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Jogo didático e o desenvolvimento do cálculo mental

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Academic year: 2020

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10.26843/rencima.v11i3.2694 eISSN 2179-426X

Jogo didático e o desenvolvimento do cálculo mental

Didactic game and the development of mental calculation Priscila Baumgartel

Fundação Universidade Regional de Blumenau pri_baumgartel@yahoo.com.br

https://orcid.org/0000-0001-5061-5298 Janaína Poffo Possamai

Fundação Universidade Regional de Blumenau janainap@furb.br

https://orcid.org/0000-0003-3131-9316

Resumo

Este artigo é resultado de uma dissertação, que discute o uso de jogos didáticos no desenvolvimento do cálculo mental. Este estudo tem como objetivo promover a autoconfiança e a autonomia dos estudantes em relação à Matemática, em especial na superação das dificuldades relacionadas às quatro operações fundamentais. A pesquisa caracteriza-se com pesquisa-ação, uma vez que a pesquisadora também foi professora da turma e, portanto, conviveu com as diferentes situações e com os questionamentos que levaram a essa investigação e à definição do problema de pesquisa – quais as implicações do uso de jogos didáticos para o desenvolvimento do cálculo mental? Para tanto, discute-se as concepções de cálculo mental, com o intuito de superar as noções do discute-senso comum. Neste artigo apresenta-se um jogo que foi aplicado com 15 estudantes do Programa Estadual Novas Oportunidades de Aprendizagem. Os resultados indicaram que, o jogo didático como recurso, do cálculo mental frente à metodologia de Resolução de Problemas, propiciou o desenvolvimento da capacidade de comunicação e argumentação dos estudantes em relação à Matemática. Além do mais, os estudantes passaram a refletir e a comunicar suas ações e estratégias, tornando-os protagonistas na construção de seus conhecimentos.

Palavras-chave: Educação Matemática. Jogos Didáticos. Cálculo Mental. Resolução de Problemas. Ensino Fundamental – Anos Finais.

Abstract

This article is the result of a dissertation, which discusses the use of educational games in the development of mental calculus. This study has the aim of promoting students' self-confidence and autonomy in relation to mathematics, especially in overcoming the difficulties related to the four fundamental operations. This research is characterized by action-research since the action-researcher was also the teacher of the class and, therefore, experienced different situations and questions that led to this investigation and the definition of the

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research problem - What are the implications of the use of educational games for the development of mental calculus? To this end, the concepts of mental calculation are discussed, in order to overcome the notions of common sense. This article presents a game that was applied to 15 students from the State Program New Learning Opportunities. The results indicate that the didactic game as a resource of mental calculation in face of the Problem Solving methodology, provided the development of the students communication and argumentation capacity in relation to Mathematics. Furthermore, the students began to reflect and to communicate their actions and strategies, becoming protagonists in building up their knowledge.

Keywords: Mathematical Education. Educational Games. Mental Calculation. Problem Solving. Elementary School — Final Years.

Introdução

Diversas situações da vida cotidiana estão relacionadas ao cálculo mental, como a estimativa de gastos numa compra de supermercado para não exceder o dinheiro que se tem disponível, a estimativa de gastos para organização de uma festa, o arredondamento de valores e quantidades, a verificação do valor esperado pelo troco ao efetuar uma compra, entre outros (PARRA, 1996). No que se refere à aprendizagem matemática, o cálculo mental tem papel importante na medida que possibilita desenvolver a reflexão e o senso crítico sobre a solução obtida, mesmo em processos algorítmicos.

Comumente o cálculo mental é apenas associado à ideia de cálculo rápido e exato, reduzindo sua utilização a resultados retirados da memória, porém este também deve estar relacionado aos resultados aproximados, possibilitando o desenvolvimento de estratégias a fim de se analisar o comportamento e controlar a solução obtida de situações numéricas.

Diversas estratégias podem ser utilizadas para o desenvolvimento do cálculo mental, entretanto, neste trabalho, optou-se por utilizar jogos didáticos cuja abordagem dá-se na perspectiva de Resolução de Problemas. A literatura (BEZERRA, 1962; KISHIMOTO, 1998; GRANDO, 1995) registra que os jogos didáticos desenvolvem habilidades essenciais para a aprendizagem, como análise de estratégias, previsão e validação de resultados, reflexão sobre as ações, significação para os cálculos realizados, além de promover uma relação positiva com a Matemática, o trabalho colaborativo entre os estudantes e ampliar a ação pedagógica.

O jogo didático, na perspectiva da Resolução de Problemas, pode ser analisado de duas formas: (i) na sua execução já se constitui como um problema, pois é determinado por regras que demandam elaborar e testar estratégias, refletir sobre as ações do jogador e do oponente e, de acordo com o andamento da partida, a cada nova etapa é necessário uma nova avaliação da situação e uma busca pela estratégia mais adequada; (ii) numa extensão de sua utilização, a resolução de problemas também pode ser utilizada na etapa após a execução do jogo, quando questões podem ser propostas pelo professor com base nas etapas ou nas regras do mesmo, buscando uma reflexão mais abrangente das ações dos jogadores. Nesse sentido corrobora GRANDO (2015):

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O cerne da resolução de problemas está no processo de elaboração de estratégias, levantamento de hipóteses, problematização, registro e análise/validação de resoluções. No jogo ocorre fato semelhante. Ele representa uma situação-problema determinada por regras, em que o indivíduo busca a todo o momento, elaborando estratégias, procedimentos e reestruturando-os, vencer o jogo, ou seja, resolver o problema. Esse dinamismo característico do jogo é o que possibilita identificá-lo no contexto da resolução de problemas (p. 399-400).

Acredita-se que com o hábito de utilizar estratégias de cálculo mental possa favorecer o aprendizado no momento de interpretar e identificar as possíveis estratégias para um jogo ou um problema a ser resolvido. Porém, já em 1995, Grando indica que os professores atribuem:

[...] à concepção de jogo como uma coisa não séria, como uma ‘brincadeira’, quase sem fins pedagógicos, ou seja, um ‘prêmio’ para os alunos que cumprem suas ‘obrigações’. Na verdade, o uso de jogos no processo de ensino-aprendizagem da Matemática não representa uma realidade na prática de sala de aula, ou, quando se pratica, se faz de maneira aleatória e descompromissada. Este fato nos alerta para a necessidade deste tema ser abordado com maior frequência (GRANDO, 1995, p. 3).

Nesse sentido, neste trabalho, apresenta-se uma sequência didática construída para um jogo visando nortear o trabalho pedagógico em sala de aula, dando subsídios aos professores para utilizarem os jogos de forma mais pedagógica e não só como uma atividade lúdica sem objetivo. Com a aplicação e análise dessa sequência didática, teve-se como objetivo de pesquisa analisar quais as implicações do uso de jogos didáticos como recurso para o desenvolvimento do cálculo mental.

No seguimento, mostra-se também uma discussão sobre cálculo mental, definindo-o, identificando as contribuições e possibilitando o entendimento além do senso comum, para então apresentar e discutir a sequência didática proposta na utilização de jogos didáticos, de forma a conduzir o trabalho do professor, que precisa ter sua postura centrada na mediação e intervenção adequada a fim de que reais resultados sejam obtidos no que se refere à aprendizagem matemática.

Cálculo mental

O cálculo mental além de ser utilizado como recurso no cotidiano, também é uma ferramenta em situações didáticas, como resposta imediata a um cálculo que se quer efetuar ou como estimativa para prever, controlar e avaliar resultados algorítmicos.

Parra (1996, p. 189), descreve duas formas diferentes de cálculo, aquele denominado cálculo automático ou mecânico “[...] que se refere à utilização de um algoritmo ou de um material (ábaco, régua de cálculo, calculadora, tabela de logaritmo, etc.)”, no qual o resultado obtido não é contestado; e o cálculo pensado ou refletido, denominado de cálculo mental, como “o conjunto de procedimentos em que, uma vez analisados os dados a serem tratados, estes se articulam, sem recorrer a um algoritmo pré-estabelecido para

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obter resultados exatos ou aproximados”.

No cálculo mental, entende-se que também “[...] é possível usar registos intermédios em papel e que, recorrendo a representações mentais, faz uso de factos numéricos, regras memorizadas e relações entre números e operações” (CARVALHO; PONTE, 2015, p. 70). Sabe-se que o cálculo mental está associado ao cálculo espontâneo, o qual se apoia na contagem; ao cálculo de estimativas, em que não se espera uma exatidão na resposta, mas sim uma aproximação do cálculo exato; ao cálculo exato, que se utiliza de resultados memorizados, propriedades do sistema de numeração e propriedades das operações, colocando em ação diferentes tipos de escritas numéricas; e, por fim, ao cálculo rápido em que se recorre exclusivamente a resultados memorizados.

Um adulto, por exemplo, recorre à memória quando efetua 6 + 3, pois esse já foi repetido várias vezes por ele, enquanto uma criança, no início da alfabetização Matemática, pode utilizar-se da contagem como processo para obtenção da resposta:

Inicialmente, para resolver 6 + 3 as crianças contam de novo desde 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9. Procuramos, então, conseguir que utilizem a sobrecontagem 6...7, 8, 9. Quer dizer, que partem de um dos números e acrescentem a outra quantidade contando. Muitas crianças começam a usar, implicitamente, propriedades da soma. Por exemplo, a comutatividade. Assim, para resolver 3 + 9, fazem 9...10, 11, 12. [...] estes procedimentos encontrarão posteriormente sua continuidade, particularmente no cálculo mental. Por exemplo, para calcular 23 + 17, um aluno da segunda série poderá partir de 27 e agregar sucessivamente 3 e depois 10 (PARRA, 1996, p. 211-212). Parra (1996) destaca a importância do cálculo mental para o ensino e apresenta quatro motivos para ensiná-lo, sendo que o primeiro está na capacidade de resolver problemas, pois o cálculo mental permite aos estudantes, através das relações numéricas, realizar o tratamento de dados de um problema, estabelecer relações entre os dados, antecipar seu comportamento e controlar o sentido do que obtêm. Ao contrário, os estudantes que não recorrem aos processos de cálculo mental, “tentam aplicar um algoritmo atrás do outro sem poder fazer nenhuma previsão ou poder argumentar por que fazem uma determinada escolha” (PARRA, 1996, p. 195).

As mais diferentes perspectivas afirmam que o centro do ensino da matemática deva ser a resolução de problemas. Ao mesmo tempo parece evidente que a capacidade progressiva de resolução de problemas demanda um domínio crescente de recursos de cálculo. Nesse sentido, responder à necessidade social indica uma aproximação com o cálculo que torne os alunos capazes de escolher os procedimentos apropriados, encontrar resultados e julgar a validade das respostas (PARRA, 1996, p. 187).

Ou seja, o cálculo mental auxilia na resolução de problemas, uma vez que permite aos estudantes ter um controle mínimo da resposta, utilizando o cálculo de estimativas junto com os procedimentos de obtenção da solução do problema (podendo ser um algoritmo), permitindo antecipar, controlar e julgar a confiabilidade dos resultados, inclusive

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possibilitando verificar erros quando da utilização de outros recursos como computadores ou calculadoras.

O uso do cálculo mental associado à resolução de problemas possibilita propor aos estudantes que raciocinem acerca dos cálculos realizados, permitindo-lhes avançar na busca de soluções mais complexas.

Quando estes calculam mentalmente, recorrem a representações mentais para relacionar números e operações com as experiências e conhecimentos que possuem acerca do mundo real, incluindo conhecimentos sobre Matemática. Segundo esta teoria, o indivíduo constrói representações mentais acerca do mundo que o rodeia, às quais recorre para compreender a realidade e fazer inferências (CARVALHO; PONTE, 2014, p. 95).

O cálculo mental aumenta o conhecimento no campo numérico, na medida em que os estudantes são capazes de controlar e produzir resultados numéricos sem o uso exclusivo de um algoritmo, ou ainda, que mesmo na necessidade do uso do algoritmo alguns conseguem autonomamente ter controle das operações. Por exemplo, ao realizar uma divisão, alguns estudantes esquecem-se de colocar os zeros intermediários do quociente, conforme exemplificado na Figura 1. O uso de uma estimação prévia do resultado poderia auxiliá-los nesse sentido.

Figura 1 – Divisão com zero intermediário

Fonte: Desenvolvido pelas autoras

A ampliação do conhecimento das relações numéricas, segundo item destacado pela

autora, permite também que os estudantes possam decompor um número de acordo com a necessidade de cada situação, como exemplifica Parra (1996) para o número 24:

20 + 4, se temos que dividi-lo por 4, por 2 ou por 10; 12 + 12, se se quer a metade;

25 – 1, se se quer multiplicar por 4;

21 + 3, se se quer saber que dia será 24 dias mais tarde;

próximo à 25%, se se quer fazer uma estimativa em um problema de porcentagem;

6 × 4, se se quer prever quantos pacotes de sabonetes podem ser feitos; etc. (p. 196).

A autora indica como terceiro motivo, que o cálculo mental favorece uma melhor

relação do aluno com a matemática, uma vez que esse se sente confiante em relação aos

procedimentos usados e busca sua individualidade ao utilizar caminhos de solução que lhe pareça mais úteis, além de possibilitar que ele consiga discutir, refletir, argumentar e analisar suas escolhas.

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Por fim, Parra (1996) indica que o trabalho de cálculo pensado deve ser

acompanhado de um aumento progressivo do cálculo automático. Nessa perspectiva, a

autora destaca que o “cálculo mental é uma via de acesso para a compreensão e construção de algoritmos” (p. 199), além de ser, ao mesmo tempo, uma ferramenta de controle, permitindo validar ou ter alguma previsibilidade da solução.

Também, Carvalho (2011, p. 2) apresenta aspectos importantes do cálculo mental, apontados originalmente por Taton (1969)1:

(i) a extensão das operações que se podem calcular mentalmente depende em grande parte do número de algarismos que cada um poderá reter, quer numa só vez, quer em várias etapas relacionadas; (ii) a memória é fundamental no cálculo mental, quer facilitando algumas operações pelo conhecimento de algarismos-chave, quer permitindo reter dados e diversos resultados parciais, de diferentes tentativas realizadas; e (iii) a habilidade de calcular mentalmente não depende somente da memória de cada indivíduo, mas também do modo como sabe escolher e utilizar a técnica operatória mais apropriada ao problema que está a resolver.

Assim, para calcular mentalmente, é necessário não apenas de memória e de conhecimentos prévios de cálculos já realizados, mas também é preciso conhecer estratégias que facilitem e possibilitem o cálculo com os mais diferentes números e nas mais diversas situações.

Ribeiro et al. (2009 apud CARVALHO, 2011)2 traz táticas para resolver mentalmente

cálculos envolvendo as quatro operações. Uma delas é a decomposição de números, que pode ser utilizada na adição e subtração, quando o estudante opera separadamente de acordo com a ordem dos algarismos, na multiplicação e divisão, quando a operação é reduzida aos valores que se tem retido na memória:

Na adição: 235 + 462 = 200 + 400 = 600; 30 + 60 = 90; 5 + 2 = 7; então 600 + 90 + 7 = 697 Na multiplicação 4 × 15 = 2 × (2 × 15) Na divisão 249 ÷ 3 = 240 ÷ 3 + 9 ÷ 3

A compensação também é uma estratégia utilizada nas operações de adição e subtração, quando se aproxima o número de outro em que o resultado é conhecido, como exemplo tem-se 478 + 99, em que se faz 478 + 100 – 1. Outra tática é uso das propriedades

das operações - “Estratégia que envolve o uso das operações inversas, das propriedades

comutativa e associativa na adição e multiplicação, distributiva na multiplicação, e

1 Taton, R. O cálculo mental (Tradução M. A. Videira). Lisboa: Arcádia. 1969.

2 RIBEIRO, D.; VALÉRIO, N.; GOMES, J. Cálculo mental. Programa de formação contínua em Matemática para professores do 1o e 2o Ciclos. Escola Superior de Educação de Lisboa. 2009.

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invariância do resto na subtracção” (CARVALHO, 2011, p. 4). Por exemplo, a propriedade comutativa da multiplicação por ser usada para se obter o resultado de 4 × 19 × 25, quando se opera inicialmente com 4 × 25, obtendo 100 e depois fazendo 100 × 19. Na divisão, é comum o uso da fatoração, em que se reduz o quociente para valores menores, como no cálculo de 150 ÷ 4, em que se faz 150 ÷ 2 ÷ 2. Por fim, tem-se as subtrações sucessivas, usadas também para efetuar divisões, como ao calcular 20 ÷ 4 que pode ser obtido fazendo 20 – 4 – 4 – 4 – 4 – 4.

Parra (1996, p. 215), também ressalta que “A utilização de cálculos simples para resolver outros mais complexos se vincula, de maneira imediata, ao trabalho que se faz em relação à extensão da série numérica, à compreensão das regularidades de seu funcionamento, à interpretação de sua codificação escrita, etc.”

Sendo assim, quando se utiliza o cálculo mental, todas as informações e conhecimentos que o estudante já possui sobre determinados conteúdos são “ativados” a fim de facilitar e agilizar o cálculo, só depende de escolher qual das técnicas ou memórias devem ser utilizadas para o cálculo em questão. “Neste sentido, a realização de tarefas de cálculo mental representa uma oportunidade para envolver os alunos em atividades matemáticas que lhes permitem pensar sobre números, operações e suas relações e desenvolver estratégias de cálculo” (CARVALHO; PONTE, 2014, p. 93).

Um dos recursos, indicados por Parra (1996), de se trabalhar o cálculo mental na escola refere-se ao uso de jogos didáticos:

Os jogos representam um papel importante. Por um lado, permitem que comece a haver na aula mais trabalho independente por parte dos alunos: estes aprendem as respeitar as regras, a exercer papéis diferenciados e controles recíprocos, a discutir, a chegar a acordos. Por outro lado, proporcionam ao professor maiores oportunidades de observação, a possibilidade de variar as propostas de acordo com os níveis de trabalho dos alunos e inclusive trabalhar mais intensamente com aqueles que mais o necessitam (p. 223).

Parra (1996) ainda indica que após o jogo, o professor proponha questões que façam os estudantes refletirem sobre suas opções, utilizando dados de jogadas simuladas, como se eles estivessem frente a um problema, mas que pode ser resolvido sem a rapidez do jogo.

Por fim, é importante ressaltar ainda, que Parra (1996, p. 193) verificou em suas pesquisas que “alguns autores tem chegado à conclusão que crianças sem problemas do ponto de vista cognitivo, mas que têm dificuldades em Matemática, mostram dificuldades específicas na assimilação de fatos numéricos” e verificou a recomendação por parte de outros autores de se incluir a aprendizagem de procedimentos de cálculo mental na escola a fim de resolver essa questão.

Conclui-se que o cálculo mental, enquanto cálculo espontâneo, aproximado, exato ou cálculo rápido, propicia a compreensão dos estudantes frente às quatro operações aritméticas, fazendo-os ter controle, previsibilidade e autonomia diante dos problemas a

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serem resolvidos e/ou algoritmos a serem usados.

Considerando a possibilidade da utilização de jogos didáticos para estimular a aprendizagem, adaptou-se e aplicou-se um jogo disponível na internet, para uma versão manual, com o intuito de explorar as quatro operações fundamentais da matemática, fazendo uso apenas do cálculo mental. Sendo assim uma forma de desenvolver com os estudantes, estratégias para a resolução dos cálculos necessários.

Jogo didático e o desenvolvimento do cálculo mental

Diversos autores (FARIAS; CÂNDIDO, 2019, CABO et al., 2019 ) indicam que o jogo didático pode ser utilizado como um facilitador para a aprendizagem, como a construção de conceitos e o entendimento de processos,, que inicialmente possam parecer difíceis, pois o fato de resolver diversas operações, por exemplo, durante a execução do jogo pode ser mais agradável do que a resolução de uma extensa lista de exercícios. Nesse sentido corrobora Grando (2000):

As posturas, atitudes e emoções demonstradas pelas crianças, enquanto se joga, são as mesmas desejadas na aquisição do conhecimento escolar. Espera-se um aluno participativo, envolvido na atividade de ensino, concentrado, atento, que elabore hipóteses sobre o que interage, que estabeleça soluções alternativas e variadas, que se organize segundo algumas normas e regras e, finalmente, que saiba comunicar o que pensa, as estratégias de solução de seus problemas (p. 17).

Pode-se perceber que a potencialidade do jogo como recurso didático é enfatizada pela ludicidade como estímulo, podendo levar o estudante a se envolver de forma ativa, levando-o a desenvolver estratégias para resolver os problemas propostos, a tomar decisões e a avaliar as consequências das suas atitudes, desenvolvendo assim a criatividade e a autoconfiança, além de propiciar o trabalho em grupo, em que os participantes podem discutir e socializar suas ideias, saindo da passividade que normalmente ocorre em aulas tradicionais, em que se prioriza a transmissão do conteúdo (GRANDO, 2000). Mesmo os mais simples dos jogos, como por exemplo, os jogos de memória, desenvolvem habilidades e competências que favorecem o processo de aprendizagem.

Caracterização da pesquisa

Este artigo apresenta uma pesquisa que é resultado de uma dissertação de mestrado que investigou a respeito da utilização de jogos didáticos como recurso de ensino das quatro operações fundamentais, com estudantes que apresentam dificuldade de aprendizagem, em especial no desenvolvimento do cálculo mental.

A pesquisa foi realizada em uma escola pública localizada no município de Jaraguá do Sul / SC. Os sujeitos da pesquisa são estudantes do Ensino Fundamental Anos Finais de uma turma do Programa Estadual Novas Oportunidades de Aprendizagem na Educação

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Básica (PENOA), que é ofertado nas escolas públicas estaduais de Santa Catarina. Esse programa é destinado a estudantes do Ensino Fundamental e Médio, que já tenham sido reprovados e/ou que apresentam dificuldades em leitura, escrita e Matemática, sendo que esses têm aulas de Língua Portuguesa e Matemática no contra turno.

Na escola em que esta pesquisa foi realizada, o programa atendeu apenas estudantes do 6º e 7º anos de Ensino Fundamental, selecionados pela assistente técnico-pedagógica e pelo professor de Matemática no ano anterior. As aulas aconteceram nas segundas e nas quartas-feiras, com uma turma com 17 estudantes entre 11 e 15 anos e, entre eles, 7 estudantes que apresentavam laudos psicológicos. Na data da aplicação da atividade de pesquisa (maio/2017), foram utilizadas 5 aulas de 45 min. cada e apenas 15 desses estudantes estavam presentes.

Durante a pesquisa, eles foram acompanhados pela professora da turma que é também pesquisadora desse estudo. As análises foram realizadas com base nos registros escritos das jogadas, nos registros das questões problematizadoras do jogo, nas respostas aos questionários respondidos ao final de cada jogo e na intervenção feita pela professora/pesquisadora. Além dessa análise, realizaram-se intervenções verbais durante a execução dos jogos que foram gravadas em áudio e vídeo, pois o objetivo era questionar os mesmos para compreender como estruturavam a solução dos problemas do jogo, tanto na estratégia de ação escolhida quanto no método de resolução das operações.

A referência da investigação está nas atitudes dos estudantes propiciadas pelas ações espontâneas dos jogos didáticos e no desenvolvimento das estratégias do jogo e do cálculo realizado para obter os resultados, estimulando-os a desenvolver o cálculo mental e a refletirem sobre suas ações no jogo, analisando procedimentos e estratégias usadas.

A pesquisadora, que na época também era a professora da turma, além de fazer a pesquisa, conviveu com as diversas situações e com os questionamentos que levaram a essa investigação e a definição do problema de pesquisa: “Quais as implicações do uso de jogos didáticos para o desenvolvimento do cálculo mental?”.

Dessa forma, é uma pesquisa qualitativa caracterizada como pesquisa-ação uma vez que,

Como o próprio nome já diz, a pesquisa-ação procura unir a pesquisa à ação ou prática, isto é, desenvolver o conhecimento e a compreensão como parte da prática. É, portanto, uma maneira de se fazer pesquisa em situações em que também se é uma pessoa da prática e se deseja melhorar a compreensão desta (ENGEL, 2000, p. 182).

Os aspectos de uma pesquisa-ação são evidenciados neste trabalho, dado que o problema de pesquisa e as ações desenvolvidas partiram da interação entre a professora/pesquisadora e os estudantes/sujeitos de pesquisa, bem como os resultados pretenderam contribuir com o processo de ensino e de aprendizagem do objeto matemático foco desse estudo.

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discute-se os resultados da aplicação do Jogo “Tampe os Números”. Na discute-sequência, aprediscute-senta-discute-se as considerações da aplicação, bem como os resultados.

O Jogo “Tampe os Números”: aplicação e análise

Neste artigo apresenta-se o jogo denominado “Tampe os Números”, que está disponível on-line e pode ser também adaptado e confeccionado para ser executado manualmente. Esse jogo, abordado a seguir, tem como objetivos:

● Desenvolver o cálculo mental para as operações de adição, subtração, multiplicação e divisão.

● Construir e resolver expressões numéricas.

● Aliar o caráter lúdico com o cognitivo na execução do jogo.

● Desenvolver habilidades de atenção, concentração, organização e de cumprimento de regras.

● Socializar e desenvolver um trabalho cooperativo.

A Figura 2 apresenta um protótipo do jogo manual, onde um tabuleiro é construído simulando a versão computacional e tampas de garrafa são utilizadas como marcadores.

Figura 2 – Jogo Tampe os números na versão manual

Fonte: NOVA ESCOLA3

Esse jogo, na versão em que se encontra disponível para ser utilizado computacionalmente, é denominado “Feche a Caixa” e aborda apenas a operação de adição e consiste nas seguintes regras (adaptadas de NOVA ESCOLA):

1) Inicialmente deve-se preencher o nome dos jogadores. 2) Cada jogador iniciará com 45 vidas.

3) O primeiro jogador, indicado pelo jogo, lança os dados clicando sobre eles.

4) O jogador deve fechar uma ou duas casas, de forma que o total da soma dos valores

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obtidos nos dados seja o mesmo que o da soma das casas fechadas.

5) O mesmo jogador continua a jogar até que o total de pontos nos dados não permita fechar nenhuma combinação de casas, neste caso, deve-se clicar no botão “Não é Possível Continuar”.

6) Deve-se, então, somar os valores das casas abertas e subtrair do total de vidas (45). 7) Assim, inicia o próximo jogador, podendo ter até três jogadores em cada partida. 8) Se a soma das casas abertas for maior que o número de vidas restante, o jogador é eliminado.

9) Vence o jogador que ainda tiver vidas quando o(s) outro(s) já tiverem sido eliminados.

Na versão manual, pode-se abordar as quatro operações para execução do jogo, ou restringir conforme as operações desejadas. As regras consistem em:

1) Cada jogador na sua vez deve lançar três dados.

2) O jogador deve tampar duas ou três casas numéricas, conforme a quantidade de dados usados. Ele pode tampar as casas sendo que cada uma delas corresponde a um dos números do dado. O jogador pode optar por, ao invés de tampar três casas, tampar apenas uma casa, sendo que o valor da casa deve corresponder ao resultado obtido ao utilizar uma expressão numérica fazendo uso de qualquer combinação com as quatro operações.

3) Após tampar uma ou mais casas é a vez do outro jogador. Um jogador não pode obter como resultado um número já tampado4.

4) Quando não for mais possível realizar algum cálculo com os números obtidos nos dados de forma que se tampe um número, utilizando alguma das estratégias permitidas, o jogador deve somar os números não tampados, multiplicar o resultado da soma por dois e então marcar esse valor como penalidade. Assim, um jogador pode encerrar a sua partida e passa a vez para o outro jogador, que no lançamento dos dados ainda pode conseguir tampar alguma casa.

5) A pontuação de cada jogador deve ser calculada da seguinte forma: ➢ Pontuação para cada lançamento de dados:

● Jogada realizada sem uso de uma operação – 1 ponto.

● Jogada realizada apenas com a operação de adição – 2 pontos.

● Número tampado apenas com operação de subtração – 3 pontos multiplicado pelo número tampado.

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● Número tampado apenas com operação de multiplicação ou apenas de divisão – 5 pontos multiplicado pelo número tampado.

● Número tampado combinando duas operações numéricas – 8 pontos multiplicado pelo número tampado.

➢ Pontuação final:

● A penalidade deve ser subtraída da soma dos valores obtidos em cada lançamento. Para aplicação do jogo, bem como no momento de problematização posterior, nesta pesquisa, orienta-se para a utilização de uma sequência didática norteada pela metodologia de Resolução de Problemas proposta por Onuchic e Allevato (2011), que consiste nas seguintes etapas: Preparação do Problema; Leitura Individual; Leitura em Conjunto; Resolução do Problema; Observar e Incentivar; Registro das resoluções na lousa; Plenária; Busca do Consenso; e Formalização do Conteúdo.

Dessa forma, para a execução de qualquer jogo, inicialmente, as regras devem ser entregues aos estudantes e cada um realiza individualmente a leitura para depois serem lidas no grande grupo (com todos os estudantes) pelo professor. Na sequência, realiza-se uma jogada demonstrativa, inclusive calculando os pontos obtidos, esclarecendo as eventuais dúvidas. Então, os estudantes, em grupos, começam a jogar e o professor acompanha-os observando e incentivando.

Ao final do jogo, as etapas de Registro das resoluções na lousa, Plenária, Busca do Consenso consistem em discutir com os estudantes as estratégias utilizadas na execução do jogo, e como se pode fazer para se obter a maior pontuação possível. Após essa fase, é proposto aos estudantes um momento de problematização que os fizessem pensar sobre as ações do jogo. Para tanto as etapas da metodologia de Resolução de Problemas também podem ser utilizadas.

Para o jogo em questão, utilizou-se as seguintes perguntas. 1) Qual a melhor estratégia para tampar os números menores? 2) Qual a melhor estratégia para tampar os números maiores?

3) Quais os números mais difíceis de tampar? Justifique sua resposta.

4) Quais as possíveis operações que podem ser realizadas para tampar o número 4? 5) Quais as possíveis operações que podem ser realizadas para tampar o número 11? 6) Quais as possíveis operações que podem ser realizadas para tampar o número 17? 7) Com os números 5, 4 e 3, obtidos nos dados, quais os possíveis resultados que podem ser tampados?

8) Com os números 5, 4 e 1, obtidos nos dados, quais os possíveis resultados que podem ser tampados?

9) Crie um jogo, descrevendo quais as regras devem seguidas, sendo disponíveis apenas dois dados e esse mesmo tabuleiro.

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O jogo foi executado de maneira que na primeira jogada entregou-se uma folha em branco aos estudantes e solicitou-se que eles realizassem um registro de como obtiveram a pontuação, de modo que se pudesse acompanhar o processo e a evolução da organização lógica dos estudantes. Para as demais jogadas, foi entregue uma tabela para que os estudantes fizessem os registros no decorrer do jogo.

A Figura 3 ilustra o registro de um estudante, no qual se pode observar a utilização do algoritmo como método para obtenção dos resultados.

Figura 3 – Registro de estudante que utiliza o algoritmo

Fonte: Acervo da pesquisa

Pelo registro da jogada simulada, verificou-se que 10 estudantes usaram apenas a operação de adição, 1 usou apenas multiplicação, 2 combinaram adição e multiplicação, 1 adição e subtração e 1 adição e divisão. Todos calcularam corretamente a pontuação e alguns deles, no momento de reler as regras do cálculo da pontuação, questionaram se adição é mais, se subtração é menos e se multiplicação é vezes.

Na sequência foi entregue a Tabela 1 de registro das jogadas e os estudantes foram questionados pela professora quanto à maneira com que estavam realizando os cálculos.

Tabela 1 – Tabela para registro do jogo Números obtidos nos dados Cálculo realizado Número(s) tampado(s) Pontuação das operações Pontuação total do lançamento

Soma do valor dos lançamentos

Números não tampados Soma

Penalidade Pontuação final

Fonte: Desenvolvido pelas autoras

A análise dos áudios gravados nas intervenções, permitiu organizar as linhas de pensamento dos estudantes em três grupos. No primeiro grupo, tem-se 9 estudantes que utilizaram sobrecontagem, resultados memorizados e o algoritmo das operações para obter os resultados. Apenas 1 deles não necessitou de sobrecontagem e executou um cálculo rápido com esses métodos, os demais apresentaram dificuldades em sistematizar mentalmente as operações. Desses, 3 estudantes não utilizaram resultados retidos na memória para realizar as operações e necessitaram, a todo momento, de usar a sobrecontagem, seja para adição ou mesmo para a multiplicação, por exemplo, ao realizar 3 x 2, o estudante conta nos dedos a partir do 3 (3, 4, 5, 6).

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O Quadro 1 apresenta a transcrição de um estudante que operou mecanicamente com os números, apresentando dificuldade com a operacionalização do algoritmo de multiplicação.

Quadro 1 – Diálogo com estudante que opera mecanicamente Professora: Como você vai calcular 14 × 8? Análise

Estudante G: 14 × 8, vou fazer a conta invisível. Pensou na estruturação do algoritmo.

Estudante G: Faço 8 × 4 = 32 Contou nos dedos para obter 32.

Estudante G: Aí faz vezes 1, daí coloca lá e dá 132.

Novamente estrutura o algoritmo, mas não consegue juntar a multiplicação da dezena com a unidade.

Professora: Tem outro jeito de fazer essa conta? Estudante G: O modo normal, fazendo numa folha.

Não reconhece outra forma de cálculo mental.

Fonte: Acervo da pesquisa

No Quadro 2, tem-se um estudante que não apresentou dificuldade na realização das operações mentalmente, mas também evidenciou um fazer automático e mecânico dos cálculos.

Quadro 2 – Diálogo com estudante sem dificuldade em operar mentalmente Professora: Como você vai calcular 6 × 6 × 6? Análise

Estudante EP: Pego os dois números e multiplico pela tabuada, 6 × 6 dá 36.

Uso de resultado memorizado.

Estudante EP: Agora faço 36 × 6.

Estudante EP: Faço 6 × 6 dá 36 e aí 3 × 6 que dá 18. Uso de resultado memorizado e o algoritmo.

Estudante EP: Aí faço mais 3, dá 19, 20, 21. Então fica 216. Uso da sobrecontagem e o algoritmo.

Fonte: Acervo da pesquisa

Num segundo grupo, tem-se 5 estudantes que além de usar resultados memorizados e o algoritmo das operações, por vezes também decompõem números para recorrer a resultados memorizados. Por exemplo, um estudante ao multiplicar 14 por 2, fez 10 × 2 + 4 × 2.

Abaixo apresenta-se a transcrição de um estudante que persistiu em usar o algoritmo, porém, ao ser questionamento, conseguiu operar usando decomposição de números.

Ao somar as penalidades 5, 13, 14, 15, 17, 19 e 20 esse estudante tenta fazer cálculo mental, desiste e pergunta:

Estudante R: — Não tem rascunho?

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Estudante R: — Eu não consigo.

Professora: — Você já fez 5 + 13 que resultou em 18 e agora tem que somar 14. Se ao invés de somar 14, você primeiro somar 10 e depois 4, não fica mais fácil?

Com isso o aluno percebeu que consegue e foi fazendo as decomposições e somando o restante.

Num terceiro grupo, tem-se apenas um estudante que realizou cálculo mental, sem uso do algoritmo, operando com decomposição de números, compensação e faz uso das propriedades dos números e operações. A seguir apresenta-se a transcrição da fala desse estudante:

Os estudantes foram instigados a pensar e apresentar formas diferentes para calcular 80 + 64

Estudante ES: — E, também, dá para fazer assim, 80 + 80 é 160, daí 160 – 20 dá 140, daí sobrou o 4, só acrescentei o quatro e ficou 144.

Não foi previsto, no planejamento desse jogo, que na pontuação final houvesse resultado negativo, conforme aconteceu com uma das duplas. Os estudantes que vivenciaram a situação, estavam no sexto ano e ainda não haviam estudado números inteiros. A transcrição da situação é apresentada abaixo, e mostra a discussão sobre quem é o vencedor do jogo. Na passagem, após ter sido subtraída a penalidade da soma dos valores do lançamento, o estudante R havia obtido – 21 pontos e o estudante EP – 82 pontos:

Professora: — Quem ganhou? E agora, quem ganhou?

Estudante R: — Pelos números, né. Tipo, quem ganhou dos dois é quem tiver menos número. Eu te devo 21 reais e ele te deve 82 reais

Professora: — Então quem ganhou? Estudante R: — Eu, eu acho!

Professora: — Por quê?

Estudante EP: — Porque ele tirou um número menor e eu um maior.

Professora: — E se por acaso, ele tivesse 21 positivo e você 82 positivo, quem teria ganho? Estudante R: — Ele!

Estudante EP: — Eu!

Pode-se observar, que, apesar de os estudantes não terem estudado ainda números inteiros, eles reconhecem o resultado negativo pela relação que fazem com o uso de dinheiro e naturalmente compreendem a situação.

Ao final do jogo, foi realizada uma discussão com todos os estudantes onde algumas circunstâncias foram simuladas pela professora e eles foram questionados sobre qual número poderia ser tampado e qual a pontuação da jogada. Nesse momento, os estudantes foram provocados a apresentar diversas formas de calcular, instigando o cálculo mental, com uso de resultados memorizados, decomposição de números e uso das propriedades

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dos números e das operações (de forma não explícita). Na ocasião, como descrito abaixo, também foi observado que os estudantes perceberam que o objetivo do jogo era obter o maior número de pontos, sendo assim, o cálculo que obtivesse o maior resultado seria o que iria gerar mais pontos.

Foram jogados os dados obtendo 4, 1, 1 e foi solicitado aos estudantes para apresentarem duas possibilidades de cálculos, sendo o primeiro sugerido (1 + 1) × 4 = 8, e o outro 4 ÷ (1 + 1) = 2. Os estudantes foram questionados de qual jogada seria mais interessante.

Vários estudantes: — O primeiro! Professora: — Por que o primeiro?

Estudante P: — Porque o primeiro é o maior.

Nas jogadas iniciais dos estudantes, observou-se que eles não estavam preocupados com as estratégias do jogo, ou seja, não havia a preocupação de tampar todos os números e nem de buscar maior pontuação. Nas jogadas finais, observou-se que alguns estudantes começaram a ampliar sua percepção sobre as estratégias de jogo, enquanto outros somente chegaram a essas conclusões quando da discussão com o grupo, jogando somente o jogo pelo jogo durante a atividade.

Pode-se observar que a atividade do jogo, aliada à mediação da professora, possibilitaram aos estudantes refletir sobre suas ações e estruturar formas de pensar, o que vai ao encontro da contribuição que o jogo tem para o desenvolvimento de processos cognitivos (FARIAS; CÂNDIDO, 2019). Nesse sentido corrobora Grando (2000):

Não se pode apenas observar um fenômeno matemático acontecendo e tentar explicá-lo, como acontece com a maioria dos fenômenos físicos ou químicos. A Matemática existe no pensamento humano e, por isso, depende de muita imaginação para definir suas regularidades e conceitos. Torna-se necessário aos processos pedagógicos considerarem a importância de se ampliar a experiência das crianças a fim de proporcionar-lhes momentos de atividade criadora. [...] Portanto, a escola deve estar preocupada em propiciar situações de ensino que possibilitem aos seus alunos percorrerem este caminho, valorizando a utilização de jogos nas atividades escolares (p. 23).

Analisando os registros do jogo, tem-se que 3 estudantes começaram usando apenas adição ou apenas multiplicação e, na sequência, usaram estratégias de combinar as quatro operações para obterem os números a serem tampados; 8 estudantes sempre combinaram as operações e 4 usaram exclusivamente adição ou subtração. A divisão foi a operação menos usada.

Por esse registro, percebeu-se uma situação não prevista, em que um número era obtido e tampado mais de uma vez, o que remeteu a situação observada em que alguns estudantes colocavam duas tampas ou mais empilhadas sobre um número. Por esse motivo as regras foram modificadas e essa situação explicitada.

Na semana seguinte, o jogo na versão computacional também foi proposto. Nessa atividade, observou-se uma progressão no cálculo mental realizado pelos estudantes e

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também se percebeu que estavam preocupados com as estratégias usadas, buscando vencer. No Quadro 3, percebe-se que o estudante G, começou a explorar por estratégias de decomposição de números e reduziu o uso de processo de sobrecontagem.

Quadro 3 – Diálogo com estudante que busca utilizar a decomposição Professora: Como você fez o 6 + 7 + 9? Análise

Estudante G: Vou diminuir 1 do 7 e fica 6, aí faço 6 + 6 que dá 12 e daí o resto que sobrou do 7 que é 1, dá 12 + 1 que é 13. E eu juntou mais 9 que deu ... 22 (contou nos dedos).

Usou processo de decomposição,

resultado memorizado e por fim

sobrecontagem.

Professora: E agora que tem que fazer 34 – 22?

Estudante G: Eu faço 30 – 20 que dá 10 e eu fiz 4 – 2 que dá 2 e juntou os dois que dá 12.

Usou decomposição.

Fonte: Acervo da pesquisa

O estudante R, que antes queria usar rascunho para estruturar o algoritmo, também usou o cálculo mental como primeira opção, conforme o Quadro 4:

Quadro 4 – Diálogo mostrando a evolução do estudante R Professora: Como você somou esses

pontos que sobraram? 2 + 8 + 9? Análise Estudante R: 9 + 2 dá 11, aí desconta 1

do 11 que fica 8 + 1 que dá 9 e então 10 + 9 que dá 19

Usou decomposição e resultados

memorizados

Professora: E agora 45 – 19?

Estudante R: Eu faço 40 – 10 que dá 30 e agora faço 30 tira 9 que fica 21 e aumento 5 que dá 26.

Usou decomposição e resultados

memorizados

Fonte: Acervo da pesquisa

O estudante ES continuava usando estratégias de decomposição de números, estruturando caminhos longos para chegar ao resultado, mas que permitiram recorrer a resultados já memorizados.

Professora: — Como você pensou para somar 7 + 8 + 9?

Estudante ES: — Eu tirei 1 do 9 e fiz 8 + 8 que dá 16 e aí mais 1 do 9 e ficou 17 e mais 7 dá 24.

Professora: — E para calcular os pontos?

Estudante ES: — Eu faço 45 – 24. Tirei 1 do 45 e ficou 44, e aí 40 – 20 que dá 20 e 4 – 4 que dá 0 e mais 1 fica 21.

Pode-se perceber algumas estruturas mais complexas para constituir o processo de cálculo mental, e é importante ressaltar que esses processos não devem ser julgados como

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mais fáceis ou difíceis, uma vez que esse julgamento é particular de cada estudante, conforme corrobora Parra (1996):

O cálculo pensado é eminentemente particularizante: cada problema é novo e a aprendizagem vai consistir essencialmente em compreender que para uma mesma operação determinados cálculos são mais simples que outros, e que pode ser útil escolher um caminho aparentemente mais longo, porém menos difícil (p. 201, grifo do autor).

Ao final do jogo computacional, foi entregue aos estudantes a atividade de problematização. Na resolução dos problemas, foi possível verificar que os estudantes conseguiram justificar suas escolhas e procuraram usar estratégias que combinassem as operações para conseguirem maior pontuação no jogo. Na última questão, em que foi solicitado para criarem um jogo da mesma natureza com o uso de dois dados, percebeu-se que eles criaram regras, mas não as descreveram na totalidade, por exemplo, o estudante A indicou que só deveriam ser usados números pares e que quem tivesse menos pontos é que ganharia, entretanto faltou estruturar como seria calculada a pontuação. O estudante PA criou um jogo com regras interessantes, tanto do cálculo a ser realizado quanto em relação as atitudes no jogo, das quais destaca-se:

1. Ganhe o jogo.

2. Pense bem nos valores dos dados.

3. Quanto maior o número do dado, mais pontos você perde.

4. Chegar ao final do jogo, você soma os seus pontos colocando o sinal de subtração

5. Caso seu adversário tirar três números iguais, ele rouba metade dos seus pontos.

A regra (4) indica que uma subtração deve ser feita para calcular a pontuação final do jogo e que vence quem obtiver menos pontos; logo, a regra (5) é uma penalidade ao adversário. Ao longo das demais regras, percebe-se a complexidade da estrutura do jogo, sendo que o seu entendimento não é simples, pois é sempre organizado de modo a pensar na obtenção de uma pontuação de menor valor.

As regras criadas pelos estudantes foram criativas, incluíram regras de cálculo e de atitude dos jogadores (por exemplo, a estudante J indicou como regra que ‘nunca em hipótese alguma grite ou diga não consigo’) e, por vezes, foram incompletas, pois não estruturaram logicamente o modo de jogar e o cálculo da pontuação, apresentando as informações desordenadamente. No decorrer das explicações, acrescentaram regras que se contradiziam com as inicialmente apresentadas.

Conforme indica Grando (2000, p. 32), a criatividade é um dos aspectos resultantes da ação do jogo, pois no jogo o estudante “[...] exerce seu poder criador, elaborando estratégias, elaborando regras e cumprindo-as. No contexto do jogo, ele se insere num mundo de fantasia, irreal, criado por ele, onde exerce um certo poder e é capaz de criar”.

Após a problematização, os estudantes responderam a um questionário e ao analisar as respostas pôde-se verificar que eles se sentiram envolvidos e interessados com o jogo,

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que o mesmo contribuiu para o aprendizado da Matemática e que a interação entre os colegas possibilitou um trabalho colaborativo, verificado também pela pesquisadora, evidenciado tanto no entendimento das regras do jogo, quanto no que se refere ao aprendizado das operações realizadas, indicando que interação social promovida pelo jogo favorece a aprendizagem.

Em relação ao jogo computacional, todos os estudantes gostaram de ter usado o

notebook, sendo que 3 preferem o uso do jogo computacional ao invés do manual e outros

12 estudantes marcaram como indiferente. Em relação ao aprendizado, 5 indicaram que o jogo computacional facilitou a aprendizagem do conteúdo em detrimento ao jogo manual e os demais estudantes assinalaram ser indiferente. No caso desse jogo, vale ressaltar que a versão computacional tem um nível de dificuldade menor que a manual, mas pode-se observar que parte significativa dos estudantes não indicou que houvesse essa diferença, evidenciando que o jogo manual contribuiu com a aprendizado, possibilitando aos estudantes desenvolverem processos de cálculo mental no jogo computacional que foram construídos e entendidos com o jogo manual.

Considerações Finais

A pesquisa apresentada neste artigo investiga a respeito da utilização de jogos didáticos como recurso de ensino das quatro operações fundamentais com estudantes com dificuldades de aprendizagem, em especial no desenvolvimento do cálculo mental.

De acordo com as atividades analisadas, nota-se que os estudantes não estavam habituados a usar o cálculo mental, sempre buscavam como primeira alternativa a utilização do algoritmo, que era operado mecanicamente sem reflexão e validação dos resultados obtidos. Buscou-se, então, conduzir os estudantes ao cálculo mental, sendo que, inicialmente, a maioria mostrou muita dificuldade, pois utilizavam o algoritmo mentalmente e acabavam errando durante a resolução. Houve dois estudantes, que já no início das atividades, buscaram utilizar estratégias de cálculo mental, os demais foram incentivados pelas ações de intervenção da professora/pesquisadora. No decorrer das atividades, os estudantes passaram a buscar estratégias que para eles eram adequadas para o cálculo mental.

Pode-se constatar que houve uma melhora na aprendizagem desses estudantes no processo de cálculo mental e no entendimento das quatro operações, pois passaram a substituir um fazer mecânico e sem reflexão por um processo de significação, em que eles conseguiram argumentar e explicar as estratégias usadas, bem como questionaram as dos colegas. Pode-se perceber que os jogos permitiram envolver os estudantes no processo de ensino e de aprendizagem, sendo que os mesmos se tornaram protagonistas na construção do conhecimento, mostrando autoconfiança e desenvolvendo sua capacidade de comunicação e argumentação em relação à Matemática.

É importante enfatizar que o jogo, apenas pela ação lúdica, não é uma ferramenta que possibilita por si só a construção do cálculo mental. É necessário a intervenção do

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professor, incentivando os estudantes a refletirem sobre as estratégias de cálculo. Nesse sentido, é importante ressaltar que o papel do professor no processo é de fundamental importância para que resultados positivos sejam alcançados, conforme indicado por Grando (1995).

Um fator que pode ser limitante nos resultados dessa prática está na ação do professor, pois durante a execução dos jogos, os estudantes demandam maior atenção e solicitam a presença do professor em suas discussões mais vezes do que em uma aula tradicional, inclusive realizando questionamentos que, por vezes, não estavam previstos no planejamento do jogo. Assim, para que resultados positivos sejam alcançados é necessário que o professor esteja disponível para romper com o modelo de ensino tradicional, o qual se constitui como o único detentor do controle dos processos de aprendizagem, para atuar como mediador, que não cabe dar a indicação de certo ou errado apenas, mas que responde a uma pergunta com outra pergunta, fazendo o estudante refletir e encontrar suas próprias respostas.

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Imagem

Tabela 1 – Tabela para registro do jogo  Números  obtidos nos  dados  Cálculo  realizado  Número(s)  tampado(s)  Pontuação das operações  Pontuação total do  lançamento

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