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Regulamentação técnica e a flexibilização da atuação da administratação pública contemporânea / Technical regulation and flexibilization of contemporary public administration

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 18218-18237, sep. 2019 ISSN 2525-8761

Regulamentação técnica e a flexibilização da atuação da administratação

pública contemporânea

Technical regulation and flexibilization of contemporary public

administration

DOI:10.34117/bjdv5n10-082

Recebimento dos originais: 12/09/2019 Aceitação para publicação: 07/10/2019

Eduardo Neineska

Especialista em Direito Ambiental pela Universidade Federal do Paraná

Especialista em Direito e Processo Administrativo pela Universidade Estadual

de Ponta Grossa/PR.

Endereço: Avenida Nossa Senhora Aparecida, 340, Nossa Senhora de Fátima,

Telêmaco Borba – PR, Brasil

E-mail: eduardoneineska@gmail.com

RESUMO

A Legislação e seus desdobramentos nas práticas Administrativas devem ser cada vez mais ser objeto de estudo na área jurídica, tendo como perspectiva o alastramento estatal, a concepção do Estado Gerencial e a submissão do Administrador à lei. Este artigo analisa o tema da legislação pátria sob a perspectiva dos conceitos empregados pelo legislador, e a função normativa do Poder Executivo, notadamente o dever-poder regulamentar, em sua acepção de regulamentação técnica. Sob o enfoque dos conceitos jurídicos indeterminados, busca-se dentro dos ditames constitucionais e da teoria dos três poderes demonstrar a necessidade de se entender a legislação como mecanismo de facilitação social e dentro de tal finalidade, reconhecer por vezes o desconhecimento técnico do Poder Legislativo, bem como a atribuição de competências constitucionais inerentes ao Poder Executivo. Assim, as ditas lacunas da lei, se mostram, em matéria administrativa, como verdadeiros pontos de atuação concreta e pontual da Administração na busca pelo atendimento ao interesse público.

Palavras-chave: Poder Regulamentar; Estado Gerencial; Conceitos Jurídicos Indeterminados; Cláusulas Gerais; Técnica Legislativa.

ABSTRACT

The legislation and its consequences on administrative practices should be increasingly be studied in the legal field, with the prospect the state spread the conception of the State Management and submission administrator to the law. This article examines the issue of Brazilian legislation from the perspective of the concepts employed by the legislature, and the regulatory function of the executive branch, notably due to regulatory power. Under the focus of indeterminate legal concepts, to search within the constitutional principles and the theory of three powers demonstrate the need for the legislature to understand the law as social facilitation mechanism, and within such purpose, recognize their technical knowledge, and the allocation of constitutional powers inherent in the executive branch. Thus, said gaps in the

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 18218-18237, sep. 2019 ISSN 2525-8761 law, are shown in administrative matters, as true points of concrete and timely action of the administration in the pursuit of serving the public interest.

Keywords: Regulatory power; Managerial State; Indeterminate Legal Concepts; General Provisions ; Legislative technique.

1 INTRODUÇÃO

Neste trabalho, busca-se avançar de maneira geral sobre as técnicas legislativas utilizadas de formulação utilizadas em nosso sistema legislativo, essencialmente no que tange ao modo da utilização de termos jurídicos e a respectiva restrição ou ampliação da discricionariedade administrativa, bem como da capacidade inerente ao dever-poder regulamentar do Poder Executivo.

É ponto de discussão ainda, a demonstração que o legislativo admite maior ou menor margem de escolha à Administração Pública conforme a natureza da temática abordada na legislação, bem como a necessidade de aprofundamento sobre a matéria.

Dentro de uma temática de liberdade legislativa, passa-se a adentrar no estudo do poder regulamentar, sua origem legal, bem como a forma de identificação da possibilidade ou não do exercício do dever-poder regulamentar.

Dentro da temática do dever-poder regulamentar, se realizará exposição de novos conceitos acerca do dever-poder regulamentar, especialmente em seu aspecto técnico, conciliando a técnica da necessidade material disciplinada pela lei, com a própria técnica legislativa e a utilização de conceitos jurídicos indeterminados.

Por fim, a temática da interpretação legislativa, tendo como base as ideias contemporâneas da Administração Pública Gerencial como substituto da Administração Burocrática, e as necessárias mudanças de cunho filosófico e hermenêutico, tanto na aplicação, quando na elaboração da legislação.

O presente trabalho, guarda relevância em seu tema trabalhado, já que aborda, mesmo que de maneira inicial, a temática das funções estatais, e suas atitudes de interferências e cooperações, na busca por um melhor gerenciamento do poder público através de seus órgãos.

2 METODOLOGIA

O presente artigo tem como métodos o teleológico e dialético, buscando dentro de uma análise de ideias e contrapontos a finalidade das normas jurídicas relacionadas ao tema proposto. Trata-se de pesquisa aplicada do tipo descritiva com abordagem qualitativa. Quanto aos meios de investigação, foi utilizada a revisão bibliográfica, com a formação de um

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 18218-18237, sep. 2019 ISSN 2525-8761 referencial teórico sobre assuntos em relação direta ao tema, cujos dados consistem de coletadas em periódicos, artigos, dissertações e teses.

3 A SEPARAÇÃO DE FUNÇÕES ESTATAIS: SEUS REFLEXOS NA FORMA DE APLICAÇÃO DAS LEIS

O objetivo no primeiro tópico do presente trabalho, é percorrer o caminho mais elementar do trabalho, no caso a separação de poderes, chegando-se até os aspectos de disposição na lei dos conceitos jurídicos que irão efetivamente serem aplicados no ordenamento.

Busca-se ainda, apontar a influência das mudanças no ideal clássico de separação de poderes, para uma ideia de distribuições de funções, dentro do contexto da abrangência das normas e tipos legislativos.

3.1 O IDEAL CONTEMPORÂNEO DE SEPARAÇÃO DE PODERES

Em sua grande maioria, a ciência jurídica ainda tem em mente, a tripartição dos

poderes formulada por Montesquieu1, onde funções ou poderes, são definidas como: função

legislativa, função executiva e função jurisdicional. Deferidas a determinados órgãos, com um leve sistema de freios e contrapesos. Contudo, tal divisão, quase imutável e estática já não se faz mais presente, diversos são as classificações para as funções do Estado que se formulam com o passar dos anos, e com elas o pensamento científico também se modifica.

Dentre tantas classificações formulada, as que atualmente mais são aceitas e reverenciadas pela ciência jurídica, notadamente no Brasil, abordando novas para as definições da nova estrutura funcional do Estado, são as expostas por Georges Burdeau e Karl Lowenstein.

O primeiro, divide as funções estatais na criação do Direito, produzindo o direito, introduzindo na ordem jurídica matéria inovadora, ou seja, a função de inovar na ordem jurídica, com a modificação, atualização ou introdução de conteúdos legais, a qual seria deferida como função governamental; e a execução do Direito criado, que abarcaria as competências e decisões que derivariam da função de criação do direito, essa que seria deferida

1 MONTESQUIEU, Charles Louis de Secondat. Do Espírito das Leis - Col. A Obra Prima de Cada Autor. São Paulo: Martin Claret, 2009. p. 83-105.

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 18218-18237, sep. 2019 ISSN 2525-8761 à função administrativa, tanto a função administrativa em sentido estrito, como a função

jurisdicional2.

Por sua vez Lowenstein3, sugere uma tripartição das funções, contudo, de maneira

diversa da tripartição clássica, utilizando, além das funções definidas por Burdeau, acima citadas, a função de controle.

Como bem se sabe, no Brasil, temos funções estatais definidas, quase estáticas, dentro de uma atribuição de poderes do Estado, divididas de acordo com a funcionalidade, sendo que ao Legislativo cabe legislar, ao Executivo cabe gerenciar, e ao Judiciário julgar. Evidente que aqui, se fala de um sistema de funções típicas, não deixando de lado o deferimento de funções

atípicas para os Poderes do Estado, em um sistema de freios e contrapesos4.

Nesse sentido, pode-se afirmar, que o Legislativo, e em especial no Brasil, apesar de manter seu papel de detentor e protagonista no processo legislativo, passou a contar com o acompanhamento do Executivo neste processo, em uma clara demonstração de abandono da teoria clássica da partição de poderes, flertando com uma teoria mais dinâmica para as distribuições das funções estatais.

A administração passou a gerenciar os atos do poder público (atribuição tradicional do Executivo), mas passou a prever e normatizar as situações de governo (atribuição

tradicional imposta quase que exclusivamente ao Legislativo)5.

Tanto que, enormes são os temas de iniciativa legislativa exclusiva do Poder

Executivo, como os expressos no art. 61, § 1º da CRFB/886, das leis orçamentarias, sem falar

2 GEORGES BURDEAU, Traité de Scíence Politique. 1968. p. 186 apud NETO, Diogo Figueiredo Moreira. Interferências entre poderes do estado. Revista de informação legislativa, ano 26, Brasília, n. 103, p. 05-26, jul./set. 1989. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/181961>. Acesso em: 13 mar. 2016. p. 7

3 LOWENSTEIN, Karl. Polítical poicer and the Governamental Process. Chicago Press, 1965. p. 42 apud NETO, Diogo Figueiredo Moreira. Interferências entre poderes do estado. Revista de

informação legislativa, ano 26, Brasília, n. 103, p. 05-26, jul./set. 1989. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/181961>. Acesso em: 13 mar. 2016. p. 7

4 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 33 ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 108-112.

5 RIBEIRO, Flavia. O legislativo e a problemática da responsabilidade na organização constitucional contemporânea. Brasília: Senado Federal, 1980. p. 47-51.

6 Art. 61. (...) § 1º São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que: I - fixem ou modifiquem os efetivos das Forças Armadas; II - disponham sobre: a) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração; b) organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração dos Territórios; c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria; d) organização do Ministério Público e da Defensoria Pública da União, bem como normas gerais para a organização do Ministério Público e da Defensoria Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios; e) criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública, observado o disposto no art. 84, VI; f) militares das

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 18218-18237, sep. 2019 ISSN 2525-8761 na possibilidade da edição de medidas provisórias, que detém força de lei, onde o Executivo, não só tem a iniciativa do processo legislativo, como de fato, cria a legislação dentro do ordenamento jurídico, por certo que com vigência transitória, e submetida posteriormente ao crivo do Congresso, mas em clara regra que tenta conferir eficiência e dinamismo à Administração Pública.

O que se nota, ou melhor dizendo, o que na verdade faz-se notar obrigatoriamente, é que em nossa sistemática Constitucional, o Legislativo irá receber a legislação, no que diz respeito à Administração Pública, com iniciativa legislativa do próprio Executivo, essa é a regra geral, e isso se dá porque é, afinal, o Executivo, que dentro de uma concepção clássica, detém a função do gerenciamento da Administração Pública.

E não só nesse ponto que se pode observar profundas e necessárias mudanças na divisão de atribuições dentro dos poderes do Estado. Como se passará a ver neste trabalho, dentro da técnica legislativa, não mais se entende como recomendável, mas como necessário uma abordagem mais branda da função legiferante, exercida primordialmente pelo Poder Legislativo nas atribuições atinentes ao Poder Executivo e à Administração Pública como um todo.

3.2 TÉCNICA LEGISLATIVA E SUA REDAÇÃO

Para uma melhor compreensão sobre o sistema das legislações que nos cercam, devemos voltar nossos olhos para a técnica legislativa, no modelo adotado no Brasil, para a formulação das leis, especialmente quanto ao seu conteúdo.

Na doutrina, entende-se como técnica legislativa, a série de atos que vão desde a inciativa do processo legislativo – com sua respectiva redação de projeto de lei – até o

momento de interpretação da legislação7.

Com tal premissa em mente, pode-se considerar para início de estudo, que as leis são, em última instância, verdadeiros trabalhos intelectuais, e como tais, devem observar uma ideia, um objetivo, contar com determinado planejamento para, por fim, ter a adequada estruturação.

Forças Armadas, seu regime jurídico, provimento de cargos, promoções, estabilidade, remuneração, reforma e transferência para a reserva.

7 GENY, F. Livro do Centenário do Código Civil Francês apud CARVALHO, Kildare Gonçalves. Técnica Legislativa. 4 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 80.

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 18218-18237, sep. 2019 ISSN 2525-8761 Na boa técnica legislativa, tais pontos devem sempre procurar uma harmonização dos conceitos jurídicos e sociais relacionados a legislação, para que o intérprete não tenha

dificuldades demasiadas em seu entendimento ou mesmo em sua aplicação8.

Pois bem, a técnica legislativa, em seu caráter geral, deve ser entendida como uma temática até mesmo acima do estudo do direito, é um fenômeno sociológico por essência, estudado tanto pela Ciência Jurídica como pelas demais Ciências Sociais, para eles sempre serve de baliza para determinar em que estágio a sociedade qual determinadas leis estão inseridas para traçar um perfil inicial da população.

Evidente que tal fenômeno, a arte de formar leis, por assim dizer, sob seus requisitos formais, tem como baliza ditames constitucionais e legais. Contudo, quando se atribui um olhar específico, apenas sobre seu conteúdo, percebe-se que a técnica legislativa em sentido estrito se torna um fato a parte, fora dos ditames jurídicos, mas por certo, traz aos operadores do direito uma das suas maiores, se não a sua grande atribuição, a interpretação e a integração legislativa, dentro de um sistema de fato.

Durante, muito anos, foi o entendimento majoritário que devia o legislativo, apresentar uma legislação mais completa possível, o que por muitas vezes resultou (resulta) em leis prolixas, sem coerência ou até mesmo contraditórias, deixando margem para quase nenhuma interpretação, ou qualquer margem de necessidade de integração, principalmente em razão do positivismo jurídico, que partia do pressuposto da perfeição da lei, da inexistência de falhas e de um exercício de previsibilidade das situações fáticas por parte do legislador.

Em que pese, o pensamento positivista, já se sabia, desde os autores mais clássicos, que a lei, deve ter um caráter objetivo, evitando-se a prolixidade e minucias que fogem de suas

características essenciais9.

Assim, após diversos anos do pensamento positivista, e de uma clássica e fechada separação de poderes, a técnica legislativa tradicional passou a ser vista como insuficiente, ou

até mesmo inadequada10, a divisão outrora quase imutável dos ‘poderes’ estatais deixou de ser

aplicada, e passou, conforme as aspirações e concepções de cada Constituinte a ter uma nova feição.

8 Ibid, p. 82-85

9 MONTESQUIEU, Charles Louis de Secondat. Do Espírito das Leis - Col. A Obra Prima de Cada Autor. São Paulo: Martin Claret, 2009. p. 328-331.

10 SOARES, Fabiana de Menezes. Teoria da legislação: formação e conhecimento da lei na idade tecnológica. Porto Alegre: Safe, 2004. p. 270

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 18218-18237, sep. 2019 ISSN 2525-8761 Nessa toada, dentro da técnica legislativa, possui-se além de ditames formais a serem observados, formas de se expor e redigir a lei, com o fim de atribuir ao seu destinatário, maior ou menor grau de liberdade.

Ressalte-se que mesmo na mais moderna doutrina11 acerca do tema, é de se defender

a existência nas leis o atributo da generalidade, deixando ao Executivo o aperfeiçoamento dessa generalidade as especificidades caso a caso.

Em que pese a própria visão acerca do poder do Congresso, de onde emana, em última análise, a maior parte da legislação, é importante ressaltar que o Poder Executivo de igual forma também exercer a função legislativa, decorrente, ou da atribuição deferida pelo Congresso, através de leis delegadas, ou através de ditames prescritos na própria Constituição,

como no caso das medidas provisórias e do Poder-Dever Regulamentar12.

Assim, estando-se em um Estado Democrático de Direito no qual, vincula-se a

Administração Pública, em sua atuação ao princípio da legalidade13 é o legislativo que deve

traçar normas gerais de conduta para os cidadãos bem como descrever as competências e atribuições dos agentes, dando azo a tradicional passagem onde pode-se afirmar que enquanto os indivíduos no campo privado podem fazer tudo o que a lei não veda, o administrador

público só pode atuar onde a lei autoriza14

Por outro lado, deve o Legislativo, na formulação das leis que tenham repercussão na função administrativa do Estado, com o objetivo de privilegiar o princípio da eficiência, inserido na Constituição da República como um princípio basilar da Administração Pública, traçar normas de atribuam competências, deixando assim margem para interpretação e integração, pelo Administrador, dos conteúdos dessas normas, sob pena de vincular o Executivo plenamente a vontade abstrata das leis.

4 PODER REGULAMENTAR E SEUS ASPECTOS ELEMENTARES

11 TEIXEIRA, Victor Epitácio Cravo. A trajetória do poder regulamentar no pensamento político francês e seus reflexos no Brasil: um olhar para além dos manuais jurídicos. 2012. Dissertação de Mestrado. Universidade de Brasília. Brasília. p. 117-119.

12 ZINK, Harold. apud BARACHO, Jose Alfredo De Oliveira. Teoria geral dos atos parlamentares. Revista de informação legislativa, ano 26, Brasília , v. 21, n. 81, p. 259-322, jan./mar. 1984. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/181511>.Acesso em: 21 nov. 2015. p. 264. 13 CARVALHO FILHO, Jose dos Santos. Direito administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014. p. 20.

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 18218-18237, sep. 2019 ISSN 2525-8761 Pois bem, quando a lei é promulgada, surge para o Executivo importante instrumento,

previsto no art. 84, inciso IV da Constituição da República de 198815, que consiste no dever

de complementação da legislação para sua melhor execução, com sua integração à pratica administrativa, o dever-poder regulamentar.

O Poder Regulamentar nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello16 “é o ato

geral e (de regra) abstrato, de competência privativa do chefe do poder executivo, expedido com a estrita finalidade de produzir as disposições operacionais uniformizadoras necessárias à execução da lei, cuja aplicação demande atuação da Administração Pública”.

O regulamento, portanto, é uma complementação da legislação, trata-se de um aperfeiçoamento dessa às práticas adotadas pela Administração, como uma complementação necessária para a melhor compreensão dos ditames legais pelos particulares, mas sempre com o objetivo de dar uma melhor – ou fiel – execução para as leis.

Trata-se, portanto de um ato normativo derivado, que visa “explicação ou especificação de um conteúdo normativo preexistente, visando à sua execução no plano da práxis”17.

Ressalte-se que não é necessário existir menção expressa do legislador para emerja o poder Regulamentar, este é oriundo pelo simples fato da Administração encontrar um ponto da lei que seja constatada a necessidade de uma regulamentação para sua fiel execução.

Cita-se como exemplo, para elucidar o que se aponto o Decreto nº 8.428/2015, que regulamenta o Procedimento de Manifestação de Interesse a ser observado na apresentação de projetos, levantamentos, investigações ou estudos, por pessoa física ou jurídica de direito privado, a serem utilizados pela administração pública, previsto essencial no art. 21 da Lei nº 8.987/95. O mencionado artigo não faz menção expressa a qualquer Dever-poder

Regulamentar18.

15 Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) IV - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução

16 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 26 ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 311.

17 REALE, Miguel, p. 14 apud PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Direito administrativo. 25 ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 91.

18 Art. 21. Os estudos, investigações, levantamentos, projetos, obras e despesas ou investimentos já efetuados, vinculados à concessão, de utilidade para a licitação, realizados pelo poder concedente ou com a sua autorização, estarão à disposição dos interessados, devendo o vencedor da licitação ressarcir os dispêndios correspondentes, especificados no edital.

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 18218-18237, sep. 2019 ISSN 2525-8761 Em outros casos a necessidade da manifestação Administrativa por meio do dever-poder Regulamentar já vem exposta na própria legislação, como é o caso do art. 4º da Lei nº

12.722/201219 ou no parágrafo primeiro do art. 2º da Lei nº 10.520/0220.

Como se vê a manifestação do dever-poder regulamentar surgirá, seja por expressa disposição legislativa, seja pela constatação por parte da Administração de que a legislação necessita de complementação para sua correta aplicação.

Convém mencionar que o dever-poder regulamentar pode mesmo como ato normativo derivado, estabelecer obrigações aos particulares, contudo, tais obrigações só devem ter caráter subsidiário. Não seria constitucional a inovação ou criação de obrigações originárias, função essa dos atos normativos primários. Nesse sentido explanada José dos

Santos Carvalho Filho21:

Constitui, no entanto, requisito de validade de tais obrigações sua necessária adequação às obrigações legais. Inobservado esse requisito, são inválidas as normas que as preveem e, em consequência, as próprias obrigações. Se, por exemplo, a lei concede algum benefício mediante a comprovação de determinado fato jurídico, pode o ato regulamentar indicar quais documentos o interessado estará obrigado a apresentar. Essa obrigação probatória é derivada e legítima por estar amparada na lei. O que é vedado e claramente ilegal é a exigência de obrigações derivadas impertinentes ou desnecessárias em relação à obrigação legal.

Desse trecho, pode-se afirmar que sofrem de patente ilegalidade, os decretos, que, sob a égide de pretenso exercício do dever-poder regulamentar, criam, alteram ou instituem direitos ou obrigações, já que inovando na ordem jurídica, o Executivo, por meio de dever-poder regulamentar estaria fazendo as vezes do legislativo.

O que se deve ter em mente é que

só por lei se impõem obrigações de fazer ou não fazer, e só para cumprir dispositivos legais é que o Executivo pode expedir decretos e regulamentos, de modo que são inconstitucionais regulamentos produzidos em forma de delegações disfarçadas

19 Art. 4º. São obrigatórias as transferências de recursos da União aos Municípios e ao Distrito Federal com a finalidade de prestar apoio financeiro suplementar à manutenção e ao

desenvolvimento da educação infantil para o atendimento em creches de crianças de zero a quarenta e oito meses cadastradas no Censo Escolar da Educação Básica cujas famílias sejam beneficiárias do Programa Bolsa Família, nos termos da Lei no 10.836, de 9 de janeiro de 2004, e observados os critérios de elegibilidade definidos em regulamento.

20 Art. 2º (VETADO) §1º. Poderá ser realizado o pregão por meio da utilização de recursos de tecnologia da informação, nos termos de regulamentação específica.

21 CARVALHO FILHO, Jose dos Santos. Direito administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014. p. 58

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 18218-18237, sep. 2019 ISSN 2525-8761 oriundas de leis que meramente transferem a o Executivo a função de disciplinar o exercício da liberdade e da propriedade das pessoas22

Ademais, importante mecanismo surge, quando se verifica que o poder regulamentar de fato, foi exercido além de sua competência, inovando no ordenamento jurídico, onde, em mais uma manifestação do sistema de freios e contrapesos, emerge para o Legislativo competência fiscalizatória já ressaltada em tópico anterior sobre a nova concepção de partição dos poderes ou das funções estatais. Nesse sentido, quando o regulamento extrapolar sua atribuição própria, cabe ao Congresso Nacional, sustar seus efeitos naquilo que o Regulamento

exorbite sua competência23.

Portanto, o poder regulamentar, em sua acepção contemporânea é de grande relevância para à Administração, bem como para o Estado como um todo, como se passará a expor.

5 REGULAMENTOS TÉCNICOS E OS CONCEITOS JURÍDICOS

INDETERMINADOS COMO CLÁUSULAS NECESSÁRIAS NA LEGISLAÇÃO ATINENTE À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Pois bem, até o momento, apresentou-se os conceitos fundamentais para à Administração Pública sobre o conteúdo das técnicas legislativas, perquiriu-se um caminho sobre as evoluções na forma de que se enxerga atualmente o processo legislativo, bem como a própria função do Legislativo.

Bem como, viu-se em linhas gerais, o que se trata o dever-poder Regulamentar, contudo, tendo em vista a complexidade das matérias legisladas e atinentes à atividade Administrativa, cada vez é mais comum vermos em nosso sistema jurídico o que se chama de Regulamentação Técnica.

5.1 REGULAMENTO TÉCNICO, UMA VISÃO DO DEVER-PODER REGULAMENTAR A regulamentação técnica, decorre do reconhecimento por parte do Legislativo, de uma incapacidade para tratar de assuntos altamente complexos, reservando a traçar de maneira genérica uma conduta a ser tomada pela Administração, deixando para essa, não somente a atuação em concreto, baseada na vida fática, mas também a complementação da legislação em

22 Ibid. p. 58

23 Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional (...)V - sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa;

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 18218-18237, sep. 2019 ISSN 2525-8761 abstrato, com a estipulação de conceitos altamente técnicos, para a fiel aplicação da legislação

da melhor maneira possível24.

Nesse aspecto, diante de um olhar necessariamente mais gerencial sobre a legislação

que disciplina o Direito Administrativo, José dos Santos Carvalho Filho25 bem apresenta o

conceito de regulamentação técnica:

Trata-se de modelo atual do exercício do poder regulamentar, cuja característica básica não é simplesmente a de complementar a lei através de normas de conteúdo organizacional, mas sim de criar normas técnicas não contidas na lei, proporcionando, em consequência, inovação no ordenamento jurídico. Por esse motivo, há estudiosos que o denominam de poder regulador para distingui-lo do poder regulamentar tradicional.

Como se vê o poder regulamentar tem hoje, importante função de dar eficiência para à Administração e diga-se efetividade para a legislação técnica.

Tal mudança no entendimento das funções do dever-poder regulamentar, é um reflexo de uma mudança completa em todo o Direito Administrativo, notadamente pela inserção do princípio da eficiência no rol dos princípios fundamentais da Administração Pública, elencados no art. 37 da Constituição da República.

O princípio da eficiência é marco da mudança do Estado Burocrático para o Estado

Gerencial26, nesse sentido, deve ser entendido como uma orientação para toda atuação da

Administração, visando sempre a obtenção dos melhores resultados, com uma estruturação que volte a Administração toda para que, respeitando a legalidade e demais princípios, se atinjam os resultados – em última análise, a satisfação do interesse público – da maneira mais

completa e econômica possível27. Passou-se a abandonar o apego aos procedimentos para

priorizar a obtenção dos resultados, respeitados os demais ditames atinentes à

Administração28.

Apesar do principal ponto da regulamentação técnica hoje ser encontrada nas competências das agências reguladoras, que como se sabe são fruto também da reforma gerencial do Estado, onde o estado passa a atuar minimamente como protagonista no mercado, assumindo a função de regulador e fiscalizador, expedindo normas de maior conteúdo técnico

24 CARVALHO FILHO, Jose dos Santos. Direito administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014. p. 57

25 Ibid. p. 56

26 PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. Reforma do Estado para a Cidadania: a reforma gerencial brasileira na perspectiva internacional. São Paulo: Editora 34, 1998. p. 47-58.

27 PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Direito administrativo. 25 ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 84. 28 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Administração pública gerencial. Revista Direito. v. 2, n. 4. Rio de Janeiro: 1998. p. 37-38.

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 18218-18237, sep. 2019 ISSN 2525-8761 para o mercado, esta regulamentação também passa a ser objeto da própria Administração Pública, que conta, dentro de sua estrutura direta, órgãos especializados, como os Ministérios em âmbito Federal e as Secretarias em âmbito Estadual e Municipal.

Como já dito anteriormente, a clássica concepção de separação de poderes deu lugar a uma acepção, que volta os olhos para uma distribuição funcional de maneira gerencial dentro do Estado.

Ressalte-se que de fato, o Legislativo não só vincula, como é fundamento para toda

atuação administrativa29, mas, no entendimento mais contemporâneo deve deixar para o

Executivo, devidamente aparelhado a definição de conceitos técnicos de aplicação eminentemente prática, preservando assim a natureza de abstração da legislação.

Ressalte-se que em coaduno com a regulamentação técnica, surge também o que se convencionou chamar de discricionariedade técnica, que consiste não somente na regulamentação voltada para conceitos técnicos, mas também uma valoração, dentro de margem para escolha, de uma opção tecnicamente mais viável. Assim as decisões com alta nível de complexidade técnica, que exijam perícia em determinado assunto seria de livre

manifestação dentro desta técnica, desde que não eivada de erro crasso30.

5.2 OS CONCEITOS JURÍDICOS INDETERMINADOS

Tendo em vista a modalidade de dever-poder regulamentar técnico bem como a discricionariedade técnica, onde o legislador deixa à Administração o exercício da função de definição de conceito técnicos, invariavelmente, estes andam juntos com expressões comuns que definem algo, mas sem precisar-lhe sua essência, seu conteúdo, os chamados conceitos jurídicos indeterminados.

Trata-se de importante mecanismo na técnica legislativa, estando esses conceitos jurídicos indeterminados em um ponto intermediário entre o direito fechado, que presume um direito perfeito, sem falhas, com conteúdo inquestionável, imune até mesmo a necessidade de interpretação e o direito amplamente aberto que deixaria margem aberta para atuações

desmedidas e de difícil controle, pois sem parâmetros mínimos de observância31.

29 Id. Curso de direito administrativo. 16 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 62

30 ALESSI, Renato. Diritto amministrativo. Milão: Giuffré, 1949 apud FERNANDES, André Dias. A constitucionalização do Direito Administrativo e o controle judicial do mérito do ato administrativo. Revista de Informação legislativa, n 203. Ano 51. p. 143-164. Brasília. 2014. Disponível em:

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31 COSTA, Judith Martins. As cláusulas gerais como fatores de mobilidade do sistema jurídico. Revista dos Tribunais v. 680, p. 47-58, jun./1992. p. 47.

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 18218-18237, sep. 2019 ISSN 2525-8761 Os conceitos jurídicos indeterminados, assim como boa parte dos conceitos jurídicos, surgiram no âmbito do Direito Civil, com expressões como boa-fé, onde era deferido para a função Judiciária, a análise e a interpretação de qual seria seu significado dentro de uma

determinada relação32, passando a ter relevância enorme dentro do Direito Administrativo ao

passo que o Estado passou cada vez mais a assumir funções, aplicar o direito, ou mesmo deferir a fruição de determinada prerrogativa.

Os conceitos jurídicos indeterminados, nomenclatura que muitos acham

inapropriada, por dizer ser contraditório em seus próprios termos33, tratam-se de verdadeiras

técnicas obrigatórias no direito.

São elementos que trazem a maleabilidade social necessária, deixando margem para interpretação, afinal "nem sempre convém, e às vezes é impossível, que a lei delimite com traços de absoluta nitidez o campo de incidência de uma regra jurídica, isto é, que descreva

em termos pormenorizados e exaustivos todas as situações fáticas"34.

Tendo em vista essa impossibilidade ou conveniência é que aplicamos os conceitos jurídicos indeterminados, “cujos termos são ambíguos ou imprecisos — especialmente

imprecisos —, razão pela qual necessitam ser complementados por quem os aplique”35,

portanto variam de acordo com o pressuposto fático que irá se subsumir ao texto legal. A aplicação dos conceitos jurídicos indeterminados, que tem conteúdo variável, como ‘bens comuns’ empregado para definir o objeto passível de licitação na modalidade de Pregão, visam à eficiência administrativa, facilitando o gerenciamento da função administrativa do Estado.

Pois bem, controvérsia surge, em ponto específico, qual seja, no enquadramento dos conceitos jurídicos indeterminados como espécie de discricionariedade administrativa ou não. A discricionariedade administrativa, nas palavras de Celso Antônio Bandeira de

Mello36, consiste em

Margem de liberdade conferida pela lei ao administrador a fim de que este cumpra o dever de integrar com sua vontade ou juízo a norma jurídica diante do caso

32 MORENO, Sainz. Conceptos Jurídicos, Interpretación y discrecionalidad administrativa, p. apud COSTA, Regina Helena. Conceitos jurídicos indeterminados e discricionariedade administrativa. Revista da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo, São Paulo, n. 29, p. 79-108, 1988. p. 98. 33 GRAU, Eros Roberto. Direito, conceitos e normas jurídicas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988. p. 201.

34 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Regras de experiência e conceitos juridicamente

indeterminados. Revista Forense, Rio de Janeiro, v. 74, n. 261, p. 13-19, jan./mar. 1978. p. 14. 35 GRAU. op. cit. 1988. p. 200.

36 MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Elementos de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 1992. p 63.

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 18218-18237, sep. 2019 ISSN 2525-8761 concreto, segundo critérios subjetivos próprios, a fim de dar satisfação aos objetivos consagrados no sistema legal pessoas

Posteriormente, o Autor evoluindo o conceito outrora apresentado, passa a conceituar discricionariedade como

a margem de liberdade que remanesça ao administrador para eleger, segundo critérios consistentes de razoabilidade, um, dentre pelo menos dois comportamentos cabíveis , perante cada caso concreto, a fim de cumprir o dever de adotar a solução mais adequada à satisfação da finalidade legal, quando, por força da fluidez das expressões da lei ou da liberdade conferida no mandamento, dela não se possa extrair objetivamente, uma solução unívoca para a situação vertente37

Da leitura dos conceitos, percebe-se em um primeiro momento a evolução do entendimento do que seria discricionariedade para o Autor, no primeiro a discricionariedade é margem de escolha, deferida pela lei, portanto dentro dos limites dessa, mas dentro de sua vontade – vincula aos elementos de direito administrativo – ou juízo. No segundo o conceito de legalidade é complementado pela razoabilidade e interesse público, introduzindo além da liberdade que a lei confere, o que o Autor chamou de força da fluidez das expressões da lei, ou seja, os conceitos jurídicos indeterminados.

Pois bem, os autores que aduzem que os conceitos jurídicos indeterminados não integram a margem de discricionariedade argumentam que a discricionariedade é ponto de eminente juízo de valor, um ato puramente de vontade do Administrador, enquanto os

conceitos jurídicos indeterminados, depende de interpretação interpretativo da norma38.

Argumenta-se que, existindo discricionariedade, seria defeso seu controle, judicial ou legislativo, quanto as escolhas tomadas pelo Administrador.

Quer parecer que, tais assertivas não encontram respaldo no pensamento do Direito Administrativo.

Afinal, as referidas concepções ainda partem do pressuposto de uma legalidade estrita, aplicável à Administração, bem como uma sistemática estática de controle dos atos típicos dos Poderes Estatais. Importante ressaltar que a legalidade estrita foi mitigada, dando lugar a uma fusão entre o princípio da legalidade, ou seja, a obediência a lei, e os demais

37 MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade e controle jurisdicional. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 48.

38 MAFFINI, Rafael. Discricionariedade administrativa – Controle de exercício e controle de

atribuição. Revista da Procuradoria Geral do Município de Juiz de Fora, Belo Horizonte, ano 2, n. 2, p. 257-271, jan./dez. 2012. p. 261.

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 18218-18237, sep. 2019 ISSN 2525-8761 princípios do direito administrativo, que passaram, mais do que nunca a ter especial aplicação prática39.

É indissociável no atual momento, a ideia de submissão das atuações administrativas ao Direito, portanto, a juridicidade é elemento essencial, e permite afirmar que os conceitos jurídicos indeterminados, servem, como já dito, para revitalizar constantemente a legislação, sem a instauração de um processo legislativo, apenas para mudar o fundamento técnico de determinado postulado jurídico, bem como as práticas administrativas que são da máxima relevância em nosso Estado.

O Estado, passa a atuar em conformidade com a lei, os princípios, mas atua, para, dentro desses postulados, atingir o interesse público, da melhor maneira possível, tendo para si, competência e liberdade legalmente e juridicamente deferida pelo legislador.

Dessas concepções surge a ideia de discricionariedade técnica, exatamente uma interpretação da legislação, uma atividade intelectiva do Administrador, sempre pautado no interesse público.

6 O ENGESSAMENTO ADMINISTRATIVO OU A INTEGRAÇÃO

ADMINISTRATIVO: DO ESTADO BUROCRÁTICO AO GERENCIAL

A harmonização é tema central para o Direito Administrativo pois esta é uma das atividades preponderantes para a Administração Pública, nesse sentido José dos Santos

Carvalho Filho40 adentra na ideia quanto afirma que

Mais tecnicamente pode dizer-se que função administrativa é aquela exercida pelo Estado ou por seus delegados, subjacentemente à ordem constitucional e legal, sob regime de direito público, com vistas a alcançar os fins colimados pela ordem jurídica

Pois bem, as normas jurídicas, como estruturas jurídico-linguísticas, como registrou

Vilanova41

as normas são postas para permanecer como estruturas de linguagem, ou estruturas de enunciado, bastantes em si mesmas, mas reingressam nos fatos, de onde provieram, passando do nível conceptual e abstrato para a concrescência das relações sociais, onde as condutas são pontos ou pespontos do tecido social.

39 NETO, Diogo de Figueiredo Moreira. Quatro paradigmas do direito administrativo pós-moderno: legitimidade, finalidade, eficiência, resultados. Belo Horizonte: Fórum, 2008. p. 17-25.

40 FILHO, Jose dos Santos Carvalho. Direito administrativo. 27. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014. p. 04-05

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 18218-18237, sep. 2019 ISSN 2525-8761 Portanto, conceito jurídicos indeterminados não são imperfeições ou, mesmo falhas legislativas, muito pelo contrário, estes assumem papel de grande relevo em várias situações, onde é deferido ao interprete a melhor valoração técnica entre o postulado de aplicação e seu significado para o caso, o que visa uma legislação cada vez mais fortificada e, por outro lado, cada vez mais atualizada.

Tal técnica, visa buscar do interprete maior relevância na aplicação das normas em abstrato, determinando dentro do caso administrativo uma conduta a ser seguida pela Administração na busca pelo interesse público.

Assim, acompanhando pensamento de Judith Martins Costa 42

nesse sistema, o Direito pode ser pensado, aplicado e interpretado como ordem de referência apenas relativa, sensível à interpretação de fatos e valores externos, consubstanciando “permanente discussão de problemas concretos”, para cuja resolução se mostra adequado não o pensamento lógico, mas o problemático, onde a base do raciocínio está centrada na compreensão axiológica ou teleológica dos princípios gerais do Direito.

A ideia de engessamento administrativo, da imposição de amarras quase intransponível por parte do legislativo à Administração pública, por meio do postulado da legalidade estrita, dentro do pensamento burocrático, passou, como já se viu a uma ideia de trabalho em busca de resultados, de maneira funcionalmente delimitada, buscando sempre o interesse público, atendido por meio de quem demonstra maior capacidade técnica para tal, seja executivo, seja legislativo, seja judiciário.

Abandonou-se a exclusividade da interpretação autêntica, que consistia na elucidação da norma através do próprio texto legal. O que se vê atualmente é que a compreensão da norma jurídica, deve ser esclarecido, quando assim for necessário e legalmente deferido, por meio de atos executivos, como os decretos, manifestações do dever-poder regulamentar por via autêntica.

Por fim, como bem acentuado por Diogo de Figueiredo Moreira Neto43, em relação

aos métodos interpretativos que são baliza para o Direito Administrativo, diversos são os aplicáveis, os métodos clássicos: literal, lógico, histórico e sistemático.

No primeiro método, o literal, se atende à letra da lei, sendo, reconhecidamente, o mais pobre, porque depende demasiadamente de um bom conteúdo léxico-gramatical. No segundo, o lógico, procura-se descobrir, pelo exame da articulação

42 COSTA, Judith Martins. As cláusulas gerais como fatores de mobilidade do sistema jurídico. Revista dos Tribunais v. 680, p. 47-58, jun./1992. p. 49.

43 MOREIRA NETO. Diogo Figueiredo. Curso de direito administrativo. 16 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 187.

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 18218-18237, sep. 2019 ISSN 2525-8761 de seus elementos, qual o entendimento que se apresentará mais racional e apropriado. No terceiro, o histórico, busca-se atualizar o entendimento do texto a partir de seu sentido original, acompanhando as mutações de significação na evolução histórica da aplicação da norma e na do próprio contexto conjuntural em que se insere. No último método, o sistemático, a compreensão da norma não é investigada apenas em seu próprio texto, mas no contexto de todo o Direito Administrativo e, até mesmo, de toda a ordem jurídica, mesmo considerando, se necessário, os elementos metajurídicos que possam contribuir para seu melhor esclarecimento.

O Direito Administrativo, como qualquer área do direito não deve buscar uma interpretação isolada dentre as possíveis, mas sim, a utilização dos métodos de interpretação de maneira concatenada, junto a utilização de conceitos e princípios próprios de sua ciência, já que a atuação interpretativa e mesmo integrativa do direito tem como objetivo alcançar conclusão sobre determinado conteúdo legal para melhor atender os fins, tanto na norma jurídica, como a finalidade púbica.

Como discorre ainda Diogo Figueiredo44

tem, também, importância, como guia interpretativo, o princípio de presunção de validade, que se desdobra nas presunções de veracidade, de legalidade, de legitimidade e de licitude, invertendo o ônus da prova da invalidade da ação administrativa pública, e, finalmente, o princípio da discricionariedade, pelo qual se estabelece também uma especial presunção, que vem a ser a da necessidade de integração administrativa casuística do preceito legal, o que equivale a afirmar que a integração discricionária vem a ser pressuposto da exequibilidade.

Em se tratando de Administração Pública, a interpretação com maior relevância sempre será a que busca, a hermenêutica finalística, em conformidade com princípios, desde os constitucionalmente previstos, bem como os provenientes da doutrina, em destaque a busca pela satisfação do interesse público, que deve pautar, ao lado do princípio da legalidade o entendimento da norma e regras no Direito Administrativo.

7 CONCLUSÃO

Em que pese a existência de uma teoria sedimentada no Direito acerca da separação de poderes, esta, em especial no caso brasileiro, ainda leva em conta a ideia de um Estado Burocrático, que ainda em nosso caso, evolui para a figura do Estado Gerencial, que visa,

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Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 10, p. 18218-18237, sep. 2019 ISSN 2525-8761 atender a processos, a obediência a lei, mas também a obtenção de resultados bem como a busca pelos interesses jurídicos mais relevantes para a sociedade.

Percorrendo esse caminho, a teoria clássica ainda vige em nossa Constituição, mas já apresenta enorme salto, para uma divisão funcional do Estado, atribuindo para cada órgão um grau de especialidade e tecnicidade a par de uma classificação fechada de funções típicas e atípicas, mas sim, de apenas funções constitucionalmente deferidas.

Para tal, o poder regulamentar, notadamente o poder regulamentar técnico, visa atender como maior eficiência possível a demanda social, sem necessariamente desrespeitar a ordem constitucional vigente. Isso ocorre, diante de um necessário entendimento da por vezes enorme disparidade de capacidade técnica para determinados temas entre os órgãos que compõe o tradicional Poder Executivo e o Poder Legislativo.

As formas de atribuição de competência técnica, portanto, surgem como mecanismo necessário para que de fato se atinja o Estado Gerencial, e dentro dessa destacam-se os conceitos jurídicos indeterminados, a discricionariedade técnica e o poder regulamentar técnico.

Estes dão ao Administrador um feixe de competências, mas também atribuem a ele certa margem de liberdade para decidir da maneira mais técnica possível, abandonando a ideia da pura e simples intenção volitiva da discricionariedade técnica.

Esses pontos são relevantes não só porque mudam a maneira como se pensa a distribuição de funções dos poderes, mas também porque são inerentes ao Estado Democrático de Direito no mundo dinâmico em que vivemos.

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