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Projeto Campo Favela

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Academic year: 2021

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Projeto Campo Favela

Relatório Técnico

Março 2021

Professores

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Índice

1. Introdução ... 3

2. A Concepção e o Contexto do Projeto ... 4

3. Breve descrição cronológica das etapas do projeto ... 8

3.1. Fase 1: Primeira entrega em Paraisópolis ... 8

3.2. Fase 2: O Apoio do Instituto BEI ... 9

3.3. Fase 3: O Apoio do Instituto Galo da Manhã ... 11

3.4. Fase 4: O Apoio da Yara Fertilizantes ... 12

3.5. Visão geral do período ... 13

4. A Operação ... 14

4.1. Captação junto a pessoas físicas ... 14

4.2. Captação e gestão do relacionamento com grandes doadores ... 14

4.3. Relacionamento com a mídia ... 15

4.4. Busca de produtores e uso de intermediários ... 15

4.5. Definição do mix de produtos ... 16

4.6. Definição dos locais de entrega ... 16

4.7. Local de separação e embalagem ... 18

4.8. Acompanhamento da operação e controle da qualidade ... 19

4.9. Fluxo financeiro e controles ... 20

4.10. Objetivos e Resultados do Projeto: modelo sustentável e doação ... 20

5. Dificuldades enfrentadas e Lições Aprendidas ... 22

5.1. Modelo sustentável - Canal de vendas ... 22

5.2. Controle das doações ... 23

5.3. Pagamentos e controle dos pagamentos ... 24

5.4. Dedicação dos voluntários ... 24

6. Encerramento do projeto e lições aprendidas ... 25

6.1. Geral ... 25

6.2. O campo ... 25

6.3. A favela ... 26

6.4. A logística ... 26

6.5. A gestão do projeto social ... 27

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1. Introdução

Este relatório tem como objetivo registrar o desenvolvimento do Projeto Campo Favela (CAMPO FAVELA). Apresentando a origem e as etapas do projeto, o relatório destaca os desafios e aprendizados capturados pela implementação de um modelo de fornecimento de alimentos frescos que buscou ajudar pequenos agricultores familiares e moradores de áreas menos favorecidas, normalmente favelas, a enfrentarem os desafios alimentares trazidos pela COVID-19. Esse documento poderá ser útil para estudos futuros sobre políticas públicas e sobre gestão da cadeia de suprimentos ligadas à produção e abastecimento de alimentos frescos em áreas urbanas de baixa renda. Pode ser também usado como fonte de aprendizado para futuros projetos sociais, relacionados ou não a produtos frescos.

O projeto foi criado por um grupo de professores pesquisadores do Insper de diversas áreas (i.e., operações, marketing e finanças), e contou com a ajuda de outros professores, assim como diversos alunos e ex-alunos de graduação e pós-graduação da mesma instituição, de familiares e amigos dos mesmos. Com início em março de 2020 e encerramento em fevereiro de 2021, o projeto distribuiu com a ajuda de associações e organizações locais sem fins lucrativos, verduras, legumes, ovos e frutas comprados de pequenos agricultores para famílias carentes moradoras de áreas de baixa renda em diversas cidades do país. Ao todo foram entregues mais de 873.000 quilos de alimentos para 101.000 famílias, beneficiando direta ou indiretamente cerca de 1.500 agricultores familiares. Para realizar esse feito o projeto arrecadou cerca de R$3 milhões de reais em doações.

Este relatório está dividindo em cinco sessões. Na primeira será explicado o contexto e as iniciativas de pesquisa que levaram ao surgimento do Projeto Campo Favela. Nas sessões seguintes serão descritas as etapas do projeto e o seu desenvolvimento operacional. Por fim, serão apresentados os principais desafios enfrentados e as lições aprendidas.

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2. A Concepção e o Contexto do Projeto

A ideia do Projeto Campo Favela surgiu do desejo de alguns professores pesquisadores do Insper de transformarem o conhecimento adquirido em pesquisas sobre logística nas favelas brasileiras em ações práticas que ajudassem a amenizar os efeitos econômicos e sociais da pandemia de COVID em populações menos favorecidas.

Estudos sobre logística em favelas já faziam parte da agenda de pesquisas dos professores André Duarte e Lars Sanches do Núcleo de Gestão de Operações e da Cadeia de Suprimentos do Insper. A publicação, em 2019, do artigo “Last mile delivery to the bottom of the pyramid in Brazilian slums1” trouxe visibilidade para o assunto e chamou a atenção de pesquisadores de instituições

de fora do país.

Em 2019, o Professor Lars Sanches em conjunto com o professor Chris Mejía Argueta do MIT – Massachusetts Institute of Technology - coordenaram uma pesquisa sobre a cadeia de frutas e verduras voltada para a população carente. Essa pesquisa teve como objetivo testar um novo modelo de distribuição e comercialização de alimentos frescos que atendesse as necessidades de classes mais baixas. Foi desenvolvido um piloto de entregas de cestas de frutas e verduras, vindas diretamente de pequenos produtores rurais, entregues em regiões carentes na cidade de Rio Grande (RS). Este projeto trouxe vários aprendizados e mostrou a necessidade de estudos futuros sobre a cadeia de suprimentos em áreas de baixa renda.

Ainda em 2019, o professor André Duarte recebeu o convite do professor Gareth Jones da London School of Economics (LSE) para estudar a Cadeia de Alimentos frescos em áreas de favelas. Surgiu então o projeto de pesquisa conjunto do Insper e da LSE intitulado e financiado pela British Academy, intitulado “Engineering Food: Infrastructure Exclusion and ‘Last Mile’ Delivery in Brazilian Favelas”. Este projeto multidisciplinar, utiliza métodos mistos e combina conhecimentos de logística e de métodos etnográficos para mapear as infraestruturas formais e informais que permitem o acesso dos moradores da favela a alimentos frescos. Visa também conhecer os hábitos de consumo de alimentos pelos moradores na favela, assim como entender as razões de tais hábitos.

Uma semana antes de iniciar o fechamento dos locais públicos decorrentes da pandemia de Corona vírus (Março/2020), um workshop teve lugar em São Paulo para marcar o início das atividades do projeto de pesquisa com a LSE. Durante esse workshop, pesquisadores do Insper e da LSE convidaram diversas pessoas e empresas envolvidas na cadeia de frutas e verduras voltadas para o público de baixa renda ou da agricultura familiar. Entre os participantes do workshop estavam líderes de associações de moradores de favelas de São Paulo, órgãos ligados a prefeituras e startups que atuavam nesse ramo.

Nos últimos dias desse workshop, os participantes fizeram uma visita à favela de Paraisópolis na cidade de São Paulo. Nessa visita, os pesquisadores tiveram a oportunidade, não só conhecer o ambiente alimentar de uma favela, mas também de conversar com líderes locais, responsáveis por cozinhas comunitárias e donos de pequenos estabelecimentos comerciais que vendiam frutas e verduras dentro da favela.

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Poucos dias após o término do workshop, foi decretado pelo governo do estado de São Paulo o fechamento imediato de grande parte dos locais públicos, incluindo restaurantes e escolas, com a solicitação de que a população ficasse em suas casas. Esse fechamento drástico gerou uma série de incertezas e preocupações sobre qual seria o impacto na vida cotidiana dos moradores de favelas, que perderiam suas fontes de renda, assim como para os pequenos produtores, que dependiam dos restaurantes abertos e das compras realizadas pelas prefeituras e governos (em especial para as merendas de escolas e creches públicas) para escoarem sua produção.

Com o fechamento dos restaurantes, ficou claro que haveria uma queda brusca da demanda dos produtos2 vindos de pequenos produtores familiares. O mesmo aconteceria com produtores

que forneciam para a merenda escolar das prefeituras e governos, consequência da suspensão das aulas. Como o tempo de plantio dos produtos era significativo (no mínimo 45 dias para hortaliças e mais para outras FLV – frutas, legumes e verduras) haveria uma sobra imediata de produtos frescos que precisaria ser escoada rapidamente, especialmente pela característica de perecibilidade do produto. A alternativa de se escoar esses produtos em outros canais não se mostrava viável no curto prazo, pois a grande maioria dos mercados e supermercados já tinha uma rede de fornecedores de FLV (Frutas, Legumes e Verduras) estabelecida. Outra opção de venda para os produtores rurais eram as centrais de comercialização, como por exemplo o CEAGESP de São Paulo. No entanto, por causa do excesso de oferta, os preços pagos pelos intermediários iriam despencar no curto prazo, o que também não gerava uma alternativa satisfatória para os produtores familiares. Por causa desses problemas, haveria o risco de que uma grande quantidade de produtos frescos de qualidade fosse jogada fora. Esse aumento do desperdício faria com que os pequenos produtores familiares ficassem sem condições de sustentar suas famílias e não teriam dinheiro para reiniciar o plantio quando a demanda fosse reestabelecida. Como grande parte dos FLVs consumidos no Brasil tem a sua origem em pequenos produtores familiares, a falta de capital de giro, juntamente com a incerteza da retomada da demanda, poderia gerar uma redução na oferta de FLV que faria com que os preços subissem durante alguns meses até que os produtores conseguissem reiniciar o plantio, e esses produtos fossem disponibilizados para os consumidores. Além disso, essa situação poderia agravar a migração de jovens produtores rurais para as cidades, potencializando uma queda mais duradoura e acentuada na área plantada. Essa migração já era um problema antes da pandemia, refletido no aumento da idade média dos produtores familiares3. Muitos dos filhos

de agricultores rurais já optavam antes da pandemia por não seguir plantando, consequência de verem como o árduo trabalho dos pais é pouco recompensado financeiramente.

A rentabilidade dos produtores familiares é muito baixa por diversos motivos. O primeiro é que os seus custos de produção são relativamente maiores comparativamente com os grandes produtores, por não terem ganhos de escala na compra de insumos e na produção, assim como por não terem recursos para investirem em técnicas mais modernas de plantio e colheita. O segundo motivo é que a maioria dos produtos destes pequenos agricultores são vendidos para intermediários, que usam a flutuação da demanda para pagar valores muito baixos pelos produtos. Um terceiro motivo é a grande quantidade de produtos perdidos durante a produção agrícola que é desperdiçada por diversos motivos, entre eles por não encontrarem vendedores e/ou canais pagando um preço justo pelos produtos.

2

https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/04/produtor-rural-destroi-toneladas-de-alimentos-no-cinturao-verde-de-sao-paulo.shtml

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Na favela, a situação financeira dos proprietários dos estabelecimentos comerciais também não é das mais favoráveis. Apesar das longuíssimas jornadas de trabalho, o valor que eles conseguem tirar no final do mês é, normalmente, muito baixo. A baixa rentabilidade decorre de alguns fatores. O primeiro deles é o alto custo de compra dos produtos. Os produtos são comprados na sua grande maioria nas bancas das centrais de abastecimento (como o CEAGESP) e, por comprarem baixos volumes, não possuem um bom poder de barganha.

Com a pandemia, os preços ficaram mais voláteis. Com uma maior flutuação de preços, ficava mais difícil para os pequenos varejos fazerem negociações baseadas nos preços anteriores. Além disso, muitos desses pequenos varejistas não possuem dinheiro disponível para comprar à vista, gerando certa dependência com alguns vendedores, o que limita a capacidade deles de comprarem produtos de outras bancas. Os pagamentos a prazo, podem em alguns casos, carregar altas taxas de juros, aumentando muito o seu custo financeiro. Quando o crédito concedido pelas bancas não é suficiente, os donos dos pequenos varejos de alimentos frescos recorrem a empréstimos de agiotas, que chegavam a cobrar 15% de juros ao mês (435% ao ano). Outro problema enfrentado durante a pandemia foi a grande variação da demanda, juntamente com os pequenos prazos de validade e a falta de refrigeradores para conservação dos alimentos frescos. Como os custos de energia e da compra de geladeiras são altos, poucos comerciantes possuem refrigeradores, o que faz com que a maioria dos produtos fiquem expostos ao calor, reduzindo a sua qualidade e o seu tempo de vida útil. Para evitar o desperdício de alimentos, é comum grandes promoções no final do dia, mas mesmo com estas promoções, uma parte razoável dos produtos é perdido. O custo operacional aumenta ainda mais com a necessidade de idas frequentes, praticamente diárias, às centrais de abastecimento.

No mês de abril de 2020, com os estabelecimentos públicos fechados e uma drástica redução na circulação das pessoas, havia uma perspectiva de uma queda abrupta na renda das famílias das favelas4. Reportagens de jornais e pesquisas mostravam que muitos dos moradores das

favelas dependiam de trabalhos informais ou de trabalhos que dependiam da circulação das pessoas em estabelecimentos como lojas, padarias e restaurantes. Com o fechamento dos estabelecimentos e a queda da circulação de pessoas, havia a clara percepção que a renda dessas famílias iria cair significativamente. Pesquisa realizada pelo Data Favela5 mostrava que a

maioria dos favelados não tinha dinheiro guardado para emergências e que em poucas semanas começariam a passar fome. Para piorar a situação, a demanda por alimentos nas casas estava subindo, pois muitos dos moradores comiam suas refeições fora de casa. O problema era mais crítico ainda para as crianças que tinham grande parte de sua alimentação feita nas escolas públicas. Com o fechamento das escolas, essas crianças não teriam mais o acesso à merenda, alimento que representava uma fonte fundamental de alimentação para muitas das crianças e possuía uma qualidade nutricional muito superior aos alimentos ultra processados, que muitas vezes eram priorizados por suas famílias. Naquele momento, o governo ainda não tinha anunciado nenhum tipo de ajuda que depois veio a ser concretizada através do auxílio emergencial.

A queda do poder de compra da população local e a disposição dos consumidores para fazerem comparação de preços, acabou limitando ainda mais a capacidade dos comerciantes das favelas

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https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2020/04/com-comida-no-fim-moradores-de-favela-de praticarem preços maiores. Soma-se a isto a informalidahttps://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2020/04/com-comida-no-fim-moradores-de-favela-de nesse ramo e a percepção https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2020/04/com-comida-no-fim-moradores-de-favela-de que alguns supermercados locais usam preços subsidiados de FLV para atrair tráfego para suas lojas. Com o objetivo de ajudar as duas pontas frágeis desta cadeia, surge a ideia do projeto Campo Favela. No campo, haveria produtos sendo jogados fora e produtores familiares sem renda. Nas favelas, haveria famílias sem ou com pouca renda para comprar alimentos, e crianças sem acesso a uma alimentação saudável. O professor Lars Sanches com seu conhecimento, juntamente com o professor André Duarte, resolveu fazer um teste, ligando os dois elos da cadeia. Em seguida, ainda sem saber bem o resultado, as professoras Carla Ramos e Giuliana Isabella da área de marketing, e o professor Adalto Gonçalves da área de finanças, se juntaram ao projeto com o objetivo de criar uma iniciativa que pudesse auxiliar mais do que apenas a população de uma única favela e alguns poucos agricultores. Assim, formou-se o núcleo principal de gestão do projeto.

O projeto criado teve então dois grandes objetivos: (1) ajudar as famílias do campo e das favelas nesse período de pandemia, mas também (2) criar um modelo sustentável que permitisse uma ligação direta entre produtores e consumidores das favelas. Com a redução do número de intermediários, haveria uma diminuição do desperdício de alimentos, e os produtos frescos (FLV) poderiam chegar às famílias de baixa renda, moradoras de favelas, a um preço mais baixo, mas ao mesmo tempo remunerando de forma justa todos os agentes envolvidos nesta complexa cadeia.

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3. Breve descrição cronológica das etapas do projeto

Pode-se dividir o projeto em quatro grandes fases: primeira entrega em Paraisópolis; o apoio do Instituto BEI; o apoio do Instituto Galo da Manhã; o apoio da Yara Fertilizantes. Essas fases tiveram durações distintas e representaram mudanças significativas no tamanho do projeto e na forma de atuar.

3.1 Fase 1: Primeira entrega em Paraisópolis

Após uma noite muito mal dormida, e de grandes reflexões sobre tudo aquilo que estava estudando e sobre o momento da pandemia, o professor Lars Sanches, da área de Logística do Insper, resolveu que, além das pesquisas sobre a cadeia de suprimentos de alimentos frescos, era o momento de fazer algo mais. O professor Lars, com o apoio de seus colegas professores e de uma "vaquinha" informal de arrecadação de recursos, decidiu fazer a entrega de um caminhão de FLV para uma favela. Com os contatos feitos durante o workshop de pesquisa com a LSE, reuniu em uma operação o dono de um sacolão da favela de Paraisópolis, um líder da associação da mesma favela e uma startup que comprava produtos de pequenos produtores rurais da cidade de Piedade, no cinturão verde de SP e os vendia para os restaurantes de São Paulo, mas que agora na situação de pandemia não tinham mais para quem vender. O custo dessa operação piloto foi estimado em R$12.000 reais. Com grande apoio de alunos de graduação, colegas professores, familiares e amigos, foi possível arrecadar o valor necessário e até um pouco a mais. A ideia tocou os professores Carla, Giuliana, Adalto e André, que resolveram abraçar a causa, formando assim uma equipe de cinco professores de diferentes áreas que seriam fundamentais para a continuidade do projeto.

A primeira entrega aconteceu na primeira semana de abril de 2020 e foi de 6.000 quilos de produtos. A quantidade escolhida visava encher um caminhão para poder diluir o custo do frete. A startup parceira fez a ponte entre os produtores e a favela de Paraisópolis. Os produtos foram comprados de pequenos agricultores do cinturão verde de São Paulo e doados, uma parte para um restaurante que distribuía marmitas da associação de moradores de Paraisópolis (Mãos de Maria) e outra parte para um parceiro, proprietário de um pequeno varejo de produtos frescos, que faria a preparação das cestas a serem vendidos a baixo custo para as famílias de baixa renda. A operação de montagem das cestas foi importante, pois os produtos chegaram a granel e em grandes caixas.

Para que se pagasse a operação de montagem e distribuição das cestas arcados pelo dono do pequeno varejo de produtos frescos (sacolão), e para criar um capital de giro que seria usado para futuras compras por esse sacolão, foi estabelecido que as cestas seriam vendidas pelo sacolão a um preço simbólico de R$12,00, um valor 60% menor do que o normalmente cobrado pelo varejista. A cesta era formada por 1 bandeja de 30 ovos, 1 dúzia de banana e 3 kg de batata doce. A montagem e distribuição das cestas funcionou relativamente bem, mas levou mais tempo do que o esperado. Além disto, verificou-se a necessidade de um espaço maior para esta operação, assim como de balanças, de forma a garantir que o produto fosse separado em cestas de pesos equivalentes. Apesar destes contratempos, todos os produtos foram vendidos ou distribuídos gratuitamente antes de estragarem, gerando uma grande satisfação em todos os envolvidos, incluindo as famílias que receberam os produtos.

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3.2 Fase 2: O Apoio do Instituto BEI

Uma semana após a primeira entrega, o Projeto Campo Favela conseguiu significativo apoio financeiro do Instituto BEI. O Instituto possuía um longo relacionamento com diversas associações de moradores de favelas na cidade de São Paulo e gostaria que o projeto Campo Favela fizesse entregas em algumas delas. Foram escolhidas três favelas de São Paulo (Heliópolis, Jardim Colombo e Cidade Tiradentes) e a Associação ligada aos Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) no centro da cidade de São Paulo.

A operação passou a atender mais pontos de distribuição e aumentou sua complexidade, uma vez que as cestas passaram a ser de 8 kg e com uma maior variedade de produtos, constituídos agora por ovos, frutas (banana), legumes e folhosas. Além disso, a operação do Campo Favela deixou de usar um varejista como ponto de distribuição na favela como havia feito na 1ª entrega de Paraisópolis, e passou a usar a estrutura das associações de moradores. A pedido dessas associações todos os produtos que precisavam ser pesados (ex: batata doce) já eram separados anteriormente e colocados em caixas de papelão antes de serem entregues nas associações. A separação e montagem das cestas em caixas de papelão, passou a ser realizada pela startup parceira, em seu depósito. O fato do trabalho de montagem das cestas ter sido feito pela startup, facilitou muito o trabalho das associações que tinham que apenas juntar alguns itens que não puderam ser colocados nas caixas, por causa da sua fragilidade (ovos), ou por não suportar ficar em caixa fechada (folhosas).

Nesta fase, o modelo de operação funcionou muito bem, tanto a parte da logística do campo à favela, como a distribuição dos produtos para as famílias nas favelas. A entrega para as famílias funcionou, pois as associações trabalhavam com um grande número de voluntários que cuidavam da entrega. Além disso, em várias associações, as famílias cadastradas iam até a associação para pegar a cesta, facilitando esta etapa final do processo de distribuição.

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Cidades Tiradentes

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Associação ligada aos Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST)

3.3 Fase 3: O Apoio do Instituto Galo da Manhã

Duas semanas após as entregas nas quatro associações em SP, o Campo Favela conseguiu o apoio do Instituto Galo da Manhã, que viria a ser o principal doador do projeto. Além desse importante apoio, o Campo Favela também conseguiu doações significativas do Instituto Península, do Instituto Unibanco e da JBS. Deve-se destacar ainda que, desde o início do projeto, o Campo Favela sempre recebeu doações de outras pessoas físicas. Os apoios financeiros permitiram manter uma regularidade semanal de entregas nas associações já atendidas na etapa anterior, além de permitirem expandir para outras favelas na cidade de São Paulo, e passar a entregar no Complexo da Maré na cidade do Rio de Janeiro.

O modelo de operações no início dessa fase seguiu um padrão parecido com o da etapa anterior: os produtos eram coletados junto aos agricultores familiares, separados em cestas no depósito da startup e entregues nas associações. O tamanho da cesta e a variedade de produtos, também se manteve similar à etapa anterior. A principal mudança nessa etapa foi a entrada da Coopafasb como mais um fornecedor (ponte com os pequenos agricultores) em paralelo a startup parceira. A Coopafasb, Cooperativa de Agricultura Familiar de Sete Barras, é uma cooperativa de produtores da região do Vale do Ribeira que tem como seu principal produto, a banana. A Coopafasb está ligada a mais de 1.200 famílias de agricultores familiares da região do Vale do Ribeira, uma das regiões mais pobres do Estado de São Paulo. Quase que a totalidade de sua produção era destinada para a merenda escolar da cidade de São Paulo. Com o fechamento das escolas o contrato de fornecimento foi suspenso e, da noite para o dia, perderam sua principal

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fonte de receita. Além do impacto que isso gerou na renda dos produtores, a chance de haver perdas de produtos no campo era gigantesca. Outro problema enfrentado pela Coopafasb era manter um galpão que era utilizado para fazer a logística de entrega nas escolas. A capacidade de pagar os custos fixos desse galpão, assim como manter as pessoas que trabalhavam nele, estava em risco. O objetivo de manter o galpão era para que a Coopafasb pudesse retomar as operações junto a Prefeitura de São Paulo, na entrega da merenda escolar, assim que as escolas voltassem a operar. A Coopafasb tinha uma estrutura de veículos próprios e de agregados que era capaz de fazer entregas diretas nas mais de 3.000 escolas da cidade de São Paulo. A cooperativa tentou encontrar outros canais para vender a sua produção, como vender diretamente para varejos e consumidores, mas não obteve êxito. A única alternativa que eles tinham era vender sua produção de bananas nos entrepostos comerciais do Ceagesp e Parque Dom Pedro (cidade de São Paulo). No entanto o preço pago nesses locais, devido ao excesso de oferta momentânea, estava abaixo do custo, o que levaria os agricultores a abandonar parte da sua produção.

Atraídos pela capacidade de entregas da Coopafasb e pela vontade de ajudar seus cooperados, o Campo Favela começou a comprar bananas diretamente dessa cooperativa por um preço justo combinado de comum acordo com a cooperativa. A partir desse momento as entregas nas favelas passaram a ser feitas por dois veículos. Um com bananas, saindo direto do galpão da Coopafasb e outro com os demais produtos da cesta que vinham da startup parceira, em Piedade.

A startup parceira aos poucos foi recuperando os seus clientes - os restaurantes - que começavam a voltar a operar na cidade de São Paulo. A Coopafasb, no entanto, continuava com seu futuro incerto e sem perspectivas de voltar a fornecer para as escolas municipais. Dessa forma, na tentativa de ajudar a Cooperativa, os líderes do Campo Favela resolveram buscar fornecedores que pudessem usar a estrutura da Coopafasb para fazer as entregas nas comunidades carentes. Nessa fase, o Campo Favela fez parcerias com um grupo de agricultores de folhosas da região de Parelheiros (extremo sul da cidade de São Paulo). Esses pequenos agricultores faziam parte de um projeto da prefeitura chamado de Ligue os Pontos, e também estavam com dificuldades para escoar sua produção. Produtos, como por exemplo a mandioca, começaram a vir dos cooperados da própria Coopfasb, assim como de outras cooperativas e fornecedores. Com esses novos produtos, a operação com a Coopafasb cresceu e aumentou seu impacto juntos a novos pequenos produtores.

Dessa forma, com doadores de pessoas físicas e jurídica, e o crescimento da Coopafasp trabalhando diretamente com diversos pequenos produtores, e variedade de produtos, mais a parceria com a startup parceira, o projeto Campo Favela chegou a atender mais de 50 comunidades vulneráveis distintas.

3.4 Fase 4: O Apoio da Yara Fertilizantes

Nessa fase, os grandes doadores passaram a dar enfoque a outros problemas, deixando de doar ao projeto Campo Favela. Houve também uma queda substancial nas doações ao projeto provenientes de pessoas físicas. Entretanto, um novo doador passou a ajudar o projeto financeiramente: a Yara Fertilizantes. Como condição básica, a Yara solicitou que as entregas

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O projeto se expandiu para outros 4 estados: Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Goiás e Bahia. Em São Paulo, foram acrescentadas entregas na cidade de Cubatão (SP). A Coopafasb assumiu grande parte do planejamento e controle das entregas que eram feitas pelas diferentes cooperativas, com supervisão do Projeto Campo Favela, algo inédito para a cooperativa. O apoio da Yara permitiu essa expansão no país, mas não foi o suficiente para que o projeto pudesse manter a ajuda, por mais tempo, nas localidades já atendidas pelo Campo Favela. Dessa forma, em Fevereiro de 2021 os coordenadores do projeto optaram em focar novamente nas pesquisas que pudessem auxiliar os dois elos da cadeia, deixando de receber as doações que ainda estavam sendo realizadas por pessoas físicas entusiastas do projeto, uma vez que os volumes de recursos não seriam suficientes para viabilizar a operação em escala, ainda que reduzida.

3.5 Visão geral do período

Ao longo das 4 fases de doações de produtos frescos para as favelas, o Campo Favela testou em algumas oportunidades modelos de aproximação entre pequenos agricultores familiares e pequenos varejistas das áreas de favelas. O projeto também avaliou diferentes modelos de distribuição e comercialização de produtos junto a associações e varejistas de hortifrúti. Foram testadas ainda diferentes formas de comercialização e comunicação entre varejistas e seus consumidores. Os modelos de assinatura e de compra antecipada foram tentados em algumas oportunidades. Professores e alunos da área de Engenharia de Computação do Insper, desenvolveram um aplicativo que seria integrado ao WhatsApp. O aplicativo iria facilitar o processo de divulgação, venda e entrega da cesta por parte do varejista. A ideia era praticar um preço justo, mais baixo que o praticado pelo comércio local. A opção pela compra antecipada era conseguir proporcionar uma maior previsibilidade da demanda, e garantir que o processo de entrega fosse mais rápido, resultando em menor desperdício, maior qualidade do produto, menores custos e preços mais acessíveis. Esse mesmo modelo de venda antecipada de uma cesta pré-determinada de produtos, foi tentado em algumas associações de moradores. A intenção dos testes era desenvolver uma solução sustentável, aproximando pequenos varejistas de produtores familiares, eliminando intermediários e garantido o acesso a uma alimentação saudável pelas populações urbanas de baixa renda.

Além dos modelos de comercialização, o projeto resultou em aprendizado sobre como comunicar nas mídias sociais (Facebook, Instagram, Youtube, Site), como arrecadar doações por parte de pessoas físicas, entre outros aprendizados. O projeto ganhou notoriedade e aos poucos saiu em diversos programas televisivos (Globo, G1, Rede Band, Record, etc.). Um grupo de voluntários de alunos de pós-graduação fizeram ainda dois vídeos de 20 minutos contando um pouco sobre a vida das pessoas nas comunidades, trazendo aprendizados aos telespectadores (desde como utilizar 100% os alimentos, até como é a vida de uma criança na comunidade).

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4. A Operação

Nessa sessão serão apresentados os principais desafios enfrentados pelos líderes do projeto em suas diferentes fases.

4.1 Captação junto a pessoas físicas

O projeto começou com a captação de doações de amigos, colegas e alunos do Insper. Nesse momento, a divulgação do projeto ocorria através da rede de contato dos líderes do projeto e o principal veículo de divulgação foi o WhatsApp. Nessa etapa, houve um grande esforço dos líderes para influenciar sua rede para fazer doações. Foi interessante que nessa etapa, houve um grande envolvimento dos alunos do 5º Semestre de Administração de Empresas do Insper. Três dos cinco líderes do projeto eram professores dos alunos desse semestre o que com certeza contribuiu para o seu envolvimento. Cerca de 25% do valor captado nesse momento inicial veio dos alunos e seus familiares.

Logo depois das primeiras semanas do projeto, deram início a uma série de ações para alavancar as doações de pessoas físicas. Um dos destaques nessa área foi uma ação proposta pela professora Giuliana Isabella, uma das líderes do projeto. Ela lecionava a disciplina de Marketing para alunos do 5º semestre de Administração e lançou um desafio para que os alunos criassem uma campanha nas redes sociais para captar doações de pessoas físicas. Esse desafio foi muito bem aceito por uma parcela razoável dos alunos da disciplina que fizeram campanhas maravilhosas. Participaram das campanhas personalidades como o técnico Bernardinho, o piloto Felipe Massa entre muitos outros famosos. Paralelamente ao desafio lançado aos alunos, os líderes do projeto buscaram proporcionar um local de arrecadação das doações, iniciando com uma plataforma de crowdfunding. Ao mesmo tempo, uma ex-aluna do Insper se prontificou, junto à sua rede de contatos, a criar um site, que posteriormente passou a receber as doações. Página no Facebook, Instagram e e-mail marketing, passaram a ser utilizados como estratégia de entregar aos doadores informações sobre o que estava sendo feito com o dinheiro arrecadado pelo projeto.

Para a construção e manutenção desses canais de comunicação, esses líderes conseguiram amealhar um grupo de alunos e ex-alunos do Insper (e seus amigos/colegas). A excelência do material de divulgação, assim como a constante atualização dele, demandou um grande esforço dos envolvidos, mas trouxe um significativo fluxo de doações durante todas as fases do projeto e permitiu transmitir credibilidade ao projeto.

Site campofavela.ong.br Instagram @campofavela

Facebook https://www.facebook.com/campofavela

Youtube https://www.youtube.com/channel/UCNPQ-aZmGxkwJ2yVV6azjIQ/videos

4.2 Captação e gestão do relacionamento com grandes doadores

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institucionais foram obtidas através de dois canais fundamentais: a rede de relacionamentos dos líderes do projeto e de gestores do Insper, e a participação de chamadas públicas de doação. Através da rede de relacionamentos, o projeto chegou ao Tomas Alvim e Marisa Moreira Salles do Instituto BEI e do Instituto Arq. Futuro. A BEI, além de ser o primeiro doador institucional do projeto, foi fundamental para conectar o projeto com todos os demais doadores institucionais. Dessa forma, teve um papel fundamental para o projeto. Entre os apoiadores do projeto, o maior deles foi o Instituto Galo da Manhã da família Bracher. Além do Galo da Manhã, houve o apoio do Instituto Península e Instituto Unibanco.

Além dos institutos, o Campo Favela também teve o apoio da JBS e da Yara Fertilizante. Para conseguir a doação da JBS, o Campo Favela participou de um processo seletivo de diversas etapas. A JBS não pôde fazer a doação em dinheiro, como era feito com todos os outros doadores. Ao invés disso a JBS doou 4.000 cartões de alimentação cada um contendo um crédito de R$100. Esses cartões foram entregues para 1.500 famílias carentes de agricultores familiares no Vale do Ribeira. A operação para a entrega desses cartões e a coleta das assinaturas e comprovantes, exigiu um grande esforço logístico e de controle por parte do projeto.

O relacionamento com os doadores também exigiu um grande esforço dos líderes do projeto. Alguns dos doadores traziam exigências específicas de onde e como o dinheiro deveria ser usado. Por isto, o Campo Favela teve que atuar com muita flexibilidade para atender demanda específicas dos doadores e também com muita transparência, para mostrar como toda a operação era realizada.

4.3 Relacionamento com a mídia

Os líderes do projeto, com o apoio do Insper, procuraram ativamente interagir com pessoas de diferentes mídias. A busca para aumentar a visibilidade do projeto era uma forma encontrada tanto para angariar mais doações de pessoas físicas, mas também ajudar a chamar a atenção para possíveis doadores institucionais. O Campo Favela conseguiu excelentes resultados, mas que também demandaram um enorme esforço da liderança do projeto. Reportagens de mídia impressa (Folha, Valor Econômico) e televisiva (Globo, Bandeirantes, Record e SBT), são alguns dos resultados. Entre os destaques da mídia televisiva, estão uma reportagem de 20 minutos que foi o destaque de uma edição do Globo Rural (TV Globo) e uma reportagem no Jornal da Band. Houve até uma reportagem feita em inglês para uma rede de televisão chinesa (CGTN), e uma reportagem impressa no Japão. A repercussão dessas reportagens foi muito positiva, chamando a atenção de outros doadores institucionais, como foi o caso da Yara Fertilizantes. Os doadores institucionais também ficaram satisfeitos com a divulgação do projeto. Além disso, ajudou a trazer visibilidade para a situação dos agricultores familiares e dos moradores de favelas.

Todas essas reportagens podem ser acessadas por meio de links disponíveis no Instagram do Campo Favela @campofavela. Algumas foram ainda citadas no Facebook e no site do projeto (www.campofavela.ong.br).

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4.4 Busca de produtores e uso de intermediários

No início do projeto a busca por agricultores familiares ficou por conta da startup parceira localizada em Piedade. Com o decorrer do projeto, o Campo Favela começou a se relacionar diretamente com produtores, localizados sobretudo em Vale do Ribeira, Parelheiros, Porto Feliz e outras cidades do Cinturão Verde de São Paulo. Esse relacionamento de um lado garantia a compra de produtores familiares em dificuldade e que o valor pago seria justo. Por outro lado, exigia um trabalho muito maior de coordenação e controle das compras. O desafio era encontrar produtores em condições de fornecer produtos de qualidade, e com um mínimo de confiabilidade. Além disso, era importante buscar produtores que tivessem uma estrutura logística que permitisse levar seus produtos até o galpão da Coopafasb, e que fossem capazes de emitir uma nota fiscal. Durante o projeto, muitos produtores contataram o Campo Favela tentando escoar sua produção; porém, muitas vezes eles não atendiam uma das condições acima listadas.

Produtores de produtos orgânicos também buscaram o Campo Favela; porém, eles estavam conseguindo escoar ao menos parte de sua produção. Além disto, o preço de venda desses produtos era mais alto quando comparado ao produto convencional. Apesar de saber dos benefícios da produção orgânica, optou-se por priorizar produtos convencionais, por terem um preço menor e assim permitir distribuir uma quantidade maior de produtos.

4.5 Definição do mix de produtos

A primeira entrega, na favela de Paraisópolis, foi de apenas três itens: banana, batata doce e ovos. No entanto, em função da necessidade de ajudar mais agricultores e de fornecer uma cesta mais completa para as famílias, o Campo Favela aumentou o mix de produtos das cestas. Grande parte do projeto foi feito com entrega de uma cesta que variava de 6 a 10 itens.

Dois critérios ajudavam na definição do mix de produtos frescos da cesta: a disponibilidade do produto no campo e a preferência por determinados produtos nas favelas. Algumas pesquisas feitas com os líderes das comunidades atendidas pelo Campo Favela, determinavam as preferências de consumo da população local.

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do quilo da banana ser relativamente baixo, de ser um produto com boas propriedades nutricionais, e de ter grande aceitação junto às famílias. O ovo foi um dos produtos mais demandados, passando a ser a principal fonte de proteína na alimentação das famílias.

Também foram levados em conta o valor nutricional dos produtos, a situação do produtor rural, e o preço dos alimentos. Em alguns casos, como no exemplo das folhosas, apesar de serem produtos com prazo de validade muito curto e preços relativamente altos (por kg), optou-se por incluir na cesta para ajudar produtores que estavam perdendo uma quantidade imensa de sua produção por falta de demanda. Por outro lado, alguns produtos não entraram na cesta, como por exemplo o espinafre e o palmito. O primeiro por não agradar grande parte das famílias e o segundo pelo alto preço unitário.

4.6 Definição dos locais de entrega

A primeira entrega foi feita em Paraisópolis, São Paulo, localização onde dois dos líderes do projeto tinham contatos de confiança e que reunia as condições necessárias para o recebimento e distribuição dos alimentos. Nas fases seguintes, a escolha dos locais de entrega dos produtos foi feita em parte pelos doadores institucionais, que já possuíam relações muito estreitas com algumas associações de moradores. O Campo Favela precisou usar esta relação de confiança para garantir que os produtos seriam entregues corretamente às famílias. Assim, a primeira entrega com doação institucional foi feita nas seguintes comunidades de São Paulo, através de associações sem fins lucrativas locais: Jardim Colombo, Heliópolis, Centro de SP, Cidade Tiradentes. Mais tarde, os doadores recomendaram que as entregas fossem feitas também no Complexo da Maré, Rio de Janeiro.

Com o aparecimento do Projeto nas mídias sociais, muitas associações entraram em contato com o projeto, o que levou a uma necessidade de definição clara de critérios de escolha dos locais de entrega dos alimentos. Uma lista de espera foi criada, mas para participar dessa lista, as associações precisavam seguir os seguintes critérios: a associação deveria possuir uma estrutura operacional adequada para receber, armazenar e fazer a distribuição dos produtos para as famílias. Também era feita uma análise para saber se determinadas favelas estavam mais ou menos assistidas. No decorrer do projeto, pode-se perceber que algumas favelas tinham uma capacidade maior de organização, tinham maior visibilidade da mídia e recebiam mais ajuda externa. Foi percebido que as favelas menores e mais periféricas no espaço da cidade, eram praticamente esquecidas pelas doações. Dessa forma, se tivessem uma estrutura operacional adequada, tivessem uma associação constituída e idônea, eram priorizadas pelo projeto. A questão de idoneidade das associações de moradores ou entidades que estava solicitando as doações, sempre foi uma forte consideração para o projeto. Dessas associações,

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os líderes do projeto Campo Favela sempre buscavam informações e referências para saber se essas associações ou entidades eram idôneos ou não.

Numa primeira fase (Abril 2020-Setembro 2020), as entregas foram feitas em São Paulo e no Rio de Janeiro. Segue uma lista das principais comunidades e respetivas associações, que foram atendidas pelo projeto nessa fase.

ü Paraisópolis - Bistrô Mãos de Maria, G10 favelas, entre outras associações locais (SP) ü Heliópolis - Unas Sacomã (SP)

ü Jardim Colombo - União Educacional e Esportiva (SP) ü Cidade Tiradentes - Evidência Paralela (SP)

ü Centro de SP - MSTC Movimento Sem Teto (SP) ü Complexo da Maré – Redes da Maré (RJ) ü São Miguel Paulista – NUA (SP)

ü Capão Redondo - NAVE (Núcleo de Acolhimento e Valorização da Educação) (SP) ü Parceria Banco de Alimentos (Prefeitura) – Parque Anhanguera (UMPA), Jardim

Lourdes (Ass. Moradores Sem Teto), Tremambe Zona Norte (Visarte), Jardim Helena (Ass. Força Jovem Vila Mara), Vila Lais (Viva Rim), Grupo de Ruas Cohab I (SP), Jardim Vista Alegre (Ass. Comunitária José Francisco), Pariquera-Açu (Palavra Viva), Pariquera Açu (Palavra Viva), Jardim Progresso (Ass. Criando um progresso), Água Branca (Ass. Cívica Feminina), Bairro Jardim Jacqueline (Ass. União dos Moradores do Jardim Jaqueline) ; Bairro Jardim Pedro José Nunes (Ass. Comunitária Conjunto Garagem Força e Raça); Bairro Parque Novo Mundo (Ass. Programa Nefesh – Núcleo de Assistência Social Integral); Bairro Jardim Helena (Ass. Grupo de Jovens Irmãos Guerreiros); Cidade Tiradentes (Ass. Beneficiente Curumim Raio de Luz); Vila Brasilândia (Ass. Moradores Francisco Nunes); Vila Araguaia (Ass. Beneficiente Araguaia); Bairro da Sé (Instituto de Desenvolvimento Social e Cidadania de SP); Bairro Jardim do Francos (Ass. Salinha Construindo o Saber); Bairro Jardim Santo André (ONG da Área Social Parque das Flores). ü Comunidades Indígenas Jaraguá (Tekoa Pyau, Tekoa Ytu, Tekoa Itakupe, Itawera, Yvy Porã, Tekoa Itaendy), Comunidade Indígena Funiô, Aldeia Multietnica de Guarulhos - Instituto Akhanda

ü Boqueirão, Eucaliptal (Santo André) e Moradores Rua Largo São Francisco - Associação Centro Espirita Casa de Caridade Jesus de Nazaré (SP)

ü Vila Andrade - Parque Burle Marx (SP) ü Santo Amaro – Instituto Anglicano (SP) ü Cidade Ademar – Fundação Despertar (SP)

ü Favela Sorocaba e Vila Cututuca (Santo André)– Inst. Assistência Educacional Dr Klaide e Ass. Flaminguinho Favela Sorocaba (SP)

ü Cracolândia – Coletivo Tem Sentido (SP) ü Guaianazes – Ass. Ponto e Virgula (SP) ü Guaraúna - Ass. Guaraúna Arte Cultura (SP)

ü Jardim São Lucas Tadeu – Ocupação jardim União (SP) ü Vila Medeiros - Cozinha Marmita Social Mocotó(SP) ü Bairro Jardim Japão - Cozinha Marmita Social Jamile (SP) ü Bairro Eldorado – Acer Brasil (SP)

ü Sumaré - Liga Solidária (SP)

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Com a última grande doação institucional proveniente da Yara Fertilizantes, o projeto se expandiu a partir de Outubro de 2020 e até Fevereiro de 2021, para outros 4 estados: Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Goiás e Bahia. Em São Paulo, a cidade de Cubatão (SP) foi incluída no plano de entregas. As principais comunidades e respetivas associações que foram atendidas pelo projeto nessa fase (para além de outras mencionadas acima na cidade de SP), foram:

ü São Paulo

ü Cubatão - Bolsão 9, Mantiqueira, Posto Paulínia, Jardim São Marcos, Varandas, Vila Elizabeth (SP)

ü Minas Gerais

ü Serra do Salitre - Casa da amizade e Rotary (MG) ü Cruzeiro da Fortaleza – APAE (MG)

ü Uberaba - Banco de Alimentos (MG) ü Goiás

ü Catalão - Fundação Legionarias do Bem Estar Social (Goiás) ü Bahia

ü Candeias - Associação Menino Jesus, Asmosac Malembá (BA) ü Rio Grande do Sul

ü Cruz Alta - Jd Primavera sem fome; Projeto Mãos de Luz (RS) ü Porto Alegre – Cemasi (RS)

ü Canoas - Banco de Alimentos (RS)

ü Rio Grande do Sul - Banco de Alimentos (RS)

4.7 Local de separação e embalagem

Na primeira entrega do projeto, feita em Paraisópolis, as cestas de produtos foram montadas na casa do varejista, e os produtos foram entregues para as famílias em sacolas plásticas. Apesar de apenas um dos produtos da cesta precisar ser pesado (batata doce), esse processo de separação consumiu um tempo muito grande e gerou distorções de quantidade, uma vez que os responsáveis pelo processo não possuíam balanças na quantidade adequada.

Com a entrada da startup parceira no processo, a grande maioria dos produtos passaram a ser pesados e separados no centro de distribuição dela. Nesse local, a maioria dos produtos eram pesados e colocados em caixas de papelão (mais sustentável) que depois eram enviadas para as favelas. Alguns dos produtos, como é o caso do ovo e das folhosas, não eram colocados nas caixas e eram transportadas em suas embalagens originais até a favela, evitando assim quebras do produto. Nas associações de moradores, os ovos, folhosas e bananas (entregues em suas caixas originais pela Coopafasb) eram colocados nas caixas no momento da entrega para as famílias.

Quando passamos a usar exclusivamente a Coopfasb para operacionalizar as entregas o Campo Favela deixou de montar a cesta, passando esta atividade para as associações de moradores. Essa mudança ocorreu por uma série de fatores. O primeiro deles é que o custo da mão de obra usada na separação. Outro motivo é que algumas associações de moradores das favelas eram capazes de fazer. Algumas associações montaram verdadeiras linhas de produção para pesar. Outras, deixavam as próprias famílias montarem suas cestas, sendo desnecessário inclusive as caixas de papelão. O terceiro motivo era que os líderes do projeto não queriam aumentar a complexidade da operação para a Coopafasb, uma vez que se fosse essa entidade a montra as cestas, seria necessário que investisse para compra de balanças e para contratação de pessoas.

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4.8 Acompanhamento da operação e controle da qualidade

Talvez esse tenha sido um dos maiores desafios do projeto, acompanhar a operação à distância. A primeira operação em Paraisópolis teve o acompanhamento presencial de um dos líderes do projeto, mas todas as demais operações ocorreram por meio de trocas de telefonemas, mensagens, e-mails, reuniões virtuais. Para garantir qualidade, os líderes participaram do planejamento e acompanhamento de todas as etapas no seu mais mínimo detalhe. Com o aumento do número de entregas (houve semanas com mais de 20 entregas em locais diferentes) essa tarefa passou a consumir um tempo muito grande da liderança do projeto. Foram montados procedimentos e criadas planilhas para facilitar nessa atividade.

Voluntários (alunos de graduação e pós-graduação do Insper) passaram ajudar no gerenciamento destas atividades. No entanto, o nível de comprometimento variado entre os voluntários, fez com que a liderança do projeto continuasse acompanhando de perto toda a operação.

Além disso, em situações de divergência do planejado, os líderes precisavam se envolver com a operação. Com frequência, era necessário reprogramar as entregas devido a algum problema com os envolvidos (motoristas, agricultores, associações, entre outros). Atrasos de caminhões, motoristas que não encontravam os endereços dentro de favelas, produtos que se deterioravam no caminho, baixa qualidade do produto, cestas abaixo do peso estabelecido, falta de pessoas nas associações para descarregamento dos caminhões, foram exemplos de contratempos ocorridos durante o projeto.

Todo esse processo era agravado pelo fato de os produtos serem perecíveis e extremamente sensíveis a altas temperaturas. Além disso, as associações não possuíam locais refrigerados para o armazenamento dos produtos, o que os obrigava a terem que distribuir rapidamente as cestas. Esses problemas eram ainda maiores nas entregas feitas nas cidades mais distantes, como o Rio de Janeiro, onde o tempo de viagem, juntamente com as restrições do horário de entrega, tornava a operação mais complexa.

4.9 Fluxo financeiro e controles

• Recebimento de doações de pessoas físicas

No início do projeto as doações das pessoas físicas foram depositadas diretamente na conta de um dos líderes do projeto. Essa escolha foi feita pela urgência que se tinha e por não imaginar as dimensões que a iniciativa iria tomar. Com a entrada do apoio do Instituto BEI, e a formação dos líderes do projeto, além de formalização do projeto nas mídias, optou-se em direcionar as doações para uma conta da BEI. Dessa forma, as doações de pessoas físicas passaram a ser feitas diretamente na conta da BEI, através de depósito bancário, e a partir de abril através da plataforma do PagSeguro disponível no site do Campo Favela.

• Recebimento das doações de doadores institucionais

Parte dos doadores institucionais optaram por pagar diretamente a startup e os agricultores que forneciam os produtos. Essa escolha se deu em função deles já possuírem uma estrutura para fazer os pagamentos e para poderem evitar o pagamento do imposto sobre doações (ITBI) que

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Na etapa de expansão nacional, os líderes do projeto optaram por deixar de usar a conta da BEI para receber doações, e passaram a usar os serviços de uma entidade chamada IPSIS que faz a gestão financeira para projetos baseado em doações. A IPSIS, ao contrário da BEI que não cobrou nada pelo apoio, cobrou uma taxa sobre o valor doado, mas trouxe uma grande flexibilidade para o processo de recebimento de doações e efetuação de pagamentos que foi fundamental para viabilizar a expansão do projeto para vários estados.

4.10 Objetivos e Resultados do Projeto: modelo sustentável e doação

O projeto começou com dois grandes objetivos. O primeiro deles era a ajuda emergencial para escoar os produtos que seriam jogados fora pelos agricultores familiares e garantir a disponibilidade de alimentos saudáveis para famílias carentes que estavam sem renda. O segundo era criar uma cadeia de suprimentos de FLV para regiões carentes das grandes cidades com menos perdas e desperdício, que permitisse que os agricultores familiares tivessem uma remuneração justa e que as famílias carentes pudessem ter acesso a produtos de boa qualidade a preços mais baixos.

O primeiro objetivo foi alcançado com grande sucesso pela dimensão que o projeto atingiu, com mais de 870 mil quilos de alimentos distribuídos para mais de 100.000 famílias carentes. Um dos maiores exemplos desse sucesso foi o impacto que o projeto teve na Coopafasb. Com a ajuda do projeto, os produtores de banana mantiveram uma renda mínima durante o período que a merenda escolar esteve suspensa. Além disto, tiveram condições de manter operando o seu galpão em Santo André, fundamental para a retomada das suas atividades de entrega de bananas para a merenda escolar. Mais de 1.500 produtores foram beneficiados pelo Campo Favela.

Já os resultados do segundo objetivo não foram atingidos conforme esperado. O projeto testou uma série de alternativas para se criar uma cadeia sustentável de FLV para regiões carentes. Embora alguns testes tenham mostrado resultados promissores, eles não ganharam escala suficiente para se comprovarem sustentáveis ao longo do tempo.

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5. Dificuldades enfrentadas e Lições Aprendidas

5.1 Modelo sustentável - Canal de vendas

No início, as tentativas para se criar um modelo sustentável foram canalizadas na venda através de hortifrútis localizados nas favelas. A escolha desse canal visava fortalecer o comércio já existente na favela e ajudar a manter empregos localmente. Esse modelo fracassou por uma série de fatores. O principal problema verificado é que esses hortifrútis não possuíam uma escala grande o suficiente para absorver um lote de produtos capaz de minimizar o impacto do frete no custo dos produtos. Esses hortifrútis demoraram muitos dias para conseguir vender todos os produtos o que os obrigava a baixar os preços para evitar o desperdício. O fluxo regular de clientes que tinham era menor do que o necessário e isso obrigou-os a fazerem grandes esforços para escoar os produtos. Esses pequenos varejistas de favelas, na sua grande maioria, não possuem condições de armazenagem refrigerada na quantidade necessária, o que fez com os produtos estragassem mais rápido o que forçou liquidações no final do dia.

A baixa aceitação dos varejistas em comprarem regularmente produtos diretamente dos produtores familiares, também foi um fator que contribui para abandonarmos esse canal. Como um dos pilares do projeto era pagar uma remuneração justa aos agricultores familiares, capaz de cobrir seus custos de produção e gerar uma renda digna, o valor a ser pago pelos varejistas em alguns momentos ficava maior do que o preço do Ceagesp. O preço do Ceagesp oscilava muito e normalmente era maior do que o preço combinado com os produtores familiares, mas havia momentos que isso não ocorria. Nesses momentos, os varejistas não estavam dispostos a efetuar a compra. Eles alegavam que se comprasse mais caro que o preço do Ceagesp não teria um preço competitivo para vender junto aos consumidores e que, como eles comparavam os preços entre os varejistas, não conseguiria vender. Outro problema foi a dificuldade de gestão do caixa. O Campo Favela chegou a ajudar os varejistas com o capital de giro necessário para que pudessem fazer as compras de pequenos agricultores. Porém, observou-se a incapacidade de se fazer uma boa gestão deste capital, apesar de o projeto ter inclusive o apoio da Insper Júnior e de professores da área financeira para tentar viabilizar que esses pequenos varejos pudessem implantar um controle de baixo custo e eficaz. Uma das razões aqui foi o alto endividamento desses pequenos varejistas durante a pandemia, e a taxas de juros exorbitantes que estavam sendo cobradas aos mesmos.

O Campo Favela também tentou criar um modelo sustentável através de algumas associações de moradores das favelas. Assim como feito com os varejistas, algumas associações tentaram vender os produtos a preços inferiores aos praticados no comércio local. Era importante que este valor cobrisse o valor pago pelos produtos e sobrasse uma remuneração mínima para a associação. A principal vantagem das associações em relação aos varejistas era que eles tinham acesso a uma quantidade muito maior de famílias, o que permitiu a venda em maior escala. O resultado dessas ações foi um pouco melhor do que ocorreu junto aos varejistas, mas a receita gerada não foi suficiente para gerar um modelo sustentável. A margem de lucro para a associação ficou limitada pela necessidade de se pagar preços justos aos agricultores e, ao mesmo tempo, ter um preço menor que do comércio local. Houve casos em que os varejistas locais, sabendo que as associações estavam comercializando produtos, baixaram seus preços.

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de boa aceitação pelas famílias, com produtos frescos e de alta qualidade e com preços bem menores do que o encontrado no comércio local. Essa cesta seria entregue periodicamente (ex: semanal ou quinzenal). Acreditava-se que por todas essas características as famílias estariam dispostas a aderir a esse modelo, apesar de exigir um certo planejamento. Esse modelo é muito parecido com o de Assinaturas praticado por famílias de classe mais alta interessados em comprar produtos saudáveis (normalmente orgânicos). A existência de assinantes daria uma visibilidade da demanda de produtos com boa antecedência, o que permitiria com que o varejista/associação comprasse a quantidade exata de produtos, evitando o desperdício de alimentos e acelerando o processo de venda. Como esse modelo de assinatura era uma mudança grande no hábito de compra e sabendo que os consumidores das favelas muitas vezes possuem um rendimento variável e não possuem reservas de dinheiro, decidiu-se começar pela venda da cesta com uma semana de antecedência da entrega. Nesse modelo, as famílias precisavam se comprometer a comprar apenas a cesta da próxima semana. O que aconteceu foi que poucas famílias fizeram o pedido com antecedência e algumas dessas famílias não apareceram para retirar a sua cesta. Com o fracasso desse modelo, o varejista e as associações tiveram que vender os produtos no modelo tradicional, aumentando os riscos de desperdícios. Quando havia sobra das cestas, o varejista ou a associação vendiam os produtos que tinham no modelo a granel (separado). Isto facilitou a compra pelas famílias, pois compravam o produto e a quantidade desejada, mas não gerava a previsibilidade necessária para o varejista ou associação, e para o produtor.

5.2 Controle das doações

A entrada da BEI em substituição ao uso da conta bancária pessoa física de um dos líderes, trouxe muito mais credibilidade para a captação de doações de pessoas físicas e evitou problemas legais para a equipe do projeto. Por outro lado, essa transferência obrigou o projeto a implementar uma série de procedimentos. A BEI possuía uma política de controle tanto das doações como das despesas incorridas. Para as doações de pessoas físicas, havia a necessidade de coletar uma série de dados pessoais de cada doador (cpf, endereço, e-mail, entre outros) para que a BEI pudesse arquivar as mesmas, mandar um comprovante, registrar na Secretaria da Fazenda para eventual pagamento de ITBI e informar esses dados a órgãos público reguladores de organizações sem fins lucrativos. A coleta dessas informações gerou uma carga de trabalho adicional gigantesca para os líderes do projeto. Para facilitar a obtenção desses dados, foi criado um formulário no site Campo Favela, para que os doadores preenchessem antes de efetuarem a doação. No entanto, mesmo assim havia casos em que as informações estavam incompletas ou incorretas. Além disso, esse processo "burocrático" dificultava a doação, já que por vezes as pessoas têm receio de abrir seus dados pessoais em sites.

Para as doações de outros doadores institucionais, foi necessário o envio de diversos documentos (contrato social, termos de doação), o que em algumas situações gerou stress no processo. Os próprios líderes do projeto tiveram que firmar contrato e enviar alguns documentos com firma reconhecida informando que estavam atuando como voluntários para a BEI.

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5.3 Pagamentos e controle dos pagamentos

Os pagamentos aos fornecedores do projeto eram feitos inicialmente pela conta bancária pessoa física de um dos líderes do projeto, e depois pela BEI ou diretamente por outros doadores institucionais. Para que esses pagamentos fossem efetuados foi necessário que os fornecedores (startup e Coopafasb) enviassem uma série de documentos e assinassem contratos com a BEI e com outro doador institucional. Esse trâmite de documentos demandou um grande esforço dos líderes do projeto e tirou a flexibilidade de se comprar produtos de outros fornecedores. Além disso, havia exigências do formato com que as notas fiscais eram emitidas e a necessidade de se montar controles detalhados de todos os gastos envolvidos e apontamentos dos documentos demonstrando de forma auditável que cada entrega ocorreu como registrada (termos de recebimento assinados pelo presidente da associação, fotos da entrega, entre outros). A exigência dos termos de recebimento assinado pelo presidente da associação, dificultou bastante o processo pois muitas vezes o presidente não estava presente no momento que a doação chegava. O trabalho de gerar os documentos de cada doação, recolher as assinaturas e enviar para que a BEI liberasse o pagamento de cada nota fiscal, gerou também um grande esforço de tempo para os líderes do projeto. Voluntários da graduação e pós foram colocados nessa atividade, mas mesmo assim exigiu muita dedicação dos líderes do projeto. Além disso, alguns potenciais fornecedores tiveram que ser descartados pois eles não conseguiam emitir notas fiscais eletrônicas conforme exigências da BEI.

Ao longo de todo o projeto, foi fundamental o controle financeiro para garantir que as despesas não superassem o saldo doado. Esse controle era importante para um bom planejamento das compras, e depois para acompanhar se as notas fiscais estavam de acordo com o que havia sido entregue. O controle financeiro precisou ser feito para cada um dos doadores, o que também demandou tempo.

5.4 Dedicação dos voluntários

A liderança do projeto era constituída pelos cinco professores do Insper, que atuaram do início ao fim do projeto Campo Favela, e de forma 100% voluntária. Esses professores atuavam em três áreas diferentes: Operações, Marketing e Finanças. Entretanto, quando as atividades do projeto começaram a aumentar, foi feita uma divisão de papéis e responsabilidades de cada um. Naturalmente, os professores assumiram as tarefas mais ligadas à sua área. Essa divisão funcionou bem em linhas gerais. É claro que havia momentos que um professor estava mais sobrecarregado que o outro, mas de forma geral as atividades foram bem distribuídas.

Com o crescimento do projeto, muitos voluntários se prontificaram a ajudar no projeto. Embora todos os voluntários sempre foram muito bem vindos ao projeto, a heterogeneidade de tempo de dedicação, capacidade de alto aprendizado, necessidade de liderança, em muitos momentos sobrecarregou os líderes do projeto (houve momentos que um líder coordenava grupo de quase 20 voluntários, ou participava de mais de 10 grupos de Whatsapp).

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6. Encerramento do projeto e lições aprendidas

Depois de onze meses de projeto, com o nível de energia de todos os líderes esgotado, e com a dificuldade cada vez maior para conseguir novas doações, mas com o sentimento de dever cumprido, os líderes resolveram encerrar o projeto. Foi uma decisão difícil, pois é sabido que os dois elos vulneráveis da cadeia de alimentos saudáveis para os moradores de áreas mais carentes ainda precisam de ajuda. A decisão de encerramento foi, no entanto, uma decisão para que os professores / líderes do projeto tivessem mais tempo para voltarem a estudar e pesquisar como ajudar esta complexa cadeia de suprimentos. A parte operacional do projeto foi encerrada em fevereiro de 2021, mas as pesquisas e a vontade de transformar para melhorar as comunidades urbanas e rurais atendidas continuam. Os aprendizados e material de divulgação continuam compartilhados nas redes sociais e na própria página do Projeto.

O projeto Campo Favela foi recheado de desafios, mas ao mesmo tempo trouxe vários aprendizados. Algumas das lições aprendidas com o projeto são:

6.1 Geral

ü A criação de um modelo sustentável de fornecimento de alimentos frescos requer um profundo conhecimento dos diversos elos da cadeia produtiva (produtores, intermediários, varejistas e consumidores);

ü O contexto em que essa tentativa de criação de modelo sustentável acontece, pode afetar a sua viabilidade – o contexto pandemia atribuiu ao projeto Campo Favela um caráter mais emergencial do que de sustentabilidade. De qualquer forma, algumas das comunidades tentaram implementar um modelo mais sustentável, tirando vários aprendizados para ações futuras;

ü Apoio e treinamento em conhecimentos básicos de gestão e de técnicas agrícolas podem ajudar os elos da cadeia a superarem suas dificuldades mais básicas;

ü A aplicação de novas tecnologias pode ajudar no controle de desperdícios e na redução dos custos desta cadeia, mas é fundamental que estes locais, em especial as favelas e as áreas rurais tenham acesso a rede (internet) de boa qualidade.

6.2 O campo

ü Acesso a mecanismos formais de pagamento e recebimento aos pequenos produtores familiares. Alguns produtores, por exemplo, não puderam trabalhar com o Campo Favela pois não sabiam como emitir boletos bancário;

ü Dificuldade de conseguir fornecedores confiáveis, que conseguissem atender no prazo, na quantidade e na qualidade desejada;

ü Falta conhecimento de práticas de gestão e de tecnologias agrícolas; ü Falta acesso a tecnologia de comunicação (acesso a internet no campo);

ü Falta conhecimento dos preços de compra e venda praticados no mercado de consumo; ü Falta conhecimento dos hábitos e desejos dos consumidores finais;

ü Grande dependência de intermediários para efetuar a venda de um produto altamente perecível, gerando pressão para aceitar ofertas pouco justas;

ü Produtor não contabiliza e não conhece claramente os seus custos de insumos;

ü Ao mesmo tempo, a grande volatilidade dos preços pagos aos produtores, acaba gerando uma enorme dificuldade para se definir um preço justo de forma confiável;

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ü Os intermediários podem, em alguns casos, gerar um aumento do preço e um maior desperdício devido ao maior manuseio do produto;

ü Os lotes econômicos de produção (agrícola) e de transporte são muito diferentes das necessidades dos pequenos varejistas das favelas. Isto dificulta a compra e distribuição direta, gerando a necessidade de intermediários;

ü Os pequenos produtores familiares não possuem escala para atender canais mais estruturados como o de supermercados e hipermercados;

ü A comunicação e a confiança entre os elos da cadeia é fundamental para uma relação ganha-ganha.

6.3 A favela

ü A criação de um modelo sustentável pode exigir a mudanças de mentalidade e hábitos das famílias de baixa renda;

ü Existe a necessidade de se entender hábitos de consumo e gostos dos moradores das favelas. Deve-se ainda destacar que as favelas são diferentes e possuem necessidades diversas;

ü Algumas favelas não puderam ser atendidas por falta de associações formalizadas e minimamente organizadas;

ü As entregas em favelas menores são mais difíceis e custosas, pois não alcançam um volume mínimo de entrega;

ü Houve uma desconfiança de alguns moradores das favelas em relação as vendas das cestas (nos locais onde as associações estavam implementando o modelo sustentável). Essa desconfiança surgiu, por desconhecerem o projeto Campo Favela, e acharem que as cestas eram doadas às comunidades. A comunicação com os moderadores das favelas por meios mídias sociais, auxiliou o esclarecimento de questões como estas.

ü Os pontos de distribuição (normalmente as associações) nem sempre tinham a melhor localização e estrutura (refrigeração, espaço e pessoas) para estocar e distribuir os alimentos;

ü Muitas famílias de moradores têm o hábito de fazer as compras para o consumo diário, e não conseguem comprar de forma antecipada pela incerteza da renda e pela falta de planejamento orçamentário familiar, o que dificulta a implementação de uma compra e venda planejada de FLV;

ü O papel das lideranças das associações trouxe confiança no processo de recebimento e distribuição dos produtos doados;

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6.4 A logística

ü Uma logística confiável e ágil é fundamental para se trabalhar com produtos muito perecíveis, como é o caso de frutas, legumes e verduras;

ü Conhecer e entender as características dos produtos frescos é fundamental para evitar desperdícios nas etapas de transporte, estocagem, carregamento e descarregamento da mercadoria;

ü O modelo de montagem de kits apresentou vários desafios relacionados a custos de embalagem, custo de transporte e questões relacionadas a sustentabilidade (lixo de embalagens);

ü Algumas favelas sé eram acessadas por veículos específicos, devido a características da infraestrutura local, em especial pavimentação e largura das ruas;

6.5 A gestão do projeto social

ü Existe uma grande oscilação no valor de doações de pessoas físicas e jurídicas o que dificultou o planejamento e estruturação da operação do projeto;

ü Ter influenciadores que endossem o projeto ajuda na captação de recursos;

ü Existe um ciclo onde mais mídia gera mais doação, que gera maior impacto e, que por sua vez, acaba gerando mais mídia positiva para o projeto;

ü A captação por diferentes meios (cartão de crédito, boletos, sites de doação...) faz com que seja necessário um bom gerenciamento do fluxo de caixa, pois o “timing” para dinheiro ficar disponível para uso era grande e, além disto, as tarifas podem ser significativas;

ü A gestão dos doadores jurídicos foi complexa, pois normalmente vinham com exigências para atender determinados locais, com produtos e quantidades específicas, e exigências de documentação e comprovações nem sempre simples de serem obtidas;

ü Tocar um projeto social em paralelo a atividades do dia a dia pode não ser sustentável no longo prazo: um projeto social demanda muito esforço e dedicação, tem muitas atividades urgentes, ao mesmo tempo em que é extremamente gratificante e atrativo para seus líderes. A combinação desses três fatores acaba drenando muito do tempo dos seus líderes o que acaba afetando o desempenho das atividades profissionais e seu convívio familiar/social. A profissionalização de projetos sociais deve ser considerada para que se consiga projetos mais perenes.

Referências

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Local de realização da avaliação: Centro de Aperfeiçoamento dos Profissionais da Educação - EAPE , endereço : SGAS 907 - Brasília/DF. Estamos à disposição

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