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Os lusitanos e o comércio carioca

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Academic year: 2022

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Os lusitanos e o comércio carioca

Walmer Peres Santana

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No Rio de Janeiro, os portugueses, na sua maioria jovens vindos do Norte português, especialmente do Minho, Douro e Trás-os-Montes (provenientes de cidades como Viana do Castelo, Braga e Vila Real, ou camponeses pobres de Vila Nova de Foz Côa ou Moimenta da Beira), desempenhavam variadas atividades, entretanto, destacava- se, sobretudo, a presença dos lusos no comércio e no transporte da urbe carioca. O setor comercial é particularmente importante para o Club de Regatas Vasco da Gama, haja vista que a maior parte de seus fundadores e sócios e dirigentes nas primeiras décadas de sua existência provinham do comércio, como patrões ou empregados.

De um modo geral, o português que chegava ao Rio de Janeiro, desembarcando no antigo Cais Pharoux, rumo ao pretendido sucesso através do comércio, sem possuir capital inicial para a abertura de um negócio próprio, inevitavelmente, atuaria na função de caixeiro (empregado do comércio). Atuando como uma espécie de “faz tudo”, empregado no estabelecimento de algum parente, vizinho ou de algum patrício já estabelecido a quem o jovem era recomendado e o apadrinhava, esse trabalhador poderia residir como agregado na casa dos patrões ou dormir no próprio comércio (loja ou armazém) em que labutava. Estavam sujeitos a longas jornadas de trabalho, com a abertura do comércio no Rio de Janeiro entre às quatro e seis horas da manhã e o fechamento das portas variando entre às dez horas e meia-noite, alcançando dezessete ou dezoito horas de trabalho.

Os empregados do comércio estavam subordinados ao severo controle social exercido pelo seu empregador. As horas de lazer eram escassas e, geralmente, praticadas próximos ao local onde trabalhava e, não raro, também residia. Esses indivíduos se submetiam ao trabalho morigerado, com a perspectiva de ganhar a confiança de seu patrão, subir na hierarquia interna e, talvez, após alguns anos, tornar-se sócio do empreendimento ou dono de seu próprio negócio.

Desde meados do século XIX, a profissão de caixeiro, no Rio de Janeiro, incluía um espectro amplo de funções que atendiam a uma escala hierarquia. Era o caixeiro que

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Mestre em História Política pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Historiador do Club

de Regatas Vasco da Gama e Coordenador do Centro de Pesquisa, Preservação de Acervos e Divulgação

da História e Memória do Club de Regatas Vasco da Gama (CPAD-CRVG).

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atendia ao balcão, pesava, embrulhava, vendia, organizava e carregava as mercadorias, fazia as entregas e as cobranças aos fregueses. Era também responsável pelos livros de contas e letras. Além disso tudo, era o caixeiro quem fazia a limpeza e a arrumação, ou seja, a maioria deles fazia de tudo um pouco nas pequenas lojas.

Os estabelecimentos um pouco maiores costumavam empregar mais de um caixeiro: aquele que cuidava das finanças da casa era o primeiro-caixeiro ou guarda-livros e o que atendia o público era chamado de caixeiro de balcão, que podia também ser o segundo-caixeiro. Já o último empregado de um estabelecimento era responsável pelas tarefas consideradas memores, como, por exemplo, a limpeza do local, de que lhe surgiria a designação “vassoura”.

O objetivo do imigrante lusitano nas terras brasileiras, a grosso modo, era trabalhar para que pudesse fazer suas economias, ao mesmo tempo, enviar dividendos para ajudar os seus familiares que ficaram na sua terra natal, e guardava consigo o sonho de retornar como “Brasileiro” (eram assim chamados em sua terra natal os portugueses que retornavam enriquecidos para Portugal, após a emigração para o Brasil), ostentando riqueza na sua “terrinha”, realidade essa que, na maioria dos casos, não se concretizava.

Grande parte dos imigrantes portugueses não possuía profissão certa (uma tônica do cenário social da sociedade carioca do período), trabalhavam de ambulantes pela cidade, comercializando os mais diversos produtos de porta em porta. Para sobreviverem na vida urbana do Rio de Janeiro, havia aqueles que sujeitavam a serviços extremamente exaustivos e que forneciam péssimas condições de trabalho, como a atividade da estiva na zona portuária.

Por se submeterem a “qualquer tipo de trabalho” no intuito de vencer em terras cariocas, aceitando salários exíguos, que em Portugal jamais aceitariam, os imigrantes portugueses passaram a ser chamados de “galegos” pelos próprios patrícios. O apelido se popularizou na cidade, passando os próprios brasileiros a ofenderem os portugueses com tal alcunha, haja vista que chamar um português de “galego” era uma das maiores ofensas que se poderia fazer a um lusitano naquele período. Em Portugal, os piores postos de trabalho eram reservados aos galegos, espanhóis que imigravam vindos da Galícia, região paupérrima da Espanha e que faz divisa com o Noroeste português.

No Rio de Janeiro do final do século XIX e início do século XX havia o “baixo

comércio” e o “alto comércio”. No “baixo comércio” encontravam-se os armarinhos,

hotéis, hospedarias, casas de cômodos, lojas de calçados, barbeiros e cabelereiros,

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restaurantes, padarias, confeitarias, tavernas, cafés, secos e molhados, armazéns, vendas, bares, botequins e casas de pastos.

Por outro lado, o “alto comércio” era formado sobretudo pelos escritórios de exportação e importação, que encerravam os trabalhos por volta das três ou quatro horas da tarde. Executavam-se operações complexas, dizia-se (referência às operações de câmbio, entre outras), para as quais seria necessária formação mais especializada e aprofundada do que a que era exigida no “baixo comércio” do Rio de Janeiro.

Consequentemente, a situação dos caixeiros de escritório que trabalhavam nesse tipo de casa era bem diferente da dos outros.

Alberto de Carvalho Silva

Alberto de Carvalho Silva foi eleito pela primeira vez para Presidente do Vasco da Gama em 24 de agosto de 1902, com 66 votos, tomando posse no dia 31 de agosto daquele ano. Português e negociante de prestígio na praça comercial da urbe carioca, trabalhou como empregado do comércio para o seu antigo patrão, Alvaro Braga, provavelmente um lusitano, no estabelecimento Camisaria Especial, até tornar-se sócio do estabelecimento, em 1892.

Junto a Manoel José Tavares, outro ex-funcionário de Alvaro Braga, Alberto Silva constituiu a firma Carvalho, Tavares & C., que herdou o estabelecimento do antigo patrão.

Tal casa comercial situava-se no número 53 da prestigiada Rua do Ouvidor, no local vendia-se roupas e artigos para homens, acessórios para casa e cama, e artigos esportivos de remo e ciclismo. Em 1903, Alberto de Carvalho Silva constituiu a firma Almeida &

Silva, voltada para a comercialização de fazendas a varejo (lã, algodão, seda e linho), ao lado de José Domingues de Almeida. O estabelecimento situava-se nos números 54 e 56 da Rua Uruguaiana.

A família Carvalho Silva foi importante na vida social, política e financeira do

Vasco da Gama nos anos iniciais do século XX. Os pais de Alberto Silva eram os

portugueses Daniel de Carvalho Silva e Anna Rodrigues de Barros. Fizeram parte da

agremiação vascaína de forma constante os seus irmãos José de Carvalho Silva e

Francisco de Carvalho Silva, e os que acreditamos serem seus primos, Luiz Alberto de

Carvalho Silva e Luiz de Carvalho Silva. Todos eles atuavam no comércio da cidade do

Rio de Janeiro. Havia outros dois irmãos, o negociante Antonio de Carvalho Silva e Maria

Augusta de Carvalho Silva.

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Alberto de Carvalho Silva também seria Presidente do Vasco em mais duas

oportunidades, sendo reeleito em 02 de agosto de 1903 e eleito para o terceiro mandato,

em 12 de agosto de 1906. Auxiliado por outros negociantes, contribuiu significativamente

para as finanças e o crescimento patrimonial do Clube. O dirigente financiava a

construção e importação de embarcações, doava dinheiro, comprava objetos de

necessidade diárias para a agremiação, entre outras benesses. A participação do

mandatário vascaíno foi fundamental para a consolidação do Club de Regatas Vasco da

Gama no campo esportivo.

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Imigrante português, que cresceu no comércio do Rio de Janeiro, Alberto Silva foi um dos grandes dirigentes da história do Vasco da Gama. Alberto de Carvalho Silva, sem data. Acervo: CPAD-CRVG.

FERREZ, Marc. Rua do Ouvidor. c.1895. Domínio Público. Acervo: Instituto Moreira

Salles.

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FERREZ, Marc. Rua Uruguaiana. c.1895. Domínio Público. Acervo: Instituto Moreira

Salles.

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