UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
FACULDADE DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PÓS-GRADUAÇÃO EM PATOLOGIA MOLECULAR
Patologia dos baculovírus: Efeito da ação de
enzimas heterólogas e análise da resposta
transcricional do hospedeiro durante a
infecção viral
Aline Welzel Gramkow
Orientador: Dr. Bergmann Morais Ribeiro
Tese apresentada ao Departamento de
Pós-Graduação em Patologia Molecular, da
Faculdade de Ciências da Saúde da
Universidade de Brasília, como parte dos
requisitos necessários à obtenção do título de
Doutor em Patologia Molecular.
ii
UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
FACULDADE DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PÓS-GRADUAÇÃO EM PATOLOGIA MOLECULAR
Patologia dos baculovírus: Efeito da ação
de enzimas heterólogas e análise da
resposta transcricional do hospedeiro
durante a infecção viral
Aline Welzel Gramkow
Orientador: Dr. Bergmann Morais Ribeiro
Tese apresentada ao Departamento
de Pós-Graduação em Patologia
Molecular, da Faculdade de Ciências
da Saúde da Universidade de
Brasília, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de
Doutor em Patologia Molecular.
iii
ÍNDICE
Figuras ... vii
Tabelas ... viii
Citação ... x
Agradecimento a Deus... xi
In memorian ... xii
Dedicatória ... xiii
Agradecimentos gerais ... xiv
Abreviaturas e símbolos ... xvii
Resumo ... xix
Abstract ... xx
Introdução ... 023
Revisão bibliográfica ... 026
A. Baculovírus ... 026
B. Modo de infecção in vivo ... 029
C. Regulação da expressão gênica ... 032
D. Baculovírus como vetor de expressão: AcMNPV ... 033
E. Anticarsia gemmatalismultiplenucleopolyhedrovirus (AgMNPV) ... 037
F. Baculovírus recombinante para controle biológico ... 040
G. Proteases... 043
I. Classificação ... 043
iv
III. Catepsina-L ... 046
IV. Quitinase ... 047
H. Sistema Imune de insetos ... 050
Capítulo I ... 056
1. Introdução ... 056
2. Objetivos ... 060
3. Materiais e Métodos ... 060
3.1. Vírus e células ... 060
3.2. Construção dos plasmídeos e vírus recombinantes ... 061
3.3. Bioensaios ... 063
3.4. Análise estrutural e ultraestrutural dos tecidos internos de larvas S. frugiperda infectadas ... 064
3.5. Ensaio para atividade de fenoloxidase ... 065
3.6. Ensaio para atividade de quitinase ... 065
4. Resultados ... 067
4.1.Construção dos plasmídeos e dos vírus recombinantes ... 067
4.2.Bioensaios ... 069
4.3.Análise estrutural e ultraestrutural dos tecidos das larvas S. frugiperda infectadas com os diferentes vírus ... 073
v
4.5.Atividade de quitinase ... 079
5. Discussão ... 080
Capitulo II ... 086
1. Introdução ... 086
2. Objetivo ... 092
3. Materiais e Métodos ... 092
3.1. Vírus ... 092
3.2. Insetos ... 093
3.3. Extração do RNA total e síntese dos cDNAs ... 093
3.4. Hibridização subtrativa e obtenção de bibliotecas subtraídas ... 094
3.5. Sequenciamento dos cDNAs e geração de ESTs ... 095
3.6. Processamento das ESTs, anotação e análise de expressão diferencial .... 096
3.7. PCR em tempo real (qPCR) ... 096
4. Resultados ... 098
4.1. Síntese das fitas de cDNAs e ensaio de RDA ... 098
4.2. Análise das sequências dos clones obtidos ... 101
4.3. PCR em tempo real (qPCR) ... 116
5. Discussão ... 118
Perspectivas ... 124
vii
FIGURAS
Figura 1: Ultraestrutura de um baculovírus. ... 027
Figura 2: Esquema da infecção de uma larva de um inseto da ordem Lepidóptera por
baculovírus, in vivo. ... 031
Figura 3: Foto de uma larva de Anticarsia gemmatalis ... 039
Figura 4: Foto de uma larva de Spodoptera frugiperda ... 059
Figura 5: Esquema mostrado o gene da poliedrina do vírus selvagem AcMNPV e os
diferentes vírus recombinantes. ... 068
Figura 6: Análise estrutural da cutícula de larvas de S. frugiperda infectadas pelo
AcMNPV selvagem e recombinantes ... 074
Figura 7: Esquema mostrando uma lagarta de S. frugiperda não infectada ... 075
Figura 8: Análise estrutural dos tecidos internos de larvas de S. frugiperda. ... 076
Figura 9: Ultraestrutura de intestinos de larvas S. frugiperda infectadas com os vírus
96 h p.i. ... 077
Figura 10: Atividade de fenoloxidase em hemolinfa de S. frugiperda infectada ... 078
Figura 11: Atividade quitinolítica de amostras de poliedros de AcMNPV e vSynQuit.
... 079
Figura 12:Esquema da metodologia de RDA ... 088
Figura 13: Eletroforese em gel de agarose 1,5% da segunda fita de cDNAs driver e
produtos diferenciais corados com brometo de etídeo. ... 099
Figura 14: Eletroforese emgel de agarose 1,5% dos produtos diferenciais corados com
brometo de etídeo ... 101
Figura 15: Sequência de nucleotídeos do gene e de aminoácidos da proteína do cognato
de choque térmico de 70 kDa de A. gemmatalis... 115
viii
TABELAS
Tabela 1: Valores de TL50 para o vírus selvagem e os recombinantes vSynScathL e
vSynKerat injetados em larvas de S. frugiperda 3º ínstar. ... 070
Tabela 2: Valores de TL50 para o vírus selvagem e o recombinante vSynQuit injetados
em larvas de S. frugiperda 3º ínstar. ... 071
Tabela 3: Valores de CL50 para o vírus selvagem e os recombinantes vSynScathL e
vSynKerat em larvas neonatas de S. frugiperda infectadas oralmente com poliedros . 071
Tabela 4: Valores de CL50 para o vírus selvagem e o recombinante vSynQuit em larvas
neonatas de S. frugiperda infectadas oralmente com poliedros. ... 072
Tabela 5: Valores de TL50 para o vírus selvagem e os recombinantes vSynScathL e
vSynKerat em larvas neonatas de S. frugiperda infectadas oralmente com poliedros
... 072
Tabela 6:Valores de TL50 para o vírus selvagem e o recombinante vSynQuit em larvas
neonatas de S. frugiperda infectadas oralmente com poliedros ... 073
Tabela 7: Oligonucleotídeos utilizados nas etapas do RDA, sequenciamento, clonagem
e PCR em tempo real ... 097
Tabela 8: Análise dos contigs por Blastx derivados de ESTs resultantes do
sequenciamento da biblioteca subtrativa obtida de cDNAs de hemócitos das larvas de A.
gemmatalis infectadas e não infectadas, mostrando genes reprimidos quando utilizado o
AcMNPV como driver ... 103
Tabela 9: Análise dos contigs por Blastx derivados de ESTs resultantes do
sequenciamento da biblioteca subtraída obtida de cDNAs de hemócitos das larvas de A.
gemmatalis infectadas e não infectadas, mostrando genes induzidos quando utilizado o
ix Tabela 10: Análise dos contigs por Blastx derivados de ESTs resultantes do
sequenciamento da biblioteca subtraída obtida de cDNAs de hemócitos das larvas de A.
gemmatalis infectadas e não infectadas, mostrando genes reprimidos quando utilizado o
AgMNPV como driver ... 107
Tabela 11: Análise dos contigs por Blastx derivados de ESTs resultantes do
sequenciamento da biblioteca subtraída obtida de cDNAs de hemócitos das larvas de A.
gemmatalis infectadas e não infectadas, mostrando genes induzidos quando utilizado o
AgMNPV como tester ... 110
Tabela 12: Transcritos gênicos e frequência obtidos pelo sequenciamento através da
técnica RDA ... 111
Tabela 13: Produtos gênicos e funções dos transcritos obtidos do sequenciamento da
biblioteca subtrativa obtida de cDNAs de hemócitos das larvas de A. gemmatalis
x
“Consulte não a seus medos, mas a suas esperanças e sonhos.
Pense não sobre suas frustrações, mas sobre seu potencial não
usado. Preocupe-se não com o que você tentou e falhou, mas com
aquilo que ainda é possível você fazer."
xi
“Deus é meu amparo, minha fortaleza, meu consolo forte na
tribulação.”
xii
In memorian
xiii
Ao meu querido marido Daniel, meus queridos pais, Almiro e
Silvia e minha querida irmã Alessandra
Dedico de todo o meu coração, por toda força e confiança
depositada, em todos os momentos ...
xiv
Agradecimentos gerais
A DEUS que me deu a vida e a oportunidade de realização dessa pesquisa, o
que seria de nós sem fé!
Ao meu querido e amado marido Daniel, que mesmo nos momentos de
desânimo, me levantou e incentivou a continuar. Obrigada por toda a ajuda e amor,
pelos conselhos dados, mesmo nos momentos angustiantes. Amo você!
Aos meus pais, Almiro e Silvia, por serem meu porto seguro, por toda a
confiança depositada, por todo carinho, amor e ânimo, fundamentais para o
desenvolvimento desta tese.
A minha irmã Ale, obrigada por tudo! Por cada momento de coragem e por
seu ombro amigo sempre presente! Nossas conversas foram fortificantes!
Ao meu orientador Dr. Bergmann Morais Ribeiro, por toda confiança
depositada, por toda a paciência e orientação na minha formação acadêmica e
profissional, meu obrigado!
Aos meus sogros Heinz e Márcia por todas as conversas, correções
ortográficas e preocupações. E também a todos os Gramkow por toda a ajuda.
Obrigada!
A toda minha família que está longe, meu querido avô, tios, tias, primos por
todo o incentivo e curiosidade pelo meu trabalho.
Às minhas queridas amigas Bel e Carla por todo o apoio e amizade durante
todos esses anos. Obrigada por toda a paciência de me escutarem em muitos momentos
difíceis e me aconselharem.
Aos meus amigos dos Jovens Mais, ao Pastor Bolla, Pastor Joachim, Pastor
xv ao grupo de Estudo Bíblico Comunhão em Família da Igreja Evangélica Luterana e
grupo de dança. Obrigada por toda a torcida e curiosidade sobre meu trabalho.
À minha amiga Anabele, por toda amizade, “comidinhas”, conversas e
amadurecimento que tivemos durante todos esses anos, espero de coração que nossa
amizade seja eterna! À minha amiga Bruna de igual forma, por toda a amizade e
companheirismo, consolo durante essa jornada e claro, não por última à minha amiga
Dra. Gláucia, plena em sua bondade, obrigada pela amizade, por todos os conselhos e
puxões de orelha.
Aos meus queridos amigos do Laboratório de Microscopia Eletrônica, os mais
antigos Su, Aninha, Maria (Obrigada meninas, por tudo!), Roberto, Raimundo, Bruno,
Breno, Tati, Dani (muito obrigada pela hospedagem e conversas que tivemos!), Greice,
Lorrainy, Vírginia, Raíssa, Clarinha e os mais novos, Raul, Raphael, Mari, Carol,
Daniel, Fabrício, Briana, Lorena.
À querida Érica e Paulo, obrigada por toda a ajuda profissional incondicional,
indispensáveis ao trabalho, por todas as dicas e desabafos e também ao Vinícius e Dra.
Rose pela ajuda e pelos insetos
Aos professores do Laboratório de Microscopia Eletrônica Sônia e Renato pela
ajuda quando era necessária.
Ao grupo da Universidade de Goiânia, principalmente Dra Célia e Dr
Alexandre pela ajuda com RDA e qPCR.
A todos do Núcleo de Controle Biológico e da criação de insetos, que me
forneceram os insetos.
Aos secretários do Curso de Pós-Graduação em Patologia Molecular,
Alessandro, Jaqueline por todos os esclarecimentos.
Ao CNPq, pelo apoio financeiro.
xvi Aos membros da banca, pela disponibilidade em contribuir com nosso
trabalho.
A todos que de alguma forma contribuíram na minha formação, considerando
que essa tese é fruto de uma caminhada de muitos anos, agradeço a todos que direta ou
indiretamente participaram dessa construção, que não mediram esforços para me apoiar
xvii
ABREVIATURAS E SÍMBOLOS
BSA Albumina Sérica Bovina
cDNA DNA complementar
CL50 Concentração Letal em 50% das larvas
df graus de liberdade
DNA ácido desoxirribonucléico
DNS ácido dinitrosalicílico
EDTA ácido etilenodiaminotetracético
ESTs Expressed sequence tag
g grama
GlcNac N-acetilglucosamina
h hora
h p.i. horas pós-infecção
IM Intestino médio
kDa quilodalton
KDEL
Possível sinal de localização no retículo endoplasmático (K -Lisina,
D - ácido aspártico, E - ácido glutâmico e L - leucina).
L litro
L-DOPA L-3,4-dihydroxyphenylalanine
LF
Limite fiducial
M molar: mol/l
mg miligrama
nL nonolitro
xviii mL mililitro
µL microlitro =10-6 litro
µM micromolar (micromol por litro)
mM milimolar
NaCl Cloreto de sódio
NaOH Hidróxido de sódio
pb pares de base
PCR reação em cadeia da polimerase
pfu Unidade formadora de placa
pH potencial de hidrogênio
qPCR PCR em tempo real
RDA Análise de Diferença Representacional
RNA ácido ribonucléico
RNAi RNA de interferência
s segundo
SD desvio padrão
T Traquéia
TD média do tempo de morte
TL50 Tempo letal em 50% das larvas
TG Tecido gorduroso
TM Túbulo de Malphigui
Tris tris(hidroximetil) aminometano
U unidade enzimática
X-Gal 5-bromo-4-cloro-3-indolil-β-d-galactopiranosídeo
°C grau Celsius
xix
RESUMO
Os baculovírus compreendem o maior grupo de vírus de insetos estudados no
mundo, principalmente pela eficiência em matar pragas da agricultura. Neste trabalho,
três baculovírus recombinantes contendo os genes ScathL (Catepsina L) de Sarcophaga
peregrina (vSynScathL), Kerat (Queratinase) do fungo Aspergillus fumigatus
(vSynKerat) e Quit (Quitinase) do fungo Metarhizium anisopliae (vSynQuit) foram
construídos e suas propriedades bioinseticidas analisadas em larvas de Spodoptera
frugiperda. Bioensaios em larvas neonatas e de 3º ínstar de S. frugiperda infectadas
com os baculovírus vSynScathL, vSynKerat e vSynQuit mostraram uma diminuição no
tempo necessário para matar os insetos infectados quando comparado ao vírus
selvagem. O vSynScathL apresentou uma TL50 e TD de 47 horas e 2,62 dias,
respectivamente, enquanto o AcMNPV, uma TL50 de 136 horas e TD de 5,37 dias,
respectivamente para larvas de S. frugiperda de 3º ínstar. Isso representa uma
diminuição significativa de 65,5% para TL50 e 50,09% para TD, no tempo necessário
para o vírus matar os insetos infectados quando comparado ao vírus selvagem. A TL50 e
TD para o vírus vSynKerat foi de 91 horas e 3,70 dias, respectivamente, com uma
redução de 32,8% para TL50 e 30,21% para TD, no tempo necessário para o vírus matar
os insetos infectados quando comparado ao vírus AcMNPV. Já, o vírus recombinante
vSynQuit apresentou uma TL50 de 110,67 horas, o que foi 23,6% menor do que o vírus
selvagem (TL50 de 144,97). Já em larvas neonatas de S. frugiperda o vSynScathL
mostrou uma TL50 de 77 horas comparado ao AcMNPV de 104 horas quando inoculado
com 102 corpos de oclusão/nL, já o TD foi de 3,46 dias para o vírus recombinante e
4,16 dias para o AcMNPV. Isso representa uma redução de 26% na TL50 e 16,82% para
TD no tempo necessário para matar os insetos infectados quando comparado ao vírus
xx 48% comparado ao vírus AcMNPV e o TD de 3,87 dias, reduzindo 6,97% no tempo
necessário para matar os insetos; já a TL50 do vírus vSynQuit foi de 86 horas, com uma
redução de 45,2% comparado ao vírus selvagem e o TD de 3,75 dias comparado com o
vírus selvagem de 4,43 dias, representando uma redução de 15,34% no tempo
necessário para matar os insetos. Também mostramos que os vírus vSynScathL e
vSynKerat foram capazes de aumentar a atividade de fenoloxidase na hemolinfa de
larvas de S. frugiperda em relação ao vírus selvagem e à larva não infectada. A
expressão de proteases em larvas infectadas resulta na destruição dos tecidos internos
em estágios tardios da infecção, podendo ser uma das razões para o aumento da
velocidade para matar as larvas de S. frugiperda, como observado na microscopia
eletrônica de varredura para os vírus vSynScathL e vSynKerat em relação ao vírus
selvagem e à larva não infectada. O ensaio enzimático com quitina regenerada mostrou
também uma diferença quitinolítica significativa em relação aos corpos de oclusão do
vírus vSynQuit em comparação ao vírus selvagem. A transcrição de genes celulares em
hemócitos derivados de larvas de Anticarsia gemmatalis infectados (12 h p.i.) pelos
baculovírus Anticarsia gemmatalis multiple nucleopolyhedrovirus (AgMNPV) e/ou
Autographa californica multiple nucleopolyhedrovirus (AcMNPV) também foram
analisados neste trabalho pela técnica análise de diferença representacional (RDA). Os
trancritos mais abundantes encontrados foram para proteases celulares, que estão
provavelmente envolvidas na resposta do inseto à infecção viral. Outros genes, como
por exemplo, hsp70 e hsc70, proteínas ribossomais, aminopeptidase, beta 1,3 glicanase,
proteína induzida pelo hormônio juvenil, lipase também foram detectados. Todos esses
transcritos podem de alguma maneira ter um papel na defesa celular e/ou
estabelecimento da infecção viral. Para confirmação dos dados obtidos pela RDA, a
transcrição do gene hsc70 foi analisada por PCR em tempo real e confirmou sua
xxi
ABSTRACT
Baculovirus comprise the largest group of insect viruses most studied
worldwide, mainly because they efficiently kill agricutural insect pests. In this study,
tree recombinant baculoviruses containing the ScathL gene (Cathepsin L) from
Sarcophaga peregrina (vSynScathL), the Kerat gene (Keratinase) from the fungus
Aspergillus fumigatus (vSynKerat) and Quit gene (Chitinase) from the fungus
Metarhizium anisopliae (vSynQuit) were constructed and their insecticidal properties
analysed against Spodoptera frugiperda larvae. Bioassays of third-instar and neonate S.
frugiperda larvae with vSynScathL,vSynKerat and vSynQuit showed a decrease in the
time needed to kill the infected insects when compared to the wild type virus. The
vSynScathL showed LT50 and TD of 47 hours and 2.62 days respectively, while
AcMNPV, a LT50 of 136 hours and TD of 5.37 days, respectively for third-instar S.
frugiperda.larvae. This represents a significant decrease (from 65.5% for LT50 and
50.09% for TD) in the time required to kill the virus infected insects compared to wild
virus. The LT50 and TD for vSynKerat was 91 hours and 3.70 days, respectively,
showing also a reduction (32.8% for LT50 and 30.21% for TD), in the time required to
kill the virus infected insects compared to AcMNPV. Also, the vSynQuit in another
bioassay, showed a LT50 of 110.67 hours, which was 23.6% lower than the wild type
virus (LT50 of 144.97 hours). Using neonate larvae of S.frugiperda, the vSynScathL
showed a LT50 77 hours compared to 104 hours of AcMNPV when inoculated with 102
occlusion bodies/nL, since the TD was 3.46 days for the recombinant virus and 4.16
days for AcMNPV. This represents a 26% reduction in LT50 and 16.82% for TD
compared to wild type virus AcMNPV. The LT50 of the virus vSynKerat was 54 hours
with a 48% reduction compared to AcMNPV and in the TD of 3.87 days, 6.97%; with
xxii and TD of 3.75 days compared with 4.43 days for wild type virus, a reduction of
15.34%. We have also shown that vSynScathL and vSynKerat were able to increase
phenoloxidase activity in the hemolymph of S. frugiperda larvae compared with the
wild type virus and with larvae not infected. The expression of proteases in infected
larvae resulted in destruction of internal tissues late in infection, which could be the
reason for the increased viral speed of kill, as observed in scanning electron microscopy
for viruses vSynScathL and vSynKerat compared to the wild type virus and uninfected
larvae. The enzyme assay with regenerated chitin also showed a significant chitinolytic
difference with occlusion bodies of the vSynQuit compared to wild type virus . The
transcription of cellular genes in hemocytes derived from infected larvae of Anticarsia
gemmatalis (12 h p.i.) by Anticarsia gemmatalis multiple nucleopolyhedrovirus
(AgMNPV) and/or Autographa californica multiple nucleopolyhedrovirus (AcMNPV)
were also analyzed in this work by the representational difference analysis (RDA).
Transcrits more abundants were cellular proteases, which are probably involved in
insect response to viral infection. Other genes, such as hsc70 and hsp70, ribosomal
proteins, aminopeptidase, beta 1.3 glucanase, protein induced by juvenile hormone,
lipase were also detected. All of these transcripts can somehow play a role in cellular
defense and/or establishment of viral infection. To confirm the data obtained by RDA,
the hsc70 gene transcription was analyzed by real time PCR and confirmed their
23
INTRODUÇÃO
A produção agrícola no mundo sofre perdas significativas devido ao ataque de
insetos. Esse ataque é um importante fator na redução da produção de várias culturas,
sendo necessário algum tipo de controle da população do inseto-praga para sua
diminuição (Turnipseed & Kogan, 1987). Isso leva à utilização, pelos agricultores, de
inseticidas químicos em doses elevadas, a fim de assegurar os níveis de produção. Além
de causar resistência às pragas com o uso constante dessas substâncias, os pesticidas
causam danos ao meio ambiente e à saúde humana, demandando alto investimento
financeiro.
Novas alternativas no controle de pragas e doenças tornam-se necessárias a
fim de minimizar os efeitos causados pelo uso de inseticidas químicos. Alternativas
seguras e mais econômicas são possíveis com o uso de agentes biológicos (Szewczyk et
al., 2008). Os bioinseticidas, por serem mais seletivos, mais seguros ao aplicador e por
não poluírem o meio ambiente como os agrotóxicos, são alternativas verdadeiramente
ecológicas e sustentáveis, que contribuem para manter o equilíbrio biológico (Secchi,
2002). Estes são mais seletivos, possuem maior tempo de vida útil, dado à dificuldade
da praga se tornar resistente ao seu uso, além de serem mais específicos e menos
poluentes. Porém, em contrapartida, exigem estudos mais aprofundados, tanto no
isolamento de novos patógenos como nos testes de seleção, produção e formulação.
Vários países utilizam bioinseticidas para controle de pragas da lavoura e esses agentes,
atualmente, representam mais de 2% do mercado de inseticida do mundo (Ribeiro et al.,
24 Dentre os métodos de controle biológico, destaca-se o uso de produtos à base
de vírus, principalmente os baculovírus (Souza et al., 2002). Estes têm sido estudados
como agentes de controle biológico desde a década de 60 (Payne, 1986) e compreendem
o maior grupo de vírus de insetos, tendo grande potencial como agentes de controle
biológico de insetos-praga na agricultura e em áreas florestais (Martignoni, 1984;
Payne, 1986; Moscardi & Sosa-Gómez, 1992, 1993; Moscardi, 1998).
A vantagem em utilizar os baculovírus é por serem específicos em relação ao
seu hospedeiro e inofensivos aos humanos. O caso de maior sucesso mundial no uso de
controle biológico é o uso do baculovírus Anticarsia gemmatalis multiple
nucleopolyhedrovirus (AgMNPV) contra a lagarta-da-soja (Anticarsia gemmatalis),
quando, na safra de 2003/2004, por volta de dois milhões de hectares de plantação de
soja no País foram tratados com formulações desse vírus (Moscardi, 1999; Moscardi &
Santos, 2005). Os principais danos causados à cultura da soja ocorrem na fase larval de
A. gemmatalis, comem tanto o limbo como as nervuras, podendo ocasionar 100% de
desfolhamento até atingirem o seu desenvolvimento máximo, para tornarem-se pupa.
Até completar o seu desenvolvimento larval, cada lagarta pode consumir em média 90
cm2 de folhas, ou seja, o equivalente a 2,1 vezes a sua própria massa a cada 24 horas
(Gallo et al., 2002).
Além disso, existem outros programas em países como Rússia e China e
também para outras pragas no Brasil, como Spodoptera frugiperda e Spodoptera
litorallis (Melo & Azevedo, 1998). Um programa brasileiro resulta no combate à lagarta
do cartucho do milho (S. frugiperda), coordenado pela Embrapa Milho e Sorgo em Sete
Lagoas/MG. Essa lagarta é a principal praga da cultura do milho, podendo reduzir a
25
frugiperda multiple nucleopolyhedrovirus (SfMNPV), produzido na forma de pó
molhável (Valicente, 2009 ).
Para aumentar a velocidade de morte das larvas, baculovírus recombinantes
têm sido construídos, aumentando a sua propriedade bioinseticida. Uma maneira de
melhorar a virulência dos baculovírus é a inserção de genes de hormônios e/ou
26
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
A.
Baculovírus
Os baculovírus compreendem o maior grupo de vírus de insetos já estudado,
sendo usados como agentes de controle biológico (Martignoni, 1984; Payne, 1986;
Moscardi & Sosa-Gómez, 1992, 1993; Moscardi, 1998; Castro et al., 1999; Szewczyk et
al., 2008), como vetores de expressão (Luckow & Summers, 1988; O´Reilly et al.,1992;
Richardson, 1995; Bonning & Hammock, 1996; Jarvis et al.,1997; Condreay et al.,
2007) e como possíveis vetores de terapia gênica (Tani et al., 2003; Van Oers et al.,
2006; Raty et al., 2008). Uma das razões pelas quais vários grupos de pesquisa estudam
baculovírus como uma ferramenta biotecnológica é a sua segurança, pois são altamente
específicos a uma ou a poucas espécies de insetos relacionadas, não afetando outros
organismos (Gröner, 1986). O uso dos baculovírus como agente de controle biológico é
facilitado pela característica desses vírus de serem encapsulados em uma oclusão
cristalina de natureza protéica, que confere proteção aos vírions no meio ambiente e
permite a formulação de biopesticidas com fácil tecnologia de aplicação, representando
economia e segurança em relação aos inseticidas químicos (Castro et al., 1999).
São vírus com DNA de dupla fita, circular, superenovelados (supercoiled),
pertencentes à família Baculoviridae, possuindo um ou mais vírions com envelope em
formato de bastão (báculo), contendo no seu genoma entre 80 e 200 kilobases (kb)
(Lauzon et al, 2006). O nome Baculoviridae tem origem a partir da palavra latina
27 (Fields et al., 2001). Possuem uma característica única entre os vírus conhecidos, por
apresentarem dois fenótipos distintos durante um único ciclo de infecção: o BV ou vírus
extracelular (BV do inglês budded virus), que é responsável pela transmissão do vírus
de célula a célula; e o OB, vírus ocluso ou corpo de oclusão (OB do inglês occlusion
body) (Smith et al., 1983), sendo responsável pela transmissão horizontal do vírus de
inseto a inseto (Figura 1).
Figura 1: Ultraestrutura de um baculovírus. (A) Microscopia eletrônica de transmissão mostrando uma partícula viral extracelular (budded virus – BV) entrando em uma célula por endocitose. (B) A figura mostra através de microscopia eletrônica de transmissão as partículas virais oclusas (ODV) em uma
matriz protéica (corpo de oclusão, OB ou poliedro). A seta em A mostra uma partícula viral extracelular e
em B mostra múltiplas partículas virais envelopadas (vírus oclusos) no interior de um poliedro. (Fontes:
foto A: adaptada de www.cheque.uq.edu.au/research/bioengineering/research/Baculovirus/Baculo2.gif e
foto B: cedida pelo Dr. Bergmann Morais Ribeiro).
Na década de 90, a classificação do Comitê Internacional de Taxonomia de
Vírus dividiu a família Baculoviridae em apenas dois gêneros: Nucleopolyhedrovirus,
composto pelos NPV, e Granulovirus, compreendendo os GV (Murphy et al., 1995;
28 Os NPV possuem corpos de oclusão poliédrica (PIB), também chamados de poliedros,
variando seu diâmetro de 0,15 a 15 µm (Bilimoria, 1991) e contendo vários vírions. Sua
principal proteína é denominada poliedrina, com massa molecular em torno de 30.000
daltons (Summers et al., 1980), correspondendo a cerca de 95% do seu conteúdo
protéico (Maruniak, 1986). Os vírus desse gênero podem conter apenas um
nucleocapsídeo por vírion (Single nucleopolyhedrovirus - SNPV) ou vários
nucleocapsídeos por vírion (Multiple nucleopolyhedrovirus - MNPV) (Bilimoria, 1991;
Theilmann et al., 2005), enquanto os GV são caracterizados pela forma ovicilíndrica do
corpo de oclusão, denominado grânulo, com cerca de 0,3 x 0,5 µm (Crook, 1991) e
geralmente possuem um ou raramente dois a três vírions por grânulo. Assim como a
poliedrina, a granulina é o principal componente protéico do grânulo. Os GV ainda são
pouco estudados, devido a limitações no tocante à replicação viral em cultura de células,
(Winstanley & Crook, 1993) e por possuírem uma restrita gama de hospedeiros (Dwyer
& Granados, 1988; Funk & Consigli 1992; Winstanley & Crook 1993). Por sua vez, os
NPV são encontrados em mais de 700 espécies hospedeiras documentadas para esse
tipo de vírus (Moscardi, 1999; Herniou & Jehle, 2007) e diferentes linhagens de células
de inseto em cultura susceptíveis foram descritas (Miller, 1997).
Baseando-se em estudos filogenéticos de baculovírus, utilizando o gene da
poliedrina, os NPV foram classificados em grupo I e grupo II (Zanotto et al., 1993;
Herniou et al., 2003).
A maioria dos baculovírus tem sido isolada a partir de lepidópteros, com
centenas de espécies confirmadas como hospedeiras. Além de lepidópteros, os
baculovírus também infectam himenópteros e dípteros (Theilmann et al., 2005).
Análise dos genomas de 29 baculovírus demandou uma revisão na
29 proposta, existem quatro gêneros: Alphabaculovírus, NPV Lepidópteros específicos;
Betabaculovírus, GV Lepidópteros específicos; Gammabaculovírus, NPV himenópteros
específicos; e NPV Deltabaculovírus, dípteros específicos (Cartens & Ball, 2009).
B.
Modo de infecção
in vivo
A principal rota natural de infecção por baculovírus é pela ingestão de
alimento contaminado com o vírus na forma ocluída, o OB (poliedro ou grânulo,
dependendo do gênero). Os ODV, presentes na matriz cristalina dos OB, estão
protegidos da degradação ambiental e são liberados do OB após a dissolução dos
mesmos no ambiente altamente alcalino (pH 9,5 a 11,5) do intestino médio da larva do
inseto, dando início à infecção das células colunares epiteliais do intestino médio pela
fusão dos nucleocapsídeos virais com a membrana das microvilosidades (Horton &
Burand, 1993). A partir da progênie viral da infecção primária, é estabelecida a infecção
secundária, ou seja, outros tecidos são infectados (Hom & Volkman, 2000). Dentro da
célula, o vírus perde seu capsídeo e o DNA viral é liberado no núcleo ou então o próprio
nucleocapsídeo entra no núcleo e perde a sua capa protéica. Após a entrada no núcleo, o
DNA viral é replicado e novos nucleocapsídeos são produzidos. Estes são então
transportados para a região basolateral das células colunares do intestino médio e
eventualmente são liberados para infectar células do sistema traqueal. Estas células
atravessam a lâmina basal e servem de vias para o deslocamento do vírus tanto para
células epidermais da traquéia quanto para a hemolinfa (Hom & Volkman, 2000). Os
vírus podem também passar direto pelas células intestinais via membrana basal do
30 Após oito horas da infecção, o núcleo torna-se hipertrofiado, o nucléolo
aumenta de tamanho e forma-se um estroma virogênico no seu centro. A montagem e
maturação dos nucleocapsídeos ocorrem, ainda, no núcleo, perifericamente ao estroma
virogênico (Williams & Faulkner, 1997) e, logo após, os nucleocapsídeos brotam da
membrana nuclear para o citoplasma (Federici, 1997). As células epiteliais infectadas
produzem um segundo fenótipo, os BV, que brotam através das células da membrana
basal que contém a glicoproteína GP64 ou LD130, dependendo do vírus, permitindo a
entrada dos mesmos nas células-alvo, promovendo a fusão do envelope com as
membranas vesiculares endocíticas (Engelhard et al., 1994; Volkman, 2007) (Figura 2).
A infecção em insetos da ordem Lepidoptera geralmente se espalha rapidamente para
outros tecidos e o inseto morre em poucos dias. Na maioria das vezes, após a morte da
larva do inseto infectada pelo vírus, o seu tegumento se desintegra, liberando os OB no
meio ambiente. A quantidade de OB presente em uma larva em seu último estágio de
desenvolvimento antes de se tornar adulta é de até 1010 OB nos NPV e 1011 OB nos
GV (Payne, 1986).
As lagartas são mais susceptíveis à infecção viral durante os primeiros estágios
larvais. Os sintomas mais comuns da infecção por NPV incluem perda de apetite,
clareamento da epiderme devido ao acúmulo de vírus nos núcleos das células
epidermais e adiposas, parada no desenvolvimento larval e diminuição de movimentos
31
.
Figura 2: Esquema da infecção de uma larva de um inseto da ordem Lepidoptera por baculovírus: Em (1) o inseto ingere o poliedro (OB), que eventualmente havia sido liberado no meio ambiente, por um outro inseto morto por infecção causada por baculovírus. O poliedro é, então, dissolvido no intestino médio (2), pela ação do pH alcalino, liberando as
partículas virais. Com a ruptura da membrana peritrófica, o vírus pode então infectar células colunares (caracterizando a infecção primária) inicialmente, e, em seguida, partindo para a
infecção de outros tipos celulares, como traqueócitos e hemócitos, (caracterizando a infecção secundária) (3). A infecção se espalha, causando a morte da larva (4) e esta se torna um
32
C.
Regulação da expressão gênica
A expressão gênica dos baculovírus pode ser dividida em duas fases distintas:
fase precoce (“early”) e fase tardia (“late”). Podem existir ainda subdivisões
representadas pelas fases: a) imediata precoce (“immediately early”), correspondendo a
genes expressos logo nas primeiras horas de infecção; e b) muito tardia (“very late”),
representando os genes expressos a partir de 18 horas de infecção, sendo que nessa fase,
a proteína viral mais produzida nos NPV é a poliedrina (Maruniak, 1986). A fase
precoce ocorre antes da replicação do DNA viral, como no caso do Autographa
californica multiple nucleopolyhedrovirus (AcMNPV), onde esses genes são
dependentes da RNA polimerase II do hospedeiro para serem expressos e estão
envolvidos no processo de replicação viral que ocorre posteriormente. A fase tardia
ocorre após a replicação do DNA viral quando há o “desligamento” da expressão gênica
da célula hospedeira e a produção de BV (Ribeiro et al., 1998). Os genes tardios estão
envolvidos na montagem do vírus e os genes muito tardios no processo de oclusão
(Jarvis et al., 1997; Thiem et al., 1996; Lu & Miller, 1997).
Os genes expressos durante a fase precoce, a partir de 30 minutos após a
infecção (p.i.) e até aproximadamente 8 horas após a infecção (h p.i.), correspondem a
fatores de transcrição, principalmente, mas também podem ser proteínas pertencentes à
maquinaria de replicação do DNA viral. Esses genes são prontamente reconhecidos pelo
complexo de transcrição celular, sendo, por esse motivo, transcritos rapidamente
(Passarelli & Miller, 1993; Xu et al., 1995; Todd et al., 1996; Guarino et al., 1998;
Gross & Shuman, 1998). Os genes produzidos durante essa fase são necessários para as
33 Os genes expressos durante a fase tardia, entre 6 e 18 h p.i., correspondem ao
início da replicação viral. Essa fase coincide com a produção de BV, que são produzidos
pelo empacotamento de novos DNA virais sintetizados em nucleocapsídeos que deixam
o núcleo e brotam através da membrana plasmática celular (Lu & Miller, 1997).
Os genes expressos durante a fase muito tardia, iniciando a 18 h p.i.,
coincidem com a produção dos OB, que são produzidos depois que o nucleocapsídeo
torna-se envelopado dentro do núcleo, resultando em vírions que são embebidos em
uma matriz protéica cristalina, formando corpos nucleares conhecidos como poliedros
ou grânulos, dependendo de sua aparência morfológica (Lu & Miller, 1997).
D.
Baculovírus como vetor de expressão: AcMNPV
O conhecimento sobre o genoma dos baculovírus permitiu um estudo mais
detalhado de seus genes e promotores. Os primeiros relatos do uso de baculovírus como
vetor de expressão foram publicados por Smith et al. (1983 b) e Pennock et al. (1984),
que usaram o AcMNPV para produzir β-interferon e β-galactosidase, respectivamente, em células de S. frugiperda. As vantagens para utilização de baculovírus como vetores
de expressão segundo O’ Reilly et al., 1992; Jarvis, 1997; e Ribeiro et al., 1998, Castro
et al., 1999; Kost et al., 2005 são as seguintes:
1. Potencial para expressão de proteínas heterólogas em altos
níveis (varia de 10 a 100 mg de proteína por 109 células de inseto, mas há
casos de 600 mg/109 células);
2. Facilidade de purificação da proteína heteróloga;
3. Existência de promotores fortemente ativos durante a fase
34 4. Diferentes fases na regulação gênica do ciclo viral,
oferecendo oportunidade de expressão de genes heterólogos sob diferentes
condições celulares;
5. Capacidade para clonagem de grandes inserções;
6. Eficiência na expressão de genes contínuos (sem íntrons) e
cDNA;
7. Simplicidade de manipulação;
8. Ambiente eucariótico para expressão de proteínas
complexas de eucariotos. Principalmente, quando as proteínas necessitam de
modificações pós-traducionais exclusivas de sistemas eucariotos para serem
ativas como N-glicosilação; O-glicosilação; clivagem proteolíticas etc.; e
9. Alta especificidade dos baculovírus, que os torna um
sistema seguro de ser utilizado.
O sistema de expressão baculoviral também possui algumas limitações, entre
elas encontramos o fato de que células de inseto são incapazes de produzir complexos
N-glicosilados com resíduos de galactose, no penúltimo, e ácido siálico no último
resíduo de sua cadeia. Isso ocorre porque células de insetos e células de mamíferos
possuem caminhos para a modificação pós-traducional de N-glicosilação diferentes.
Ensaios enzimáticos demonstram que células de inseto possuem pouca ou nenhuma
atividade de galactosiltransferase ou sialiltransferase envolvidas no processo de
N-glicosilação, dificultando a adição desses resíduos no final da cadeia proteica.
Modificações de N-glicosilação, principalmente resíduos terminais de ácido siálico,
contribuem para diferentes funções biológicas da glicoproteína. Para algumas aplicações
35 recombinantes, a falta dos resíduos de ácido siálico é inaceitável (Jarvis et al., 2001;
Kost et al., 2005).
Outra modificação pós-traducional que não é tão eficiente em células de inseto
quanto em células de mamíferos é a sumolização, adição de moléculas da proteína
Sumo (semelhante a ubiquitina) na proteína recém traduzida. Para suprir essa limitação,
Langereis (2007) introduziu, em linhagens celulares de insetos, componentes da
sumolização de mamíferos por co-infecção com baculovírus recombinantes. Os
recombinantes expressavam individualmente cada componente deste processo. A
expressão dessas proteínas foi necessária e suficiente para ativar a sumolização de
proteínas testes.
O sistema de expressão de proteínas heterólogas usando baculovírus baseia-se
na introdução de genes exógenos no genoma viral no lugar de um gene não-essencial
para replicação, sob o comando de um promotor forte (por exemplo, o promotor do gene
da poliedrina, polh). A inativação desse gene por deleção ou inserção de uma seqüência
de DNA produz um vírus que é capaz de se replicar em células de inseto, mas não
produz poliedrina e, como consequência, não ocorre a formação da forma oclusa do
vírus (OB). As células infectadas pelo vírus, que não produz OB, são de fácil
localização através da observação ao microscópio óptico, pela ausência de OB
intracelulares característicos dos vírus normais. A expressão do gene polh é conduzida a
partir de um promotor forte, pois, por volta de 72 h p.i., a poliedrina compõe cerca de
20-50% da proteína produzida pela célula infectada. Dessa forma, o modelo mais
simples de vetores para o sistema de expressão em baculovírus foi a troca do gene da
poliedrina por um gene heterólogo de interesse sob o controle do promotor do gene polh
36 A tecnologia para construção de vetores de baculovírus é feita com base em
plasmídeos de transferência. Estes são unidades replicativas que contêm regiões
flanqueadoras do gene que se pretende substituir no genoma viral, incluindo ou não a
seqüência codificante, seu promotor e um sítio de clonagem (Miller et al., 1986). Após
a construção do plasmídeo, é feita a co-transfecção da célula do inseto, utilizando-se o
DNA do vírus parental e o DNA do plasmídeo. Durante a infecção viral, por
recombinação homóloga, o gene original no vírus é substituído pelo gene de interesse
contido no plasmídeo. O vírus recombinante formado é, então, selecionado por
plaqueamento em células infectadas (Castro et al., 1999).
Inicialmente, os vírus recombinantes eram construídos com deleção do gene da
poliedrina, permitindo sua seleção através de placas ocluso-negativas. Para facilitar a
identificação, outros vírus, contendo genes marcadores como o lac-Z (β-galactosidase),
foram desenvolvidos (Summers & Smith, 1987; O’Reilly & Miller, 1990). Dessa forma,
a seleção de um clone recombinante é facilitada em presença do substrato sintético
(X-Gal). Neste caso, células infectadas com o vírus parental apresentam coloração azul,
enquanto as infectadas com o vírus que recebeu o inserto (gene da β-galactosidase
interrompido) apresentam coloração branca (O’Reilly et al.,1992).
Existem vários métodos para facilitar e aumentar a velocidade de construção
de um baculovírus recombinante e estes diferem apenas na localização onde o gene de
interesse será incorporado dentro do genoma do baculovírus. O primeiro método
acontece quando um vetor de transferência, contendo o gene clonado, é introduzido
juntamente com o DNA viral dentro de células de inseto, onde eventos de recombinação
ocorrerão. O uso do DNA circular do tipo selvagem para este processo foi amplamente
substituído pelo uso de formas lineares do genoma viral, não infeccioso. Este processo é
37 o gene de interesse é posicionado sob o comando de um promotor forte do baculovírus,
e o uso de um DNA viral linear com o mínimo de possibilidade de re-circularização
para que eventos não desejados de recombinação ocorram, diminuindo a infectividade e
aumentando a proporção de baculovírus recombinantes (Kitts et al., 1990; Airenne et
al., 2003). Outro método é a recombinação em células de Escherichia coli, DH10BacTM
(Invitrogen) a qual utiliza sítios de transposição Tn7 para inserir genes no locus do gene
polh e no meio do gene lac-Z, que codifica a enzima β-galactosidade (Lac-Z) no DNA viral na forma de um plasmídeo (bacmídeo) propagado em células de E. coli. Desse
modo, o vetor recombinante (onde ocorreu transposição do gene de interesse) gerará
apenas colônias brancas, devido à interrupção da sequência codificadora da β -galactosidase, diferentemente do vetor íntegro que produzirá β-galactosidase e colônias bacterianas azuis (Luckow et al., 1993). Esse método consiste de um vetor de
transferência (por exemplo, o pFastBacTM1) que contém o gene de interesse sob o
comando de um promotor específico do baculovírus e, quando propagadas em células
de E. coli, DH10BacTM, ocorre a transposição do cassete de expressão do gene
heterólogo para o bacmídeo dentro da célula hospedeira.
E.
Anticarsia gemmatalis
multiple
nucleopolyhedrovirus
(AgMNPV)
O baculovírus mais estudado até hoje é o Autographa californica multiple
nucleopolyhedrovirus (AcMNPV), sendo considerado espécie-tipo do gênero
Alphabaculovírus (Theilmann et al., 2005). Também foi o primeiro baculovírus a ser
sequenciado (Ayres et al., 1994). No Brasil, o baculovírus mais utilizado como
38 para o controle de uma praga. A utilização do AgMNPV para o controle da lagarta da
soja, A. gemmatalis (Hübner) (Lepidoptera: Noctuidae), foi desenvolvido a partir do
final da década de 70 e início da década de 80 pela Embrapa Soja em Londrina/PR
(Figura 3). Parâmetros de controle biológico, bem como método de produção massal,
controle de qualidade, epizootiologia e tecnologia de aplicação foram estabelecidos por
Moscardi (1983, 1989). Ao lado das vantagens ecológicas no uso do vírus, existe
também uma vantagem econômica de aproximadamente 70% quando comparado ao uso
de pesticidas químicos. Esse fato indica que milhões de litros de inseticida químico não
estão sendo aplicados anualmente e consequentemente há uma economia de milhões de
dólares e menor contaminação do meio ambiente com resíduos químicos (Ribeiro et al.,
1998). A mortalidade das larvas tem sido acima de 80% e o desfolhamento da soja
tem-se mantido abaixo do limiar de dano econômico, quando o biointem-seticida é aplicado nas
condições recomendadas (Moscardi, 1983, 1989; Moscardi & Correa-Ferreira, 1985;
Moscardi & Sosa-Gómez, 1996). Esses resultados levaram ao desenvolvimento de uma
formulação do bioinseticida, permitindo sua industrialização e comercialização
39
Figura 3: Fotos de uma larva de Anticarsia gemmatalis saudável (A) e infectada pelo baculovírus AgMNPV (B). Adaptado de www.viarural.com.ar/viarural.com.ar/insumosagropecuarios/agricolas/ agroquimicos/cheminova/especies/anticarsia-gemmatalis-05.htm (A) e de www.embrapa.gov.br/ (B).
O genoma do AgMNPV foi sequenciado (Oliveira et al., 2006) e contém
132.242 pares de bases (pb) e a sua análise inicial revelou que o AgMNPV pertence aos
NPV do grupo I, possuindo uma maior identidade de sequência e organização genômica
com os vírus Choristoneura fumiferana defective nucleopolyhedrovirus (CfDefMNPV),
Orgyia pseudotsugata multiple nucleopolyhedrovirus (OpMNPV) e Choristoneura
fumiferana multiple nucleopolyhedrovirus (CfMNPV), conforme árvore filogenética
construída por Dalmolin et al. (2005). O AgMNPV se replica em células de
Trichoplusia ni (TN368), S. frugiperda (IPLB-Sf21-AE), A. gemmatalis (UFL-AG-286)
(Hink, 1970; Vaugh et al., 1977; Sieburth & Maruniak, 1988; Castro et al., 2006) e
40
F.
Baculovírus recombinante para controle biológico
A utilização de baculovírus como agente de controle biológico nas lavouras,
atualmente, é dificultada por alguns fatores que interferem no seu uso no campo, como a
inativação do vírus pela radiação solar, a folha onde o mesmo é depositado, o momento
da aplicação, a temperatura, a qualidade e quantidade de inóculo e a baixa velocidade do
baculovírus selvagem para matar seu hospedeiro (Moscardi, 1998; Fuxa, 1991). Uma
das soluções encontradas para o último fator é a construção e utilização de baculovírus
capazes de aumentar a virulência e consequentemente diminuir o tempo de vida dos
insetos infectados.
Avanços na engenharia genética tem tornado possível manipular
geneticamente baculovírus selvagens para realçar suas propriedades como agentes de
controle de pragas (Booth et al., 1992; Van Beek & Hughes, 1998; Ashour et al., 2007).
Genes codificando neurotoxinas, enzimas e hormônios peptídicos de insetos
têm sido introduzidos nos genomas de baculovírus para produzir baculovírus
recombinantes com o aumento da velocidade de morte, reduzindo os prejuízos causados
pelos insetos-pragas. Alguns dos mais efetivos baculovírus recombinantes expressam
neurotoxinas específicas para inseto (Smith et al., 2000; Treacy et al., 2000; Van Beek
& Hughes, 1998). Em hospedeiros susceptíveis, estas neurotoxinas, expressas pelos
vírus, reduzem os danos à lavoura e o tempo necessário para matar 50% dos insetos em
bioensaios (TL50) estimados para 25-50% quando comparado às larvas infectadas com o
vírus selvagem (Cory et al., 1994; McCutchen et al., 1991; Stewart et al., 1991;
41 Em 1988, o primeiro gene de toxina inseto-específica foi inserida no genoma
do baculovírus AcMNPV sob o comando do promotor da poliedrina (polh). O gene
inserido codifica a toxina-1 do escorpião Buthus eupeus (Belt). No entanto, essa toxina
não aumentou a eficiência do baculovírus recombinante (Carbonell et al., 1988).
Genes da toxina Cry da bactéria Bacillus thuringiensis (Bt) foram inseridosem
baculovírus (Merryweather et al., 1990, Pang et al., 1992; Ribeiro & Crook, 1993;
Ribeiro et al., 1998; Martens et al., 1995; Chang et al., 2003; Aguiar et al., 2006;
Martins et al., 2008). Todas as proteínas Cry foram expressas em grande quantidade e
mostraram atividade biológica similar às proteínas nativas. Entretanto, apenas quando a
proteína Cry foi expressa na forma fusionada com a proteína poliedrina do baculovírus
AcMNPV (Chang et al, 2003), o vírus recombinante apresentou uma maior virulência
em relação à dose necessária para matar 50% dos insetos em bioensaios (CL50) para
Plutella xylostella quando comparado ao vírus selvagem.
Um dos primeiros baculovírus recombinantes eficaz, construído com a
intenção de controle biológico, continha o gene do hormônio diurético que, quando
injetado em larvas de Bombyx mori, foi capaz de matar os insetos 20% mais rápido que
o vírus selvagem (Maeda, 1989).
Hammock et al., 1990, inseriram o gene da esterase do hormônio juvenil
(JHE) de Heliothis virescens no genoma do AcMNPV, mostrando uma pequena
melhora na virulência somente para larvas neonatas de T. ni. Entretanto, quando versões
mutadas do gene JHE, que aumentam a estabilidade da proteína, foram introduzidas no
genoma do AcMNPV, ocorreu um aumento na virulência contra larvas de diferentes
estágios de desenvolvimento de H. virescens (Bonning et al., 1999).
O gene da toxina derivada do ácaro Pyemotes tritici, TxP-1, foi também
42 & Miller, 1991, 1992; Lu & Miller, 1997). A ação dessa toxina é paralisante, causando
contração muscular. Resultados semelhantes foram encontrados com a toxina AaIT do
escorpião Androctonus australis. Sua ação ocorre nos canais de sódio dos neurônios,
causando um efeito excitatório pré-sináptico. Larvas infectadas com esses baculovírus
recombinantes exibem um aumento da irritabilidade e cessam sua alimentação.
Outras toxinas como Lqh&IT2 de escorpiões (Froy et al., 2000; Imai et al.,
2000), aranhas (Prikhod’ko et al., 1998), anêmonas do mar (Prikhod’ko et al., 1998) e
ácaros (Tomalski & Miller, 1991; Hughes et al., 1997; Burden et al., 2000) foram
também expressas usando baculovírus, mostrando, também, redução no tempo letal dos
vírus recombinantes.
Alguns baculovírus produzem uma proteína, Ecdisteroide UDP-Glicosil
Transferase (EGT), que inativa o hormônio da muda do inseto (O’Reilly & Miller,
1989; Rodrigues et al., 2001). A deleção ou inativação desse gene resulta em redução
do tempo letal (O’Reilly & Miller, 1989; Pinedo et al., 2003). Esse exemplo demonstra
a utilidade de deleção de um gene para acelerar a mortalidade inseto (O’Reilly, 1995;
Bonning & Hammock, 1996).
Baculovírus recombinantes que expressam proteases que degradam a
membrana basal dos tecidos dos insetos também foram desenvolvidos. Um AcMNPV
recombinante foi construído com a introdução do gene da catepsina L de Sarcophaga
peregrina, reduzindo o tempo de sobrevivência e o dano causado pelas larvas infectadas
quando comparado com o vírus selvagem (Harrison & Bonning, 2001; Li et al., 2008).
Outro gene com potencial inseticida é o gene da quitinase. Um AcMNPV
contendo o gene da quitinase de Manduca sexta, sob o comando do promotor do gene
43 de larvas de S. frugiperda, quando comparado ao vírus selvagem (Gopalakrishnan et al.,
1995).
G.
Proteases
As proteases são enzimas proteolíticas que catalisam a clivagem de ligações
peptídicas em outras proteínas. As proteases são enzimas degradativas capazes de
catalisar a hidrólise total de proteínas. Essa hidrólise requer sítios ativos dessas
proteases, com aminoácidos específicos no sítio ativo, sendo eles serina, cisteína,
aspartato e histidina. Essas enzimas ocupam uma posição importante pelas suas
aplicações tanto na fisiologia quanto na área comercial. São encontradas em vegetais,
animais e microrganismos (Rao et al., 1998).
As proteases possuem funções metabólicas funcionais e regulatórias em
processos fisiológicos e patológicos, tais como: catabolismo de proteínas, coagulação
sanguínea, migração celular, crescimento celular, arranjo de tecidos, morfogênese,
inflamação, crescimento de tumores e metástases, ativação de precursores, liberação de
hormônios, liberação de peptídeos farmacologicamente ativos, digestão, regulação do
metabolismo, nutrição, ciclo de replicação viral e regulação da expressão gênica
(Santos, 1996; Rao et al., 1998; Bressolier et al., 1999; Rawlings et al., 2002).
I. Classificação
Existem diversos critérios para classificar as proteases. Os principais estão
baseados no pH de atividade, na posição do sítio de clivagem e no tipo de substrato
44 Quanto à faixa de pH nas quais as proteases possuem maior atividade, estas
enzimas podem ser classificadas em proteases ácidas, básicas e neutras. As proteases
ácidas são representadas, principalmente, pelas aspartato-proteases e possuem atividade
na faixa de pH 2.0-6.0. As proteases neutras possuem atividade em pH neutro, na faixa
de 6.0-8.0, e incluem cisteíno-proteases, metalo-proteases e algumas serino-proteases.
Já as proteases alcalinas possuem maior atividade na faixa de pH 8.0-13.0 e são
representadas principalmente pelas serino-proteases (Santos, 1996; Rao et al., 1998).
Quanto ao sítio de clivagem, as proteases são classificadas em exopeptidases e
endopeptidases. As exopeptidases clivam as ligações peptídicas a partir das
extremidades amino ou carboxiterminais do substrato, sendo subdivididas em
aminopeptidases e carboxipeptidases. As carboxipeptidases clivam as ligações
peptídicas a partir da extremidade carboxiterminal, liberando um único resíduo de
aminoácido ou um dipeptídeo. Já as endopeptidases reconhecem uma sequência ou
grupo de aminoácidos de caráter específico e clivam ligações peptídicas internamente
na cadeia polipeptídica, liberando oligopeptídeos, e são subdivididas em
serino-proteases, serino-alcalino serino-proteases, subtilisinas, aspartato-serino-proteases,
cisteina/tiol-proteases e metalo-cisteina/tiol-proteases (Rao et al., 1998).
Quanto ao tipo de substrato, as proteases são denominadas em relação a sua
atividade como, por exemplo: colagenase, elastase e queratinase, que hidrolisam o
colágeno, elastina e queratina, respectivamente (Rao et al., 1998).
Uma classificação mais abrangente em relação às proteases é encontrada pelo
sistema de database MEROPS, onde as mesmas são classificadas em famílias e clãs
45
II. Queratinase
A queratinase é uma serino-protease, que pertence à família que utiliza
unicamente um resíduo ativo de serina para catalisar a hidrólise das ligações peptídicas
(Rawlings et al., 2002; Rao et al., 1998).
As serino-proteases representam 0,6% de todas as proteínas do genoma
humano e estão envolvidas em muitas funções vitais como a digestão, coagulação
sangüínea, fibrinólise, fertilização, ativação do sistema complemento e se relacionam
com muitas doenças como câncer, artrite e enfisema (Yousef et al., 2003).
As serino-proteases também desempenham papel importante em muitos
processos biológicos como desenvolvimento (Nakajima et al., 1997) e imunidade
(Gorman et al., 2000 a, b; Munier et al., 2004). Nos insetos, as serino-proteases são
importantes na coagulação da hemolinfa, síntese de peptídeos antimicrobianos e síntese
de melanina (Gorman & Paskewitz, 2001).
Serino-proteases pertencem ao principal grupo de enzimas do intestino de
insetos, envolvidas na digestão de proteínas da dieta (Lehane et al., 1998; Gorman &
Paskewitz, 1999; Gorman et al., 2000 a; Yan et al., 2001). As enzimas digestivas do
intestino médio são secretadas em resposta ao aumento da quantidade de proteína no
intestino e à mudança nos seus níveis no lúmen. Muitos genes de serino-proteases têm
sido identificados no intestino médio de insetos (Lehane et al., 1998; Yan et al., 2001;
Nakazawa et al., 2004). Uma serino-protease de B. mori mostrou atividade antiviral
contra BmNPV no início da infecção viral (Nakazawa et al., 2004).
A queratinase do fungo Aspergillus fumigatus foi isolada por Santos (1996),
purificada e caracterizada com uma massa molecular de 31 kDa, com características de
serino-protease, codificada por um gene de 1.200 pares de bases, com poder
46 patógeno oportunista das vias aéreas, afetando humanos, pássaros e outros animais. É
responsável por uma variedade de doenças respiratórias e muitas infecções invasivas. É
um fungo caracterizado por produzir muitas enzimas proteolíticas, como elastases
(Frosco et al., 1992; Markaryan et al., 1994; Moser et al., 1994), serino-proteases
fibrinogenolíticas (Larcher et al., 1992) e colagenases (Monod et al., 1993), que estão
envolvidas em muitos eventos-chaves na fisiopatologia de A. fumigatus (Santos et al.,
1996).
A produção de elastases em A. fumigatus e a correlação das mesmas com a
invasibilidade e aumento da patogenicidade foi descrita em diversos experimentos em
camundongos (Blanco et al., 2002; Kolattukudy et al., 1993; Kothary et al., 1984).
III. Catepsina-L
Catepsina-L é uma protease lisossomal com pH ácido em torno de 5.0, sendo
encontrada em vários tipos de células. Ela é sintetizada como uma pro-enzima no
complexo de Golgi e transportada para os lisossomos, onde acumula como uma enzima
madura (VonFigura et al., 1986; Kornfeld, 1987; Kornfeld et al., 1989; Brown et al.,
1984). A catepsina-L tem em torno de 35 kDa de massa molecular e sua pro-enzima,
pro-catepsina L, em torno de 50 kDa. A catepsina-L é uma cisteíno-protease pertencente
à família da papaína (Homma et al., 1994).
Kageyama e Takahashi (1990) purificaram e caracterizaram uma
cisteíno-protease de B. mori. A pro-enzima tem em torno de 47 kDa e sua forma madura em
torno de 39 kDa. Essa protease mostrou ter uma alta similaridade com a catepsina-L de
mamíferos (Takahashi et al., 1993). Mais tarde, essa protease foi identificada como a
enzima catepsina-L (Yarygin et al., 2003). Essa protease foi também identificada na
47 células embrionárias e discos imaginais (Harrison & Bonning, 2001). A secreção e
atividade dessa enzima está correlacionada com a inversão in vitro dos discos imaginais
durante o desenvolvimento em estruturas primordiais adultas das pernas e a degradação
de duas proteínas com peso molecular de 200 e 210 kDa (Homma & Natori, 1996).
Essas proteínas estão localizadas na superfície dos discos imaginais e podem ser
componentes da membrana basal (Harrison & Bonning, 2001).
A catepsina-L é uma poderosa cisteíno-protease, envolvida no processo de
degradação protéica intracelular e extracelular. Como outras proteases, ela é sintetizada
como uma pré-pro-enzima e subsequentemente processada para sua forma ativa madura
(Ishido & Kominami, 1998). A pro-catepsina L pode ser processada para a forma
madura da catepsina L e estocada nos lisossomos ou secretada para o meio de cultura
(Homma et al., 1994; Ishido & Kominami, 1998).
IV. Quitinase
A enzima quitinase catalisa a hidrólise de β-1, 4-N-acetyl-D-glucosamina em
polímeros de quitina. Essa enzima tem sido detectada em muitos organismos, tendo uma
função importante em cada um, como a degradação do exoesqueleto em insetos e
crustáceos, crescimento e divisão celular em fungos, degradação da quitina como
nutriente para bactérias e defesa em plantas (Kramer & Muthukrishnan, 1997;
Merzendorfer & Zimoch, 2003).
Alguns micróbios entomopatogênicos produzem quitinases para penetração no
corpo hospedeiro (Kramer & Muthukrishnan, 1997; Gooday, 1999). Por outro lado,
baculovírus produzem quitinases para liquefazer o corpo do hospedeiro depois da
48 Quitinases de lepidópteros têm sido purificadas, como de M. sexta e B. mori, e
suas propriedades bioquímicas bem caracterizadas (Kramer & Muthukrishnan, 1997;
Merzendorfer & Zimoch, 2003). Esses genes que codificam essas enzimas foram
clonados e isolados em vários lepidópteros (Kramer et al., 1993; Kim et al., 1998;
Mikitani et al., 2000; Shinoda et al., 2001; Zheng et al., 2002). Um estudo
imunohistoquímico da quitinase de C. fumiferana (Zheng et al., 2003), um ortólogo da
quitinase de M. sexta e de B. mori, revelou que essas quitinases participam da
degradação da quitina durante o processo de muda dos insetos (Kramer &
Muthukrishnan, 1997; Merzendorfer & Zimoch, 2003).
O fungo Metarhizium anisopliae é um patógeno de inseto bem conhecido e
estudado, usado como controle biológico de muitas pragas na China, Rússia e Brasil
(Gillespie et al., 1988). M. anisopliae produz distintas serino-proteases extracelulares,
como as proteases subtilisinas, tripsinas, metaloproteases, bem como muitas
exo-peptidases, que provavelmente são importantes na degradação da cutícula do hospedeiro
(St. Leger et al., 1995 b, 1996 a). A quitinase do fungo M. anisopliae parece ser
derivada de várias enzimas que dissolvem a cutícula, como hidrolases, quitinases e
proteases. No caso de M. anisopliae, é proposto que a penetração do fungo no inseto é
facilitada pela liberação de proteases durante os passos de invasão, sugerindo que a
quitinase é um dos fatores principais na penetração da cutícula comparado com
proteases (St. Leger et al. 1991). Como as proteases, as quitinases parecem ser
determinantes patogênicos (Charnley et al., 1991). As quitinases são produzidas por
estruturas de infecção na superfície da cutícula em níveis baixos durante o processo de
penetração em M. sexta; níveis altos de quitinases acumulam no ponto da degradação
proteolítica, sugerindo que a liberação da quitinase é dependente da acessibilidade do
49 Após o sequenciamento do genoma do AcMNPV, foi possível avaliar a
composição gênica desse baculovírus. Um dos genes identificados em seu genoma é o
que codifica uma quitinase (Hawtin et al., 1995). O AcMNPV causa liquefação nas
larvas infectadas pela expressão do gene de uma quitinase (Ayres et al., 1994; Hawtin et
al., 1995) e do gene (vcath) de uma catepsina (Rawlings et al., 1992; Slack et al., 1995).
Estudos de mutantes de BmNPV e AcMNPV, incapazes de produzir V-CATH, também
não causam a liquefação terminal do inseto hospedeiro (Ohkawa et al., 1994; Slack et
al., 1995; Daimon et al., 2006). Vírus recombinantes sem um dos genes são incapazes
de liquefazerem os insetos, visto que a co-infecção com os dois recombinantes restaurou
o processo (Hawtin et al., 1997; Thomas et al., 1998, 2000). A desintegração do inseto
infectado pelo AcMNPV é vantajosa, pois permite uma disseminação máxima de
poliedros no ambiente (Saville et al., 2004). No genoma do AcMNPV, a quitinase está
localizada entre os genes lef-7 e vcath (Rawlings et al., 1992; Ayres et al., 1994; Hawtin
et al., 1995). A enzima tem seu nível de expressão máxima com atividade de
endoquitinase e exoquitinase a 12 h p.i (Hawtin et al., 1995; Thomas et al., 1998).
Saville et al. (2002) mostraram que a deleção do possível sinal de localização
no retículo endoplasmático (KDEL) da quitinase do AcMNPV e a expressão do gene
modificado sob o comando do promotor da poliedrina resultou no acúmulo da quitinase
no meio de cultura das células infectadas. Larvas de T. ni infectadas com o vírus
modificado possuem um tempo de liquefação menor comparado com o vírus controle,