conjuntamente representam a quantidade total de fichas; o numeral como um todo representa toda a quantidade, porém, cada dígito tem um significado de acordo com agrupamentos de dezenas ou unidades, sendo que a criança tem uma visão parcial de como isto funciona e neste caso, a criança não se incomoda em atribuir significado para as fichas que sobram; ambos os dígitos da representação significam unidades uma vez que a criança circula 1 para o 1 do 15 e 5 para o cinco

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do 15, 2 para o 2 do 25 e 5 para o 5 do 25, 2 para 2 do 24 e 4 para o 4 do 24, 3 para o 3 do 36 e 6 para o 6 do 36, 1 para 1 do 12 e 2 para 2 do 12, 3 para 3 do 30, 8 para 8 do 84 e 4 para 4 do 84; a criança não interpreta a decodificação dos algarismos de um numeral em relação às operações de soma e produto (15 = 10 + 5; 25 = 2 x 10 + 5; 24 = 2 x 10 + 4; 36 = 3 x 10 + 6; 30 = 3 x 10; 12 = 1 x 10 + 2; 84 = 8 x 10 + 4); a criança atribui hipóteses para a trans-codificação oral-escrito em relação à mudança de unidades e não aos agrupamentos de agrupamentos e aos rótulos verbais; a criança atribui significações diferentes na manipulação de diferentes registros de representação de quantidades.

S(48;1) efetua a notação arábica escrita do número 15 e o desenho representativo da quantidade de fichas. De acordo com Sinclair et al (1990), o sujeito usa tipos de notações não excludentes e complementares: um numeral de dois dígitos para representar toda a coleção (em termos de notação arábica escrita); grafismos abstratos cuja grafia não tem relação com a forma e a notação (representa a coleção inteira enquanto coleção e estas grafias estão sempre alinhadas). A notação gráfica já representa a pluralidade de objetos idênticos, a correspondência termo a termo, a cardinalidade e a ordinalidade da coleção.

Para fazer a notação numérica da quantidade de fichas, escreve os dígitos da esquerda para a direita, isto é, escreve primeiro o 1 seguido do 5 (15), ao mesmo tempo em que pronuncia “quinze”. Ao representar, através de desenho, as 15 fichinhas pergunta se as bolinhas podem ser meio quadradinhas. Isso revela que o sujeito reconhece a forma das fichinhas ao mesmo tempo em que faz uma abstração referente à forma de representar cada um dos elementos da coleção (pluralidade). A pergunta relativa à forma do desenho certamente é motivada por uma dificuldade motora de representar um círculo, embora se esforce para que o desenho assemelhe-se à forma do elemento físico apresentado.

Se faz mister registrar que só os desenhos representativos das quantidades, embora nos permita a visualização, não contempla a totalidade da compreensão que o sujeito possui do sistema de numeração decimal. Para efetuar o desenho da quantidade correspondente ao número 15, o sujeito iniciou também da esquerda para a direita, assim como na notação arábica. Isso revela a convenção estabelecida socialmente em relação à ordem de efetuar a notação de números, palavras e desenhos representativos de quantidades numéricas.

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Ao destacar, no desenho, a quantidade corresponde ao 1 do 15, o sujeito destaca o primeiro desenho, como aparece na figura 5 e ao destacar a quantidade correspondente ao 5 do 15, destaca mais quatro desenhos, como se o primeiro fizesse parte do 5. Aqui temos alguns aspectos importantes pois o sujeito não reconhece o 1 do 15 como sendo uma dezena, nem na notação arábica, nem no desenho das fichinhas e nem ao se referir à quantidade de fichinhas destacadas no desenho. O sujeito adulto não consegue fazer a trans-codificação numérica entre a formulação verbal e a notação arábica escrita. Isto porque, estes dois tipos de notações apresentam diferenças, e, para que haja trans-codificação seria necessário que o sujeito conhecesse as regras da notação arábica escrita. O sujeito não compreende que 15 é 10 mais 5, ou seja sua representação semântica, não se baseia nesta compreensão que não está refletida na compreensão do sistema numérico verbal.

Existe um processamento centrado nos componentes léxicos, como por exemplo marcas de 1 e 5, correspondentes a cada tipo de unidade. Seu erro resulta de uma aplicação errada de concatenação (relações de produto) e é cometido porque o sujeito fragmenta a expressão escrita em segmentos, com sentido para ele, sem levar em conta as regras da notação arábica escrita. A notação arábica e o desenho representativo das quantidades são duas notações diferentes, que possuem significados atribuídos pelo sujeito.

Segundo Vergnaud (1989; 1990; 1993) não existe homomorfismo entre significante (notações utilizadas) e significado (quantificações) que indique, por parte do sujeito, uma conceitualização. A conduta do sujeito revela que somente a utilização de notações simbólicas não é garantia de conceitualização. O sujeito comunica, representa a quantidade, mas isso não o ajuda a conceitualizar. As formas lingüísticas utilizadas não são ferramentas de pensamento que permitem as trans-codificações necessárias. Concordamos também com Vergnaud (idem), que o simbolismo matemático não é, matematicamente falando, nem uma condição necessária nem uma condição suficiente para conceitualização. Como o sentido não está nem na situação, nem nas palavras, nem nos símbolos, ele está certamente nos esquemas evocados pelo sujeito na situação. Os esquemas são reveladores da conduta do sujeito e sua organização. A situação e o simbolismo não permitiram que fossem evocados os esquemas necessários.

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Partes dessas observações já constam dos estudos feitos por Kamii (1992), mas são os estudos de Teixeira (1996), que alertam que o problema da compreensão situa-se entre a conceituação e a representação. Isso pôde muito bem ser observado nas condutas do sujeito, quando destacou uma fichinha para o 1 do 15, 2 fichinhas para o 2 do 25 e assim sucessivamente.

O sujeito não reconhece o valor posicional dos números, isto é, não compreende a estruturação do sistema de numeração. Ao destacar no desenho, a quantidade correspondente a cada dígito do número 15 não é reconhecida na quantidade de desenhos. Quando é indagado a respeito da quantidade de fichas desenhadas e não destacadas busca, na adição, argumentos para justificar a sobra. E, mesmo obtendo o número 30 através da soma, não percebe que está se tratando do número 15. A princípio ele não procura atribuir significado para os objetos que sobram. A partir do contra-argumento, de que os objetos que sobram têm a ver com o número, o sujeito continua a considerar que somente o 1 e o 5, justapostos, e não somados, formam o 15. Ao considerar os demais (os que sobram) soma-os com os 15, obtendo 30. Na conduta do sujeito percebe-se a justaposição e a compactação dos dígitos da representação ao falar que se juntar 1 (1 ficha) com 5 (5 fichas) dá 15. Esta justaposição não leva em conta as regras que regem a composição na escrita de numerais. O adulto organiza a escrita do numeral em função das pistas morfossintáticas que ele deduz da expressão numérica verbal. O mesmo ocorreu para os demais números.

Ao se tratar de pessoas adultas há que se observar que o contato diário com notações numéricas, não garante a compreensão do sistema de numeração. As notações numéricas com as quais nos deparamos no contexto social, muitas vezes, primam pela informação e não necessariamente obedecem às regras estabelecidas convencionalmente para representar os números.

Os resultados encontrados a partir da análise das diversas representações utilizadas pelo sujeito adulto ao contar, desenhar, escrever o numeral representativo da quantidade e da atribuição de significados aos dígitos da representação, nos levam a concluir que para este sujeito: os numerais conjuntamente representam a quantidade total de fichas; o numeral como um todo representa toda a quantidade, porém, cada dígito tem um significado de acordo com os agrupamentos de dezenas, centenas ou unidades, sendo que o sujeito tem uma visão parcial sobre como isto funciona e o sujeito procura atribuir significado para as fichas que sobram e que não

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foram circuladas; ambos os dígitos significam unidades sendo que os objetos são contados duas vezes ao circular o 1 para o 1 do 15 e voltar a contá-lo para representar o 5 do quinze; não interpreta a decodificação dos algarismos do numeral em relação às operações de soma e produto enquanto notação arábica escrita (15 = 10 + 5; 25 = 2 x 10 + 5; 36 = 3 x 10 + 6; 12 = 10 + 2); apresenta significações diferentes para o ler e escrever; atribui hipóteses para a trans-codificação oral-escrito em relação à mudança de unidades, aos agrupamentos de agrupamentos e aos rótulos verbais; atribui significações diferentes na manipulação de diferentes registros de representação de quantidades.

5. DISCUSSÕES

Os resultados da presente investigação apontaram que é possível elaborar provas que permitem identificar, nas condutas dos sujeitos, as relações que os mesmos estabelecem entre os significantes e significados. Apontaram também, que não é suficiente o estabelecimento de relações entre partes e todo e entre partes e partes, ou seja, a inclusão no campo das classes, para levar o sujeito a conceitualizar este objeto matemático. Isso nos leva concordar com Teixeira (1996), quando diz que “a análise da conceituação tendo em vista o papel das diferentes formas simbólicas utilizadas nas atividades de numeração, mais particularmente da numeração posicional e da tradução não tem sentido se não recorrermos a uma teoria de representação. [...] Esta teoria da representação é articulada em torno de duas questões distintas: a conceitualização e a simbolização.” (p. 198,199)

Com base no referencial teórico adotado, e, nas análises das informações obtidas nas entrevistas, pode-se afirmar que em relação à quantificação e sua representação, existem diversos aspectos a serem considerados. Dentre eles podemos destacar: os aspectos relativos à contagem; à inclusão; e as relações entre significantes e significados. Isso evidencia a necessidade de se aprofundar as investigações no ambiente escolar, no sentido de propor situações didáticas que possibilitem aos sujeitos estabelecer relação entre significante e significado, na perspectiva de conceitualizar o objeto em estudo. As situações didáticas devem levar em consideração os elementos constitutivos dos significantes e significados, bem como as relações que se estabelecem no interior dos sistemas

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significantes/significados e as possíveis representações para um mesmo objeto de estudo.

Segundo Vergnaud (1990), o simbolismo numérico contribui essencialmente para uma conceitualização, mas outros significantes também são poderosos tais como diagramas, desenhos e possuem o laconismo indispensável para a seleção e o tratamento de informações e relações de pertinência. Por esta razão, a necessidade de organizar situações didáticas significativas para os conceitos que queremos ensinar, e, analisar as tarefas cognitivas apresentadas pelos sujeitos na realização destas situações. Nesta análise podemos identificar os esquemas, as ações e os simbolismos aos quais os sujeitos lançam mão para organizar suas condutas para uma classe de situações dadas.

Os resultados encontrados apontaram que tanto o sujeito criança como o sujeito adulto, dispõem de um repertório variado de condutas frente a diversos tipos de material (escrito, desenhado, etc) e que eles vão empregando estratégias que repousam sobre hipóteses específicas construídas por eles. A diferença encontrada entre o sujeito adulto e o sujeito criança diz respeito à contagem dupla dos objetos unitários correspondentes aos dígitos da representação e à atribuição de sentido aos objetos que sobram e não foram circulados. Mas são hipóteses construídas e inferidas individualmente, mostrando que o sujeito em ação explicita tais hipóteses.

Os resultados apontaram que o conhecimento de algarismos não é suficiente para a utilização apropriada e correta de grafias. Por esta razão, evidenciamos a necessidade de pensar nas formas mais convenientes e adequadas de organização de situações, que incluam as relações entre significantes e significados necessários as conceitualizações. Será necessário um conhecimento das formas adequadas de organização combinada com o conhecimento dos elementos cognitivos que permitam a compreensão e a utilização do sistema de numeração escrita.

Para Vergnaud (1985, apud Teixeira, 1996), “a função principal da representação é conceitualizar o real para agir eficazmente [...] distinguir entre o plano dos significantes (linguagem natural, gestos, desenhos, esquemas, tabelas, álgebra ...) e entre os diferentes componentes do significado (invariantes, inferências, regras de ação, predição).” (p.200) Os significantes podem designar os invariantes, acompanhar as inferências, explicitar as regras de ação e de predição, daí sua importância. Tendo em vista que os significantes só cobrem parte do significado, nosso estudo aponta para a importância de representar quantidades em

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diferentes registros de representação. Dentre eles, podemos destacar: o registro escrito em linguagem natural ou matemática; o agrupamento de coleções pela manipulação de materiais diversos; o desenho dos agrupamentos; a representação das quantidades no ábaco e/ou e material multibase.

A utilização desses diferentes recursos se constituem em significantes e poderão levar os sujeitos a lançar mão de esquemas mentais que, ao entrarem em ação, podem combinar e recombinar os objetos a serem representados. No processo de considerar as relações que se estabelecem no interior dos sistemas significados/significantes aliadas às possíveis representações conduzirão os sujeitos a identificar os invariantes operatórios e chegar a conceitualização.

Os resultados apontaram que há uma íntima relação significado/significante e que o significado não se exprime da mesma maneira no significante. Muitas vezes o significante está relacionado ao símbolo ou mesmo à marca de um objeto do contexto imediato e o significado, muitas vezes está relacionado ao uso ou a utilidade que se faz do objeto real, sem nenhuma relação com a operatividade de conceitualização. Daí a necessidade de se observar nos significantes, quais são os aspectos do significado que são engajados. No processo de construção do conhecimento, proveitoso será investigar as relações entre os significantes e o significado para a situação referente. Esses resultados mostram que através da organização de uma diversidade de situações didáticas, pode-se conduzir os sujeitos à compreensão da estrutura do SND. Da mesma forma que quando as situações didáticas são previamente pensadas e elaboradas, e suas tarefas bem articuladas, pode-se investigar as compreensões que os sujeitos possuem acerca de um objeto, assim como, permitir que o conceitualizem.

Respondendo à pergunta da investigação concluímos que o sujeito criança do 2o ciclo do ensino fundamental SND e o sujeito adulto em fase de alfabetização possuem compreensão parcial do SND mas, esta se manifesta de forma diferente de acordo com o tipo de registro ao qual lançam mão para representar as quantidades.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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