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FRONTEIRAS DO RIO GRANDE DO SUL NO PORTAL UNBRAL FRONTEIRAS: A ATIVIDADE AGROPECUÁRIA E SUAS INTERAÇÕES COMO ELEMENTO DA PAISAGEM CULTURAL 1

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Academic year: 2021

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FRONTEIRAS DO RIO GRANDE DO SUL NO PORTAL UNBRAL FRONTEIRAS: A ATIVIDADE AGROPECUÁRIA E SUAS INTERAÇÕES COMO ELEMENTO DA

PAISAGEM CULTURAL1

Thaís LEOBETH2 Adriana DORFMAN3

Karla M. MÜLLER4

Resumo: O artigo tem como objetivo identificar teses e dissertações disponíveis no Portal Unbral Fronteiras cuja abordagem volta-se para as fronteiras do Brasil com Argentina e Uruguai. Buscou-se por trabalhos acadêmicos que refletisBuscou-sem sobre essas regiões a partir de elementos políticos, econômicos, históricos e culturais que fossem esclarecedores das interações entre os grupos envolvidos e que exemplificassem a importância da agropecuária para esses territórios. A proposta parte de um projeto do Campo da Comunicação5 que pesquisa a fronteira e a atividade agropecuária na mídia local, e considera pertinente refletir o assunto sob a ótica de um conjunto de características das regiões de fronteira em questão. A escolha do referido portal se deu em função de ser um repositório que reúne apenas produções que discorrem sobre as fronteiras e limites do Brasil. Um dos objetivos do Portal Unbral Fronteiras é suprir a necessidade de organização e disponibilização de trabalhos científicos e da produção técnica sobre as fronteiras brasileiras6.

Palavras-chave: Fronteiras Nacionais; Cultura e Identidade; Mídia Local; Portal Unbral Fronteiras; Atividade Agropecuária.

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Artigo produzido para o VI Seminário Internacional América Platina, Eixo Temático V – Fronteira e relações de vizinhança, realizado de 16 a 18 de novembro de 2016, em Campo Grande – MS.

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Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Informação (PPGCOM) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); Bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq; Jornalista. Participante da equipe de pesquisa “Mídia e Fronteiras: cartografia dos estudos no Brasil”; Integrante da Pesquisa Unbral Fronteiras - Portal de Acesso Aberto das Universidades Brasileiras sobre Fronteiras e Limites; membro da equipe do projeto de extensão Em dia com a pesquisa – PPGCOM/UFRGS. E-mail: thais.leobeth@ufrgs.br.

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Dra. em Geografia. Professora do Depto. de Geografia e do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Coordenadora do projeto Unbral Fronteiras - Portal de Acesso Aberto das Universidades Brasileiras sobre Limites e Fronteiras. Líder do GREFIT – Grupo de Pesquisas Espaço Fronteira Informação Tecnologia. E-mail: adriana.dorfman@ufrgs.br.

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Dra. em Ciências da Comunicação; Mestre em Comunicação; Relações Públicas, Jornalista e Publicitária. Profa. pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Informação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); Coordenadora da pesquisa “Mídia e Fronteiras: cartografia dos estudos no Brasil”; Membro dos Grupos de Pesquisa no CNPq “Comunicação e práticas culturais”, “Mídia, tecnologia e cultura” e “História da Comunicação”; Coordenadora do Projeto de Extensão Em dia com a pesquisa – PPGCOM/UFRGS; Assessora Ad Hoc do CNPq e da CAPES. E-mail: kmmuller@ufrgs.br.

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O projeto de pesquisa está sendo desenvolvido junto ao Programa de Pós-graduação em Comunicação e Informação da UFRGS e resultará em dissertação de mestrado.

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A proposta do Unbral Fronteiras é maior do que ser um repositório. Os trabalhos selecionados estão classificados com diversas referencias o que enriquece as possibilidades de interpretação dos dados e articulação das informações coletadas.

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Abstract: The paper aims to identify thesis and dissertations available at the Unbral Fronteiras Portal, whose approach is focused on the borders of Brazil with Argentina and Uruguay. It was sought for academic works that reflect upon those regions from political, economic, historical and cultural elements that were enlightening of the interaction between the groups involved and exemplifying of the importance of agriculture to these territories. The proposal is part of a Communications Field project that researches the frontier and agricultural activity in local media, and considers it pertinent to reflect the matter in the view of a set of features from the border areas concerned. The selection of this portal was due to it being an archive that gathers only productions that discuss about borders and bounds of Brazil. One objective of the Unbral Fronteiras Portal is to fulfill the need for organization and delivery of scientific papers and technical production about the Brazilian frontiers.

Key words: National Boundaries; Culture and Identity; Local media; Portal Unbral Fronteiras; Agricultural Activity.

Introdução

Possuidoras de uma realidade social complexa e específica, as zonas de fronteiras nacionais constituem um instigante ambiente de pesquisa. As zonas limítrofes entre o Brasil e os países da América do Sul, por exemplo, são permeadas por diferentes conjecturas de relações. Trata-se de uma vasta extensão territorial que comporta diversificadas formas de contato entre os habitantes locais nos casos onde as cidades se encontram ou são bastante próximas. Uma peculiaridade desses territórios são as escalas as quais contempla: o internacional, o nacional e o local. Pode-se considerar também o regional, pois em alguns casos o pertencimento nesse nível é determinante nas relações sociais.

As fronteiras nacionais do sul brasileiro, onde os municípios de Santana do Livramento e Uruguaiana limitam-se com Rivera (Uruguai) e Passo de Los Libres (Argentina), respectivamente, são territórios permeados por uma relação direta entre os habitantes locais. Além disso, são pontos que concentram fluxos de pessoas das diversas partes de ambos os países. A principal razão disso é a referência comercial bastante característica do mercado globalizado, representadas nos freeshops, mas também por esses municípios que servem como zona de escoamento. A produção agropecuária dos três países acima mencionados por vezes necessita da circulação internacional para transporte e comercialização dos seus produtos, bem como para aquisição de insumos. Trata-se de um aspecto da base econômica e um elemento cultural determinante nessas nações.

Dada à importância do assunto para as relações cotidianas dessas regiões de fronteira, acredita-se que publicações jornalísticas da mídia local podem revelar traços do comportamento social. A atividade agropecuária, por vezes, é uma questão polêmica tanto por aspectos ambientais quanto por políticas econômicas e culturais. Por envolver interesses internacionais, interações relacionadas com essa temática incidem diretamente nos municípios Santana do Livramento e Uruguaiana.

A mídia, através do seu potencial simbólico, que ultrapassa o limite do território estatal, reflete e ao mesmo tempo influencia a realidade social. Considerando a prática jornalística por essa perspectiva, considera-se que através da mídia produzida nessas fronteiras é possível identificar traços da identidade cultural na abordagem de assuntos relacionados com a agropecuária. Nesse sentido, é interessante estudar fenômenos específicos que dizem respeito a particularidades que ocorrem no âmbito das práticas da região de fronteira por meio de conteúdos jornalísticos.

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A contextualização acima compreende uma proposta de pesquisa que está em andamento. Como uma das primeiras incursões aos objetivos da pesquisa, considerou-se pertinente mapear dissertações e teses mencionadas no Portal Unbral Fronteiras, cuja abordagem volta-se para questões econômicas, políticas, históricas e culturais de Brasil, Argentina e Uruguai. Além disso, constitui-se também como atividade de reflexão do conteúdo disponibilizado previsto nos objetivos do projeto Unbral Fronteiras.

O Portal Unbral Fronteiras como suporte de pesquisa

A metodologia de pesquisa do presente artigo consiste na busca por teses e dissertações que abordem relações entre Brasil, Argentina e Uruguai, independente da área do conhecimento a que esteja vinculada. A motivação para o desenvolvimento deste trabalho baseia-se na contribuição que dará ao projeto de investigação que está em curso, pois os trabalhos encontrados poderão servir como fundamentação da abordagem proposta. Além disso, também é uma contribuição da proponente enquanto integrante do projeto Portal Unbral Fronteiras, que constitui o suporte para realização da pesquisa em função de que tem como enfoque a temática fronteira.

O trabalho do Portal Unbral Fronteiras constitui-se num repositório que reúne teses, dissertações e monografias cuja abordagem dedica-se ao estudo de fronteiras e limites do Brasil. O objetivo do projeto é dar visibilidade às produções, servindo como referência na localização de trabalhos acadêmicos publicados no período de 2000 a 2014 em nível nacional. O portal é um repositório de acesso aberto, destinado a suprir a carência de sistematização da produção acadêmica brasileira em torno dos Estudos Fronteiriços, que vêm ganhando espaço nos programas de pós-graduação do país. A catalogação está em fase de realização e se estenderá até que sejam atingidas todas as universidades brasileiras, na medida em que estas disponibilizam os arquivos. Até o momento da presente pesquisa, estavam disponíveis 286 produções referentes às seguintes instituições: Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade de Brasília (UnB), Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e Universidade Federal de Roraima (UFRR).

A partir da apresentação do assunto e das justificativas mencionadas, considera-se que quanto aos objetivos,trata-se de pesquisa exploratória. Segundo Gil (2002, p. 41), “pode-se dizer que estas pesquisas têm como objetivo principal o aprimoramento de ideias ou a descoberta de intuições”. Segundo este e outros autores como Stumpf (2009), em relação aos procedimentos técnicos, o presente estudo classifica-se como pesquisa bibliográfica, em função do uso de referenciais teóricos sobre os assuntos abordados, bem como pelo conteúdo mapeado no Portal Unbral Fronteiras. Após a abordagem teórica que segue, são apresentados os resultados da pesquisa realizada no portal e considerações acercado que foi encontrado.

Fronteiras nacionais: encontro de identidades culturais

As zonas de fronteira, enquanto limite nacional, constituem-se como ambiente de características próprias. Müller e Oliveira (2004), pesquisando regiões das fronteiras brasileiras, perceberam que esse espaço é tido pelos seus habitantes como local de identidade de um grupo específico, que, através de suas peculiaridades, se mantém distinto e especial. Para os autores, “o ponto que chama mais a atenção é que esta diferenciação se dá no sentido de reconhecer que existem, no mínimo, duas identidades nacionais em questão, sempre bem claras e previsíveis” (MÜLLER eOLIVEIRA, 2004, p. 05).

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Geograficamente distantes dos grandes centros urbanos, como é o caso do extremo sul do Brasil, os fronteiriços constroem sua identidade marcando o pertencimento a esse lugar comum compartilhado com os cidadãos dos países vizinhos. Há consciência de unidade, mas também há o senso de diferença. Esses territórios se consolidam através de um cotidiano que tem suas facilidades e dificuldades. Conforme afirma Dorfman (2013),

na fronteira gaúcha, os agentes experimentam uma condição fronteiriça em que as diferenças se ampliam pela justaposição de experiências nacionais, ao mesmo tempo em que se apagam através de dispositivos de transição; em outros casos, práticas e objetos geográficos são unificados (redes de infraestrutura), criados (extraterritorialidades e ilegalidades), espelhados (redes compartilhadas) e distinguidos (administração dos limites e das barreiras nacionais) (DORFMAN, 2013, p. 1).

A partir da identificação desses aspectos, a autora considera que os sujeitos dessas regiões vivem o que denominou “condição fronteiriça”. Vive-se a dualidade nacional como especificidade desse tipo de fronteira que oferece condições de possibilidades e também de necessidade para certas práticas.

A condição fronteiriça é entendida aqui como um savoirpasser [saber passar] adquirido pelos habitantes da fronteira, acostumados a acionar diferenças e semelhanças nacionais, linguísticas, jurídicas, étnicas, econômicas, religiosas que ora representam vantagens, ora o cerceamento de trânsito ou direitos (DORFMAN, 2013, p. 10).

No estado do Rio Grande do Sul, onde o Brasil faz fronteira com Uruguai (ao sul) e Argentina (a oeste), embora muitas características socioeconômicas e culturais sejam comuns a ambos os povos fronteiriços dessas três nacionalidades, e talvez justamente por estes fatores, os conflitos também estão presentes. É preciso encarar desafios diante das diferenças, principalmente relacionadas à desigualdade social e às normas e condutas estabelecidas que regem as sociedades que ali se encontram lado a lado. Assim, agem conforme a realidade se apresenta, explicam Müller e Oliveira (2004).

Esse delineamento das realidades fronteiriças atuais está intimamente relacionado ao fenômeno da globalização. Os aspectos econômicos tornaram-se preponderantes nas mais diversas situações do cotidiano. Além disso, a promoção do contato com outras culturas pode ser considerada elemento determinante do cenário cultural e identitário atual, em que se tem cada vez mais diversidade. Encontra-se em parte, por um lado abertura para a pluralidade cultural; por outro, tentativas de manter comportamentos tidos como tradicionais ao território de fronteira. Esse duelo de perspectivas se desenvolve numa era de transição social. Em contrapartida com o homem moderno, conforme explica Hall (2011), o sujeito pós-moderno caracteriza-se pela suscetibilidade de flexão quanto a sua identificação cultural. Porém, a multiplicidade de possibilidades a tornou problemática e variável. Na vivência pós-moderna, identificar-se culturalmente

torna-se uma “celebração móvel”: formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam. É definida historicamente, e não biologicamente. Dentro de nós há identidades contraditórias, empurradas em diferentes direções, de tal modo que nossas identificações estão sendo continuamente deslocadas (HALL, 1987 apud HALL, 2011, 13).

Fazendo um paralelo com as relações do sujeito fronteiriço, a partir de fatores contextuais cotidianos, podem ser manifestados comportamentos de aproximação ou distanciamento, por exemplo, quando do compartilhamento de assuntos que interessam ao Brasil, ao Uruguai e à

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Argentina. Por vezes, as familiaridades culturais podem ser relegadas ao segundo plano, de modo que a condição de vizinhança não seja determinante para o estabelecimento de acordos ou atuação coletiva.

A fragmentação caracteriza o sujeito da pós-modernidade. Esse aspecto gera conflitos e incompreensões. A relação com o Estado é um ponto que evidencia essa nova conjuntura social. Hall (2011) preocupa-se especialmente com a identidade nacional e seus desdobramentos a partir da globalização. Para o autor, “as identidades nacionais não são coisas com as quais nós nascemos, mas são formadas e transformadas no interior da representação” (HALL, 2011, p. 49, grifo do autor). Assim, a nação não se constitui apenas como organização política, mas também como um sistema de representação cultural. Ocorre que a sociedade moderna foi delineando-se e efetivou-se sob a essência do nacionalismo, que se tornou determinante no que tange a identidade cultural dos sujeitos, como afirma Hall:

A cultura nacional, ao produzir sentidos sobre “a nação”, sentidos com os quais podemos nos identificar, constrói identidades. Estes sentidos estão contidos nas histórias que são contadas sobre a nação, memórias que conectam seu presente com seu passado e imagens que dela são construídas (HALL, 2011, p. 51, destaque do autor).

Dessa forma, a imaginação é acionada e forma a visão que se tem da nação e do significado que seu cotidiano, suas façanhas ou derrotas adquirem para os sujeitos que a integram. Trata-se de uma narrativa que é determinante no comportamento dos indivíduos. Hall (2011) aponta que, dentre outras influências, isso se dá através da reafirmação de questões históricas, da ênfase nas origens e na continuidade, da invenção de tradições, do mito em torno do princípio da nação e muitas vezes do ideal de um povo puro. A partir dessa concepção, os projetos nacionalistas apegaram-se à crença da possibilidade de unificação, no entanto, como afirma Hall: “As nações modernas são, todas, híbridos culturais” (2011, p. 63, grifo do autor). A globalização veio desestruturar esses princípios de identidade cultural unificada. A esfera política e econômica que fomentou a circulação cultural não se preparou para a superação de problemáticas decorrentes do cenário de pluralidade identitária. Nesse contexto, por um lado, novos territórios passaram a servir de base para a reafirmação cultural: “as identidades nacionais permanecem fortes, especialmente com respeito a coisas como direitos legais e de cidadania, mas as identidades locais, regionais e comunitárias têm se tornado mais importantes” (HALL, 2011, p. 73). Por outro, quando consideradas acima da cultura nacional, as identificações globais passam a se deslocar e até a apagar manifestações tidas como elementos da identidade nacional. Trata-se de uma constante de conflitos conectados. E, pensando a realidade das fronteiras nacionais aqui abordadas, essa profusão de situações está na vivência do sujeito fronteiriço, pois esses lugares são permeados por sentimentos e possibilidades diversos. Como afirma Dorfman:

As fronteiras são lugares da contradição, ao mesmo tempo periféricos aos estados-nação e plenos de alternativas políticas e econômicas oferecidas pelo trânsito fronteiriço. São também lugares da diversidade, em que o contato estrutural entre dois grupos nacionais - ou grupos nacionalizados, na medida em que a distinção entre eles pode originar-se na ação político-cultural do estado-nação que, em seus processos de territorialização, coloniza as margens, marcas e monumentos - é experimentado cotidianamente. Além disso, o chamado da fronteira atinge os ouvidos de muitos outros grupos interessados na indecidibilidade característica desse lugar (DORFMAN, 2013, p. 9).

Pode-se perceber que variadas qualificações direcionam a conjuntura social das fronteiras e são determinantes comportamentais. Müller e Oliveira (2004, p. 6) ressaltam que

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“os movimentos estimulados pelo processo de globalização demonstram que não há limites para o trânsito de pessoas, mercadorias, bens materiais e simbólicos, confirmando que as fronteiras, mais do que geopolíticas, caracterizam-se por serem imaginárias, simbólicas”.

Para o recorte da proposta de pesquisa aqui trazida como motivação para o presente artigo, considera-se pertinente analisar a agropecuária como prática econômica e cultural das três nacionalidades em questão. Isso se deve em função de que por trás da agricultura e da pecuária existe uma história que abrange o sul brasileiro, principalmente entre as populações que formam as regiões interioranas e fronteiriças do Rio Grande do Sul, com uruguaios e argentinos estabelecidos também na fronteira. Mais do que uma atividade econômica, a tradição desse tipo de produção também compõe a identidade dos sujeitos. O Bloco Mercosul (Mercado Comum do Sul), efetivado em 1994, é um dos determinantes políticos atuais nas relações entre Brasil, Argentina e Uruguai. O estudo proposto parte de perspectivas da Comunicação e busca na mídia local, por esta ser um elemento fundamental na dinâmica social, marcas de aproximação e/ou distanciamento entre os sujeitos fronteiriços.

A mídia em território fronteiriço

Um elemento fundamental na consolidação e manutenção da cultura e da identidade fronteiriças é a mídia. Ela é um fomentador direto da interação permanente que ocorre em zonas de fronteira, pois ultrapassa os limites geográficos. Os meios de comunicação, principalmente o jornal, o rádio e a televisão, e, atualmente, a internet, atuam na construção da realidade assim como também fazem parte dela. A mídia não apenas reproduz os fatos; ela também é um elemento participante. Conforme afirmam Müller e Oliveira (2004, p. 09): “Mais do que um reprodutor do que se passa no mundo, os meios de comunicação assumem, cada vez mais, o papel de sujeitos, inserindo-se como agente, participando ativamente dos rumos que tomam a sociedade”.

Através da mídia local, os meios de comunicação servem para o estabelecimento das realidades convenientes e como ferramenta para as transformações ou influências que interessam aos grupos dominantes. As vozes que constituem as fontes presentes nos veículos de comunicação não são selecionadas aleatoriamente, bem como os discursos não são ingênuos e imparcialmente narrados. Isso configura também o diálogo com o país vizinho. Müller et al (2010, p. 124) afirma que “a mídia de fronteira funciona como a representação concreta das relações que se estabelecem na sociedade, a partir dos interesses e desejos desta, decorrentes das crises, conflitos e necessidades que se criam no dia a dia de vizinhança”. Sendo assim, a mídia tem poder para influenciar a identidade cultural, conduzindo os sujeitos a novas concepções do seu sentimento de fronteiriço.

Na atualidade, não é possível pensar qualquer realidade sem considerar a comunicação e as possibilidades proporcionadas pelo acesso às novas tecnologias de informação. Sem dúvida, o avanço tecnológico das últimas duas décadas, com mais intensidade nos últimos anos, contribuiu para a transformação do cenário de fronteira, mudando hábitos, costumes e a forma de ver o outro. A possibilidade de conexões que vinha se estabelecendo como primeiros sintomas da globalização foi efetivada a partir da internet. O novo cenário chegou às pautas e às rotinas de produção dos meios de comunicação e deu nova visibilidade e importância para a informação local. Conforme García, “estamos na era do global e do local, uma fase na qual o processo de concentração econômica mudou a relação entre os atores trans-fronteiriços e abriu novos horizontes de futuro” (2002, p. 02). Para o autor, além da preocupação com a propagação das informações, é necessário atentar “à origem da produção [...], aos objetivos perseguidos, aos meios utilizados, aos traços de identidade que caracterizam as mensagens, as características comuns dos destinatários e a capacidade de captação de cidadãos de coletivos diversos” (GARCÍA, 2002, p. 200).

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No território fronteiriço, assim como tem sido para a imprensa local de regiões interioranas, como também é o caso da mídia mencionada, o critério de noticiabilidade de proximidade é o elemento fundamental para a existência dos veículos de comunicação. Porém, não significa restringir a informação ao âmbito local. Diferentemente disso, é preciso buscar em outras esferas as informações que interessam ao local. Segundo Grimberg,

cada escala do processo comunicacional (local, regional, nacional, global) cumpre um papel específico no processo de inteligibilidade do mundo, objetivo norteador da comunicação jornalística, encontrando sua expressão mais objetiva na produção noticiosa (2014, p. 22).

A partir dessa concepção, entende-se que a produção noticiosa precisa dar conta dessas quatro escalas, considerando esse critério que também é determinante para se manter os veículos de comunicação em atividade. A proximidade pode estar relacionada com um objeto real do cotidiano da fronteira como pode ser a consequência de uma decisão simbólica que afeta diretamente a sociedade fronteiriça. Compreende-se, assim, que o critério de noticiabilidade proximidade passa pelas instâncias acima mencionadas.

E para ampliar a discussão sobre a temática mídia e fronteiras torna-se fundamental verificar o que tem sido estudado e analisado a este respeito. Neste sentido, é condição sine qua non fazer um levantamento das pesquisas já realizadas para alcançar avanços na compreensão do fenômeno. As fronteiras gaúchas em produções acadêmicas: Portal Unbral Fronteiras

Conforme a proposta do presente artigo, buscou-se por produções com viés econômico, político, histórico ou cultural voltadas para as relações de Brasil, Argentina e Uruguai, relacionadas com a produção agropecuária. No momento de realização da pesquisa7, o Portal Unbral Fronteiras possuía 286 trabalhos, entre teses e dissertações, de seis universidades, com enfoque direto para questões das fronteiras nacionais ou assuntos relacionados. Através dos títulos e dos resumos, foram identificadas 38 produções com abordagem direta às características e problemáticas das zonas fronteiriças do Brasil com os países vizinhos pelo Rio Grande do Sul, originadas em três instituições.

Da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) foram encontradas seis produções, sendo uma delas voltada para a abordagem de fenômenos da fronteira do sul brasileiro. Da Universidade de Brasília (UnB) estão 38 trabalhos no portal, sendo que três destes abordam a fronteira a partir de perspectivas que interessam à proposta de pesquisa norteadora no presente artigo. A Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) é a que possui maior número de teses e dissertações catalogadas no Portal Unbral Fronteiras: são 152. De forma proporcional, encontraram-se 34 produções acadêmicas trazendo a temática das fronteiras nacionais, algumas tratando diretamente das fronteiras gaúchas enquanto outras enfocando relações mais abrangentes. Para reflexão acerca da temática específica dos trabalhos, considerou-se pertinente analisar em agrupamentos conforme as áreas dos programas de pós-graduação dos quais são originados. Ao todo, foram identificados 17 cursos.

Verificou-se três produções de Antropologia e Antropologia Social tratando de estudos do cotidiano e aspectos políticos e religiosos comuns a Brasil, Argentina e Uruguai enquanto pertencentes à matriz cultural cisplatina. De Letras, Linguística e Letras Neolatinas, três dissertações e duas teses trazem aspectos do bilinguismo presente nas fronteiras gaúchas com os

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A inserção de trabalhos acadêmicos desenvolvidos junto a programas de pós-graduação brasileiros, resultantes de teses e dissertações, segue sendo realizada pela equipe do Unbral Fronteiras.

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países vizinhos, o que é uma das características mais fortes da interação entre os povos fronteiriços. Reflexões da fronteira a partir de uma perspectiva histórica somaram seis itens. Os trabalhos contemplam assuntos impactantes quando se trata de fronteiras nacionais: propriedade de terras, comércio relacionado com a presença de imigrantes, contrabando, exército, relações de poder. Cinco dissertações se apropriam da temática de fronteira pela perspectiva de cursos de Relações Internacionais. Os estudos encontrados evidenciam a diversidade de possibilidades e também de problemáticas que envolvem as relações entre as nações, quando se trata de pensar o papel das fronteiras nos acordos.

Preocupando-se com as interações que se dão a partir da zona urbana, três produções de pós-graduação em Planejamento Urbano e Regional têm como enfoque as cidades-gêmeas. A estrutura paralela das cidades é determinante no cotidiano dos sujeitos. Quatro dissertações e uma tese mostram estudos sobre as fronteiras pela perspectiva da Geografia. Através desses trabalhos pode-se obpode-servar que práticas rurais são recorrentes em pesquisas dessas regiões, mostrando que o assunto é pertinente para as sociedades de fronteira tanto em nível local quanto internacional. Aspectos de política democrática foram pautados por uma dissertação do curso de Ciência Política. Numa perspectiva próxima, uma dissertação vinculada a um programa de pós-graduação voltado ao estudo das Américas reflete sobre a estrutura do Estado, buscando identificar a influência do comportamento das elites que atuam em seu centro administrativo e ocupam-se da abordagem da faixa de fronteira brasileira.

Voltados para uma análise de fenômenos da Administração, três produções discorrem sobre o Mercosul, a RBSTV, enquanto meio de comunicação da fronteira oeste gaúcha, e questões empresariais de Brasil e Uruguai. Abordando tratados comerciais, uma dissertação construída pelo viés da Economia ocupa-se de conhecer as relações e ações mercadológicas estabelecidas em torno da produção de soja. Numa perspectiva aproximada, duas produções de pós-graduação em Agronegócio trazem pontos polêmicos da relação do Brasil com Uruguai e Argentina: exportação e competitividade. Foram selecionadas também duas dissertações de Desenvolvimento Rural que tratam da agropecuária como uma fonte de renda dos povos das fronteiras gaúchas, que são caracteristicamente propícias a esse tipo de produção. Com enfoque para práticas culturais, identificou-se uma dissertação, oriunda de estudos de Música que exemplifica um aspecto forte da cultura do Rio Grande do Sul, que tem como ponto de partida as regiões de fronteiras do estado com Argentina e Uruguai. O trabalho traz uma questão atual e pertinente que é a nova configuração da identidade cultural. Por fim, uma tese do campo da Comunicação aborda o envolvimento das rádios de cidades de fronteira na interação cultural local. O estudo mostra as transformações e a propagação de rádios impulsionadas pela web em quatro pontos das fronteiras nacionais do Brasil, sendo dois deles Santana do Livramento\Rivera e Uruguaiana\Passo de Los Libres.

Como se pode observar, os trabalhos acima mencionados trazem um conjunto variado de abordagens sobre as fronteiras do Brasil com os países vizinhos, Argentina e Uruguai, principalmente através do estado do Rio Grande do Sul. Dos 38 trabalhos, dez estão diretamente relacionados com questões de agricultura e pecuária. O conjunto de produções analisadas evidencia processos e elementos da composição política, econômica, histórica e cultural que se configuraram e que permanecem como determinantes do cenário atual. As teses e dissertações analisadas que não são voltadas para atividades agropecuárias servem para reafirmar a dinâmica relação que ocorre nessas zonas de fronteira. Os trabalhos mostram que é o somatório de questões peculiares a esses territórios que vêm delineando as relações no âmbito fronteiriço. Um dos resultados dessa composição social é a prática de agricultura e pecuária como elementos fundamentais da economia e da identidade cultural, o que as configura como pautas indispensáveis aos meios de comunicação dessas regiões.

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Voltando à origem do presente artigo, que se propõe pesquisar as relações estabelecidas na fronteira a partir da mídia, percebe-se a raridade de estudos que reflitam os fenômenos culturais sob essa ótica. Embora possa haver outras teses e dissertações que pensem as fronteiras a partir dos meios de comunicação, como é o caso de outras quatro produções mencionadas por Müller et al (2015), é evidente a carência de pesquisas que compreendam as fronteiras através da mídia, visto o nível de interação que esta mantém nas sociedades desses locais.

Considerações

Pode-se perceber que as relações entre os povos do Brasil, principalmente da região Sul, e argentinos e uruguaios não são superficiais, tampouco recentes. São sociedades que vêm se relacionando através de séculos de história e que na atualidade têm se deparado com mudanças rápidas nas identidades culturais e impactantes desafios econômicos. A dinâmica social pós-moderna contempla, de forma dinâmica, rupturas e entrelaçamentos, no entanto, a partir dos trabalhos analisados, nota-se que características essenciais da construção histórica dos territórios fronteiriços continuam determinantes e, por vezes, podem se confrontar com possíveis novas configurações culturais.

A diversidade de assuntos trazidos pela pesquisa no Portal Unbral Fronteiras evidencia que são muitos os aspectos que podem e devem ser pensados quando se trata de fronteira e confirmam a importância de se pesquisar as interações que se formam em torno da atividade agropecuária. Esses territórios peculiares são formados por um conjunto de circunstâncias que se tornam mais compreensíveis quando lidas a partir de diferentes perspectivas. Através das produções pesquisadas pode-se inferir que aspectos econômicos, políticos, históricos e culturais, principalmente da formação fronteiriça do Rio Grande do Sul, fazem da agricultura e da pecuária elementos de vital importância para a manutenção da dinâmica social desses territórios. Cabe ainda destacar que certamente os acontecimentos ocorridos nos diversos campos sociais estão presentes no que é divulgado pelos meios de comunicação, entretanto poucos são os estudos que avaliam o fenômeno fronteiras nacionais (ou internacionais, dependendo do enfoque dado) presentes na mídia, motivo que justifica nossa preocupação em aprofundar a pesquisa sobre o tema.

Referências

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NASCIMENTO, D; REBELO, J. P. Fronteiras em perspectiva comparada e temas de defesa da

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Referências

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