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Revendo o Programa de Residência Médica em Medicina Interna

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Academic year: 2021

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Revendo o Programa de Residência Médica em Medicina

Interna

José Batista C. Tomaz A criação do primeiro programa de Residência Médica (RM) é atribuída a William Halsted, no Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade John's Hopkins, em 1889. Portanto, a Residência Médica já completou mais de um século. O primeiro programa em Medicina Interna foi implantado logo em seguida por William Osler. A partir de 1944, os primeiros programas foram iniciados no Brasil, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Ao longo dos anos os programas foram expandindo-se e hoje, não há a menor dúvida de que a Residência Médica (RM) é uma parte indispensável da formação e especialização médica. Mais de 90% dos médicos que se formam a cada ano no Brasil, buscam uma vaga na Residência Médica1.

Tem-se observado, no entanto, que uma grande maioria das RM não tem um programa bem estruturado e muitas delas nem sequer têm currículo, ficando muitas vezes a cargo dos coordenadores e dos preceptores a decisão sobre o conteúdo a ser incluído no programa e como esse conteúdo deverá ser abordado. Esse fato, sem dúvida,

compromete de maneira significativa a qualidade do programa e a formação do residente. No Brasil, infelizmente, é muito comum encontrar programas de RM em diferentes

especialidades e sub-especialidades sem um programa estruturado e entre os poucos programas existentes que possuem currículo, muitos têm problemas relacionados ao conteúdo e à estrutura. O que torna a situação mais grave é que, aparentemente, não tem havido ao longo das últimas décadas movimentos consistentes para reverter esse quadro. Só recentemente é que as entidades profissionais médicas, as escolas médicas e os ministérios da educação e da saúde iniciaram a discussão sobre formas de aperfeiçoar os programas e a estrutura da Residência. Dentre os pontos em discussão, incluem-se a definição de vagas em função de necessidades sociais, as formas de acesso, a

necessidade de elaboração de projetos pedagógicos, a capacitação dos preceptores, a avaliação da qualidade dos programas e as condições de trabalho e de suporte didático e pessoal aos residentes.

O artigo de Meyers e cols. é um artigo de opinião (Position Paper) publicado recentemente (dezembro de 2007) que levanta uma questão crucial para o

desenvolvimento da RM: a necessidade de revisão dos programas, em particular, os relacionados à Medicina Interna. Os autores apresentam as razões para o redesenho dos programas, fazem recomendações para a reforma do currículo tomando como base a proposta da Alliance for Academic Internal Medicine Education Redesign Task Force (AAIM Força Tarefa) e sugerem estratégias para a implementação das recomendações. Segundo os autores, críticas têm sido feitas em relação à RM levando em conta pelo menos três elementos fundamentais: i. deficiências no conteúdo (ex. pouca ênfase na área da atenção ao idoso); ii. a estrutura inadequada dos programas (ex. duração e local do treinamento) e o sistema de financiamento instável dos programas.

Dentre as razões para a revisão da RM em Medicina Interna apresentadas pelos autores, destacamos três:

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- Recentes avanços científicos têm enfatizado a necessidade do desenvolvimento de habilidades para a aprendizagem para a vida (lifelong learning) e uma sólida base para o cuidado do paciente.

- Movimentos pela segurança do paciente têm requerido a utilização de simulações e a adoção de abordagens mais centradas no paciente.

- Um baixo interesse em Atenção Primária e Medicina Interna tem levado os responsáveis a propor alternativas educacionais e financeiras para aumentar a atratividade da especialidade.

Em relação a essa última razão, no Brasil, devido à implementação de um amplo

programa de consolidação da atenção primária à saúde – o Programa Saúde da Família (PSF) – ainda há uma boa procura pelos programas de RM em Clínica Médica. Segundo Silva & Rocha Filho, (2007) a concorrência por vaga na RM de Clínica Médica no Ceará em 2003 foi 12,56; para as áreas de especialidades clínicas, a competição por vaga foi de 2,54, o que mostra o aumento de interesse nessa área. No Ceará, apesar de existirem 14 instituições, todas em Fortaleza, com programas de RM, apenas três mantêm programa de Clínica. Por isso é preciso expandir e diversificar a oferta de vagas em residência de Clínica Médica. 2

Em 2006, o Comitê Educacional do Colégio Americano de Médicos (American College of Physicians), publicou um artigo no qual levanta a necessidade de mudanças na formação dos médicos em Medicina Interna tanto na graduação como na Residência. Dentre as sugestões de reformas na graduação destacam-se:

A inclusão de experiências curriculares que permitam a exposição precoce e em

maior número de vezes dos estudantes em temas relacionados à Medicina Interna.

Melhora do treinamento em ambulatório em Medicina Interna.

Expor os estudantes durante mais tempo a experiências educacionais com

docentes que sirvam de modelos (role models) em Medicina Interna.

Incorporar experiências educacionais durante o quarto ano que destaquem seu

valor e relevância para a futura carreira em Medicina Interna 3 Dentre as sugestões para mudanças na Residência destacam-se:

• A RM em Medicina Interna deve ter a duração de 3 anos, com um componente comum a todos os residentes e um componente no terceiro ano direcionado para a futura carreira do residente de acordo com sua escolha.

• Os programas de Residência devem ser desenhados levando em consideração as necessidades educacionais e não as necessidades institucionais dos serviços de saúde.

• Substanciais reformas devem ser feitas no treinamento em ambulatório em termos de estrutura, locais, conteúdo e duração.

• Modelos baseados em equipes devem ser utilizados tanto para a atenção ao paciente como para o desenho do programa de Residência.

• O quadro de docentes e preceptores deve ser desenvolvido, de modo que seja criado um “núcleo de docentes” em Medicina Interna, melhoria da remuneração e um programa de desenvolvimento docente baseado no aprimoramento de

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Entre 2005 a 2007, a comunidade acadêmica e os diretores de programas de Medicina Interna, sob os auspícios da Força Tarefa da AAIM, desenvolveram seis recomendações para o redesenho de programas de RM:

1. Programas de RM devem ser organizados ao redor de um currículo central (core curriculum) de Medicina Interna.

Todo o processo educacional e de avaliação deve tomar como base um currículo central ao longo de toda a vida profissional dos internistas, incluindo a própria residência, a educação médica continuada, a certificação e re-certificação. Os residentes de Medicina Interna bem como os das subespecialidades devem desenvolver durante o programa proficiência no currículo central e nas competências propostas pelo curso. Tais

competências devem ser freqüentemente reavaliadas, de acordo com a abrangência da prática dos internistas generalistas e subespecialistas.

A Força Tarefa identificou e definiu oito áreas do conhecimento médico aplicável a todos os internistas. Estas áreas centrais devem ser desenvolvidas durante a residência e mantidas ao longo da prática de todos os internistas, incluindo os internistas gerais e os especialistas. Em termos gerais, o currículo central (core curriculum) em medicina interna deve incluir:

• Avaliação do paciente com um quadro não diagnosticado e indiferenciado, levando ao desenvolvimento de uma série de hipóteses diagnósticas.

• Tratamento de condições clínicas mais comumente manejada por internistas, particularmente condições médicas crônicas, incluindo o uso de diretrizes clínicas quando existirem.

• Cuidados básicos preventivos.

• Interpretação de testes clínicos básicos e imagens.

• Identificação e início de tratamento de problemas médicos de urgência e emergência. • Utilização de farmacoterapia comum.

• Conhecimentos e habilidades relacionados com tópicos não clínicos relevantes. • Uso apropriado de procedimentos diagnósticos e terapêuticos.

Em resumo, o currículo central em Medicina Interna deve focalizar em habilidades

cognitivas de raciocínio diagnóstico, exame clínico e a utilização estratégica da consulta e de testes para realizar acurado diagnóstico e tratamento.

2. Programas de RM em Medicina Interna devem adotar e implementar a abordagem da educação e avaliação baseada em competência

Programas de RM em Medicina Interna devem ter no mínimo 36 meses de duração e os residentes devem prosseguir no curso de acordo com a avaliação de suas competências. Para isso os programas devem definir critérios claros para a progressão no curso e utilizar instrumentos de avaliação baseados em competências para avaliar o progresso de acordo com os critérios estabelecidos. Os residentes devem manter, expandir e refinar

continuamente portfólios de sua performance que contenham avaliações formativas e certificativas, quantitativas e qualitativas e oportunidades para a reflexão sobre a prática.

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Docentes e preceptores da RM devem ser selecionados e treinados na utilização desses instrumentos.

Uma reflexão interessante sobre essa recomendação é sobre o conflito entre os requisitos para a conclusão da residência, ou seja, baseado no tempo, como acontece atualmente, ou baseado no alcance das competências. Num programa de RM baseado em

competência, o residente só seria graduado quando tivesse alcançado proficiência em todas as competências requeridas pelo programa. Isso poderia significar dois ou três anos para alguns, ou quatro a cinco anos para outros.

3. Programas de RM em Medicina Interna devem adotar e implementar abordagens educacionais centradas no residente

Programas de RM em Medicina Interna que quiserem adotar abordagens centradas no residente devem ser estimulados. Experiências que facilitem essas abordagens devem ser criadas e estruturadas dentro do currículo dos programas incluindo o sistema de avaliação. Tais experiências devem ir além dos tradicionais eletivos. Ao mesmo tempo os residentes devem ter tempos protegidos para realizar tais experiências e se dedicarem ao desenvolvimento de competências orientadas para as suas futuras necessidades

profissionais.

4. Treinamento em ambulatório para os residentes de medicina interna deve ser melhorado

Treinamento em ambulatório deve ser planejado de modo que seja centrado no paciente e atrativo para o residente, equilibrando as responsabilidades do residente sobre

pacientes internados e de ambulatório. Uma maneira de equilibrar essas

responsabilidades é criar rotações em diferentes ambulatórios. Tais rotações devem ser estruturadas dentro do currículo da RM e ter avaliação rigorosa, de modo que possa assegurar a aquisição de competência do cuidado longitudinal do paciente. É

recomendado que sejam utilizados novos modelos de atenção ao paciente envolvendo o residente no contexto ambulatorial, como por exemplo, o cuidado baseado em equipe de saúde.

5. Programas de RM em Medicina Interna devem adotar novos modelos de trabalho do corpo docente de modo que estimulem a educação e o desenvolvimento profissional dos residentes

Em cada instituição deveria ser desenvolvido um núcleo de docentes, consistindo de “clínicos-educadores” que tenham a responsabilidade da formação clínica do residente. Tais docentes bem como os demais profissionais envolvidos na capacitação dos

residentes devem ter o suporte adequado da instituição e receber treinamento específico para o desenvolvimento de competências educacionais requeridas.

6. Recursos institucionais e programáticos devem estar alinhados aos objetivos da revisão educacional do programa de modo que assegure o sucesso de sua implementação

As melhores práticas para o financiamento da educação médica devem ser identificadas e disseminadas entre as instituições que oferecem programas de RM. É recomendado que se faça uma análise de custo-benefício de programas de RM e compará-los com o

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objetivo de identificar modelos alternativos mais custo-efetivos. Finalmente, problemas disfuncionais na atenção aos pacientes nas instituições de ensino devem ser identificados e como esses problemas afetam negativamente os residentes e pacientes deve ser explicado.

No momento em que, no Brasil, as entidades profissionais médicas, as escolas médicas e os ministérios da educação e da saúde iniciam um processo de discussão sobre formas de aperfeiçoar os programas e a estrutura da Residência, as recomendações propostas neste artigo são de muita relevância e podem contribuir muito para as decisões a serem tomadas.

Referências

1. Martins, LAN, (2005). Residência Médica: estresse e crescimento. Editora Casa do Psicólogo.

2. Silva, M G C & Rocha Filho, F S (2007). Residência Médica em Clínica Médica no Ceará em 2003: oferta de vagas e perfil da concorrência. Rev. bras. educ. méd;31(2):127-136.

3. Weinberger, SE, Smith LG, Collier VU (2006). Position Paper: Redesigning Training for Internal Medicine. Annals of Interne Medicine, Volume 144 Issue 12.

______________________________________________________

Artigo Original

Redesigning Residency Training in Internal Medicine: The Consensus Report of the Alliance for Academic Internal Medicine Education Redesign Task Force

Frederick J. Meyers, MD, Steven E. Weinberger, MD, John P. Fitzgibbons, MD, Jeffrey Glassroth, MD, F. Daniel Duffy, MD, Charles P. Clayton,

and the Alliance for Academic Internal Medicine Education Redesign Task Force Academic Medicine, Vol. 82, No. 12 / December 2007 pp. 1211-1219.

Referências

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