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A Linguagem da Moral (diniz) - R. M. Hare.pdf

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apresentar uma clara, breve e

compreensível introdução à éti­

ca que possa levar o principian­

te, o mais diretamente possível, a

lidar com os problemas funda­

mentais do tema.

R. M. Hare mostra como novos

métodos filosóficos permitem

compreender antigas controvér­

sias. Qual a natureza e a função

do discurso moral? Em que esse

discurso se assemelha ou difere

dos outros tipos de discurso?

Que importância ele pode ter

para as decisões que temos de

enfrentar continuamente? O que

significa tomar uma decisão mo­

ral e como ela pode ser justifica­

da? Essas e outras questões cen­

trais são discutidas com lucidez

neste livro que mereceu o reco­

nhecimento de juristas e outros

especialistas e que passou a ser

considerado um clássico na área.

CAPA

Projeto gráfico Katia Harumi Térasaka

Imagens Andrea Mantegna, Retrato de um homem (detalhe) Antonello da Messina, Retrato de um jovem (detalhe) Domenico Ghirlandaio, Retrato de G iovanna

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Esta obra f o i publicada originalm ente em inglês com o título T H E LANG U AGE OF M O RALS

por C larendon Press. Oxford, em 1952. Reedições corrigidas em 1961 e 1972. C opyright © O xford University Press

C opyright © Livraria M artins Fontes E ditora L td a ., São Paulo, 1996, para a presente edição

1- edição dezem bro de 1996

Esta tradução de "The Language o f M orais" {3- edição 1972, 7- tiragem ) f o i publicada com acordo do editor original O xford U niversity P ress

Coordenação da tradução e texto final

Luís C arlos Borges

Tradução

Eduardo Pereira e Ferreira

Revisão gráfica

Solange M artins Eliane Rodrigues de Abreu

Produção gráfica

G eraldo Alves

Paginação/Fotolitos

Stitdio 3 D esenvolvim ento Editorial

Capa

K atia H arum i Teram ka

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Hare, R. M.

A linguagem da moral / R. M. Hare ; tradução Eduardo Pe- Teira e Ferreira. - São Paulo : Martins Fontes, 1996.

Título original: The language of morais. ISBN 85-336-0567-6

1. Ética I. Título.

96-5015 CDD-170

Índices para catálogo sistemático:

1. Ética : Filosofia 170 2. Moral : Filosofia 170

Todos os direitos para o Brasil reservados à Livraria M artins Fontes E ditora Ltda.

Rua C onselheiro Ram alho, 330/340 01325-000 S ã o Paulo SP Brasil Telefone 239-3677

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P refácio... VII PRIMEIRA PARTE O MODO IMPERATIVO 1. Linguagem prescritiva... 3 2. Imperativos e lógica... 19 3. Inferência... 33 4. Decisões de princípio... 59 SEGUNDA PARTE “BOM” 5. “Naturalismo”... ... 85 6. Significado e critérios... 101 7. Descrição e avaliação... 119 8. Aprovar e escolher... 135

9. “Bom” em contextos morais... 145 TERCEIRA PARTE

“DEVER”

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11. “Dever” e imperativos... 175

12. Um modelo analítico... ! 93

N otas... 211

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Planejei neste livro escrever uma introdução à ética clara, breve e de fácil leitura, que possa levar o iniciante a lidar com os problemas fundamentais do assunto tão diretamente quanto possível. Portanto, ao reduzir o material que tinha preparado a cerca da metade do volume original, deixei de fora a maioria das qualificações, respostas a objeções menores e outras defe­ sas das quais tende a cercar-se o filósofo precavido. Embora entenda que o enfoque da ética esboçado nestas páginas é de modo geral produtivo, ficarei menos incomodado se meus lei­ tores discordarem de mim do que se nâo conseguirem me en­ tender. Quase todo parágrafo neste livro, assim como em outros trabalhos de filosofia, requer alguma qualificação, mas forne- cê-la a cada ocasião seria tornar minhas principais asserções mais difíceis de apreender. Tentei, portanto, adotar em todo o trabalho um ponto de vista o mais definido possível, na crença de que é mais importante que haja discussão dos pontos aqui levantados do que eu sobreviver incólume a eles.

A ética, tal como a entendo, é o: estudo lógico da lingua­ gem da moral. De modo geral, é mais fácil compreender a lógi­ ca muito complexa dos termos morais quando se tem algum conhecimento dos tipos mais simples de lógica; porém, como muitos estudantes de filosofia, por alguma razão, são obriga­ dos a estudar ética sem tal conhecimento, tentei não

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considerá-VIH A LINGUAGEM DA MORAL

lo como pressuposto. Se alguém tomar este livro sem nenhuma leitura prévia sobre filosofia, irá, espero, considerá-lo inteligí­ vel desde que siga esta regra simples; omitir quaisquer trechos que considerar difíceis, prosseguir a leitura e voltar a eles mais tarde. Incluí, em benefício dos que possam estar interessados, certas referências bem rápidas a alguns dos “tipos de teoria éti­ ca” familiares e também aos trabalhos de alguns dos mais conhecidos autores sobre ética; mas essas referências podem ser ignoradas sem que se perca qualquer ponto essencial de mi­ nha argumentação. Coloquei no início a seção sobre “O Modo Imperativo” porque me parece a mais fundamental; mas, como talvez seja também a mais difícil, nao considerei pressuposto, na Segunda Parte, o argumento da Primeira Parte; qualquer lei­ tor, por conseguinte, que queira ler essas duas partes na ordem inversa é livre para fazê-lo.

Evitei deliberadamente referências aos problemas da psi­ cologia moral. Em particular, o problema conhecido como “A Liberdade da Vontade” , que tem seu lugar na maioria das intro­ duções à ética, não é mencionado, e o problema geralmente conhecido pelo título aristotélico de Akrasia, que deveria ser discutido mais freqüentemente, é mencionado apenas de passa­ gem. Não porque considere desprezíveis esses problemas ou porque não tenha nada a dizer sobre eles, mas porque são antes problemas da linguagem da psicologia da moral do que da lin­ guagem da moral propriamente dita.

Meus agradecimentos, em primeiro lugar, ao diretor e aos catedráticos do Balliol College, pela generosidade de liberar­ me, durante o ano 1950-51, dos meus deveres de professor, sem o que a tarefa jam ais poderia ter sido realizada. Em segundo lugar, tenho de agradecer aos examinadores do Prêmio de Filosofia da Moral T. H. Green, aos Professores H. J. Patón e G. Ryle e ao Sr. P, H. Nowell-Smith, por seus muitos comentários proveitosos sobre minha dissertação para o prêmio, da qual a Primeira Parte deste livro é uma condensação. Em terceiro lu­ gar, devo reconhecim ento aos muitos, em Oxford e alhures,

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com os quais aprendi no curso da discussão a maior parte do que é apresentado aqui; meu débito para com o Sr. J. O. Urmson, por exemplo, ficará evidente. Tenho especial motivo para ser grato ao Sr. D. Mitchell e aos Professores H. L. A. Hart, A. J. Ayer e A. E. Duncan-Jones, que levaram parte ou todo o original datilo­ grafado e livraram-me de erros graves - pelos que possam ter restado, peço perdão. O ensaio deste último para a Aristotelian Society sobre “Asserções e Comandos” surgiu tarde demais para permitir qualquer comentário no texto; o mesmo aplica-se ao livro What is Vahie? do Professor Everett Hall, no qual o assunto do presente livro é examinado numa escala mais ambi­ ciosa. Para uma discussão dos pontos de vista do Professor Hall devo remeter o leitor a uma resenha a ser publicada em Mind. Devo ainda agradecer ao Sr. B. F. McGuinness pelo auxílio na compilação do índice Remissivo. Finalmente, caso a brevidade pareça ter acarretado dogmatismo ao lidar com os escritos de filósofos vivos ou mortos e injustiça para com suas doutrinas, devo confessar que aprendi tanto com os autores com os quais talvez pareça discordar como com aqueles que aplaudo.

Dedico este estudo da linguagem moral àqueles homens e mulheres bons sem cujas vidas o moralista estaria desperdiçan­ do seu fôlego, e especialmente a minha mulher.

R. M. H. BALLIOL COLLEGE

1952

Na segunda impressão fiz algumas correções de pouca importância que nao envolvem alteração radical do texto, Se estivesse reescrevendo o livro, eu o escreveria de forma dife­ rente, já que agora tenho a vantagem de saber o que foi mal compreendido e o que induziu a erro. Embora meus pontos de vista tenham mudado em algumas particularidades, não se

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alte-X A LINGUAGEM DA MORAL

raram em qualquer aspecto que me pareça fundamental. Sou muito grato aos que me ajudaram a esclarecer essas questões tecendo comentários sobre meus argumentos. Quanto às minhas presentes opiniões, devo remeter o leitor a um novo livro, conti­ nuação deste, que espero publicar em breve*.

R. M. H. BALLIOL COLLEGE

1960

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O modo imperativo

“A virtude, então, é uma disposição que governa nossas escolhas.”

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Linguagem prescritiva

1 .1 . Se perguntássemos a uma pessoa “Quais são seus princípios morais?” a maneira pela qual poderíamos ter mais certeza de uma resposta verdadeira seria estudando o que ela

faz. Ela pode, logicamente, professar em seu discurso toda

sorte de princípios que desconsidera completamente em suas ações; mas, quando estivesse frente a escolhas ou decisões entre cursos de ação alternativos, entre respostas alternativas à questão “Que devo fazer?”, conhecendo todos os fatos relevan­ tes de uma situação, ela revelaria em quais princípios de condu­ ta realmente acredita. A razão pela qual as ações; de uma maneira peculiar, são reveladoras de princípios morais-é que á I ungão dos princípios morais é orientar a conduta.-A linguagem da moral é uma espécie de linguagem prescritiva. E é isso que luz da ética algo que vale a pena estudar pois a pergunta “O que devo fazer?” é uma a que não podemos nos esquivar por muito tempo; os problemas da conduta, embora às vezes menos diver- tidos que palavras cruzadas, têm de ser resolvidos de forma di ¡crente das palavras cruzadas. Não podemos esperar para ver a solução no próximo número porque da solução dos problemas depende o que acontecerá no próximo número. Assim, num mundo em que os problemas da conduta tornam-se mais com­ plexos e atormentadores a cada dia, há uma grande necessidade de compreensão da linguagem na qual esses problemas são

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colocados e respondidos. Pois a confusão quanto a nossa lin­ guagem moral leva não meramente a confusões teóricas, mas a perplexidades práticas desnecessárias.

Uma maneira antiquada, mas ainda útil, de estudar qual­ quer coisa é p e r genus et differentiam; se a linguagem moral pertence ao gênero “linguagem prescritiva”, compreenderemos muito facilmente sua natureza se compararmos e contrastarmos, antes de tudo, a linguagem prescritiva com outros tipos de lin­ guagem e, depois, a linguagem moral com outros tipos de lingua­ gem prescritiva. Esse, em poucas palavras, é o plano deste livro. Partirei do simples para o mais complexo. Tratarei primeira­ mente da forma mais simples da linguagem prescritiva, a sen­ tença imperativa comum. O comportamento lógico desse tipo de sentença é de grande interesse para o estudante da linguagem moral porque, apesar de sua comparativa simplicidade, suscita, em forma facilmente discemível, muitos dos problemas que têm assolado a teoria ética. Portanto, embora não seja parte de meu propósito “reduzir” a linguagem moral a imperativos, o estudo dos imperativos é de longe a melhor introdução ao estudo da ética, e se o leitor não percebe imediatamente a relevância para a ética da parte inicial da discussão, devo pedir-lhe paciência. O desprezo aos princípios enunciados na primeira parte deste livro é a fonte de muitas das mais insidiosas confusões na ética.

Dos imperativos singulares partirei para os imperativos ou princípios universais. A discussão destes, e de como os adota­ mos ou rejeitamos, dar-me-á oportunidade de descrever os pro­ cessos de ensino e aprendizado e a lógica da linguagem que usamos para esses propósitos. Já que um dos usos mais impor­ tantes da linguagem moral é o ensino moral, a relevância dessa discussão para a ética será evidente.

Discutirei em seguida um tipo de linguagem prescritiva que está mais intimamente relacionado com a linguagem da moral do que o imperativo simples. É a linguagem dos juízos de valor não-morais - todas as sentenças que contêm palavras como “dever”, “certo” e “bom” que não são juízos morais. Procurarei demonstrar que müitás das características que têm

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causado problemas a estudantes de ética também são exibidas por esses tipos de sentenças - tanto assim que uma compreen­ são adequada destes contribui muito para a elucidação dos pro­ blemas da própria ética. Tomarei separadamente as duas pala­ vras morais mais típicas, “dever” (verbo) e “bom”, e discutirei primeiramente seus usos não-morais, e depois seus usos morais; em cada caso espero mostrar que esses usos têm muitas características em comum. Como conclusão relacionarei a lógi­ ca de “dever” e “bom”, em contextos morais e não-morais, à lógica dos imperativos* elaborando um modelo lógieo/.emíque conceitos artificiais, que poderiam até certo ponto servir eomo palavras de valor da linguagem comum, sao definidos nos ter­ mos de um modo imperativo Codificado. Esse modelo não deve ser tomado muito seriamente; pretende-se com ele somen­ te uma esquematização bastante aproximada da discussão pre­ cedente, a qual contém a substância daquilo que tenho a dizer.

Assim, a classificação da linguagem prescritiva que propo­ nho pode ser representada da seguinte forma:

Linguagem Prescritiva

Imperativos Juízos de Valor.

Singulares Universais N8o~Morais Morais

Esta é apenas uma classificação grosseira; ficará mais pre­ cisa no decorrer do livro; por exemplo, será visto que os chama­ dos “imperativos universais” da linguagem comum não são universais propriamente ditos. Tampouco quero sugerir que a classificação é exaustiva; há, por exemplo, muitos tipos dife­ rentes de imperativos singulares e de juízos de valor não- morais; e há outros tipos de imperativos além dos singulares e universais. Porém, a classificação é boa o bastante para come­ çar e explica o plano deste livro.

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6 A LINGUAGEM DA MORAL

1.2. Os autores de livros de gramática elementar por vezes classificam as sentenças segundo o que exprimem: afirmações, comandos ou perguntas. Essa classificação não é exaustiva ou rigorosa o bastante para o lógico. Por exemplo, os lógicos devo­ taram muito trabalho à demonstração 4e que sentenças no modo indicativo podem ter caracteres lógicos diversos, e que a classificação de todas sob o nome único de “afirmações” pode levar a erro grave se nos fizer ignorar as importantes diferenças entre elas. Veremos na parte final deste livro como um tipo de sentença indicativa, a que expressa juízo s de valor, tem um comportamento lógico inteiramente diverso da sentença indica­ tiva comum.

Os imperativos, da m esm a forma, são um agrupamento heterogêneo. Mesmo que excluamos sentenças como “ Would I

were in Grantchester!” [“Quem dera eu estivesse em Grantches-

ter!”], que são discutidas por alguns gramáticos em seus livros na m esm a seção dedicada aos imperativos, temos ainda, em m eio a sentenças que estão no modo imperativo propriamente dito, muitos tipos diferentes de enunciado. Temos ordens milita­ res (de desfiles e outras), especificações arquitetônicas, instru­ ções para preparar omeletes ou operar aspiradores de pó, conse­ lhos, pedidos, súplicas, e outros incontáveis tipos de sentenças, com muitas funções que se sobrepõem umas às outras. A distin­ ção entre esses vários tipos de sentenças proporcionaria material a um bom lógico para muitos artigos nos periódicos de filoso­ fia; mas num trabalho desta natureza é necessário ser ousado. Seguirei, portanto, os gramáticos e empregarei o termo único “comando” para cobrir todas essas coisas que as sentenças no modo imperativo expressam e, dentro da classe dos comandos, farei somente algumas distinções bastante amplas. A justificati­ va para esse procedim ento é que espero interessar o leitor em características que são comuns a todos, ou praticamente todos, esses tipos de sentença; com suas diferenças ele sem dúvida está familiarizado o bastante. Pela mesma razão empregarei a pala­ vra “afirmação” para abrigar tudo o que é expresso por

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senten-•v Mttlu ativ-aS típicas, se é que tais existem. Estarei delineando ,.(n . . miraste, por assim dizer, entre sentenças como “Feche a

f> '/i.i v sentenças como “Você vai fechar a porta”.

I- difícil negar que há uma diferença entre afirmações e i »»mandos; mas é muito mais difícil dizer precisamente qual é a

ihiavnça. Não é meramente de forma gramatical, pois se tivés­

semos de estudar uma língua recentemente descoberta seria­ mos capazes de identificar as formas gramaticais usadas para exprimir afirmações e comandos, respectivamente, e denomi­ naríamos essas formas “indicativo” e “imperativo” (se a língua Iosse construída de tal forma que essa distinção fosse útil)..A distinção encontra-se entre os significados que as diferentes ¡orinas gramaticais expressam. Ambas são empregadas para falar sobre um assunto, mas são empregadas para falar dele de maneiras diferentes. A s duas sentenças, “Você vai fechar a porta” e “Feche a porta”, falam-sobre<você fechar a porta no fu­ turo imediato, mas o que elas dizem sobre isso é bem diferente. Uma sentença indicativa é utilizada para contar a alguém que algo acontece; um imperativo não - é usado para dizer a alguém que faça algo acontecer.

1.3. Vale bem a pena para o filósofo da moral gastar tempo e esforço examinando algumas das teorias que têm sido, ou que podem ser, sustentadas quanto à maneira como os imperativos têm significado. Elas oferecem um paralelo muito interessante a teorias similares sobre os juízos morais, e esse paralelo indica que pode haver alguma similaridade lógica importante entre as duas. Consideremos primeiramente duas teorias, similares ao tipo de teoria ética ao qual darei posteriormente o nome “natu­ ralista” (5.3). Ambas são tentativas de “reduzir” imperativos a indicativos..A primeira faz isso representando-os como expri­ mindo afirmações sobre a mente do falante. Assim como se sustentou que “A está correto” significa “Aprovo A ”, também seria possível sustentar que “Feche a porta” significa “Quero que você feche a porta”. Não há, no plano coloquial, nenhum problema em dizer isso; mas filosoficamente pode ser bastante

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8 A LINGUAGEM DA MORAL

enganoso. Tem como conseqüência que, se digo “Feche a por­ ta” e você diz (para a m esm a pessoa) “Não feche a porta”, não estam os nos contradizendo, e isso é esquisito. O defensor da teoria pode replicar que, embora não haja contradição, há um desacordo de vontades, e que isso é suficiente para explicar o sentimento que temos de que as duas sentenças são, de alguma forma, incompatíveis (que “não” tem a mesma função que na sentença “Você não vai fechar a porta”). Mas permanece a difi­ culdade de que a sentença “Feche a porta” parece ser sobre fe­ char a porta e não sobre o estado mental do falante, da mesma form a que instruções para preparar om eletes (“Tome quatro ovos, etc.”) são instruções sobre ovos, e não análises introspec­ tivas da psique da Sra. Beeton. Dizer que “Feche a porta” signi­ fica o m esm o que “Quero que você feche a porta” é como dizer que “Você vai fechar a porta” significa o mesmo que “Creio que você vai fechar a porta” . Em ambos os casos parece estra­ nho descrever um comentário sobre fechar a porta como um co­ m entário sobre o que está acontecendo na minha mente. Mas, na realidade, nem a palavra “creio” nem a palavra “quero” ad­ m itirão tal interpretação. “ Creio que você vai fechar a porta” não é (exceto numa forma altamente figurativa) uma afirmação sobre a m inha mente; é um a afirm ação sobre você fechar a porta, um a versão mais hesitante de “Você vai fechar a porta”; e, sim ilarm ente, “ Quero que você feche a porta” não é uma afirm ação sobre m inha mente m as um a m aneira educada de dizer o imperativo “Feche a porta”. A m enos que compreenda­ mos a lógica de “Você vai fechar a porta”, não podemos com­ preender a lógica de “Creio que você vai fechar a porta”; e, de maneira similar, a não ser que compreendamos “Feche a porta” , é im provável que compreendamos “Quero que você feche a porta” . A teoria, portanto, não explica nada, e a teoria ética paralela está no mesmo caso pois “Aprovo A ” é meramente uma form a m ais complicada e perifrástica de dizer “A está cor­ reto”. N ão é um a afirmação, verificável por observação, de que tenho um sentimento reconhecível ou um estado mental

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recor-i ente; é um juízo de valor; se pergunto “Aprovo A ?”, mrecor-inha res-

1'nsTa é uma decisão moral, não um a observação de fato intros- (icciível. “Aprovo A ” seria ininteligível para alguém que não entendesse “A está correto”, e a explicação é um caso de obscu-

i i m p er obscurius.

1.4. A segunda tentativa de reduzir imperativos a indicati­

vos que quero considerar é a do Dr. H. G. Bohnert1. Esta inte­ ressante sugestão pode ser resumida (espero que sem injustiça) pela afirmação de que “Feche a porta” significa o mesm o que Você vai fechar a porta, ou X acontecerá”, onde se entende ser X algo ruim para a pessoa a que se dirige. Uma teoria sim ilar seria a de que significaria o mesmo que “Se você não fechar a porta, X acontecerá” . Essa teoria é análoga a teorias éticas do tipo que igualam “A está correto” a “A conduz a Y”, onde Y é algo considerado bom pela generalidade, como, por exemplo, o prazer ou a prevenção da dor. Veremos mais tarde que as expressões de valor por vezes adquirem - em razão da constân­ cia dos padrões pelos quais são aplicadas - uma certa força des­ critiva; assim, se, numa sociedade cujos padrões são m arcada­ mente utilitários, dizemos “O Serviço de Saúde fez m uita coisa boa”, todos sabem que estam os sugerindo que o Serviço de Saúde evitou muito sofrimento, angústia, etc. Similarmente, no caso de imperativos que são em alto grau “hipotéticos” (3.2) porque percebemos rapidamente à conquista de que fim ou à prevenção de que resultado desfavorável são dirigidos, a análi­ se de Bohnert é plausível. Para tomar seu próprio exemplo, “Cor­ ra”, dito numa casa em chamas, é algo sim ilar em intenção a “Você corre ou morre queimado”. Porém em casos onde o fim almejado não é reconhecido tão faci lmente (o imperativo sendo “hipotético” somente em pequeno grau, ou nem isso), o ouvinte pode ter dificuldades para compreender, nessa análise, o que deve colocar depois da palavra “ou”. É muito difícil perceber de que forma uma sentença como “Por favor diga a seu pai que liguei” seria analisada na teoria de Bohnert. Está claro, sempre é possível concluir a análise com “ou algo ruim acontecerá” ;

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10 A LINGUAGEM DA MORAL

mas esse expediente é bem-sucedido somente através da rein- trodução na análise de um a palavra prescritiva, pois “ruim ” é um a palavra de valor, e portanto prescritiva. E, similarmente, teorias teleológicas da ética que interpretam “correto” como “conducente a Z ”, onde “Z” é um a palavra de valor, tal como “satisfação” ou “felicidade”, apenas armazenam para si a difi­ culdade de analisar tais palavras.

A tentação de reduzir im perativos a indicativos é muito forte, e tem a mesma origem que a tentação de analisar palavras de valor da maneira denominada “naturalista”. É o sentimento de que a sentença indicativa propriamente dita, da qual se pensa que existe apenas um tipo, está, de algum modo, acima de sus­ peita de um a forma que outras espécies de sentenças não estão e que, portanto, para colocar acim a de suspeita essas outras espécies de sentenças, é necessário m ostrar que são realmente indicativas. Esse sentimento foi intensificado quando a chama­ da teoria “verificacionista” do significado tornou-se popular. Essa teoria, que, de muitas maneiras, é bastante fecunda em sua esfera própria, sustenta, grosseiramente falando, que uma sen­ tença não tem significado a menos que haja algo que venha a ser se for verdadeira. Ora, essa é uma explicação muito promis­ sora de um a das formas em que um a determinada classe de sen­ tenças (as indicativas típicas) tem significado. Obviamente, caso se alegue que uma sentença expressa um a afirm ação de fato e, não obstante, não tem os nenhuma idéia do que acontece­ ria se fosse verdadeira, então essa sentença (para nós) não tem significado. Porém se esse critério de significação, que é útil no caso de afirmações de fato, for aplicado indiscriminadamente a tipos de elocução que não pretendem expressar afirmações de fato, surgirão problemas. As sentenças imperativas não satisfa­ zem esse critério, e pode ser que sentenças que expressam ju í­ zos morais tam bém não; mas isso m ostra apenas que elas não expressam afirmações no sentido definido pelo critério, e esse sentido pode ser mais restrito do que o do uso normal. Isso não significa que não têm significado ou mesmo que seu

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significa->!>> c de um caráter tal que não se pode fornecer nenhuma regra lógica para seu emprego2.

I3 .T T s e n tim é n to d e que somente “indicativos propria­ mente ditos” estão acima de suspeita pode sobreviver (surpre­ endentemente) à descoberta de que há sentenças com significa­ dos perfeitamente satisfatórios no nosso discurso com um que não são redutíveis a indicativos. Sobrevive na assunção de que qualquer significado descoberto para essas sentenças deve ser necessariamente de condição logicamente inferior à dos indica­ tivos. Essa assunção levou filósofos com o o Professor A. J. Aver, no decorrer da exposição de suas pesquisas mais valiosas quanto à natureza lógica dos juízos morais, a fazer comentários incidentais que originaram desnecessárias torrentes de protes­ to3. A substância da teoria de Ayer é que os juízos m orais não funcionam comumente da mesma m aneira que a classe de sen­ tenças indicativas destacadas por seu critério de verificação. Mas, pela forma de apresentar sua opinião e por sua assim i­ lação dos juízos morais a outros tipos (bem distintos) de sen­ tença que são também diferenciados de indicativos típicos pelo seu critério, ele levantou poeira que ainda não abaixou. Tudo isso poderia encontrar um paralelo próximo em um tratamento similar dos imperativos - e parece que autores da mesma linha geral de pensamento de Ayer teriam dito sobre os imperativos a m esm a espécie de coisa que disseram sobre os juízos morais. Suponha-se que reconhecemos o fato óbvio de que os imperati­ vos não são como os indicativos típicos. Suponha-se, ainda, que consideramos acim a de suspeita somente os indicativos típicos. Será natural, então, dizer “O s imperativos não afirm am nada, apenas expressam desejos”. Então, dizer que os imperatiT vos expressam desejos é, como a prim eira teoria que considera­ mos, incontestável no plano coloquial; na verdade, se alguém dissesse “Deixe meu nome fora disso”, diríamos que expressou um desejo de ter seu nome mantido fora disso. Mas, não obs­ tante, a extrema ambigüidade da palavra “expressar” pode ge­ rar confusão filosófica. Falamos de expressar afirmações, opi­

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12 A LINGUAGEM DA MORAL

niões, crenças, relações matemáticas, e assim por diante, e, se é em um desses sentidos que a palavra é empregada, a teoria, em­ bora nos diga pouco, é inofensiva. Mas, infelizmente, é empre­ gada também de formas que são diferentes dessas, e o emprego de Ayer (quando fala de juízos morais) da palavra “evidenciar” como seu sinônimo aproximado foi perigoso. Dizem que artis­ tas, compositores e poetas expressam seus próprios sentimen­ tos e os nossos; dizem que imprecações expressam raiva e que dançar em cima da m esa pode expressar alegria. Assim , dizer que os imperativos expressam desejos pode levar os incautos a supor que o que ocorre quando empregamos um deles é isto: temos fervilhando dentro de nós uma espécie de ânsia, à qual, quando a pressão íorna-se forte demais para a suportarm os, damos vazão dizendo uma sentença imperativa. Tal interpreta­ ção, quando aplicada a sentenças como “Fornecer e ajustar à m ortagem da porta tranqueta dormida e m açaneta plástica” , é im plausível. E parece que os juízos de valor tam bém podem deixar de satisfazer o critério de verificação e ser, em certo sen­ tido, como os imperativos, prescritivos sem que se diga tal coisa a seu respeito. É perfeitamente inatacável, no plano colo­ quial, dizer que a sentença “A é bom” é usada para expressar aprovação de A ( The Shorter Oxford English D ictionary diz: “Aprovar: ... declarar bom ”), mas é filosoficam ente enganoso se pensam os que a aprovação expressa é um sentimento tem o e esquisito»'dentro de nós. Se o ministro do interior expressa apro­ vação do plano de m inha cidade m andando seus subalternos escrever-me dizendo “O ministro aprova seu plano” ou “O ministro considera seu plano o melhor”, não vou, em nenhuma circunstância, confirmar a carta mandando um detetive particu­ lar espreitar o ministro atrás de sinais de emoção. Nesse caso, enviar tal carta é aprovar.

1.6. Não poderia haver nenhuma analogia, no caso dos im­ perativos singulares, da variedade “postura” da teoria da apro­ vação de juízos de valor4, mas é possível construir tal teoria para as sentenças imperativas universais. Se alguém dissesse

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"Nunca bata num homem quando ele estiver caído”, seria natu­

ra! dizer que expressou um a determinada postura para com ta! conduta. É extremamente difícil definir exatamente essa postu­

ra ou fornecer critérios para seu reconhecimento, assim como é difícil dizer exatamente o que é a aprovação moral em oposição

a outros tipos de aprovação. A única maneira segura de caracte­ rizar a postura expressa por um imperativo universal é dizer “A postura de que não se deve (ou se deve) fazer isso e aquilo”, e a única maneira segura de caracterizar a postura expressa por um juízo moral é dizer “A postura de que é errado (ou certo) fazer isso e aquilo”. M anter um a postura de “aprovação m oral” para com determinada prática é ter um a disposição para pensar, nas ocasiões apropriadas, que ela é certa; ou, se mesmo “pensar” é uma palavra disposicional, é simplesmente pensar que é certa; e nosso pensar que é certa pode ser traído ou exibido - os beha- vioristas diriam constituído - quando atuamos de determinadas formas (acima de tudo, realizando atos do tipo em questão quando surge o momento; depois, dizendo que estão certos, aplaudindo-os de outras maneiras, e assim por diante). Mas não há nada em tudo isso que explique precisamente o que se pensa quando se pensa que um a determinada espécie de ato é certa. E, similarmente, se disséssem os que “Nunca bata num hom em quando ele estiver caído” expressa um a postura de que não se deve bater, etc. (ou um a atitude de aversão ao ato de bater, ou um a “contrapostura” ao ato de bater), não teríam os dito nada inteligível para alguém que não entendeu a sentença que está- vamos tentando explicar.

Quero enfatizar que não estou buscando refutar nenhum a dessas teorias. Todas elas têm a característica de, quando colo­ cadas em termos do cotidiano, não dizer nada contestável no que diz respeito a suas asserções principais; mas, quando bus­ camos entender como elas explicam as perplexidades filosófi­ cas que as geraram, somos forçados a interpretá-las de maneira a torná-las implausíveis ou então descobrir que elas meramente expõem os mesmos problemas de form a mais complicada. Sen­

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tenças que contêm a palavra “aprovar” são de análise tão difícil que não parece razoável usar essa noção para explicar o signifi­ cado de juízos morais que aprendemos a fazer anos antes de aprender a palavra “aprovar”; e, de modo similar, não seria razoável explicar o significado do modo imperativo em termos de desejo ou qualquer outro sentimento ou postura; pois apren­ demos a reagir e a usar comandos bem antes de aprendermos as noções comparativamente complexas de “vontade”, “desejo”, “aversão”, etc.

1.7, Devemos agora considerar outro grupo de teorias, muitas vezes sustentado simultaneamente com o grupo recém- considerado. Essas sustentam que, na linguagem, a função dos juízos m orais ou dos imperativos (que as teorias muitas vezes equiparam) é afetar causalmente o comportamento ou as emo­ ções do ouvinte. O Professor R. Carnap escreve:

M as, na verdade, um a afirm ação de valor nada mais é do que um comando num a form a gram atical enganosa. Pode ter efeitos sobre as ações dos homens, e esses efeitos podem estar em concordância com nossos desejos ou não; m as não é verda­ deira nem falsa5.

e o Professor Ayer escreve:

Os termos éticos não servem apenas para expressar o senti­ m ento. São calculados tam bém para despertar o sentimento e, assim , para estim ular a ação. Na verdade, alguns deles são em­ pregados de forma a dar às sentenças em que ocorrem o efeito de com andos6.

Mais recentemente esse tipo de ponto de vista foi elabora­ do pelo Professor Stevenson7. Aqui, novamente, temos um tipo de teoria que pode ser inofensiva no plano coloquial, mas que sugere erros filosóficos por parecer assim ilar os processos de utilização de um comando ou juízo m oral a outros processos que, na verdade, são marcadamente dissimilares.

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É realmente verdadeiro no que diz respeito a sentenças im­ perativas que se alguém, ao empregá-las, está sendo sincero ou honesto, pretende que a pessoa a que se dirige deva fa z e r algo (a saber, aquilo que está ordenando). Isso é realmente um teste de sinceridade no caso de comandos, assim como se crê que uma afirmação é sincera apenas se o falante acredita nela. E há critérios similares, como veremos mais tarde, para assentir sin­ ceramente a comandos e afirm ações dados ou feitos por ou­ trem. Mas não é exatamente isso o que as teorias sugerem. Elas sugerem, antes, que a função de um comando é afetar o ouvinte causalmente ou conseguir que faça algo; e dizer isso pode ser enganoso. No linguajar comum não há nenhum mal em dizer que, ao usar um comando, nossa intenção é conseguir que alguém faça alguma coisa, mas, para propósitos filosóficos, deve-se fazer uma distinção importante. Os processos de dizer a alguém que faça alguma coisa e conseguir que ele a faça são, logicamente, bem distintos um do outro8. A distinção pode ser elucidada considerando-se um a distinção paralela no caso das afirmações. Dizer a alguém que alguma coisa é logicamente é distinto de conseguir (ou tentar conseguir) que ele acredite nela. Tendo dito a alguém que algo é, podemos, se ele não está disposto a acreditar no que dizemos, iniciar o processo bem diferente de tentar fazê-lo acreditar (tentar persuadi-lo ou con­ vencê-lo de que o que dissemos é verdadeiro). Ao buscar expli­ car a função das sentenças indicativas, ninguém diria que elas são tentativas de persuadir alguém de que algo é. E não há mais motivos para dizer que os comandos são tentativas de persuadir alguém ou conseguir que alguém faça algo; aqui, também, pri­ meiramente dizemos a alguém o que deve fazer e, então, se ele não está disposto a fazer o que dizemos, podemos iniciar o pro­ cesso completamente diferente de tentar conseguir que o faça. Assim, a instrução já mencionada “Fornecer e ajustar à morta- gem da porta tranqueta dormida e m açaneta plástica” não pre­ tende estimular carpinteiros a entrar em atividade; para tal pro­ pósito empregam-se outros meios.

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16 A LINGUAGEM DA MORAL

Essa distinção é importante para a filosofia moral pois, na verdade, a sugestão de que a função dos juízos morais era per­ suadir levava a uma dificuldade em distinguir sua função da função da propaganda9. Como vou chamar a atenção para algu­ mas similaridades entre comandos e juízos morais e classificar am bos como prescrições, exijo enfaticamente dissociar-me da confusão de qualquer um a dessas duas coisas com a propagan­ da. Temos aqui, como m uitas vezes em filosofia, uma mistura de duas distinções. A primeira é entre a linguagem das afirm a­ ções e a da linguagem prescritiva. A segunda é entre dizer algo a alguém e conseguir que creia ou que faça o que lhe disseram. Q ue essas duas distinções são bem diferentes e sobrepõem-se um a à outra deve ficar claro após uma breve consideração. Pois podem os dizer a alguém que algo é ou que faça algo; não há tentativa de persuasão (ou de influenciar, induzir ou conseguir). Se a pessoa não está disposta a assentir ao que lhe dizemos, po­ dem os então recorrer à retórica, à propaganda, a fatos adicio­ nais, ardis psicológicos, ameaças, suborno, tortura, zombaria, prom essas de proteção e uma variedade de outros expedientes. Todas essas são maneiras de induzi-lo a fazer ou a conseguir que faça algo; as quatro prim eiras são tam bém m aneiras de fazê-lo acreditar em algo; nenhum a delas é um a maneira de di­ zer-lhe algo, embora as que envolvem o emprego da linguagem possam incluir dizer-lhe toda sorte de coisas. Consideradas como induzimentos ou expedientes de persuasão, seu sucesso é julgado unicam ente por seus efeitos - se a pessoa crê no que tentamos fazê-la crer ou faz o que tentamos conseguir que faça. N ão importa se os meios usados para persuadi-la são válidos ou inválidos, contanto que a persuadam. E, portanto, a reação natural quando nos damos conta de que alguém está tentando nos persuadir é “Ele está tentando me influenciar; preciso ficar alerta; não posso perm itir que ele influa na m inha decisão de form a desleal; devo ter cuidado para tom ar m inha decisão sobre o assunto e permanecer um agente responsável livre”. Tal reação a juízos morais não deve ser encorajada por filósofos.

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Por outro lado, essas não são reações naturais ao fato de alguém nos dizer que algo é ou ao fato de nos ordenar que façamos algo (por exemplo, encaixar um a tranqueta na porta). D izer a al­ guém que faça algo, ou dizer que algo é, é responder à pergunta “O que farei?” ou “Quais são os fatos?”. Quando respondemos essas perguntas o ouvinte sabe o que fazer ou quais são os fatos - se o que lhe dissemos estiver certo. Com isso, ele não é neces­ sariamente influenciado de um a forma ou de outra nem fracas­ samos se deixa de sê-lo pois ele pode decidir descrer ou deso- bedecer-nos, e o mero fato de dizer a ele não faz nada - e não procura fazer nada ~ para impedir que faça isso. Mas a persua­ são não é dirigida a uma pessoa como agente racional que está perguntando a si (ou a nós) “O que farei?”; não é um a resposta a esta ou a qualquer outra pergunta; é uma tentativa de fa z e r com que a responda de m aneira particular.

É fácil perceber, portanto, por que a chamada “teoria impe­ rativa” dos juízos morais suscitou protestos. Por basear-se nu­ m a concepção errônea da função, não apenas dos juízos m o­ rais, mas também dos comandos aos quais estavam sendo assi­ milados, ela parecia impugnar a racionalidade do discurso mo­ ral. M as se percerbemos que os comandos, por m ais que pos­ sam diferir das afirmações, são semelhantes a eles no seguinte, no fato de que consistem em dizer algo a alguém, não em bus­ car influenciá-lo, não há problema em chamar a atenção para as similaridades entre os comandos e os juízos morais. Pois, como demonstrarei, os comandos, porque se destinam, assim como as afirmações, essencialmente a responder questões colocadas por agentes racionais, são regidos por regras lógicas, como as afir­ mações. E isso significa que os juízos morais também podem ser regidos dessa forma. Lembramos que o m aior de todos os racionalistas, Kant, referia-se aos juízos morais como imperati­ vos, embora também devamos lembrar que estava empregando esse term o num sentido ampliado e que os juízos m orais, em ­ bora sejam semelhantes aos imperativos em alguns aspectos, são diferentes em outros (11.5).

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Imperativos e lógica

2.1. Para caracterizar claramente a diferença entre impera­ tivos e indicativos será útil analisar os dois tipos de sentença, de forma a tornar evidente que elementos de significado eles têm cm comum e, assim, isolar a diferença essencial. Como já ten­ tei fazer isso num artigo a que me referi acima (1.4), serei o mais breve possível.

Notamos que as duas sentenças “Você vai fechar a porta” e “Feche a porta” são ambas sobre a mesma coisa, a saber, você lechar a porta no futuro imediato, mas que são utilizadas para dizer coisas diferentes sobre isso. É puramente um acidente gramatical que as partes da sentença falada ou escrita, que, em cada um dos casos, referem-se a essa coisa sobre a qual falam, não sejam idênticas. Remodelemos as sentenças mais clara­ mente, escrevendo nos dois casos uma expressão idêntica para nos referirmos a essa coisa sobre a qual falam. A expressão pode ser:

Você fechar a porta no futuro imediato.

Teremos então de adicionar algo, diferente em cada caso, que forneça o restante do que cada sentença comunica. O que temos até aqui diz-nos bastante claramente do que tratam as sentenças. Não nos diz, porém, o que o falante está dizendo

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sobre isso. Não sabemos se ele está afirmando que você fechar a porta no futuro imediato é o que vai acontecer ou será, ou se ele está nos dizendo que façamos isso acontecer ou alguma outra coisa. Para completar as sentenças, portanto, algo tem de ser acrescentado para que nos digam isso. Poderíamos comple­ tar as sentenças como um comando ou como uma afirmação, respectivamente, escrevendo:

Você fechar a porta no íuturo imediato, por favor. Você fechar a porta no futuro imediato, sim.

Essas duas sentenças corresponderiam às sentenças normais:

Feche a porta.

Você vai fechar a porta.

Necessitaremos de termos técnicos para nos referirmos a essas diferentes partes das sentenças. Os termos adotados em meu artigo não são totalmente satisfatórios e, portanto, cunharei palavras inteiramente novas. Denominarei frástica a gacEé^ia sentença que é comum a ambos os modos (“Você fechar a porta no futuro imediato”); e nêustica a parte que é diferente no caso de comandos e afirmações (“sim” ou “por favor”). Leitores do

Greek Lexicón de Liddell e Scott reconhecerão a adequação des­

ses termos. “Frástica” deriva de uma palavra grega que significa “apontar ou indicar” e “nêustica” de uma palavra que quer dizer “consentir inclinando a cabeça”. Ambas as palavras são empre­ gadas indiferentemente para o discurso imperativo e o indicativo A elocução de uma sentença que contém frástica e nêustica pode ser dramatizada da seguinte maneira: (1) O falante aponta ou índica o que vai afirmar que é ou ordenar que se faça ser; (2) Ele assente com a cabeça, como para dizer ou “Faça-o”. Ele, porém, terá de assentir movendo a cabeça de formas diferentes, conforme queira dizer uma ou outra dessas coisas.

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2.2. Agora, claramente, sé estamos procurando pela dife- u-nga essencial entre afirmações e comandos, temos de procu­ rar na nêustíca, não na frástica. Porém* como o emprego da palavra “nêustíca” indica, há ainda algo em comum entre nêus- licas indicativas e imperativas. É a idéia comum, por assim tlizcr, de assentir a uma sentença “inclinando a cabeça”. É algo que é feito por alguém que usa a sentença com sinceridade e não que meramente a menciona ou cita entre aspas, algo essen- c ial ao ato de dizer (e querer dizer) algo. A ausência de aspas na luiguagem escrita simboliza o elemento de significado de que estou falando; escrever uma sentença sem aspas é como assinar um cheque; escrevê-la entre aspas é como preencher um che­ que sem assiná-lo, e. g., para mostrar a alguém como preencher cheques. Poderíamos ter uma convenção segundo a qual, em vez de colocar entre aspas sentenças que estivéssemos mencio­ nando e não usando, inclinaríamos a cabeça ou faríamos algum sinal especial na escrita quando estivéssemos usando a sentença a sério. O “símbolo de asserção” no sistema lógico de Frege e no de Russell e Whitehead tem, entre outras funções, esta, de significar o uso ou afirmação de uma sentença1. Ele poderia, nessa função, ser aplicado a comandos bem como a afirma­ ções. Podemos talvez forçar levemente a linguagem e empregar a palavra “afirmar” para ambos.

Estreitamente aparentado com tal sinal de afirmação esta­ ria um sinal de concordância ou assentimento para uso de um ouvinte. Empregar tal sinal de assentimento seria equivalente a repetir a sentença com os pronomes, etc., alterados onde neces­ sário. Assim, se eu dissesse “Você vai fechar a porta” e você respondesse “Sim”, este seria um sinal de assentimento e seria equivalente a “Vou fechar a porta”. E se eu dissesse “Feche a porta” e você respondesse “Sim, sim, senhor”, isto seria, da mesma forma, um sinal de assentimento; se desejássemos ex­ pressar a que isso eqüivale, poderíamos dizer “Deixe-me fechar a porta” ou “Fecharei a porta” (onde “ei” não é uma predição, mas a expressão de uma resolução ou uma promessa). Ora, isso

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deve nos dar urna pista para a diferença essencial entre afirm a­ ções e comandos; ela está no que implica assentir a eles; e o que implica assentir a eles está, como já disse, estreitamente ligado ao que implica afirm á-lo2.

Se assentimos a um a afirmação, somos considerados since­ ros em nosso assentimento se - e apenas se - acreditamos que ela é verdadeira (acreditamos no que disse o falante). Se, por outro lado, assentimos a um comando de segunda pessoa dirigi­ do a nós, somos considerados sinceros em nosso assentimento se - e apenas se - fazemos ou decidimos fazer o que o falante ordenou que fizéssemos; se não o fazemos, mas apenas decidi­ m os fazê-lo mais tarde, e, então, quando chega a ocasião de fazê-lo, não o fazemos, considera-se que mudamos de idéia; não estamos mais sendo fiéis ao assentimento que expressamos pre­ viamente. E uma tautología dizer que não podemos assentir sin­ ceramente a um comando de segunda pessoa dirigido a nós e ao

mesmo tempo não realizá-lo, se agora é a ocasião de realizá-lo e

está ao nosso alcance (físico e psicológico) fazê-lo. Similar­ mente, é uma tautología dizer que não podemos assentir sincera­ mente a um a afirmação e ao mesmo tempo não crer nela. Assim, podem os caracterizar provisoriam ente a diferença entre afir­ mações e comandos dizendo que, embora o assentimento since- rofao primeiro envolva acreditar em algo, o assentimento sincero ao segundo implica (na ocasião adequada e se estiver ao nosso alcance) fa ze r algos Mas essa formulação é excessivamente sim­ plificada e exigirá qualificação mais tarde (11.2).

No caso de comandos de terceira pessoa, assentir é aderir à afirm ação. No caso de comandos de prim eira pessoa (“Deixe- me fazer assim e assim ”) e decisões (“Farei assim e assim”), que são estreitamente similares, afirmação e assentimento são idênticos. É logicamente impossível para um homem dissentir do que ele mesmo está afirm ando (embora, claro, ele possa não ser sincero ao afirmá-lo).

2.3. Deve-se explicar que, já que estou empregando a pala­ vra “afirm ar”, ela não é o oposto de “negar” . É possível afirmar

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uma sentença afirmativa ou uma negativa, O sinal de negação "não” é normalmente parte da frástica tanto de indicativos quanto de imperativos; portanto, em vez de “Você não vai lechar a porta” deveríamos escrever “Você não fechar a porta no futuro imediato, sim”, e, em vez de “Não feche a porta”, de­ veríamos escrever “Você não fechar a porta no futuro imediato, por favor”. Sentenças modais contendo a palavra “poder” pode­ riam, parece, ser representadas pela negação da nêustica; assim, “Você pode fechar a porta” (permissiva) poderia ser escrita “Não digo a você que não feche a porta” e esta, por sua vez, poderia ser transformada em “Você não fechar a porta no futuro imediato, não-por favor”; e, similarmente, a sentença “Pode ser que você vá fechar a porta” poderia ser traduzida como “Não digo que você não vai fechar a porta” ou “Você não fechar a porta no futuro imediato, não-sim”. Porém essas são complicações em que não precisamos nos aprofundar.

Indiquei no artigo já mencionado que, em seus usos comuns, os conectivos lógicos comuns “se”, “e” e “ou”, como o sinal de negação, são tratados da melhor forma como parte das frásticas das sentenças. I-sso significa que eles são comuns aos indicativos e imperativos. O mesmo é verdadeiro, com certa qualificação a ser mencionada mais adiante (11.5), dos quantificadores “todo(s)” e “algum(ns)”. Agora não tenho tanta certeza de que na linguagem comum essas palavras compor­ tam-se logicamente da mesma maneira nos imperativos e nos indicativos, mas, seja como for, as diferenças são puramente um acidente gramatical. Utilizando os conectivos lógicos comuns, tal como são usados no modo indicativo, nas frásticas de nossas sentenças imperativas remodeladas, poderíamos fazer com o modo imperativo revisado tudo o que agora faze­ mos com o natural. Isso é claro em vista do fato de que, por meio de um circunloquio, sempre podemos, em vez de um comando simples (e.g., “Feche a porta ou ponha o calço na porta”, dito a Jones), colocar em seu lugar o comando para tor­ nar verdadeira uma sentença indicativa ( e.g., “Torne verdadei­ ra a sentença ‘Jones vai fechar a porta ou colocar o calço na

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porta’ Isso, porém, nao deve ser interpretado como uma ad­ missão da “primazia” lógica do modo indicativo (seja lá o que isso possa significar); pois poderíamos fazer o mesmo no senti­ do contrario - e.g., dizendo, em vez de “Jones fechou a porta às 5 da tarde” , “O comando [real ou imaginário] ‘Que Jones feche a porta às 5 da tarde’ foi obedecido” . A única restrição a esse procedimento deve-se ao fato, mencionado m ais tarde (12.4), de que o modo imperativo é muito menos rico do que o indica­ tivo, especialmente no que se refere a tempos.

Os modos imperativo e indicativo também têm em comum, por conta de seu elemento frástico comum, tudo o que se refere a estados de coisas efetivos ou possíveis. H á um estado de coi­ sas possível a que se refere a frástica “Você fechar a porta no futuro im ediato” . Essa referência não é afetada pelo que vem depois. Tanto imperativos como indicativos têm de se referir ao estado de coisas a que dizem respeito. Isso significa que os imperativos, como os indicativos, podem sofrer da enfermidade para a qual chama a atenção a denominada teoria da verificação do significado; pois essa enfermidade, sendo uma enfermidade da frástica, nada tem que ver com as afirmações como tais; os que pensavam assim enganaram-se. Uma das maneiras em que um a sentença pode deixar de significar é não se referir a nenhum estado de coisas identificável. Assim, as sentenças “O Absoluto é verde” e “Que o Absoluto seja tom ado verde” não têm significado pela mesma razão, isto é, não sabermos a que se refere “O Absoluto ser verde”. As sentenças, por essa razão, também podem deixar de ser compreendidas por um a pessoa, embora sejam perfeitamente significantes para outra; assim, o comando “Ponha de ló” não tem significado para os que não sabem no que consiste pôr de ló. Seria lamentável considerar que o critério de verificação impugna a significância de todas as sentenças m enos das indicativas - como se “Feche a porta” fosse tão sem sentido quanto “Frumpe o bumpe” .

Há uma outra enfermidade à qual os imperativos, como os indicativos, estão sujeitos em virtude da presença de conectivos

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lógicos nas frásticas de ambos. Isso se chama, no caso dos indi­ cativos, autocontradição, e o termo é igualmente aplicável aos ¡mperativos. Os comandos, bem como as afirm ações, podem contradizer-se. Mesmo que essa não fosse uma maneira normal de falar, poderíamos muito bem adotá-la pois a característica para a qual chama a atenção nos comandos é idêntica à que nor­ malmente se denomina contradição. Considere-se o seguinte exemplo, tomado da autobiografia do Lorde C u n n in gh am íO almirante e o capitão de um cruzador que é sua nau capitânia, para evitar um a colisão, gritam quase simultaneamente ao ti­ moneiro “Tudo a bom bordo” e “Tudo a estibordo” . Lorde Cunningham refere-se a essas duas ordens como “contrárias”, e elas o são, no sentido aristotélico próprio® Segue-se que as duas ordens contradizem um a à outra, no sentido de que sua conjunção é autocontraditória; a relação entre elas é a mesma que entre as duas previsões “Você vai virar tudo a bombordo” e “Você vai virar tudo a estibordo ”. Algumas ordens podem, é claro, ser contraditórias sem ser contrárias; a^contraditória sim­ ples de “Feche a porta” é “Não feche a porta” .

Poderia sustentar que a lei do terceiro excluído não se apli­ ca a comandos. Isso, contudo, se implica que os comandos são peculiares nesse aspecto, é um erro. É evidente que se não digo “Feche a porta” isso não me compele logicamente a dizer “Não fe­ che a porta” . Posso dizer “Você pode fechar a po rta ou não fechar a porta” ou posso simplesmente não dizer nada. Mas, si­ milarmente, se não digo “Você vai fechar ap o rta”, isso não me compele logicamente a dizer “Você não vai fechar a porta” . Posso dizer “Pode ser que você vá fechar a porta e pode ser que você não vá fechar a porta” ou posso simplesmente não dizer nada. Mas se perguntassem “Vou ou não fechar a porta?” tenho de responder, por causa dos term os da pergunta, “Você vai fechar a porta” ou “Você não vai fechar a porta”, a menos que me recuse a responder. “Pode ser que você vá” não é uma res­ posta a essa pergunta. E, de maneira semelhante, se me pergun­ tam “Devo ou não fechar a porta?” tenho de responder, se

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res-26 A LINGUAGEM DA MORAL

ponder, “Feche” ou “N ão feche”. A verdade é que nossa língua possui maneiras de falar de forma trivalente e maneiras de falar de form a bivalente; e essas duas formas são possíveis tanto no modo indicativo quanto no imperativo.

U m a outra maneira de mostrar que os imperativos simples são norm alm ente bivalentes é salientar que o conselho (a um jogador de xadrez) “N o próximo lance, mova a rainha ou não mova a rainha” é analítico (defino este termo abaixo (3.3)). Ele não dá ao jogador quaisquer instruções positivas sobre o que deve fazer, assim como a sentença “Está ou chovendo ou não chovendo” não me diz nada sobre o tem po5. Se a lógica dos imperativos simples fosse trivalente, a sentença citada não seria analítica; excluiria positivamente uma terceira possibilidade, a de não mover a rainha nem deixar de movê-la. Disjunções im­ perativas dessa espécie não são sempre analíticas; por exemplo, seria natural considerar que “Entre ou não entre” implica “Não fique bloqueando a porta”, mas isso nada tem a ver com o imperativo como tal; é um a característica da frástica da senten­ ça, como se demonstra por meio da comparação com a sentença indicativa análoga “Você vai entrar ou não entrar” (entenda-se você não vai ficar hesitando aí na porta).

2.4. Do fato de que os comandos podem contradizer um ao outro resulta que, para evitar a autocontradição, um comando, como um a afirmação, deve observar determinadas regras lógi­ cas. Essas regras são as regras para o uso de todas as expressões contidas nele. N o caso de algumas expressões - as chamadas palavras lógicas - essas regras são aquilo que dá às expressões todo o significado que elas têm. Assim, saber o significado da palavra “todos” é saber que não se pode, sem autocontradição, dizer certas coisas, como, por exemplo, “Todos os hom ens são m ortais e Sócrates é um hom em , mas Sócrates não é m ortal” . Se o leitor refletir sobre como saberia se um a pessoa conhece o significado da palavra “todos”, perceberá que a única maneira seria descobrindo quais sentenças mais simples a pessoa pensa que sentenças com a palavra “todos” “implicam”. “Implicar” é

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¡¡li | í.i lavra forte, eos lógicos hoje não são propensos a empre- t ii palavras fortes; uma discussão completa de seu significado, ¡h\ i,ilmente em contextos matemáticos, ocuparia muitas ; mi-mas, mas, para meus propósitos presentes, ela pode ser .¡r¡ niida com exatidão satisfatória da seguinte forma: Uma sen- tctiv,a P implica uma sentença Q se e somente se o fato de uma |u sM>a asseníir a P mas dissentir de Q ser critério suficiente paia dizer que ela compreendeu mal uma ou outra das senten­ ças “Sentença”, aqui, é uma abreviação de “sentença tal como ■ -mpregada por um falante particular numa ocasião particular” ¡uns os falantes podem, em ocasiões diferentes, usar palavras mm significados diferentes, e isso significa que aquilo que é implicado pelo que dizem diferirá também. Extraímos seu sig­ nificado perguntando a eles o que consideram que seus comen- iarios implicam7.

Ora, a palavra “todos” e outras palavras lógicas são utiliza­ das em comandos, assim como em afirmações. Segue-se que deve haver também relações de implicação entre comandos, pois, do contrário, seria impossível dar algum significado a essas palavras tal como utilizadas neles. Se tivéssemos de des­ cobrir se uma pessoa sabe o significado da palavra “todas” em “Leve todas as caixas para a estação”, teríamos de descobrir se ela compreende que uma pessoa que assentiu a esse comando e também à afirmação “Esta é uma das caixas” e, não obstante, se negou a assentir ao comando “Leve esta à estação”, somente poderia fazê-lo se tivesse interpretado mal uma dessas três sen­ tenças. Se essa espécie de teste fosse inaplicável, a palavra “todos” (tanto em imperativos como em indicativos) seria intei­ ramente destituída de significado. Podemos, portanto, dizer que a existência em nossa linguagem de sentenças universais no modo imperativo é em si mesma prova suficiente de que nossa linguagem admite implicações das quais pelo menos um termo é um comando. Se a palavra “implicar” deve ser utilizada para essas relações é somente uma questão de conveniência ter­ minológica. Proponho empregá-la desse modo8.

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Dei, no artigo citado, muitos exemplos de implicações cujas conclusões são comandos. Parece possível, em princípio, já que as palavras lógicas comuns ocorrem nas frásticas dos imperati­ vos, reconstruir o cálculo sentenciai comum em termos de frás­ ticas apenas, e então aplicá-lo igualmente a indicativos e impe­ rativos, simplesmente adicionando as nêusticas apropriadas5. Ficaria por determinar até que ponto o cálculo, reconstruído dessa forma, corresponderia a nossa linguagem comum; esse é um problema familiar no caso da lógica indicativa e sua solução depende de investigar pacientemente se os sinais lógicos no cál­ culo são ligados pelas mesmas regras que determinam os signi­ ficados das palavras lógicas que usamos em nossa fala normal. Poderíamos descobrir que a fala comum tem muitas regras dife­ rentes para o emprego das palavras “se”, “ou”, etc., em contex­ tos diferentes, e, em particular, seu uso em contextos indicativos poderia diferir de seu uso em contextos imperativos. Tudo isso é uma questão de investigação, mas não afeta de forma alguma o princípio de que, desde que descubramos quais são as regras ou estabeleçamos quais devam ser, podemos estudar a lógica das sentenças imperativas com tanta segurança quanto a das indica­ tivas. Não pode haver, aqui como em outro lugar, nenhum a questão de “lógicas rivais”, mas somente de regras alternativas determinando o emprego (¿.e., as relações de implicação) de nossos sinais lógicos; é um a tautologia dizer que, contanto que continuemos a usar nossas palavras no m esm o sentido, suas relações de implicação permanecerão as m esm as10.

2.5. Aqui não precisamos entrar nessas complicações. N e­ cessitaremos, nesta investigação, de considerar somente a infe­ rência a partir de sentenças imperativas universais, juntamente com premissas menores indicativas, para conclusões imperativas singulares. Já dei um exemplo de uma tal inferência e sustentei que, se fosse impossível fazer inferências desse tipo, a palavra “todos” não teria significado em comandos. Mas esse tipo de inferência faz surgir uma dificuldade adicional, porque uma das premissas está no indicativo e uma no imperativo. A inferência é:

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Leve todas as caixas para a estação. Esta é urna das caixas.

Leve esta para a estação.

I'ode-se perguntar como vamos saber, dadas duas premis­

sas em modos diferentes, em que modo deve estar a condu­ mio. O problema do efeito dos modos das premissas e da con­ clusão sobre as inferências tem sido ignorado por lógicos que

não examinaram além do modo indicativo, embora não haja i a/.ão para que o ignorassem - pois como demonstraríamos que a conclusão de um conjunto de premissas indicativas deve tam- hcm estar no indicativo? Mas se consideramos, como faço, as relações de implicação da lógica comum como relações entre as frásticas de sentenças, o problema toma-se premente. Adml- sindo que a razão da validade do silogismo acima é que as frás- ucas “Você levar todas as caixas para a estação e ser esta urna das caixas” e “Você não levar esta para a estação” são logica­ mente incoerentes entre si, por causa das regras lógicas que re­ gem o uso da palavra “todas”, como saber que não podemos adicionar nêusticas de uma forma diferente daquela acima? Poderíamos escrever, por exemplo:

Leve todas as caixas para a estação. Esta é uma das caixas.

Você vai levar esta para a estação.

e dizer que isso é um silogismo válido, o que evidentemente ele não é.

Permitam-me primeiramente expor duas das regras que parecem reger essa questão; podemos deixar para mais tarde o problema da sua justificação. As regras são:

(1) Nenhuma conclusão indicativa pode ser extraída valida­

mente de um conjunto de premissas que não possa ser ex­ traído validamente apenas dos indicativos dentre elas.

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30 A LINGUAGEM DA MORAL

(2) Nenhum a conclusão imperativa pode ser extraída valida­

mente de um conjunto de premissas que não contenha pelo menos um imperativo.

É somente a segunda regra que nos irá ocupar nesta pes­ quisa. H á um a exceção muito importante a essa regra, o chama­ do “imperativo hipotético”, do qual tratarei no próximo capítu­ lo. Para o momento, porém, tomemos a regra na forma em que se encontra. É da mais profunda importancia para a ética. Isso ficará claro se eu fornecer um a lista de alguns argumentos fam osos da ética que me parecem ter sido consciente ou in­ conscientemente baseados nela. Se admitimos, como mais tar­ de sustentarei, que deve ser parte da função de um juízo moral prescrever ou orientar escolhas, isto é, implicar uma resposta a algum a questão da forma “Que devo fazer?”, então fica claro, a p artir da segunda das regras apresentadas há pouco, que nenhum juízo m oral pode ser um a pura afirm ação de fato. Nesse fundamento baseia-se, indiretamente, a refutação socrá­ tica da definição de justiça de Céfalo, “falar a verdade e devol­ ver qualquer coisa que se tenha recebido de alguém”, e de todas as subseqüentes m odificações realizadas por Polemarco nessa definição11. Aristóteles estava apelando indiretamente a essa regra em seu mais decisivo rompimento com o platonismo, sua rejeição da Idéia do Bem; deu como razão, entre outras, que se houvesse tal Idéia, sentenças sobre esta não seriam guias da ação (“não seria um bem que você pudesse, por meio de sua ação, trazer à existência”)12. No lugar de um bem factual, exis­ tente, cognoscível por meio de um tipo de observação supra- sensível, Aristóteles coloca um “bem a ser alcançado pela ação” ou, como geralmente o chama, um “fim ”, isto é, ele reco­ nhece im plicitam ente que, se dizer que algo é bom é guiar a ação, então isso não pode ser meramente afirm ar um fato sobre o mundo. A m aioria de suas diferenças éticas em relação a Platão pode remontar a essa origem.

É nessa regra lógica, novamente, que se deve encontrar a base da celebrada observação de Hume sobre a impossibilidade

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