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CONSULTA. A consulta veio acompanhada de mais de uma dezena de documentos. 1

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Professor Associado do Departamento de Direito Processual da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo

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CONSULTA

Honra-m e o eminent e advogado Dout or Alexandre P acheco Martins , formulando consulta , com pedido de parecer, sobre acordão proferi do no j ul gam ento do Habeas Corpus regist rado s ob o nº 1410141 -30.2016.8.12.0000 , que t ramit a perant e o Egrégio Tri bunal de J ustiça do Mato Gros so, no qual fi gura com o paci ent e Luiz Eduardo Auri cchio Bot tura , vis ando o trancam ento de ação penal regist rada sob o n. 0800168 -68.2015.8.12.0022 , da Vara Úni ca da C omarca de Anauril ândi a.

A consult a veio acomp anhada de mais de uma dezena de docum entos.1

O questi onamento di z respeit o, basi cam ente, à possiblidade de s e reconhecer a nulidade parcial de um a denúncia, em que são imput ados vários cri mes.

Assim , rel at ado o assunto, o cons ul ent e formul a os quesitos abaixo arrol ados.

1 Foram enviadas cópias eletrônicas dos seguintes documentos: (1) Petição inicial do Habeas Corpus nº Habeas Corpus nº 1410141-30.2016.8.12.0000, do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do SUL; (2) Acórdão do Habeas Corpus nº 1410141-30.2016.8.12.0000, do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do SUL; (3) Embargos de Declaração do Ministério Público do Mato Grosso do Sul, contra Acórdão do Habeas Corpus nº 1410141-30.2016.8.12.0000, do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul; (4) Embargos de Declaração de Eduardo Bottura, contra Acórdão do Habeas Corpus nº 1410141-30.2016.8.12.0000, do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do SUL; (5) Acórdão do Habeas Corpus nº 1410471-27.2016.8.12.0000, do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do SUL; (6) Embargos de Declaração de Eduardo Bottura, contra Acórdão do Habeas Corpus nº 1410471-27.2016.8.12.0000, do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do SUL; (7) acórdão do Recurso em Habeas Corpus nº 75.180/MS, do Superior Tribunal de Justiça; (8) acórdão do Recurso em Habeas Corpus nº 75.287/MS, do Superior Tribunal de Justiça; (9) acórdão do Recurso em Habeas Corpus nº 76.033/MS, do Superior Tribunal de Justiça; (10) acórdão do Recurso em Habeas Corpus nº 76.060/MS, do Superior Tribunal de Justiça; (11) acordão dos embargos de declaração no Recurso em Habeas Corpus nº 76.060/MS, do Superior Tribunal de Justiça; (12) acórdão da Reclamação nº 32.616/MS, do Superior Tribunal de Justiça; (13) denúncia no processo nº 0800168-68.2015.8.12.0022, da comarca de Anaurilândia,

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QUESITOS

1. O que é o obj eto do process o penal?

2. O processo penal pode ter obj eto compos to?

3. No caso de cumulação de obj et os do process o, t al obj eto s erá divisí vel?

4. No caso de cúm ul o obj etivo, cada capí tulo da acusação poderá receber um t rat am ent o aut ônomo dos demai s?

5. O crime do art. 288 do Códi go Penal apres enta rel ação de subordi nação ou de acessori edade com al gum outro delit o?

6. No cas o concre t o, o provim ento do Recurso em Habeas Corpus nº 65.747/MS e R ecurs o em Habeas Corpus nº 70.596/MS, pelo Superi or Tri bunal de justi ça, impli cou a nulidade t otal da denúnci a ofert ada no process o nº 0800168 -68.2015.8.12.0022, que t ramit a na Vara Úni ca de Anau ril ândi a?

7. Do ponto de vi s ta da teori a da nul idade process uai s, é correto o reconhecim ento de uma nulidade parci al da denúnci a?

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3 PARECE R

1. A p retensão p rocessu al como objeto do proces so

A defi nição da possi bilidade de anul ação parci al da de uma denúnci a exi ge que se fixem duas prem issas: (1) o que é o obj eto do process o penal; (2) o obj eto do proces so penal pode s er divisí vel . O pres ent e it em res ponderá a prim ei ra quest ão.

O obj eto do processo penal é a pret ens ão process ual . Por s ua vez, o conceit o de pret ens ão proces sual, com o objeto do process o penal , leva ao conceito de i mput ação penal.

Im putar si gni fica at ribuir um fato penalment e rel evante a al guém .2 No processo penal , a imputação é o ato processual por m eio do

qual s e formul a a pret ens ão processual . É a form ulação da pret ens ão penal .3

A imput ação é a afirmação do fat o que s e at ribui ao suj eito, a afi rmação de um ti po penal e a afirm ação da conformidade do fato com o tipo penal.4 Como sint etiza Frede ri co Marques , “na imput ação, há os seguint es el em entos: a) descri ção de fat os; b) qualificação j urídico -penal desses fatos; c) a atribuição dos fatos descritos a alguém”.5

Seu conteúdo, pois, s ó pode s er a at ribuição do fato concreto que se enquadra em um ti po penal. O objeto da imput ação é o fato que foi atribuído a

2  Nesse sentido: Luigi Sansò, La correlazione fra imputazione contestata e sentenza. Milano: Giuffrè, 1953, p. 93; Giovanni Leone, Trattato di diritto processuale penale. Napoli: Jovene, 1961, v. 2, p. 255. 3  Francesco Carnelutti, Cenni sull‟imputazione penale. Rivista di Diritto Processuale, 1948, p. 207. 4 Nesse sentido: Francesco Carnelutti, Lecciones sobre el proceso penal. Trad. de Santiago Sentís Melendo. Buenos Aires: Bosch, 1950 v. 4, p. 9; Sansò, La correlazione..., p. 263, nota 13.

5 José Frederico Marques,Elementos de direito processual penal. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1965. v v. 2, p. 237.

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4 alguém.6

A infração penal é um fato j urí di co, isto é, um fat o conform e um modelo ou ti po penal . Logo, o cont eúdo da imput ação é a afirmação de que um a pes soa (o imput ado) prati cou um fato previst o em um a norma com o infração penal .7

Em estudo sobre o t em a, j á nos posi cionamos no sen tido de que, sendo a pretensão processual objeto do processo, “e sendo a imput ação o m ei o pel o qual se form ula t al pret ens ão, o obj eto do process o penal não pode ser a imputação, que é o veículo da pret ens ão.8 Por iss o, o ob jeto do processo p enal não é a i mputação, mas sim aquilo qu e foi i mpu tado , ist o é, o objeto dessa i mpu tação .

2. Do objeto do p rocesso si mples e do objeto do p rocess o composto

Sendo o obj eto do process o penal a pret ens ão process ual , cuj o cont eúdo se identifi ca com o cont eúdo da imput ação, ist o é, o fat o concreto penalm ent e rel evante, que s e atribui ao acusado, coloca -s e a segunda quest ão: o obj eto do process o penal é incindí vel ou poderá s er dividi do.

Evident e que há um núcleo míni m o para constitui r obj eto de um proces so penal. É preciso que s e im put e, ao m enos , um cri me, em todos os s eus aspect os concret os, at ribui ndo -o a um acusado. Ou s ej a, o conteúdo m ínimo de uma im put ação penal é a at ribuição de um úni co cri me, a apenas um acus ado. Por exempl o, s eria o caso de i mput ação de um crim e de roubo, ao acusado A.

Para jul gar a im put ação o j uiz resol ve quest ões de fat o e de direito . Tais questões não são aptas a caract erizar capí tulos aut ônom os

6  Assim, Sansò (La correlazione..., p. 93), para quem “a imputação é a atribuição de um fato a um sujeito. „Conteúdo‟ da imputação é, por isso, a atribuição do fato; objeto da imputação é o fato atribuído”. Franco Cordero (Considerazioni sul principio d‟identità del fatto. Rivista Italiana di Diritto e Procedura

Penale, 1938, p. 910): “o fato constitui o objeto do processo”.

7.  Nesse sentido: Carnelutti, Lecciones..., v. 4, p. 9; Sansò, La correlazione..., p. 305; Giuseppe Sabatini,

Principii costituzionali del processo penal. Napoli: Jovene, 1976, p. 60.

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da denúnci a e, consequent ement e, no futuro, da s entença.9Embora a solução das ques tões de m érit o i nfl uenci e na form ação l ógi ca da sent ença e concorram para det ermi nar s eu conteúdo, consideradas is oladam ente não poss uem relevo aut ônom o; pelo cont rário, vis am à preparação de um ato fi nal sobre o obj eto do processo.10

Por outro l ado, é pos sível que o objeto d o processo pen al se apres ente composto . Is to é, form ado por m ais de um a im putação, que por si só seri a apt a a caract erizar o conteúdo i sol ado de um process o penal . Há variáveis possi bilidade de obj etos do process o cumulados: (i) cúm ulo obj etivo, (ii ) cúmulo subjetivo; (i ii) cúm ulo obj eti vo -s ubj etivo.

No caso do cúm ulo obj etivo, há a im put ação de m ais de um cri me. A im put ação conjunt a, em um úni co pro cess o penal, norm alm ent e decorre da aplicação de regras de conexão ou de con ti nênci a. Por exempl o, i mput a -s e ao acus ado A,o crim e de roubo e o de resi stênci a.

J á no cúmulo s ubj eti vo há a at ribui ção de um m esmo crim e, há m ais de um acusado. Is so poder ocorrer em crim e de concurso necess ári o de pess oas como, por exemplo, na associ ação criminos a, ou em delit o de concurso eventual de pes soas, com no caso em que A e B, em concurs o de agent es, praticam um roubo.11No process o com cum ulação subjeti va haverá a formação de um liti scons órcio passi vo.

Por fim, é pos sível que haja um cú mulo obj etivo -subj eti vo, em que há m ais de um crim e, im put ado a mai s de um acus ado. Ness e caso, é pos sível que ambos crim es sej am atribuí dos a mai s de um suj eito, em concurs o de agentes. Por ex emplo, im put a -s e a A e a B apráti ca tanto do roubo, quanto da re sist ênci a. M as tam bém é possí vel que haj a c úm ulo obj etivo -s ubj etivo, atribuindo -se um deli to a um acus ado, e outro crim e,

9 Nesse sentido é o pensamento de Carnelutti, para quem os capítulos de sentença identificam-se não com algo que possa ser objeto autônomo de uma demanda, mas com as questões. Para o autor (Sulla “reformatio in peius”, p. 184), “dei capi della sentenza, debbono esserci dei capi nella lite. (...) Il vero è che il capo non è una parte o frazione dell‟interesse o del bene in lite; ma una delle questioni” (destaques do autor). E, em outro estudo (Capo di sentenza. Rivista di Diritto Procesuale, 1933. p. 122), explica que essa definição não era absolutamente exata, sendo que, na verdade, “il capo non è la questione, ma la

soluzione della questione”. Correta, no entanto, a crítica de Tullio Segrè(Cassazione parziale e limiti del

giudizio di rinvio. Rivista di Diritto Processuale, 1935, p. 13): “le questioni intorno ai presupposti di fatto o di diritto della pretesa non sono parti ma causa della lite; e loro soluzioni non sono capi ma motivi della decisione” (destaques do autor).

10 Nesse sentido, Enrico Tullio Liebman. “Parte” o “capo” di sentenza, p. 54.

11 Em qualquer dos dois casos, o fundamento da unidade processual será a continência por cumulação subjetiva (CPP, art. 77, inc. I).

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a um s egundo acusado. Por ex emplo: at ribui -s e a A práti ca de corrupção ativa e a B a práti ca de corrupção passiva, em situação de bil a t eralidade da corrupção.

Havendo im put ação por m ais de um deli to, a denúnci a t erá seu objeto compost o por m ais de um cri me. C ada crim e, em si, podendo ser, em t es e, objet o de um a denúnci a autônom a, será um capítulo especí fico da acus ação. No caso de cum ul ação obj eti va, apenas formalment e a denúnci a e a sent ença s erão unit ári as em raz ão de regras de conexão e continênci a. Sub st anci alm ent e, porém , s er ão t antas acus ações quant os foram os crim es .E tantos capít ulos da sent ença, quant as forem as acusações.

3. Capí tulos da d en úncia e capítul os d a sen tença

Havendo cúmulo objeti vo, por s er o obj eto do processo com post o, i sso repercuti rá no conteúdo da s ent ença.

Se há um a regra de correl ação ent re acusação e s ent ença, é evi dente que, no cas o em que a acus ação apres enta a imputação de mais de um crim e, t ambém a sent ença terá que jul gar mai s de um delito . O mesm o se di ga no caso de cúm ulo s ubj etivo. A s ent ença jul gará t antos réus quantos forem os acusados na denúnci a ou queixa.

Sendo a denúncia um projeto de sentença.12 Se o projeto e com post o, o result ado fi nal t ambém o será.

Ness e caso, evi dent e que a s ent ença s erá decomponível em tant os capítul os quantos foram os capít ulos da acus ação. A divisibili dade do jul gam ent o será um refl exo que o cúmulo de pretensões produz na

12 Pablo Meza Figueroa, De la ultra petita en el proceso penal chileno. Santiago: Juridica de Chile, 1969, p. 32. Em relação ao processo civil, Hans Sperl (Il processo civile nel sistema del diritto. Trad. Giovanni Cristofolini. Studi di diritto processuale in onore di Giuseppe Chiovenda. Padova: Cedam, 1927. p. 819) afirma que “la petizione è il progettodi sentenza (Unteilsantrag) di una parte” (destaques nossos).

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sent ença.13 Cada deci são s obre uma das pret ensões s erá um capít ulo da sent ença, no cas o de cum ulação de pretensões.

O tem a é t ratado no process o ci vil, de forma m ais com pl exa, at é mes mo em razão da possibil idade não só de cum ul ação simpl es de pedidos , m as t am bém de form ulação de pedi dos alt ernativos e suces sivos. C omo ex plica C hiovenda, haverá tantos capítulos de sent ença quantos forem os capítulos da dem anda.14

De qualquer form a, no proces so penal , cada vez que s e imput a m ais de um deli to ao acusado, na verdade, s e est á di ante de vári as im put ações, ou m elhor, de t ant as i mput ações quantos s ão os delit os at ribuídos.

Na doutrina nacional , embora com conceito at é m ais amplo, por abranger t odas as questões , jul gadas, susci tadas ou dis cuti das no processo, Frederico Marques também entende que “cada um dos pedidos cum ulados em simultaneus processos, denominam -s e „capítulos de sentença‟”.15

No process o penal , t alposi ção é defendi da por Carnel utti: “toda imputación tiene por objeto un hecho; si

13 Segundo Guiseppe Chiovenda (Principii di diritto processuale civile. Nápoles: Jovene, 1965, § 91, p. 1.128), “si ha cumulo obbiettivo quando l‟attore propone contro il convenuto più domande ciascuna delle quali possa immaginarsi come oggetto separato di un rapporto processuale”. Na doutrina nacional, para Araken de Assis(Cumulação de ações, 2. ed. São Paulo: RT, 1995, p. 231), “o traço comum das ações cumuladas consiste na aptidão de cada ação de se incluir como objeto de uma relação processual independente. O autor as formula no mesmo processo por razões de economia”.

14 Para Chiovenda (Principii..., § 91, p. 1.136), “I capi di sentenza corrispondono ai capi di domana dell‟art. 73: quindi non si dirà che una sentenza ha più capi solo perchè ha più parti in senso logico, o sai perchè risolve più questioni” (destaques do autor). Essa posição também é aceita por Liebman (“Parte” o “capo” di sentenza. Rivista di Diritto Processuale, 1964. p. 53), para quem “risulta confermata l‟opinione

che fa corrispondere i capi di sentenza ai capi di domanda” (destaques do autor). Semelhante é a posição

de Piero Calamandrei(Appunti sulla “reformatio in peius”, Rivista di Diritto Processuale, 1929. p. 300), que define capo di sentenza como “l‟accertamento di una singola volontà di legge, cioè un atto giurisdizionale completo e tale da poter costituire da solo, anche separato dagli altri capi, il contenuto di una sentenza”.No mesmo sentido, na doutrina nacional, Marcelo José Magalhães Bonício (Capítulos da

sentença e efeitos dos recursos. São Paulo: RCS Ed., 2006, p. 39) afirma que: “quando há um cúmulo de

pedidos numa única demanda, fica fácil entenderemos que, cada uma das decisões acerca desse pedido, que poderiam ter sido formulados em demandas distintas, constituem um capítulo autônomo de sentença”. 15 José Frederico Marques, Manual de Direito Processual Civil, 9 ed. São Paulo: Saraiva, 1987, v. 3, p. 45. No mesmo sentido: Cândido Rangel Dinamarco, Capítulos de sentença, 4ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 77; Paulo Henrique dos Santos Lucon, Eficácia das decisões e execução provisória. São Paulo: RT, 2000, p. 382.

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varios hechos se imput an como delit os, l as imput aciones son vari as , no una sol a; tantas las

i mputaci ones como los hech os

i mputados ”.16(dest aquei).

Ainda no mesmo sentido é o posi cionam ento de Foschi ni :

“capi della decisione, invece, sono quelli el ementi logi ci dell a decisione che ri guardano non una qualsi asi questi one, ma s olo quelle tra di es se che avrebb e potuto costi tui re, in lin ea astratta, anch e autonoma materia di proces so ”.17 (dest aquei ).

Cons equênci a di sso é que a sent ença não poderá t er menor núm ero de capít ulos que o núm ero de i mput ações, sob pena de s er um a decis ão ci tra petita .

Por out ro l ado, cada capítulo, em regra, poderá ter deci são aut ônom a: as sim, é possí vel que t odos recebam deci são em seu mérit o, sendo absolutóri a em rel ação a um , e condenat ória quant o ao outro. Tam bém poderá haver j ul gam ento de mérito em rel ação a um, mas extinção s em resol ução do mérito, quanto ao outro.

4. Pedid os d epend entes e seus ef eitos s obre os capí tulos da sen te nça

Ent re os di versos pedidos formulados no process o e, consequent em ent e, entre os capítul os da sent ença, pode existir, ou não, um nexo de dependênci a ou subordinação.

Não há no ordenam ent o jurídico brasil eiro, no Códi go de Processo Penal , nem no novel Códi go de Process o Ci vil, um a dis cipl ina especí fica para os capítulos de sent ença dependentes.

16 Lecciones sobre el processo penal. Trad. de Santiago Sentís Melendo. Buenos Aires: Bosch, 1950, v. I, n. 78, p. 193.

17 Gaetano Foschini, Sistema del diritto processuale penale. 2. ed. Milano: Giuffrè, 1965, v. I p. 214-215.

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No di reito est rangei ro, o tem a é t rat ado pel o art . 336 do

Codi ce di Pr ocedura Civi le it ali ano, sob a rubri ca “Effetti della riforma o del la cassazion e ”:

“La riforma o la cassazione parziale ha effetto anch e sulle parti della s enten za dipen denti dall a parte riformata o cass at a.

La ri form a o la cas s azione es tende i suoi effetti ai provvedim enti e agl i atti dipendenti dalla sentenza riform at a o cass at a”.18 (dest aquei).

Ao fenôm eno di sci plinado no pri mo comma , a doutri na denomina “efeito expansivo interno”, enquanto que a regra do secondo

comma t em por objet o o “efeit o expansivo ext erno ”.19

Todavi a, m esmo sem previs ão equival ent e, tem si do adm itida a m esm a dis cipli na no processo penal brasilei ro.

Como j á ti vem o s a oportunidade de escrever, quant o ao sistema devoluti vo dos recursos penai s, “os capítulos acess órios fi cam abrangi dos pelo capí tulo principal, m esm o que o recorrent e não impugne o acess óri o ”.20

Nem poderia s er di ferent e, pois s e há uma rel ação lógica ent re duas partes da sent ença, que não podem s er trat adas is ol adam ent e, o recurs o que devol va o conhecim ento de um a delas, neces sariamente devolve a out ra parte logicam ent e dependent e, ao conhecim ento do tribunal.21

5. Refl exos p ráti cos da regra da ind ependênci a dos capí tul os

18 No ab-rogado Codice di Procedura Civile, o art. 543 estabelecia que: “(…) se la sentenza sia cassata in uno dei capi, restano fermi gli altri, salvo che siano dipendenti dal capo in cui la sentenza fu cassata”. 19 Nesse sentido: Crisanto Mandrioli, Diritto Processuale Civile. 13 ed. Torino: G. Giappichelli, 2000,v. II, p. 402; Enrico Tulio Liebman, Manuale di Diritto Processual Civile, 3 ed. Milano: Giuffrè, 1976, v. III, p. 40.

20 Gustavo Henrique Badaró, Manual de Recursos Penais. São Paulo; RT, 2016, p. 168. 21

Nesse sentido: Ary de Azevedo Franco, Código de Processo Penal. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1956, v. 2, p. 312. Na doutrina estrangeira: Vincenzo Manzini, Trattato di diritto processuale penale

italiano. 6. ed. Torino: UTET, 1972. v. 4, n. 470, p. 618; Ottorrino Vannini, Manuale di Diritto Processuale Penale Italiano. 5 ed. Milano: Giuffrè, 1965, p. 426-427; Mario Pisani, Il divieto della “reformatio in pejus” nel processo penale italiano. Milano: Giuffrè, 1967, p 33.

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No si stema recursal é que se projeta m , com mai s clareza, as diferenças ent re s entenças com capít ulos independent es , de um lado, e com c apí tulos s ubordinados ou dependent es, de outro.

Por exempl o, no caso de um a s ent ença com capítulos dependent es, a apelação cont ra apenas o capítul o principal , invest e o j uiz do poder de conhecer os capítul os subordinados ou dependentes.22 De se observar que, esse “efeito devolutivo externo”, como explica Bonsignori, não é pleno, m as limitado, podendo examinar e alt erar o capít ulo dependent e e que não foi obj eto de recurso, na exat a medida do necess ári o para tornar possível o jul gam ent o do capítul o do qual depende.23

Assim, o denominado “efeito devolutivo externo”, como proj eção da vincul ação ent re os capít ulos da s ent ença, deve ser trat ado com o ex ceção, como expli ca Segrè , em cl ássi co estudo s obre o tem a :

“sol o in quei casi eccezi onali, in cui un capo di sent enz a t rovi in un alt ro capo l a propri a bas e l ogi ca, l‟ingiustizia di questo implica logicamente l‟ingiustizia di quello, e appunto por questa ragione il giudice d‟appello conosce in questi casi anche del capo di cui non è stat a es pli cit ament e afferm ata l‟ingiustizia”24

O pos ici onam ento é igualment e apli cável ao process o penal, com o s e veri fica da s eguint e pas sagem de Frederi co M arques :

“Quando os capítulos da sentença dependerem

22 Nesse sentido, no processo civil: Chiovenda, Princípii …, p. 989. Na doutrina nacional: Frederico Marques, Instituições de Direito Processual Civil. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1963, v. IV p. 163. Bonício, Capítulos da sentença …, p. 46.

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Angelo Bonsignori (L‟effetto devolutivo nell‟ambito di capi connessi, Rivista trimestrale di Diritto e

Procedura Civile, 1976, p. 960): “L‟estensione del potere del giudice di esaminarlo non è assoluta e in

funzione del contenuto del capo pregiudiziale, ma strettamente limitata a rendere possibile il giudizio sul capo pregiudicato”

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uns dos out ros, a apel ação, posto que ad st rit a ao princi pal , invest e o Tri bunal do recurs o do poder de conhecer do subordinado ou acessório”.25

Na dout rina penal itali ana, Leone expli ca, com base no que se denomina “effetto estensivo della sentenza”, referindo -se a sentença do t ribunal no j ul gament o no recurs o :

“L‟effetto estensi vo dell a sentenza, consist e nell a decisione con la qual e il giudice, pronunci ando sull‟impugnazione di una parte, dispone la riforma o l‟annullamento della sentenza anche in confronto di un‟altra parte (il cui interesse si trovi in uno dei rapporti sopra indicati con quello dell‟impugnante), che non solo non ha proposta l‟impugnazione ma non ha neanche chiesto, avvalendosi dell‟effetto estensivo dell‟impugnazione, la riforma o l‟annullamento nel suo interesse”.26

Em sum a, som ente no caso em que haja um a rel ação de dependência ló gi ca ou est rit a subordinação, ent re um capítul o e out ro, é que o recurso e, consequent em ent e, a reform a do pri mei ro, impli cará, necess ári a e l ogi cament e, a alt eração do s egundo, para manter a coerênci a do jul gado.

Com vi stas a análi se do cas o concreto, é important e ass ent ar duas premi ss as, a pri mei ra expost a no it em 4, supra, e a out ra que consta do pres ent e it em: (i ) no cas o de cúmul o objetivo, em que a denúnci a contiver a imputação de mai s de um cri m e, em regra, cada capítulo s erá considerado autonomam ent e, com o s e foss e um a denúnci a s eparada ; (ii ) excep cionalm ente, mesm o no caso de cú m ulo objet ivo, se os capít ulos forem dependent es ent re si, por relação de prejudi ci ali dade ou subordi nação, o res ultado do capítul o princi pal , impli cará logi cam ent e mudança do capítulo subordinado ou subordi nado.

25 José Frederico Marques, Elementos de Direito Processual Penal, Rio de Janeiro: Forense, 1965, v. IV, p. 234.

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Assim , t endo em consideração o cas o concret o a s er analis ado infr a, nos itens 7 a 9 , som ent e se se concl uir que os capítul os da denúnci a que foram modi ficados pel os provim ent os dos R ecursos em

Habeas Cor pus , quai s sejam , o rel ativo ao crim e de corrupção, em que a

denúnci a cons i derada inept a, e o referent e a fal sidade ideol ógica, em que houve reconhecim ento da atipi cidade da condu ta, são pri nci pai s ou subordi nant es, em rel ação aos demais capítul os, e que est es necess ari am ente serão atingidos pelo efeito extensivo dos acórdãos do Superior Tribunal de J ustiça.

6. Do crime de quadrilha ou bando e sua relação com os crimes fins de tal associação

Na ação penal que se pret ende o t rancamento i ntegral imput ava-se a Eduardo Bott ura a práti ca de cinco cri m es , ent re os quais o de quadrilha ou bando.

Considerando que o crime do art. 288 do Código Pen al tem entre os seus elementos a finalidade de cometer crimes, é

necessário verificar se há relação de prejudicialidade ou

acessoriedade entre os crimes de corrupção ativa e de falsid ade ideológica, de um lado, e odelito do art. 288, de outro.

Poder-s e-i a imaginar a exi st ênci a de uma rel ação de aces soriedade, em bora limi tada, ent re a quadril ha, de um lado, e os cri mes que os int egrant es de t al as soci ação crimi nal pretendem cometer, de out ro . Iss o porque, o tipo penal do crim e de quadril ha ou bando poderi a s er cons iderad o acess óri o em rel ação aos crim es que são o propósit o de tal soci edade deli nquen ci al .

Todavi a, bem analis ada a quest ão, verifi ca -s e que s equer há ess a relação de acessori eda de. Isso porque, não é elemen to do crime d o art. 288 do Códi go Penal a existência ou a p rática d e ou tro cri me .

Tal rel ação exist e, por exempl o, no cri m e de recept ação, no favorecim ento real, no favorecim ent o pessoal , ou na lavagem de

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dinhei ro, por exemplo. A recept ação t em como um de s eus el em ent os “coisa que é produto de crime” (CP, a rt. 180, caput). No favorecimento pes soal, pres ta -s e auxílio a “aut or de cri me” (CP, art. 348, caput ) e no favorecim ento real, prest a -se auxílio “desti nado a tornar seguro o proveito do crime” (CP, art. 349, caput). Na lavagem de dinheiro, oculta -se ou diss imul a -s e característ icas de “bens , di reitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal” (Lei nº 9.613/1998). Em todos es ses casos , para que ocorra um dos crim es aces sórios acima exempli fi cados, é necessário a exist ênci a de um out r o cri me, que j á deverá ter si do prati cado.

Não é es ta, contudo, a situação do anti go crim e de quadrilha ou bando, atualm ent e denom inado ass oci ação criminos a. O t i po penal do art . 288 do Códi go P enal não pressupõe a existên cia de u m outro crime , mas apenas a in ten ção d e vir a p raticar crimes !

Ali ás, há um consenso de que s equer é necess ári a a práti ca de qualquer crim e para que exista a quadri lha, s endo perfeit am ent e possí vel a exist ênci a e a condenação por quadril ha, ainda q ue nenhu m cri me tenh a sid o pra ti cado pel os seus membros . Bast a que, efeti vamente, exista a associação com es sa fi nali dade, mes m o que s em a efeti va realização de tal escopo ilí cito. Explica Hungria:

“como se vê do art. 288, para que exist a o crime de quadrilha ou bando é sufi cient e o m e ro fat o de s e ass oci arem m ais de três pess oas (no mí nimo quat ro) para o fi m de cometer cri mes, sem necessidad e, sequ er, do começo de execução d e qualquer d eles , isto é, independent em ent e da at uação do m ais ou menos ext enso pl ano crim inoso que os associados s e hajam proposto”.27

E o posi cionam ento continua atual , com se veri fica em Luiz Regis Prado: “Não é necessário que a associação tenha cometido algum cri me para que o delito se concreti ze. A simples uni ão j á é o

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14 suficiente”.28

A juris prudência t am bém é t ranquil a nes s e s enti do, conform e se vê no s egui nt e aresto do Suprem o Tribunal Federal:

“O delito de formação de quadrilha ou bando é

formal e s e cons uma no mom ent o em que s e concretiza a convergênci a de vont ades , independent em en t e da realização ult erior do fim visado. Ordem denegada”.29

Enquanto que nos crimes que há rel ação de acess oriedade há necessidade de efet iva exist ênc ia e práti ca do crim e pri nci pal; na quadri lha est es s ão meram ente um intento ou seu fadário. Lá, exi ge -s e um crim e em at o; aqui, crimes em pot ê ncia!

Evident e que, um a denúnci a pelo deli to de quadrilha ou bando, porque est e tem como el em ent o intenção específica de prati car cri mes, deverá narrar, concret a e especificam ent e, da existênci a de

soci et as scell eri s – i sto é a reuni ão est ável e perm anent e de mais de t rês

pes soas, bem como o propósit o de comet er crimes, indicando quais seriam est es delit os que const ituem a met a optata da organiz ação de mal fei tores.

Is so não si gni fica, contudo, que será exi gi do uma im put ação com plet a dos crim es alm ejados pel a quadril ha.Desde que, na denúnci a em que s e imput a o delit o do art . 288 do Códi go Penal, est ej a des crito de forma indi vidualiz ada, de m olde a permi tir a at ividade probatóri a para verificação de sua ocorrênci a ou nã o, do especi al fim de agi r, com os delit os alm ej ados pela ass oci ação criminal, a denúnci a s erá apt a quanto ao crim e de quadrilha ou bando.

28 Tratado de Direito Penal.São Paulo: RT, 2014, v. 6, p. 247. No mesmo sentido Cezar Roberto Bitencourt, Tratado de Direito Penal. 5 ed. São Paulo: Saraiva, v. 4, 2011, p. 380.

29 STF, HC 84.223/RS, 1.ª Turma, rel. Min. Eros Grau, j. 03.08.2004, v.u. No mesmo sentido posiciona-se, também, o Superior Tribunal de Justiça: “O delito de quadrilha, formal e de perigo, envolve a associação de mais de três pessoas para o fim de cometer crimes. De acordo com a doutrina e a jurisprudência, não é necessário que tais infrações penais idealizadas venham a se concretizar para que se aperfeiçoe a tipificação” (HC 135.715/MS, 6.ª Turma, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 03.02.2011, v.u.). Cite-se, ainda. STJ, REsp 654.951/DF, 5.ª Turma, rel. Min. Laurita Vaz, j. 04.11.2004, v.u.; STJ, REsp 103.578/RJ, 6.ª Turma, rel. Min. Vicente Leal, j. 18.10.1999, v.u.

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Evident e que, se no mesm o processo, t ambém se at ri bui r, em cúm ulo objet ivo, a práti ca dos crimes j á efetivam ent e pra ti cados pel a quadri lha, para que a peça acusatóri a sej a apt a, com rel ação a ess es delit os – p. ex.: roubo de carga – , é necess ári o que haj a uma narrat iva com plet a e porm enoriz ada, com o fat o crimin oso e todas s uas circunst ânci as . Ou s ej a, no exempl o cit ado , s eri a necess ári o des crever, com se deu a subtração, qual a coisa alheia móvel, em que ci rcunstância de tem po, lugar e m odo de execução, quem a prati cou, et c...

Destaque-se que, em rel ação ao crime de falsidade ideológi ca, poderi a haver, concret am ent e, u m a rel ação cont ingent e de aces soriedade. Iss o s e a denúncia por quadril ha narrass e que t al grupo de mal fei tores alm ej ava a práti ca de crim es de fals idade ideológi cas – e soment e t ais crim es –, consist ent es exatament e no que se reconheceu s er uma condut a at í pi ca. Nesse caso, não seri a pos sível subsisti r a quadril ha. Mas ess a não é a sit uação do caso em anál ise, como s e verá na sequência.

7. Do caso concreto: análi se dos ob jetos d o p rocesso n º 0800168 -68.2015.8.12.0022

Est abeleci das as premiss as aci m a, cabe verificar, concretam ente, qual ou quais são os obj et os do process o regis t rado sob o nº 0800168 -68.2015.8.12.0022 , que trami ta perante o J uízo de Direit o da Vara Úni ca da Com arca de Anauril ândia, da J usti ça do Est ado d o M ato Grosso do S ul. Aos acusados, im put ou -s e os s egui nt es crimes: falsi dade ideológi ca, corrupção at iva, corrupção pas siva, as soci ação criminos a, viol ação de s i gilo funci onal, quebra il egal de si gilo tel efônico.

Segundo a denúncia, no ano de 2007, Marg ari da Elizabeth Weiler se associou a Eduardo Garci a d a Si lveira Net o, J uvenal Laurenti no Martins e Luiz Eduardo Auricchio Bot tura, cri ando um esquem a de favorecim ento de deci sões judi ciais que visavam ao enriquecim ent o dos mesmos, e à obt enção inform a ções si gi losas dos desafetos de Luiz Eduardo Auri cchi o Bot t ura .

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Além dos delit os acim a m encionados, Luiz Eduardo Auricchio Bott ura e Eduardo Garcia d a Silvei ra Neto t am bém foram denunci ados por corrupção ativa , e Margarida Eliz abeth Weil er , junt ament e com J uvenal Laurenti no M art i ns, por corrupção passiva. M ais especi ficam ent e, segundo a denúnci a, Luiz Eduardo Auricchi o Bottura e Eduardo Garci a da Silvei ra Neto ofereceram vant agem indevi da para Margari da Eliz abeth Weil er e J uvenal Laurenti no Mart ins, para q ue est es, em razão det al vant agem, prati cassem ato de ofí cio, infringindo dever funci onal.

Aos quat ro acus ados supramencionados tam bém foram imput ados o delito do art. 10 da Lei nº 9.296/ 1996 (crim es de intercept ação de comuni cações de i nformáti ca e t el e mática) , bem com o de form ação de quadrilha (CP, art. 288, caput ).

Por fim, imput ou -s e a M argari da Eliz abeth W eil er, Eduardo Garcia da Silvei ra Net o , Luiz Eduardo Auri cchio Bott ura e Eduardo Garcia da Sil vei ra Neto o crim e do art . 10 da Lei C ompl ement ar nº 105/2001.

Ins urgindo -se cont ra tal denúnci a, foram interpos tos vári os

Habeas Corpus em favor de Luiz Eduardo Auri cchio Bottura , perant e o

Tri bunal de J usti ça do M ato Gross o do Sul, que denegou as ordens. Contra referidas denegações, foram i nt erpost os R ecursos Ordinári os em

Habeas Corpus , perant e o Superi or Tribunal de J ust iça, s endo que , dois

del es, foram provi dos, como será expost o, na sequê nci a, nos itens 6 e 7

infra .

Em suma, por mei o de R ecursos O rdinários em Habeas

Corpus, providos pelo S uperi or Trib unal de J usti ça, em favor do

Paciente Eduardo Bottura , foi det ermi nado por aquel e Tri bunal o trancam ento, da ação penal que tramit a na Vara Úni ca da Comarca de Anauril ândi a, tanto em relação ao delito de corrupção – por inépcia –, quanto do crim e de falsi dade i deológica que, na espéci e , foi considerado atípi co .

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8. Da d ecisão p roferida no julgamen to d o RH C n 65.747/MS , pel o STJ

O Recurs o em Habeas Corpus nº 65. 747/MS foi int erpos to contra acórdão do Tribunal de Justiça do Mat o Gros so do S ul, que n o Habeas Corpus regi strado sob o nº 1407948 -76.2015.8.12.0000, interposto em favor de Luiz Eduardo Auri cchio Bott ura, denegou a ordem.

Postul ava -s e denúnci a seri a inept a quanto ao delito de corrupção ativa, ao argum ent o de que o órgão minis teri al não teri a des crito quando, como e qual t eria sido a vant agem indevi da supostam ente por el e ofereci da

No Superi or Tribunal de J ustiç a, a 5.ª Turma, acompanhando o vot o do R el ator J orge Mus si, deu provim ento ao recurso, para reconhecer a i népcia da denúnci a, quanto ao crim e de corrupção ativa.

Const a do v. Acórd ão que:

“veri fica -se que o Minist ério Públi co deixou de indi car em que consisti ri a a vant agem indevida oferecida ou prom et ida pelo recorrent e ao del egado de polí ci a e à j uíza de direit o, consi gnando apenas que os aludi dos funcionários públi cos a t eri am aceit ado e prat icado atos de ofí cio infri ngindo dever funcional, em des respei to à legisl ação vigent e, de forma arbi trária, desproporcional, e caus ando prejuízo a tercei ros (...) Em mom ento al gum, o titul ar da ação penal el uci dou qual teri a sido o benefí cio ilícit o o ferecido pelo recorrente aos funcionári os públi cos, t am pouco o mom ento em que tal proposta teria sido fei ta, om issões que impedem o exercí cio da ampla defesa e do contraditório”.

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inépci a da denúnci a , rest ara prejudi cada a al egação de fal ta de just a caus a.

O recurs o foi provido, nos seguintes t erm os :

“Ante o exposto, dá-s e p rovi men to ao recurs o para declarar a i népcia da denúnci a ofert ada cont ra o recorrent e no que s e refere ao delito de corrupção ativa, estendendo -se os efei tos da decis ão ao corréu Eduardo Garcia da Silveira Neto”

Esclareça -s e que, com o reconheci mento da inépci a da denúnci a, restou prej udi cada a alegação de falta de j ust a caus a.

Em sum a, com o provimento do Recurs o em Habeas Corpus nº 65.747/MS, o S uperior Tri bunal de J ustiça reconheceu a inépci a parcial da denúnci a que deu iní cio ao processo nº 0800168 -68.2015.8.12.0022, que t ramit a perant e o J uízo de dir eit o da C omarca de Anauril ândi a, apenas em rel ação ao crim e de corrupção ativa.

9. Da d eci são p rof erida no jul gamen to do RHC nº 70.596/MS, p elo STJ

O Recurs o em Habeas Corpus nº 70 .596 /MS foi int erpos to contr a acórdão proferi do pelo Tri bunal de J ustiça do Mat o Gros so do Sul, regi strado sob o nº 14 10879-52.2015.8.12.0000 / 50000, que denegou ordem de Habeas Corpus em favor de Lui z Eduardo Auri cchio Bottura .

Postul ava -s e o trancam ento da ação penal, quanto ao crim e de falsi dade ideol ógi ca ou, alt ernativam ente, a anul ação da ação penal.

O Superior Tribunal de Justi ç a, por sua 5.ª Turm a, deu provim ento ao recurso, nos t erm os do voto do rel ator, Mi ni stro Jorge Mussi , para reconhecer a at ipi cidade do fat o imputado na denúncia, a

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19 título de fal sidade i deol ógi ca .

Const a do v. Acórd ão que:

“Na hipótese, a atipicidade da conduta i mputada ao recorren te é manifes ta , pois j á s e sedi mentou na doutri na e na j uri s prudência o ent endim ento de que a peti ção apres ent ada em J uízo não caract eriza document o para fins penais, um a vez que não é capaz de produzi r prova por si m esm a, dependendo de out ras veri fi cações para que sua fidelidade seja atestada”. (destaquei)

Est abeleci da tal premiss a, o recurso foi provi do, nos seguint es term os:

“Ante o exposto, dá -se provim ent o ao recurs o para d etermin ar o tran camento da ação penal instau rad a con tra o recorren te no que se ref ere ao deli to de falsidad e ideológica , est endendo -s e os efeit os da decis ão ao corréu Eduardo Garcia da Silvei ra Net o ”.

Em sum a, com o provimento do Recurs o em Habeas C orpus nº 70.596/ MS, o Superior Tribunal de J usti ça reconheceu a atipi ci dade do fat o imputado na denúncia, a títul o de falsi dade ideológi ca , no process o nº 0800168 -68.2015.8.12.0022, que tramit a perant e o J uízo de direito da C omarca de Anauril ândi a.

10. Aind a o caso concreto: o jul gamen to do Habeas Corpu s perante o Tribunal de Jus ti ça do Mato Grosso do Sul

Diant e do t eor dos acórdão s m encionados nos it ens 8 e 9supra, requereu -se, perant e o Juiz de pri mei ro grau da com arca de Anauril ândi a, no processo nº 0800168 -68.2015.8.12.0022, que foss e reconhecida a nulidade da denúnci a, para que assim fosse dado int egral

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20 cum prim ento aos referi dos acórdãos.

Com iss o int erpôs-s e em s eu favor novo Habeas Corpus , perant e o Tribunal de J usti ça do Mat o Grosso do Sul , regist rado s ob o nº HC nº 1410141-30.2016.8.12.0000, e que foi dist rib uí do para a 2ª Câm ara C rimi na l, s ob a rel atori a do Desembargador Carlos Contar.

Pleit eou -s eo deferim ent o da ordem para t rancar a ação penal (int egralm ent e) ou, subsi diari am ent e, anul ar a ação, desde o s eu recebim ento, “por inépcia mat erial e for mal da coat iva, que per deu sua

lógi ca depoi s que o S uperior Tribunal de Justi ça concedeu a ordem e reconheceu a i népcia no t ocant e ao cri me de corrupção ati va ”.

No j ul gam ent o do Habeas C orpus , o Tri bunal de J usti ça, por maiori a de votos , concedeu a ordem, para anul ar int egral ment e a denúnci a, det ermi nando que o M inist éri o Públi co oferecess e nova denúnci a:

“A d eclaração de i népci a da d enúnci a quanto aos cri mes de corrupção ativa e falsidade ideol ógi ca e a m enção aos m esmos em outros pontos daquela torna i mperioso a necessidad e de ofereci men to d e nova denún cia , excluindo -s e t ais imput ações, sob pena de se m acul ar o convencimento do jul gador. Habeas Cor pus que se concede parcial mente, para d eclarar a nulid ade da denún cia ofertad a na ação penal , determinando o ofereci men to de nova p eça acu satória , com exclus ão dos crimes de corrupção ati va e falsi dade ideológica”.

Contra t al aresto foi i nterposto embargos de decl aração, tant o pelo Mi nist ério Púb li co quant o pel o próprio P aci ent e.

Os decl arat óri os ainda não foram jul gados.

Não é pos sível concordar com os fundam entos do acórdão acima t ranscrito. N ão há que se cogit ar de nul idade int egral da denúncia. Como j á visto, t rata se de denúnci a em que há cúm ulo obj etivo -subj etivo, sendo imputados 5 crimes, a 5 diferentes réus.

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Além di sso, ent re os delitos im put ados, não há rel ação de prejudici ali dade ou subordinação ent re os crimes pel os quais se det erminou o trancament o da ação penal, quais s ejam, corrupção at iva (por i népcia da denúncia) e falsidade i deológi ca (por ati pi cidade dos fat os ), e os demais crim es do art. 288 do Códi go Penal , do art . 10, da Lei Compl em ent ar nº 105/2001 e do art. 10 da Lei nº 9.296/ 1996.

Há, ainda, m ais a ser considerado.

Afi rm ar que a deci são do juiz a quo des cumpriu jul gados do Superior Tribunal de J ustiça, ao dar provimento ao R ecurs o em Habeas Corpus nº 65.747/M S e ao Recurso em Habeas Corpus nº 7 0.596/MS é querer s er m ais reali sta do que o réu!Referi dos acórdãos deix aram cl aro que s e t rat ava de trancamento parci al da ação penal , do ponto de vis ta obj etivo, ati ngi ndo, respectiva e som e nte, os crim es de corrupção ativa e de falsi dade ideol ógi ca.

Não é tudo, com re lação ao cri me do art. 10 d a Lei Comp lementar n º 105/2001, questi onou -s e a in épci a da denúnci a , pret endendo anul á -l a por t al motivo, em Habeas Corpus perant e o Tri bunal de J ustiça do Mato Grosso do Sul, que denegou a ordem. Contra tal negativa, foi interposto R ecurs o em Habeas Corpus p ara o Superi or Tribunal d e Jus ti ça, regis trado sob o n º 76.033/ MS, ao qu al se n egou provi mento, por vot ação unânim e, em 10 de novembro de 2016.

O mesm o ocorreu com rel ação ao cri me do cri me do art. 10 da L ei n º 9.296/1996 :ques tion ou -se a i népci a d a d enúnci a , vi aHabeas

Corpus, que foi denegado pelo Tribunal de J ust iça do M ato Gross o do

Sul. Int erposto Recurso em Habeas Cor pus, que recebeu o nº 75.287/MS , o Superi or Tribunal d e Ju sti ça, novamente p or votação unâni me, negou -lh e p rovi men to , aos 22 de set embro de 2016.

Mais do que isso. No v. aresto, cons tou, expres sam ente: “Finalmente, o fato de esta colenda Quinta Turma ha ver reconhecido a in ép ci a da p eça vestibular n o tocan te ao cri me de corrupção ativa não i mp ede qu e a pers ecução cri mi nal pros siga

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quanto aos demais deli tos as sest ados ao recorrent e.

É que no referido j ulgam ent o s e afi rmou apenas que o órgão minist eri al nã o t eri a indi cado em que consisti ri a a vant agem indevi da oferecida ou prom eti da pel o réu aos agentes públi cos, bem como o benefí cio il ícit o que lhes t eri a si do ofert ado antes ou depois dos atos de ofí cio que pret endi a que prati cass em em viol ação aos s eus de veres funci onais , ou mesmo se o cometim ent o de t ais atos decorreu efeti vamente da propost a realiz ada, d efeitos qu e, à toda evid ên cia, não interferem nas demais acus ações con tra el e assacad as , inclus i ve porque é possí vel o oferecim ent o de nova e xordial s em as aludidas máculas”.

Ora, o tem a que se pret ende dis cut ir no Habeas Corpus nº 14101141-30.2016.8.12.0000 – sob o fundam ento de que o magi strado de pi so est ari a a des cum pri r decis ão do Superior Tribunal de J ustiça – j á foi analis ado pelo própri o Superior Tribunal de J usti ça , que reconheceu, express am ent e, que o trancamento d a ação penal, quant o à corrupção ativa, não prejudica o and amen to d a ação p enal p el os d emais cri mes !

Se contra tal decisão pretende se insurgi r o Im pet rant e do

Habeas Corpus , deveri a fazê -l o por meio de R ecurso Extraordinário para

o Suprem o Tri bunal Federal. M as não, por m eio de Habeas Corpus perant e o Tribunal de J ustiça do M at o Gross o do Sul , que não pode s er órgão revisor e m odi ficador de decisão do Superior Tri bunal de J u sti ça!

Regis tre -s e, por últi mo, qu e ainda sob o fundamen to de que es tariam send o des cu mp ridos os acórdãos d o Recu rs o em Hab eas Corpus nº 65.747 e d o Recu rso em Hab eas Corpus nº 70.596/ MS, foi interposta Reclamação Consti tuci onal regis trada s ob o nº 32.61 6/ MS, que foi julgada i mproced en te , no d ia 26 d e ou tub ro d e 2016, p elo Superi or Tribunal de Justi ça, por entender qu e não hou ve qu alquer

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des cu mp ri men to de seus jul gados! Eis a em ent a do ares to :

“1. Em sessão de julgamento realizada em 7.4.2016, a Quint a Turm a dest e Sodalí ci o, à unanimidade de votos , deu provi ment o ao recurs o ordi nário constituci onal para decl arar a inépci a da denúncia ofert ada cont ra o recorrent e no que s e refere ao delit o de cor rupção ativa, t endo estendi do os efeitos da deci são ao corréu em i dênti ca sit uação.

2. No j ul gam ento do RHC 70.596/MS , a col enda Quint a Turma, na s essão do dia 1.9.2016, det erminou o trancam ento da ação penal i nst aurada cont ra o requerente pelo crime de f alsidade ideol ógi ca, est endendo -s e os efeit os da deci são ao corréu Eduardo Garci a Sil veira Neto

3. O Juiz d e Di reito da Vara Úni ca da comarca de Anau rilândia atendeu os comandos contidos nos julgad os p roferi dos por este Sodalí cio, notad amen te o referente ao RH C 65.747/ MS, anotando a inép cia da denúncia quan to ao d eli to de corrup ção ativa, e trancando a ação pen al no que diz resp eito à falsidad e ideológi ca, não havend o que s e falar, as si m, na inaptid ão de toda a incoati va, como sus ten tad o na reclamação.

4. Ao jul gar o R HC 75.287/MS , também interposto pel o requerent e, a Quint a Turm a manteve o processo contra ele defl agrado pel o crim e do arti go 10 da Lei 9.296/1996, ocasi ão em que reg ist rou que o reconhecimento da „inépcia da peça vestibular no tocant e ao crim e de corrupção at iva não i mpede que a pers ecução cri minal prossi ga quanto aos dem ais delit os assest ados ao recorrent e‟, uma vez que „ no referi do jul gam ento se afi rmou apenas que o órgão minist erial não teri a i ndi cado em que consisti ri a a vantagem indevi da oferecida ou prom et ida pel o réu

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aos agentes públi cos, bem com o o benefí ci o ilí cit o que lhes t eri a sido ofert ado ant es ou depois dos at os de ofí ci o que pretendia que prati cass em em viol ação aos s eus deveres funcionai s, ou mesm o se o com etim ent o de t ais atos decorreu efeti vam ent e da propost a realizada, defei tos qu e, à tod a evid ênci a, não in terf erem nas demais acus ações contra el e assacad as, incl usi ve porque é possí vel o oferecim ent o de nova exordi al s em as aludidas mácul as ‟, o que reforça a i mprocedênci a das al egações contidas na pres ent e ação.

4. Reclamação julgada i mp roced ente ”.30(dest aquei). A decis ão do Superi or Tribunal de J usti ça é abs olut am ent e corret a, sob t odos os aspectos . Havendo cum ulação obj etiva, reconhe cer que h á nul idade da denúncia em rel ação a dois dos crim es , não impede o pross eguim ento da ação penal em rel ação aos dem ai s, que s ão capít ulos aut ônom os da peça acus atóri a.

Além diss o, assim agi ndo, do ponto de vist a da t eori a das nulidades , cum pre -se regra lógi c a de cons ervação dos atos independent es , que não são afetados pel a regra da caus ali dade, com o se verá no it em 11 , infr a.

Em sum a, mesmo havendo a inépci a da denúncia pelo crim e de corrupção ativa , e o trancamento da ação, pelo delit o de falsidade ideológi ca, os dem ais capí tulos acus atóri os são aut ônom os e não guardam relação de dependência, pelo que deve a mesma denúncia s er considerada válida em relação a el es , mantendo -s e a t ramitação do process o quanto aos crimes de corrupção passiva, quadril ha ou bando , bem como o crime do art. 10 da Lei nº 9.296/1996 e do art . 10 da Lei Compl em ent ar nº 105/2001.

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11. Da regra da conservação dos atos processuai s, no s istema das nulidades

A tipi cidade dos at os proces suais e de suas formas é um a garanti a para as part es e para a correta prestação juris di cional. As part es ficari am profundamente i nseguras s e, ao prati carem um ato process ual , não s oubes sem se este seria eficaz ou i nefi caz, fi cando a produção ou não dos efeitos ao mero capri cho do juiz. Por out ro lado, haven do um modelo a s er seguido, as partes saberão que, se o segui rem, inevitavelm ent e, o ato será eficaz, produzindo seus efei tos norm ai s. O que se deve impedir é o “fetichismo formalista” que prejudique a própria subst ânci a dos at os.31

Ao s e prati car um ato processual, est e pode es tar conform e as exi gênci as l egais, ou não ter cumprido a form a est abeleci da em lei . Em outras pal avras , o ato poderá s er típico ou atípico.

A ti pici dade é um conceit o abs olut o. O ato típi co é aquel e que em sua práti ca obedece a todos os requisit os do m odelo previst o em lei. J á a atipici dade pode variar em sua i ntensidade. Há graus de atipi ci dade que poderão ser m enores (pequena des conform idade com o o modelo l egal ) ou m aiores (grande di ferença para o tipo legal) . De acordo com o grau m ai or ou menor de des conformidade entre o ato prat icado e o modelo previsto na l ei, poderão variar as cons equências da inobs ervância da form a l egal .

A ati pi cidade do ato process ual pode s er i rrel evante, caracteriz ando -s e como m era irregularidade que não impede que o ato produza seus efeitos processuai s (por exempl o, denúncia ofereci da fora do prazo legal ). O ato irregul ar é at o at ípico, porém eficaz, isto é, ato defeituoso, m as que não sofreu a s anção de ineficáci a. Por outro lado, a atipi ci dade pode s er tão intens a que o ato sej a consi derado j uridicam ent e inexi stente (por exemplo, sent ença proferida por j uiz aposent ado). Entre a i nexist ênci a e a mera i rregul aridade, exist em as nuli dades que,

31 A expressão é de Frederico Marques, Elementos de Direito Processual Penal. Rio de Janeiro: Forense, 1962, v. 3, p. 398.

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conform e a natureza do disposi tivo vi olad o, podem ser absolutas ou rel ati vas.

O que distingue a nulidade absoluta da nulidade relativa é a fi nal idade para a qual foi instituí da a form a violada. A viol ação de uma forma que at enda a um interes se públi co gera um a nuli dade absol ut a, enquanto o des re speito a um a form a ins tituída no int eress e das partes caus a uma nul idade rel ativa.

Uma das regras gerais que rege o sist em a das nulidade s é a regra da causalidade , s egundo a qual, decret ada a nulidade de um ato process ual , el a acarret ará a nul idade “(...) dos at os que del e diret am ent e dependam ou sejam consequência”(CPP, art. 573, § 1.º).32

Ou s eja, s e o juiz reconhece a nulidade de um ato caus ador ou subordi nante de outro at o, o ato consequent e ou subordinado post eri or também s erá nulo. Tal efei to extensivo da nulidade nada m ai s é do que uma cons equênci a de o procedimento ser um a s equê ncia encadeada de atos , um sucedendo o outro, que norm alm ent e l he da caus a, at é o at o final de jul gam ento.

Por iss o, o j uiz, ao pronunci ar a nulidade de um ato no process o, deverá decl arar tam bém os atos a os quai s el a s e estendem (CPP, art. 573, § 2.º).

A regra da caus alidade ou da co nsequencial idade é com plem entada pel a regra da conservação dos atos p rocessuais , segundo a qual a nul idade de um ato não prejudica out ros atos que s ej am independent es . É o que est abel ece o art. 281, prim ei ra part e, do Códi go de P rocess o Civil, numa int epretação contrario s ens u :

“Ar t. 281. Anulado o ato, c ons ideram -se de nenhum e f e it o t o d o s o s s u b s e q u e n t e s q u e d e l e d e p e n d a m ,

32 Trata-se, aliás, de regra tradicionalíssima do direito processual brasileiro. Disposição similar já era encontrada no artigo 674 do Decreto nº 737, de 25.11.1850, que reza: “As referidas nulidades podem ser alegadas em qualquer tempo e instância; anulam o processo desde o termo em que se elas deram, quanto

aos atos relativos dependentes e consequentes; não podem ser supridas pelo Juiz, mas somente ratificadas

pelas partes”. Entre os Códigos estaduais, por exemplo, o art. 477 do Código de Processo Civil e Comercial do Rio Grande do Sul, estabelecia: “„(...) anulam o processo desde o termo em que se deram, quanto aos atos relativos, dependentes e consequentes (...)”. Citese, ainda, o art. 278, caput, do ab -rogado Código de Processo Civil de 1939, que dispunha : “A nulidade de qualquer ato não prejudicará senão os posteriores, que dele dependam ou sejam consequência”.

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t o d a vi a , a n u l i d a d e d e u m a p a rt e d o a t o n ã o

p r e j u d i c a r á a s o u t ra s q u e d e l a s e j a m i n d e p e n d e n t e s . ”33 ( d e s t a q u e i)

Comentando disposi tivo s ubst anci alm ent e i gual do códi go ab -rogado , Tornaghi explica que:

“como se vê s ão duas regras i guai s; apenas uma est á formul ada pel o lado anvers o e a outra pel o revers o: a pri mei ra fal a na inval idez dos at os dependent es; na segunda, d a valid ez das partes independ en tes d e cada ato . A s egunda met a de do dispositivo l onge de ser cont rári a à pri mei ra, com o faz crer a conjunção advers ativa usada (todavi a) é uma confirmação dela, em outro campo” .34

(dest aquei )

Regra s emel hant e s são encont radas em di vers os ordenam ent os j urídi cos . Por exemplo, o Codice di Procedura Civile itali ano prevê que :

“Ar t. 159. Estens ione della nullit à. La nullità di un a t t o n o n im p o r t a q u e l l a d e g l i a t t i p r e c e d e n t i , n è d i q u e ll i s u c c e s s i v i c h e n e s o n o i n d i p e n d e n t i. L a n u l l i t à d i u n a

parte dell’att o non colpisce le alt re part i che ne sono i n d i p e n d e n t i ” . ( d e s t a q u e i)

Comentando t al dispositivo, e nsinou -nos Li ebman que o juiz deve esforçar -s e por isolar os el ementos do procedi mento afet ados pel o víci o e conter a expansão dest e, com se faz com os focos de uma epi demi a (pri ncí pio da con s ervação dos atos process uai s)”.35

Regra equival ent e existe n o Códi go de Proces so Civil port uguês , de 2015, que prevê, em s eu art. 195.2, nas “regras gerais sobre as nulidades dos atos processuais”, que:

33 O art. 248 do ab-rogado Código de Processo Civil de 1973 dispunha que: “art. 248 do CPC: “Anulado o ato , reputam-se de nenhum efeito todos os subsequentes , que dele dependam ; todavia, a nulidade de uma parte do ato não prejudicará as outras, que dela sejam independentes”.

34 Hélio Tornaghi, Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1975, v. II, p. 239.

35 Enrico Tulio Liebman, Manuale di diritto processuale civile. 2 ed. Milano: Giuffrè, v. II, 1957, n. 118, p. 217.

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“195.2 - Quando um ato tenha de ser anulado, anulam-se também os termos subsequentes que dele dependam absolutamente; a nulidade de uma parte

do ato não prejudica as outras partes que dela sejam independentes.”36

( d e s t a q u e i)

Tam bém n a Argenti n a, no art. 174 do Có di go Proces al Civil y Com erci al de l a Nación , s obre os efeitos das nulidades , prevê:

“La nulidad de un acto non importará la de los

a n t e r i o r e s n i la d e l o s s u c e s i v o s q u e s e a n i n d e p e n d i e n t e s d e d ic h o a c t o .

La nulidad de una parte del acto no afectará a

las demás partes que sean independientes aquélla ”.(destaquei).

A regra da conservação dos atos p rocessu ais , prevista na segunda part e do art. 281 do Códi go de P rocesso Civil brasil ei ro tem plena apli cação, por analogia, no process o penal , como permi te o art . 3º do Códi go de P rocesso P enal. Ali ás, referi do dispositi vo nada m ais faz do que cons agrar a máxima util e per inutil er non vi ciat ur .37Trat a -s e, como denominou Redenti, um “princípio de lógica elementar”.38

Ent re nós, s obre o tema, assim se mani fes ta Dinam arco: “Ai nda que a l ei nada dis sess e a respeit o, só a consci ênci a da t eori a dos capít ulos da s ent ença seri a sufi ci ent e para tornar indisp ensável distingu ir capítulos e capítul os e examinar o estado d e higidez ou de invalidade de cada u m, deixand o íntegros os qu e forem em si mes mo perfei tos e não

36 Regra semelhante, na disciplina das “Regras gerais sobre a nulidade dos actos”, era prevista no art. 201.2 do Código de Processo Civil português, de 1961: Art. 201.2 Quando um acto tenha de ser anulado, anular-se-ão também os termos subsequentes que dele dependam absolutamente. A nulidade de uma parte do ato não prejudica as outras partes que dela sejam independentes”.

37 Essa regra recebeu idêntica formulação de Ulpiano (1, 5 D. 45, 1): neque vitiatur utilis per hanc

inutilem.

38

Enrico Redenti, Diritto Processuale civile, 4 ed. Milano: Giuffrè, 1997, v. 2, p. 396. Na doutrina nacional Bonício (Capítulos da sentença …, p. 57) assim se manifesta sobre o tema: “surge uma questão interessante: será que, caso não existisse uma norma legal, condicionando o „efeito expansivo‟ das nulidades à existência de um nexo de dependência, ainda assim tal efeito existiria? A resposta só pode ser afirmativa, porque se trata de um efeito natural do sistema”.

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estejam contaminados pelo vício do outro”. 39

A mesm a lógi ca s e aplica em rel ação a todos os atos process uai s que pos sam ser divididos em par t es autônomas. No caso de ato compl exo, ist o é, aquele formado por m ais de uma uni dade el ement ar, a nulidade de um a das unidades autônom as não prejudica as dem ais , exat ament e porque s ão independent es.40

Os atos complexos, como explica Moniz de Aragão, “são formados po r diversos at os simples, unitários, resi dindo a sua not a caracteriz adora no fato de que todos, em parti cul ar, cons ervam a própri a singularidade. Trat ar -s e-i a de um feixe de atos simpl es , t endo cada qual sus própri os efeit os, cuj a s oma ori gina o ato com pl exo”.41 Parti ndo de t al premiss a, ao anali sar os efei tos das nulidades , afi rm a:

“Nos atos com plexos , porém, a anul ação pode -se dar no todo ou em part e. (...) Ou com relação a todo o processo ou com rel ação a al gum de s eus atos salva-s e o que for úti l, s e e enquanto poss ível ”. 42 Ora, havendo independência, ent re um a part e e out ra do a to complexo não há porque admitir o contágio de vício circunscrito a uma

das part es do ato, mant endo -s e a “efi cácia da part e i ndependente do ato”.43

Como j á t ivemos oportunidade de analis ar, com fundam ent o no art. 281 do Códi go de Proces so Civil , a regra da cons ervação dos atos processuais implica que, “nos atos complexos a nulidade de uma das partes do ato não prejudi ca a d e outras partes que dela sejam independ en tes ”.44Ou sej a, preserva -se a eficáci a da part e independente

39 Dinamarco, Capítulos de sentença..., p. 84. 40

O que é decorrência da própria natureza do ato, pois como explica Carnelutti (Instituciones del

Proceso Civil. Trad. Santiago Sentis Melendo,Buenos Aires: EJEA, 1959, v. I, n. 295, p. 434): “los actos

jurídicos son simples o complejos según que no se puedan descomponer o bien que se puedan

descomponer en varios actos jurídicos, es decir envarios actos, cada un de los cuales tenga un efecto

jurídico”. (destaquei) 41

Egas D. Moniz de Aragão, Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1974, v. II, p. 307-308.

42 Moniz de Aragão, Comentários ..., v. II, p. 308-309. 43 Tornaghi, Comentárijos …, v. II, p. 239.

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do ato compl exo, que na verdade é apenas form alm ent e um úni co at o, mas que s ubst anci alm ent e se desdobra em duas ou m ais part es , independent es um a das out ras.

A pr es ervação da part e independent e do ato nulo é um a decorrênci a do próprio pri ncí pio geral de economi a processual, segundo o qual o proces so deve atingi r o seu obj etivo, com o m enor emprego de ativi dade das partes e do juiz, que, com o advert e P elli ngra, é um princípio de política legislativa “e serve di guida all‟interprete”.45

Da m esm a form a que num a s entença que cont enha capí tulo s, é possí vel reconhecer a nulidade apenas do capítul o vi ci ado, pres ervando os que est ão saudáveis, no cas o de um a denúncia que apres ent e obj et os cum ulados , com im put ação de mai s de um crim e, a nulidade de um a imput ação não impli cará a nulidade out ros capít ulos que s ej am aptos e , em rel ação aos quai s , estejam pres entes as condi ções da ação e a just a caus a.

Evident e que, no caso de u ma d enún cia ob jetivamen te complexa, com mais de u m capí tulo acu satóri o e cu mulação de deli tos i mputados , a nuli dade d e u ma das i mputações – ou mes mo a absolvi ção su mári a em relação a u ma dela – não i mplica a invalidação d e toda a denún cia .

Sendo seu conteúdo complexo e, portant o, divisível , as part es m acul adas podem ser extirpadas s em com prometer o t odo. Não se trata de um c as o em que o ví cio m at a o doent e, m as de sit uação em que bast a a amputação da part e comprom eti da, sendo possí vel sal va a vida do paci ent e.

Com a propri edade t écni ca de s em pre, observa Dinam arco: “Os tribunai s brasil eiros relut am enormement e a pronunci ar a nulidade apenas parci al de uma s entença (ou sej a, de al gum ou al guns de seus capít ulos ), deixando í nt egro o mais , ai nda quando a causa da invalidade atinj a somente um ou al guns de s eus

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Referências

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