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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO PARA A CIÊNCIA E A MATEMÁTICA

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO PARA A CIÊNCIA E A MATEMÁTICA

HEDERSON APARECIDO DE ALMEIDA

AS ANALOGIAS UTILIZADAS POR PROFESSORES DE BIOLOGIA COMO ELEMENTOS DA TRANSPOSIÇÃO

DIDÁTICA

MARINGÁ – PR 2016

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HEDERSON APARECIDO DE ALMEIDA

AS ANALOGIAS UTILIZADAS POR PROFESSORES DE BIOLOGIA COMO ELEMENTOS DA TRANSPOSIÇÃO

DIDÁTICA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação para a Ciência e a Matemática do Centro de Ciências Exatas da Universidade Estadual de Maringá, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação para a Ciência e a Matemática.

Área de concentração: Ensino de Ciências e Matemática.

Orientador: Profº. Drº. Álvaro Lorencini Júnior

MARINGÁ-PR 2016

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AGRADECIMENTOS Agradeço a DEUS, por minha existência.

Ao meu orientador, pelas palavras, pelos conselhos, pelas soluções, pelas dúvidas e pelo conhecimento que me proporcionou ao longo dessa caminhada.

Aos meus pais, Maria Aparecida da Conceição e Tarcísio Luiz de Almeida, meus irmãos Hemerson Aparecido de Almeida e Edson Aparecido de Almeida por acreditarem em mim, desde sempre.

Aos amigos de mestrado pelas conversas, desabafos, jantares, parcerias em nossas atividades acadêmicas e convivência durante as aulas e fora delas.

Agradeço a minha amiga Mariana Peres Maranho, por sua amizade, construída na graduação e fortalecida durante o mestrado.

Aos colegas e membros do GETEPEC- Grupo de Estudo e Pesquisa: Tendências e Perspectivas no Ensino de Ciências, pelas riquíssimas sugestões e contribuições.

Aos professores do PCM pelas reflexões compartilhadas durante as disciplinas.

Em especial à professora Dra. Ana Tyomi Obara, pelo apoio e incentivo desde a graduação.

A professora Dra. Fúlvia Eloá Maricato pelos materiais disponibilizados e pelas sábias reflexões decorrentes do grupo de estudo do qual tive o prazer de participar.

Aos professores Dr. André Luís de Oliveira e Dra. Fernanda Cátia Bozelli por me mostrarem as incoerências do trabalho no exame de qualificação e apontarem novos direcionamentos para a finalização da pesquisa.

A professora Daniela Frigo Ferraz pela gentileza do material presenteado e pela sua disponibilidade em me auxiliar no que fosse necessário.

Aos professores sujeitos desta pesquisa, sem os quais o conhecimento gerado não seria possível.

A CAPES pelo subsídio à pesquisa.

Agradeço, por fim, a todos aqueles que se fizeram presentes, direta ou indiretamente, que não foram nominados, mas que foram essenciais durante esta jornada.

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ALMEIDA, Hederson Aparecido de. As analogias utilizadas por professores de Biologia como elementos da transposição didática. 2016, 197 f. Dissertação (Mestrado em Educação para a Ciência e a Matemática) – Universidade Estadual de Maringá, Maringá, 2016.

RESUMO

Esta investigação tem como principal objetivo compreender o processo didático no qual as analogias servem de ferramentas para converter o saber sábio a saber a ser ensinado.

O estudo dessas conversões de saberes baseou-se na Teoria da Transposição Didática de Chevallard. Os sujeitos da pesquisa foram dois professores de Biologia da rede de ensino público do município de Maringá, Paraná, Brasil. A metodologia adotada foi alicerçada na pesquisa qualitativa e na observação participante. Os dados para análise emergiram com base nas observações diretas das aulas dos docentes, de gravações em áudio e por meio de uma entrevista semiestruturada. Os fragmentos dos discursos dos docentes que continham as analogias foram denominados Episódios de Ensino com Analogias e as analogias foram classificadas segundo seu nível de organização.

Analisamos, ainda, a eficácia dessas analogias utilizando Glynn e os passos do modelo TWA- teaching with analogies. Os resultados mostraram que o emprego de analogias pelos professores ocorre de modo frequente e que na maioria das vezes o fazem sem planejamento. Os tipos de analogias são muito escassos comprometendo a qualidade das mesmas. No entanto, não há uma relação direta entre o tipo de analogia ou a quantidade de passos contemplados do modelo TWA com a eficácia dessa analogia, mas há um perfil docente com habilidades didáticas mais ajustadas para o uso das mesmas. Indícios sugerem que as analogias servem como ferramentas de transposição de saberes ao cumprirem sua função de ponte entre o conhecimento cotidiano e o científico.

Palavras-chave: Ensino de Ciências. Ensino com analogias. Transposição Didática.

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ALMEIDA, Hederson Aparecido de. The analogies used by Biology teachers as elements of didatic transposition. 2016, 197 f. Dissertation (Masters in Education for Science and Mathematics) – State University of Maringá, Maringá, 2016.

ABSTRACT

The main aim of this research is to understand the educational process in which analogies work as tools to convert the knowledge wise to the knowledge to be taught.

The study of these conversions knowledge was based on the Didactic Transposition Theory of Chevallard. The research subjects were two biology teachers of public schools in the city of Maringa, Parana, Brazil. The methodology adopted was founded on the qualitative research and participant observation. The data for analysis emerged based on direct observations of the classes of teachers, audio recordings and through a semi-structured interview. Parts of the teachers’ discourse containing the analogies were called Teaching Episodes with Analogies and the analogies were classified according to their level of organization. Also, it was analyzed the effectiveness of these analogies using Glynn and TWA- teaching with analogies model steps. The results showed that the use of analogies by teachers occurs so frequently and most of teachers often do so without planning. The types of analogies are very sparce compromising their quality.

Nonetheless, there is a direct relationship between the type of analogy or the amount of steps contemplated TWA- teaching with analogies model with the effectiveness of this analogy, but there is a teacher profile with adjusted teaching skills for using them.

Evidence suggests that analogies work as knowledge of transposition tools to fulfill their bridging function between the everyday knowledge and scientific knowledge.

Keywords: Science Teaching. Teaching with analogies. Didactic Transposition.

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LISTA DE SIGLAS DNA- Ácido Desoxirribonucleico

EEA- Episódio de Ensino com Analogia GMAT-General Model of Analogy Teaching MECA- Modelo de Ensino com Analogia

PCM- Programa de Pós-graduação em Educação para a Ciência e a Matemática PDE- Plano de Desenvolvimento Educacional

PIBID- Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência PR- Paraná

SEED- Secretaria de Educação do Estado TD- Transposição Didática

TDE- Transposição Didática Externa TDI- Transposição Didática Interna TWA-Teaching with analogies

UEL- Universidade Estadual de Londrina UEM- Universidade Estadual de Maringá

UNICESUMAR- Centro Universitário de Maringá ZPD- Zona de Desenvolvimento Proximal

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1. Sistema didático...34

Figura 2. Esquema da relação entre os conceitos alvo e análogo...38

Figura 3. Diagrama das três características de uma analogia eficaz...79

Quadro 1. Passos do modelo TWA...41

Quadro 2. Períodos de observação das aulas dos professores...55

Quadro 3. Perfil dos professores...56

Quadro 4. Normatização brasileira de transcrição...65

Quadro 5. Classificação das analogias segundo os níveis de organização...76

Quadro 6. Passos do modelo Teaching with analogies (TWA)...79

Quadro 7. Perfil docente de P1...111

Quadro 8. Perfil docente de P2...129

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... 11

CAPÍTULO I- TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA, FUNDAMENTOS E ELEMENTOS... 20

1.1. Os elementos da transposição didática... 27

1.1.1 Noosfera... 27

1.1.2 Vigilância e ruptura epistemológica... 28

1.1.3 Cronogênese e topogênese... 29

1.1.4 Obsolência externa e obsolência interna... 30

1.1.5 Envelhecimento biológico e moral do saber... 31

1.1.6 Dialética Antigo/novo... 32

1.2 A Didática das Ciências e a Transposição Didática... 32

CAPÍTULO II- AS ANALOGIAS COMO OBJETO DE ESTUDO DA LINGUAGEM EM ENSINO DE CIÊNCIAS E A LINGUAGEM NA PERSPECTIVA VIGOTSKIANA37 1.1. Analogias: Conceituação e origem... 37

1.2 A linguagem segundo Vigotski... 46

CAPÍTULO III- PERCURSO ANALÍTICO E METODOLÓGICO/ CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO DA PESQUISA... 52

3.1 Parcerias estabelecidas... 52

3.2 O contexto: a escola e os sujeitos... 53

3.2.1 A escola... 53

3.2.2. Os sujeitos da investigação... 55

3.3. Os instrumentos de constituição dos dados... 58

3.3.1 A observação... 58

3.3.2 Diário de campo... 61

3.3.3. As gravações em áudio... 63

3.3.4 A entrevista... 64

3.3.5 O processo de transcrição... 66

3.4. A pesquisa qualitativa... 68

CAPÍTULO IV- INTEGRAÇÃO ENTRE A TEORIA DA TD E AS ANALOGIAS: UMA PROPOSTA PARA A ANÁLISE... 72

4.1 Procedimento de análise dos dados... 76

CAPÍTULO V- ANÁLISES DAS ANALOGIAS EMPREGADAS PELOS PROFESSORES DE BIOLOGIA... 82

5.1 Indícios de uso de analogias... 82

5.1.1 As aulas do sujeito P1... 82

5.1.2 As aulas do sujeito P2... 84

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5.2 As relações analógicas do sujeito P1... 86

5.2.1 EEA1: A BEXIGA... 86

5.2.2 EEA2: O CABO DE GUERRA... 89

5.2.3 EEA3: DAS MÃES NASCEM OS FILHOS... 91

5.2.4 EEA4: A BEXIGA 2... 93

5.2.5 EEA5: A VIAGEM DA CÉLULA... 95

5.2.6 EEA6: A MORTE VEM PARA TODOS... 97

5.2.7 EEA7: A MÓRULA E A AMORA... 99

5.2.8 EEA8: A BOLA DE FUTEBOL... 101

5.2.9 EEA9: MOLENGA COMO UMA GELATINA... 103

5.2.10 EEA10: A PELE DA CASCA DO OVO... 105

5.2.11 EEA11: A BEXIGA E A ROCHA... 107

5.2.12 EEA12: O COLAR DE CONCHAS... 109

5.3. As relações analógicas do sujeito P2... 120

5.3.1 EEA1a: OS GESTOS... 120

5.3.2 EEA2a: DE QUE ESPONJA EU FALO?... 123

5.3.3 EEA3a: A FOICE, A LUA E A MASSINHA... 126

CAPÍTULO VI- INVESTIGANDO A PRÁTICA DOCENTE COM O ENSINO DE ANALOGIAS... 134

6.1EEA13: O CABELINHO E A VASSOURINHA... 134

6.2 EEA14: O CARRO MOVIDO A ÓLEO?... 140

6.3. Alguns apontamentos sobre as concepções de P1 quanto às analogias... 148

6.3.1 Analogias: múltiplas expressões... 148

6.3.2 A abstração e a concretude... 149

6.6.3 O aluno e suas analogias... 152

6.3.4 As relações entre as analogias, cronogênese e topogênese do saber... 153

CONSIDERAÇÕES FINAIS... 156

REFERÊNCIAS... 161

APÊNDICES... 168

Apêndice A- EEA do sujeito P1... 169

Apêndice B- EEA do sujeito P2... 182

Apêndice C- Roteiro de entrevista... 186

Apêndice D- Entrevista do sujeito P1... 187

Apêndice E- Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)... 197

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INTRODUÇÃO

Os (des) caminhos durante o percurso

A presente pesquisa, intitulada “As analogias utilizadas por professores de Biologia como elementos da transposição didática”, emergiu com base em minhas vivências como acadêmico do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade Estadual de Maringá.

A escolha pelo curso de Licenciatura em Ciências Biológicas foi motivada por meus viveres ainda na condição de aluno da Educação Básica de Ensino. Dentre as disciplinas obrigatórias, a Biologia despertou em mim o interesse pela leitura e a busca por mais informações relacionadas a esta disciplina. Lembro-me, como se fosse agora, meu fascínio pela classificação dos seres vivos em grupos, pelas Leis de Mendel, pela fisiologia do corpo humano e tantos outros conteúdos ministrados que ainda me despertam prazeres infindáveis.

Assim como os conteúdos, os professores de Biologia que ministraram aulas para mim no Ensino Médio tiveram um papel fundamental pela escolha da graduação em Ciências Biológicas. A admiração pela profissão surgiu nesse intervalo, momento no qual me espelho na prática desses docentes que se esforçavam em ensinar os conteúdos utilizando-se de diferentes ferramentas didáticas.

Julgo de igual relevância para a escolha do curso meu modo de ser e agir. Isto porque, uma característica pessoal minha sempre foi compartilhar os conhecimentos aprendidos em sala de aula com os meus colegas e familiares. O prazer em ensinar e ao mesmo tempo aprender, que analogicamente digo ser uma estrada de mão dupla, condicionou uma aproximação íntima com a docência e pela escolha da licenciatura após a formação do segundo grau no ano de 2007.

A entrada no Curso de Licenciatura em Ciências Biológicas no ano de 2009 foi marcada por imensa alegria devido a aprovação em uma instituição de Ensino Superior pública. Ingressando no primeiro ano do curso tive minhas primeiras disciplinas relacionadas à habilitação de licenciatura. Embora as disciplinas específicas do curso muito me agradavam, foram as disciplinas específicas da habilitação que promoveram com maior empenho as discussões sobre a profissão docente, seus limites e possibilidades, bem como um apreço maior pela carreira docente.

As primeiras experiências para com a profissão, agora na condição de estagiário, ocorreram no quarto e quintos anos da graduação, devido a concentração das disciplinas

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de Estágio Supervisionado nos anos finais do curso. No entanto, foi no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência- PIBID de Biologia da UEM que minhas primeiras vivências como docente foram sendo escritas.

O ingresso no PIBID, em meados de março de 2012, provocou em mim imensa comoção, pois uma formação paralela e complementar contribuiria de forma ímpar para a minha identificação quanto a futura profissão. Por intermédio de reuniões semanais na universidade e quinzenais nos colégios contemplados com o programa, promoviam-se discussões sobre a prática docente, o ensino e aprendizagem dos conteúdos científicos, as visões de ciências, as concepções alternativas e de senso comum, estratégias de ensino e recursos didáticos, entre outros temas tão importantes quanto os descritos.

A leitura de textos durante as reuniões era marcada por discussões e reflexões profundas dos bolsistas, carinhosamente chamados de “pibidianos”, dos professores coordenadores do projeto e dos professores supervisores das escolas. Essas discussões permitiram, já naquele momento, reflexões sobre minhas primeiras ações quando fosse adentrar no colégio, sobre meu modo de se comportar, de me relacionar com os alunos, de ministrar os conteúdos, tudo isso contribuiu para a construção de minha identidade profissional.

No período em que eu estive envolvido com o projeto ministrei oficinas temáticas para os alunos de um dos colégios contemplado. Preparei aulas práticas para auxiliar a professora supervisora e desenvolvi outras atividades que me permitiram acompanhar a rotina de um docente, seus anseios, suas dificuldades e seus conflitos. É neste intervalo que tenho meus primeiros contatos com a temática das analogias. Na observação das aulas da professora supervisora percebi que, em diversos momentos, ela buscava explicar os conceitos científicos de modo simplificado, minimizando a abstração necessária para a compreensão desses.

Sobre a abstração Mayer et al. (2001) revelam que o ensino de conceitos abstratos é um dos principais problemas enfrentados pelos professores de Ciências. Isto devido a própria dificuldade desses docentes de trabalharem com conceitos extremamente abstratos. Compreendem-se os conceitos abstratos em Biologia quando estes possuem dimensões microscópicas, não visíveis a olho nu. Os conceitos concretos seriam os que possuem dimensões no plano macroscópicos.

Algumas formas utilizadas pelos docentes para diminuir a abstração foram o emprego de exemplos do cotidiano, de comparação a situações práticas, de analogias, de

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modelos didáticos, dentre outros. No entanto, esse meu primeiro contato com a temática foi bastante incipiente.

Estabelecidas as primeiras experiências com a prática docente entrei como estagiário da disciplina de Ciências em uma turma de 6ºano do Ensino Fundamental, ainda no ano de 2012. Diferentemente do PIBID, no qual trabalhei com alunos do Ensino Médio, trabalhar com o Ensino Fundamental foi uma experiência nova e interessante. Percebi que a linguagem, como principal forma de expressão dos sujeitos, se manifestava nos discursos dos alunos de vários modos e os recursos linguísticos eram demasiadamente ricos. Na posição de professor eu procurava explicar os conceitos científicos com uma linguagem mais simples buscando associar, sempre que possível, o conceito científico com o cotidiano dos alunos. Essa atitude se mostrou bastante pertinente, pois percebi que os alunos faziam suas próprias comparações marcadas de concepções prévias. Esse primeiro contato foi relevante para eu assumir uma postura mais segura e firme em sala de aula no Estágio Supervisionado II desenvolvido no ano seguinte na disciplina de Biologia.

Dividido em estágio de observação, participação e regência, o Estágio Supervisionado II foi realizado com uma turma de primeiro ano do Ensino Médio. A professora da turma era muito expressiva, iniciava e terminava suas aulas no tempo programado por ela e utilizava de diferentes ferramentas para explicar os conceitos relativos à Biologia das células. As analogias se fizeram muito presentes em suas aulas e, de certo modo, era um elemento frequente no discurso dessa docente. Observando a prática da professora e como ela explicava os conteúdos foi que comecei a refletir sobre minhas futuras ações quando assumisse as aulas.

E foi no estágio de regência que iniciei minhas reflexões. O conteúdo trabalhado durante o estágio foi a divisão celular. Para trabalhá-lo tive que estudar bastante e encontrar formas de expor os conceitos científicos de modo claro e simplificado, mas sem distorcê-los. Os conteúdos relativos à divisão celular exigiam um alto grau de abstração dos discente, por isso eu procurava usar de diversos recursos para concretizar o conteúdo como, por exemplo, o microscópio, imagens, desenhos, figuras, modelos e também recursos linguísticos.

No mesmo ano tive outra experiência em sala de aula, mas desta vez em uma rede particular de ensino. Durante seis meses auxiliei a única professora de Biologia dessa instituição na elaboração de aulas e atividades práticas. De igual modo pude acompanhar de perto suas estratégias didáticas e os recursos que utilizava para ensinar

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os conteúdos biológicos. Novamente o emprego de diferentes recursos linguísticos por um docente mostrou-se evidente, conferindo um possível perfil docente para o uso das analogias.

Percebe-se que no ensino de Biologia os conceitos têm papel central na abordagem dessa disciplina, uma vez que segundo Mayr (2005) a maioria das Teorias deste campo do conhecimento não se baseiam em Leis e sim em conceitos. Essa afirmação implica na diferença da Biologia com as demais áreas das Ciências Naturais.

Mas cabe aí pensarmos sobre o que compreendemos por conceitos biológicos.

Para Meglhioratti et al. (2008) os conceitos são representações, conhecimentos que se constituem em representações do mundo e modo de interpretá-lo através da cognição humana e da linguagem humana. Por serem representações dos fenômenos e fatos da natureza, os conceitos estabelecem relações indiretas com o objeto que se propõem conceituar. São, em suma, representações da cognição criada e partilhada tanto individualmente quanto coletivamente que permite aos sujeitos classificar, organizar os dados advindos da experiência.

Quando o professor trabalha com conceitos biológicos e traz para a sala de aula imagens, figuras e modelos didáticos ele está trabalhando com representações desse conceito. Da mesma forma ocorre com os livros didáticos ao trazerem, por exemplo, ilustrações do conceito de célula. Essas ilustrações são formas de demonstrar o conceito, mas não é efetivamente o conceito. Uma célula não é uma figura, plana, colorida. As imagens implicam no modo como os alunos representarão e definirão o conceito de célula

Voltando a narrativa, essas breves experiências durante o penúltimo e último ano da graduação foram importantes para minha decisão em prosseguir os meus estudos em um programa de pós-graduação na área de Educação. Sob essas condições me propus a desenvolver um projeto na área de ensino de Ciências e Matemática. Na etapa de elaboração do projeto, para o pleito de uma vaga ao Mestrado, percebi minha identificação com o tema analogias e com base nisso busquei na literatura informações sobre a temática. Percebi que o campo de investigação sobre o papel das analogias no ensino de Ciências era promissor e dentre as linhas de investigação, a que me despertou maior interesse foi a linha que investiga as razões pelas quais o professor utiliza as analogias no processo de aprendizagem.

Após a entrega do projeto e a participação no processo seletivo para o ingresso no curso de Mestrado, em dois programas distintos, fui aprovado no programa de Pós-

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Graduação em Educação para a Ciência e a Matemática- PCM da UEM. As atividades acadêmicas iniciaram-se no ano de 2014 e desde então o projeto passou por diversas readequações. As disciplinas cursadas no ano letivo, as orientações e o aprofundamento das leituras sobre o tema se constituíram essenciais para as novas direções dada ao trabalho. Encontramos outros referenciais teóricos. É neste momento que delimito o tema da pesquisa e faço os primeiros recortes do corpus teórico.

Contextualizando a pesquisa

O interesse para com a temática sobre as analogias e metáforas no Ensino de Ciências tem evidenciado-se um importante campo de pesquisa. Duarte (2005) realizou um levantamento, um ‘estado da arte’ dos trabalhos em Ensino de Ciências que versavam sobre a temática analogias. A autora identificou diversos contributos dessas pesquisas agrupando-as em categorias, a saber: o conceito e objetivos da analogia; os modelos de ensino com analogias; as analogias na investigação em Ensino de Ciências;

potencialidades e dificuldades na utilização das analogias no Ensino de Ciências;

contributos teóricos e empíricos para uma redefinição do estatuto da analogia na educação em Ciências.

Em trabalho anterior (ALMEIDA e LORENCINI JÚNIOR, 2015), fora realizado um mapeamento da produção intelectual dos trabalhos stricto sensu que versam sobre o tema. Investigamos as dissertações e teses produzidas por pesquisadores nos programas de pós-graduação em Ensino de Ciências do Brasil. Como resultado, identificamos 20 trabalhos, dos quais, a maioria estavam relacionados às áreas da química e da física.

Essa tendência é corroborada pela pesquisa de Duarte (2005) que também identificou uma menor produção na área disciplinar da Biologia quando comparado às outras áreas disciplinares da Ciência.

Os trabalhos encontrados pelos autores foram defendidos entre os anos de 2004 e 2014, revelando, assim, uma recente e crescente preocupação para com o uso das analogias no processo de ensino e aprendizagem. Identificaram sete eixos temáticos, dos quais, o eixo nominado como “Intervenção de estratégia didática com analogias e metáforas” foi o que apresentou maior número de trabalhos.

Pesquisas realizadas em âmbito internacional evidenciam a importância dos recursos analógicos quando usados para a construção dos conhecimentos científicos.

Esses estudos (CURTIS; REIGELUTH, 1984; DUIT, 1991; DAGHER, 1994;

HARRISON; TREAGUST, 1994; GLYNN; GIBSON; HAWKINS, 1998) contribuem

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para a área ao reconhecer os limites e validade do uso da analogia nos processos de construção do conhecimento por raciocínio analógico.

Neste sentido, as analogias teriam a finalidade de relacionar o conceito não familiar que será trabalhado pelo professor com um conceito familiar, dito análogo. Para isso, as diferenças e similaridades entre os conceitos devem ser apresentadas de modo a evitar a transferência errônea de significados do conceito científico para o análogo.

Caso isso ocorra o análogo poderá ser compreendido, pelo aluno, como o próprio conceito científico em si.

Percebe-se que há, portanto, vantagens para que as analogias sejam usadas para auxiliarem nos processos de construção dos conceitos científicos em Ciências. Sobre as vantagens Duit (1991) aponta que elas auxiliam os estudantes na construção dos conceitos com base nos seus conhecimentos prévios, sendo valiosas ferramenta no que tange a Teoria de mudança conceitual. Aponta, também, que podem auxiliar na compreensão de abstratos ao comparar com concretos do mundo real. Para Duarte (2005, p. 11), dentre outras possibilidades, as analogias “[...] levam à activação do raciocínio analógico, organizam a percepção, desenvolvem capacidades cognitivas como a criatividade e a tomada de decisões”. São, portanto, importantes aliados na construção do raciocínio e da cognição.

Contudo, há algumas desvantagens para o uso das analogias. O raciocínio analógico não é possível se as analogias apresentadas pelo professor somente fizerem parte da realidade dele. Estas teriam que ser formuladas pelos alunos, pois são eles quem estabelecerão um análogo mais próximo de sua realidade e, portanto, mais significativo. Ainda sobre as desvantagens do uso, Duarte (2005, p.12) aponta que “os alunos podem centrar-se nos aspectos positivos da analogia e desvalorizar as suas limitações”, assim, não compreendendo as falhas presentes no análogo para a explicação do conceito alvo.

Por toda essa breve explanação, percebe-se que em Ensino de Ciências as investigações com a temática analogias estão longe de se esgotar. No caso específico da pesquisa em Ensino da Biologia, algumas considerações podem ser apontadas. Quanto aos trabalhos levantados por Almeida e Lorencini Júnior (2015), apenas 4 foram relacionados ao Ensino de Biologia. Contudo, os autores delimitaram a pesquisa ao buscarem apenas as dissertações e teses defendidas nos programas de Ensino de Ciências.

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Em um recorte mais amplo, Hoffmman (2012) realizou um levantamento dos trabalhos acadêmicos que versam sobre as analogias e metáforas no ensino de Biologia.

Em sua tese, caracterizada como o estado da arte, a pesquisadora encontrou 45 trabalhos publicados com tal temática em um recorte temporal de 25 anos, de 1984 a 2009. Esses trabalhos foram divulgados por meio de trabalhos de eventos, periódicos, revistas, dissertações e teses. Como resultados, a autora apontou alguns eixos de trabalhos ainda pouco explorados e que merecem atenção em futuras pesquisas, como, por exemplo, o papel da analogia e da metáfora no momento em que se aprende e se ensina Biologia.

Veinlle e Treagust (1997, apud FERRAZ 2006), ao realizarem um levantamento sobre os estudos relativos às analogias no Ensino de Biologia, revelam que as pesquisas empíricas nessa área disciplinar mostram que as analogias possibilitam a melhoria do entendimento dos conceitos científicos, mas que podem, por outro lado, não se mostrarem efetivas para a compreensão dos estudantes, podendo, inclusive, ocasionar um efeito deteriorante.

Portanto, faz-se necessário pesquisas que buscam investigar como os professores de Biologia, mediadores no processo de ensino/aprendizagem, empregam as analogias na prática, quando estão ensinando conceitos científicos/biológicos. É através desta constatação que a presente pesquisa foi delimitada, cujo o problema proposto a ser respondido foi: As analogias empregadas pelos professores de Biologia são ferramentas de ensino que possibilitam a conversão do saber sábio em saber ensinado na transposição didática?

Com base no problema inicial delineamos o objetivo geral a ser alcançado:

compreender o processo didático no qual as analogias são utilizadas para converter um saber sábio em um saber ensinado. Do objetivo geral emergiram os seguintes objetivos específicos: identificar as analogias empregadas pelos professores de Biologia em seu discurso; classificar as analogias segundo o seu nível de organização1; identificar as situações de ensino na qual o professor utiliza dessa ferramenta; elaborar um perfil docente de Biologia para o uso de analogias; conhecer como os professores empregam as analogias na transposição dos saberes.

1 O nível de organização segundo Ferraz (2006) refere-se a como as analogias estão relacionadas ao conceito científico. Quando são meramente citadas e não fazem o mapeamento de qualquer atributo do conceito científico ou do conceito não científico, as analogias são denominadas como simples. Quando vários atributos do conceito científico são explicados e fazem correspondências ao conceito análogo, as analogias são denominadas como estendidas.

Há outras 7 categorias quanto ao nível de organização e essas estão descritas detalhadamente no capítulo IV.

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Para o alcance dos objetivos elencados acompanhamos dois professores de Biologia durante três períodos distintos, entre os anos de 2014 e 2015. Estes docentes lecionavam em uma instituição pública de ensino do estado do Paraná. Na primeira etapa da pesquisa os dados emergiram por intermédio das observações e gravações das aulas desses docentes. Após essa etapa, transcrevemos os áudios a fim de identificarmos as analogias presentes no discurso deles. Em etapa subsequente, classificamos as analogias encontradas segundo seu nível de organização, identificamos as situações de ensino que levam o docente a usar determinada analogia e elaboramos um perfil docente para este uso.

A última fonte de constituição dos dados foi o discurso dos docentes enunciados mediante a realização de uma entrevista semiestruturada. Tal etapa foi realizada após a observação das aulas. O objetivo desse instrumento de coleta de dados, dentre outros, foi investigar as concepções do professor quanto as analogias no Ensino de Biologia, encontrar no seu discurso elementos da Transposição Didática (TD) e compreender como ele planeja o emprego das analogias.

Apresentados o problema e os objetivos da pesquisa, descrevemos a seguir breves considerações sobre os capítulos do trabalho. No capítulo I fizemos uma caracterização da teoria da TD sob uma perspectiva histórica apresentando os seus principais elementos e fundamentos. Ainda no mesmo capítulo discutimos sobre a didática da matemática, campo no qual surgiu a TD, aproximando-a à didática das ciências com base em referencial teórico pertencente a área.

No capítulo II apresentamos a temática analogias como objeto de estudo e de pesquisa, conceituando e definindo-a. Posteriormente apresentamos uma breve consideração sobre a linguagem enquanto construção individual e coletiva tendo como base teórica os estudos de Vygotsky. O modelo TWA-Teaching with analogies que se configura como o mais conhecido no que diz respeito ao uso sistematizado das analogias em textos didáticos e em sala de aula também foi descrito neste capítulo. Por fim, expusemos os principais referenciais internacionais sobre a temática que conduziram as análises desse estudo.

No capítulo III descrevemos os percursos metodológicos que nortearam a presente pesquisa. Narramos o contexto dela, os sujeitos participantes, os instrumentos de coleta de dados e os referenciais metodológicos que orientaram as análises. De igual modo, descrevemos os caminhos que nos levaram a caracterizar a pesquisa como qualitativa.

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O capítulo IV foi dedicado a apresentação da integração entre duas diferentes linhas de investigação, as analogias e a Transposição Didática. Procuramos aproximar as duas linhas relacionando-as e dialogando com autores da área. Ainda no capítulo apresentamos os procedimentos de análise dos EEA- Episódios de Ensino com Analogias- e das entrevistas.

No capítulo V estão contidas as análises dos EEA. Apresentamos a classificação das analogias encontradas de acordo com seu nível de organização e sua eficácia para o uso em sala de aula por meio de critérios estabelecidos por Glynn (1989). Pode-se, também, construir um perfil docente para o uso das analogias.

No VI e último capítulo apresentamos algumas considerações sobre a prática docente com o ensino de analogias de um dos professores pesquisados, conseguido mediante as respostas concedidas por ele a uma entrevista semiestruturada.

Finalizamos o trabalho apresentando as considerações finais. Resgatamos, nesse momento, a relevância da pesquisa, os objetivos iniciais, os resultados qualitativos empíricos encontrados, além de tecermos caminhos para novas pesquisas no campo investigativo das analogias com base nas lacunas evidenciadas no presente estudo.

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CAPÍTULO I- TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA, FUNDAMENTOS E ELEMENTOS

A necessária adaptação e transformação do saber acadêmico quando se trata de ensiná-lo no contexto escolar é consenso no meio educacional. As relações entre os saberes e suas formas de apropriação se configuram como um campo promissor de pesquisas nas áreas da educação e de ensino. Na tentativa de apontar as relações entre esses saberes e encontrar referenciais que permitam estudar de maneira mais adequada como essas relações se estabelecem a Transposição Didática emerge como uma possibilidade.

O conceito de Transposição Didática (TD) foi proposto inicialmente pelo sociólogo francês Michel Verret em 1975, sendo usado por Yves Chavellard em seu trabalho referente à discussão do conceito matemático de distância. A publicação de uma segunda edição no ano de 1991, adicionando-se à obra um posfácio, fez-se necessária devido a críticas e polêmicas surgidas em torno de sua primeira edição (DEVELAY; ASTOLFI, 2012).

O subtítulo original da obra de Chevallard intitulado Du savoir savant au savoir enseigné pode apresentar, numa breve interpretação, alguns equívocos. Um destes seria acreditar que para o saber sábio ser transformado em saber ensinado bastaria apenas uma simplificação do primeiro, sem levar em consideração as variáveis que os separam, senão, fatores ligados à personalidade de cada docente. Todavia, a mera simplificação do saber dito sábio não garante a ocorrência da TD. Fazer uma transposição requer reconstruir especificamente um saber a ensinar, e posteriormente reconstruí-lo em saber ensinado. Os saberes, de acordo com esse referencial teórico, são classificados como saber sábio, saber a ser ensinado e saber ensinado.

O saber sábio está intimamente associado à vida acadêmica, construído nas universidades e nos institutos de pesquisas, mas que não está necessariamente vinculado ao ensino básico. Por sua vez, o saber a ser ensinado representa o conjunto dos conteúdos previsto na estrutura curricular das várias disciplinas escolares valorizadas no contexto da história da educação. Enquanto o saber sábio é apresentado por meio de artigos, teses, livros e relatórios, o saber a ser ensinado é divulgado através de livros didáticos, programas, diretrizes e outros materiais. O processo de ensino leva finalmente ao saber ensinado que é aquele registrado no plano de aula do professor e que não coincide, necessariamente, com a intenção prevista nos objetivos programados.

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Almeida (2007, p.10) parafraseia Chevallard ao dizer que “há, sim, diferenças entre aquilo que se elabora nos espaços puramente científicos e aquilo que é desenvolvido nos ambientes estritamente educativos”. Os conceitos são ensinados na escola e na academia com linguagem diferente uma vez que o público alvo não é o mesmo, estão em etapas de desenvolvimento cognitivo diferente.

Ao estudar como o conhecimento escolar é construído, Lopes (1999) debate as relações entre o “saber” e o “conhecimento”. De modo geral, os termos são considerados sinônimos sob a ótica da filosofia. Contudo, alguns autores buscam diferenciá-los ao atribuírem ao termo “saber” um sentido mais amplo do que ao termo

“conhecimento”. A autora apresenta a concepção de saber e conhecimento de alguns filósofos como, por exemplo, Foucault. Esse autor considera o conhecimento como uma forma de saber sistematizado, organizado com base em normas de verificação e coerência rigorosas. São, assim, o conhecimento científico e as disciplinas do campo das humanidades. Os saberes, propriamente ditos, seriam os saberes do cotidiano, leigo, tradicional e empírico que não alcançam os limites da cientificidade. Nessa perspectiva foucaultiana os saberes são independentes das ciências.

Ao abordar sobre o conhecimento e o saber, Pais (2008) discorre alguns apontamentos sobre a diferença entre esses dois termos. Segundo o autor, na linguagem do meio científico, o saber é, geralmente, caracterizado por ser relativamente descontextualizado, despersonalizado e mais associado a um contexto científico histórico e cultural. Em contrapartida, o conhecimento sempre diz respeito ao conceito mais individual e subjetivo, revelando algum aspecto de contato experiencial do sujeito.

Nessa perspectiva, conhecimento e experiência pessoal estão intimamente associados.

Partindo destas considerações, pode-se inferir que na construção do conhecimento há um olhar subjetivo e individual do observador sobre o objeto observado. Na construção do saber, há critérios mais objetivos, científicos, históricos e culturais que são submetidos à aprovação de uma comunidade científica. Portanto, na escola ensina-se saberes, por intermédio de conteúdos que foram selecionados usando-se parâmetros, legitimados pelo pensamento de vários indivíduos.

Sobre os aspectos relativos à TD, Lopes (1997) apregoa que essa não representa uma mera reconstrução de saberes a serem ensinados, mas uma complexa transformação dos conhecimentos científicos.

O termo transposição tende a ser associado à ideia de reprodução, movimento de transportar de um lugar a outro, sem alterações. Mais

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coerentemente, devemo-nos referir a um processo de mediação didática. Todavia, não no sentido genérico, ação de relacionar duas ou mais coisas, de servir de intermediário ou “ponte”, de permitir a passagem de uma coisa à outra. Mas no sentido dialético: processo de constituição de uma realidade através de mediações contraditórias, de relações complexas, não imediatas, com um profundo sentido de dialogia (LOPES, 1997, p. 564, grifo da autora).

Mediante a autora, os movimentos transpositivos promovem rupturas e diversas reformulações advindas do processo de desenvolvimento e elaboração dos conhecimentos escolares em relação ao contexto social. A TD não se constitui um simples deslocamento do saber sábio para o âmbito escolar, pois se seleciona, dentro de um dado período histórico e de dada cultura, os saberes a fim de torná-los transmissíveis e assimiláveis. Esta seleção só é possível em virtude da TD que permite a reorganização e reestruturação desses saberes.

Assim, os conteúdos da maneira como são ensinados no âmbito escolar passam por um processo de didatização do conhecimento que permite aos alunos assimilá-lo na escola (LOPES, 1997). Esse processo, no entanto, não é meramente de vulgarização ou adaptação de um conhecimento produzido nas universidades e nos centros de pesquisa.

Implica, obrigatoriamente, uma atividade de produção nova, original de um novo conhecimento. Ao abordar o processo de transposição do conhecimento científico para o conhecimento escolar Almeida corrobora que essa transposição

[...] se dá primeiro com a definição da parte que será prioridade absorver. Depois, faz-se um apanhado da totalidade do conteúdo científico a fim de mostrar a sua amplitude. Essa visão mais ampla precisa ser, no mínimo, projetada para que o aluno perceba que o horizonte é bem mais distante, mas que será, aos poucos, apropriado por ele (ALMEIDA, 2007, p. 47).

Portanto, o saber ensinado não é uma reprodução fiel do saber sábio. O saber ensinado tende a se aproximar do senso comum e se afastar do saber sábio, ou seja, frequentemente ocorre uma grande distância entre objeto do saber2 e o objeto de ensino (CHEVALLARD, 2005). O saber ensinado, desta forma, constitui-se em um novo saber, modificado e legitimado como saber escolar. Chevallard (2005) define o termo TD em sua obra do seguinte modo:

Um conteúdo do saber que tenha sido designado como saber a ensinar, sofre a partir de então um conjunto de transformações adaptativas que

2 O objeto do saber é compreendido como o saber erudito que ao ser selecionado pela noosfera se torna objeto de ensino, sendo, portanto, incluído nos programas e currículos escolares.

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vão torná-lo apto a ocupar um lugar entre os objetos de Ensino. Este

“trabalho” que transforma um objeto de saber a ensinar em um objeto de Ensino é denominado de transposição didática (CHEVALLARD, 2005, p. 45, grifo do autor, tradução nossa)3.

Todavia, o conceito de TD descreve que a passagem de um saber sábio a saber ensinado nunca é direta, antes, passa por duas etapas. A primeira etapa é nominada Transposição Didática Externa (TDE) e a segunda etapa Transposição Didática Interna (TDI). A diferença entre elas situa-se em torno das adequações realizadas pelos agentes envolvidos no processo de transposição, a noosfera. Pais (2008, p.16) define o conceito de noosfera como

[...] o conjunto das fontes de influências que atuam na seleção dos conteúdos que deverão compor os programas escolares e determinam todo o funcionamento do processo didático [...] fazem parte cientistas, professores, especialistas, políticos, autores de livros e outros agentes de educação. O resultado do trabalho seletivo da noosfera resume-se não só à determinação dos conteúdos, como também influencia a estruturação dos valores, dos objetivos e dos métodos que conduzem a prática de Ensino.

O saber sábio, ao sofrer uma primeira adequação realizada pela noosfera, transforma-se em saber a ser ensinado. Desta forma, quando o saber passa ao plano do currículo formal e/ou dos livros didáticos a TDE foi concluída. A TDI ocorre quando o professor seleciona os conteúdos a serem ensinados, bem como os objetivos e métodos que irá trabalhar e, portanto, produz o seu próprio metatexto transpondo o saber a ensinar em saber ensinado.

Quanto as adaptações específicas que cada docente realiza, Develay e Astolfi descrevem que eles “[...] apenas intervêm na segunda fase da transposição, sendo a primeira regulada por aquilo que Chevallard designa por noosfera [...]” (DEVELAY;

ASTOLFI, 2012, p. 195). Essa intervenção de natureza pedagógica, nem sempre resulta numa verdadeira transposição, caso fosse, os docentes a realizariam inconscientemente, sem pensar nos elementos necessários para sua concretização.

Compreendida como uma ferramenta teórica a TD explica as transformações textuais e contextuais de um saber científico ao saber ensinado (CHEVALLARD, 2005). Os conteúdos científicos selecionados para serem ensinados na escola passam

3 Un contenido de saber que há designado como saber a enseñar, sufre a partir de entonces um conjunto de transformaciones adaptativas que van a hacerlo apto para ocupar um lugar entre los objetos de ensênanza. El “trabalho” que transforma de un objeto de saber a enseñar en um objeto de enseñanza, es denominado la transposicíon didática(CHEVALLARD, 2005, p. 45, grifo do autor).

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por um processo denominado textualização. De modo geral, a textualização estabelece quatro regras a serem seguidas para que o saber seja escrito de uma forma didática, a saber: desincretização, despersonalização, programabilidade e publicidade. A desincretização consiste na divisão de uma determinada Teoria em várias áreas e em especialidades delimitadas, ou seja, particiona o saber em saberes parciais. Usando como exemplo a Biologia, normalmente esta é dividida em: Biologia das células, Biologia dos organismo e Biologia das populações e comunidades. A desincretização é, então, metódica, sistemática e organizacional.

A despersonalização do saber diz respeito à separação do saber de qualquer contexto pessoal. Infere que o saber se tornou público, universal, não é de ninguém é para todos. Embora a despersonalização distancie o saber de seu “produtor científico”

ela não, necessariamente, apaga a História desse saber (NEVES, 2009). Retomando o exemplo da Biologia, atualmente ainda encontra-se nos manuais didáticos de Biologia referências do “produtor científico” com o seu “produto”. Em Genética, por exemplo, os manuais associam as Leis da hereditariedade (produto/saber) a Mendel (produtor científico), mostrando que nem sempre a despersonalização é omitida.

A ordem como o saber é apresentado deve seguir uma sequência progressiva e racional, estabelecendo, assim, uma programação. Na Biologia, a programabilidade dos conteúdos a serem ensinados geralmente segue uma sequência típica: se ensina primeiro sobre os níveis menores das estruturas, iniciando pelas células, passando pelos organismos até atingir os níveis maiores das estruturas, como as populações e comunidades. Por fim, a publicidade do saber diz respeito à forma como o saber será divulgado. Normalmente é encontrada nos prefácios, mas pode estar na introdução ou em outras partes do texto. A publicidade deve mostrar a importância e a finalidade dos saberes que serão trabalhados.

Após sofrer a despersonalização o saber sábio sofre uma descontextualização, pois é retirado dele a autoria, o tempo e o lugar. Se omite o contexto no qual o saber foi produzido, de modo que não se menciona as problemáticas que se puseram diante da construção desse saber. A História das Ciências, portanto, é desconsiderada no processo da transposição didática.

No entanto, acreditamos que transpor didaticamente um saber erudito a saber escolar requer planejamento pelo docente, tal como levar em consideração os aspectos mais importantes do conteúdo trabalhado que se deseja evidenciar e que não podem ser esquecidos, como a construção histórica daquele conceito, mostrando que a ciência é

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construída, não é neutra e nem atemporal. Outro aspecto diz respeito à aplicação do conteúdo aprendido na escola na vida diária. Se o professor não mostrar aos alunos tal aplicação, corre-se o risco deles acreditarem ser desnecessário a aprendizagem do conteúdo trabalhado.

Nesta perspectiva, como apontado por Chevallard (2005), dificilmente os professores realizam a TDI, a não ser em alguns casos. Neves (2009) revela que para um novo saber resulte em um saber ensinado os docentes devem cumprir algumas exigências repensando, assim, a sua prática de ensino. A 1ª exigência diz respeito à contextualização do saber sábio. A 2ª exigência diz que o professor deve buscar contextualizar historicamente como determinado saber sábio foi produzido. Deverá, também, atualizar-se de modo a conhecer o que há de novo quanto ao saber em questão, procurando fontes reconhecidas e seguras. A terceira diz que o docente deverá conhecer a epistemologia do saber, além de dominar a linguagem científica a fim de reescrevê-lo de acordo com o vocabulário dos alunos

Para que a TDI se concretize, o professor deve tornar-se um vigilante epistemológico indagando sobre a natureza do objeto em estudo, como ele se concebe no ensino e qual a relação entre a sua construção e a sua abordagem didática. Para isso, o docente deverá conhecer mais profundamente o objeto de ensino que está trabalhando, inclusive o saber sábio do qual é originário. Desta forma, a TDI se concretizará, pois, haverá uma ruptura de ordem epistemológica.

Ser vigilante epistemologicamente não é uma tarefa simples, que se realiza de uma hora para outra. Exige a reflexão do professor quanto ao objeto de ensino que está trabalhando. A partir do momento que ele questiona-se sobre este objeto e procura investigar a qual objeto do saber esse está relacionado, a ruptura epistemológica acontece. Nota-se que a TDI é resultado de um trabalho tanto consciente quanto inconsciente. Consciente, pois ao planejar sua aula o professor acredita representar fielmente o texto científico do saber. Inconsciente, pois, ao organizar, planejar e fazer suas escolhas metodológicas e teóricas o professor já não está trabalhando com o saber sábio, este já é saber a ser ensinado. Portanto, a TDI é um processo dialético, consciente e inconsciente. Contudo, a dimensão ‘consciente’ é tanto maior quanto mais vigilante epistemologicamente for o professor.

O grande desafio dos docentes é transformarem o saber sábio em conteúdo didático e adaptá-lo sem deixar de considerar o nível cognitivo dos principais atingidos

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por essa ação, os alunos. Deste modo a TD possibilita, por uma ação modificadora, a transformação de um saber acadêmico a saber escolar.

O objetivo da TD é propiciar o contínuo processo de atualização dos conteúdos escolares advindas dos saberes acadêmicos, produto das comunidades científicas (NEVES, 2009). Isto, porque na concepção da didática das disciplinas os saberes escolares, assim como outras formas de saber, envelhecem com relação ao modelo social em que estão inseridos, o que os obriga a se apresentarem com uma nova roupagem. Chevallard (2005) ironiza ao dizer que quando determinado saber já pode ser ensinado pelos pais sem que o aluno precise ir à escola, este saber já não precisa ser ensinado no contexto escolar. Portanto, a TDE atualiza os conteúdos escolares à medida que a noosfera determina o que deverá ser ensinado na escola. Contudo, o professor ao realizar a TDI, tem autonomia de adicionar ou retirar dos conteúdos programáticos os saberes a serem ensinados.

Assim, uma nova configuração é encontrada em elementos inerentes aos saberes científicos e, portanto, herda as alterações deles quando se modificam ao viver uma crise paradigmática. A ideia de crise advém do epistemólogo Tomas Kuhn4. Para o autor, em períodos de ascensão de uma determinada Teoria científica a comunidade científica produz uma ciência normal com base nessa Teoria aceita universalmente.

Caso uma anomalia surja, contrariando a Teoria vigente e esta não consiga solucionar tal problema, se instaura uma crise paradigmática. Tal crise, agora já no período de revolução científica, perdura até que a anomalia seja solucionada ou uma nova Teoria acabe com essa.

Da mesma forma ocorre com os conteúdos escolares. Como exemplo, temos a ideia de genes em Biologia. Até a década passada acreditava-se que um único gene continha a informação para a síntese de uma única proteína. Desse modo, um gene produziria uma proteína. Uma crise paradigmática se instaurou pela descoberta de que um único gene poderia codificar mais de uma proteína e vários genes, interagindo, poderiam codificar uma proteína específica. Esse é apenas um exemplo de como a crise em torno do saber científico, neste caso o gene, influencia na atualização dos conteúdos curriculares.

Uma possibilidade de renovação dos conteúdos é, portanto, por meio da TD. O saber sábio deverá sofrer um processo de degradação. Esta se caracteriza pela perda do

4 Para maiores detalhes consultar: KUHN, T. S. A estrutura das revoluções científicas.10. ed.

São Paulo: Perspectiva, 2010.

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contexto original de produção do saber sábio, processo nominado como descontextualização. Esta ação é necessária, pois todos aspectos relativos ao conceito científico não podem ser transpostos para o saber a ser ensinado, uma vez que a complexidade do conhecimento científico é um fator limitante. O saber ensinado legitima-se, então, como algo que não é de nenhum tempo e de nenhum lugar, despersonificado e atemporal (CHEVALLARD, 2005).

Por conseguinte, compreender o porquê de um determinado saber ser selecionado ou não é tarefa árdua que exige reflexões por parte dos agentes que atuam dentro e em torno da noosfera. O papel do professor é assegurar que os saberes a serem ensinados não sejam meras simplificações ou reduções do saber sábio, mas sim uma adequação que possibilite ao aluno compreender um conceito científico fazendo-o conhecer o contexto histórico e as problemáticas em torno da construção do conceito em questão.

1.1. Os elementos da transposição didática

A TD possui elementos específicos e próprios da sua teoria. Nessa subseção apresentamos alguns desses elementos com suas características. São eles: noosfera, vigilância epistemológica, ruptura epistemológica, cronogênese e topogênese, obsolência externa e interna, envelhecimento biológico e moral e relação antigo/novo.

1.1.1Noosfera

A noosfera representa o conjunto das fontes de influência que atuam na seleção de conteúdos que comporão os programas escolares e que determinarão o funcionamento de todo o processo didático. A noosfera é composta pelos cientistas, professores, especialistas, políticos, autores de livros e demais agentes envolvidos no processo educativo. O resultado do trabalho seletivo influenciará os objetivos e os métodos que conduzem a prática de ensino, além de estruturarem os valores promovidos no contexto escolar. Costuma-se nomear os agentes da noosfera como didatas (PAIS, 2008).

Os professores e cientistas envolvidos no processo da TD devem conhecer todos os elementos do mesmo. Segundo Chevallard (2005) cabe à noosfera a função de fazer a seleção dos conteúdos estabelecendo a ponte entre o sistema de ensino e o ambiente que a rodeia e, neste caso, os docentes que atuam nas salas de aula poderiam contribuir na

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escolha dos conteúdos, pois são eles quem farão a ponte entre o saber a ser ensinado e o saber ensinado.

É nesse âmbito da noosfera que a transposição didática traduzirá a resposta do desequilíbrio entre os saberes, criados e comprovados pelos cientistas, pais e professores. Logo, a noosfera produz e resolve todo conflito do sistema escolar, tentando diminuir ou eliminar os problemas que chegariam aos professores. No entanto, a noosfera, apesar de ter o seu lugar privilegiado de expressões, deve manter dentro de limites aceitáveis a autonomia do funcionamento didático promovido pela escola (CHEVALLARD, 2005).

1.1.2 Vigilância e ruptura epistemológica

A TD está atrelada à vigilância epistemológica. A sua conceituação não é complexa. Quando há uma indagação sobre a natureza de determinado objeto do saber no intuito de averiguar como se concebe tal objeto e qual a relação entre a construção deste objeto e sua abordagem didática, dizemos que o professor está sendo vigilante epistemologicamente. Neste sentido, os didatas verão

[...] a identidade do fim (o objeto designado como ensinável) e dos meios (o objeto de ensino, tal como foi moldado pela transposição didática) e proporá a questão da adequação: Será que houve por acaso uma conversão do objeto? Neste caso, qual? (CHEVALLARD, 2005, p.49, grifo do autor, tradução nossa)5.

No entanto, ser vigilante epistemologicamente não é apenas conhecer a natureza do objeto do saber do qual o objeto de ensino se origina. É necessário um aprofundamento e conhecimento maior sobre os objetos de ensino e ter uma ampla ideia da construção dos saberes dos quais o professor irão tratar. Chevallard descreve que “o princípio de vigilância na transposição didática é uma das condições que determinam a possibilidade de uma análise científica do sistema didático” (CHEVALLARD, 2005, p.51, grifo do autor).

Pode-se dizer que a vigilância epistemológica busca conhecer a trajetória de um saber, as transformações sofridas por ele até se tornar saber escolar sistematizado pelos

5 [...] la identidad del fin (el objeto designado como enseñable) y de los medios (el objeto de la enseñanza, tal como lo ha moldeado l transposición didáctica), el didacta plantea la cuestión de la adecuación: ¿no hay acaso conversión de objeto? Y en ese caso, ¿cuál? (CHEVALLARD, 2005, p.49, grifo do autor).

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professores em sala de aula. A ruptura epistemológica ocorreria no momento em que eles refletissem sobre a conversão do objeto do saber a objeto de ensino. Nesta perspectiva, a ruptura significa não compreender os objetos de ensino como são apresentados, mas testando-os. Isso ocorre quando o docente duvida sobre a natureza epistemológica dos objetos de ensino o qual se propõem a ensinar.

A TD intervém na epistemologia do conhecimento, possibilitando a passagem do saber sábio ao saber ensinado. O saber escolar está na escola porque algo o trouxe até ali. Discutir de que forma tal saber chegou até a escola é o ponto de partida para os docentes analisarem a TD ocorrida com os objetos de ensino.

1.1.3 Cronogênese e topogênese

No sistema de ensino os diferentes lugares que ocupam o professor e aluno são importantes para a compreensão dos movimentos transpositivos. Tais lugares são determinados pela cronogênese e pela topogênese.

Para compreendermos do que se trata a cronogênese é necessário definir o que são os tempos didático e burocrático. Recorremos a Chevallard (2005) para definir o tempo didático como o tempo no qual ocorrem as ações de ensinar e aprender, tendo como principal consequência a aprendizagem. O tempo didático burocrático é o tempo estabelecido pelas diretrizes escolares a fim de que o cronograma de ensino seja cumprido.

Neste ponto, professor e aluno se distinguem quanto a esses tempos.

Cronologicamente, quem programa o tempo do saber, no sentido de demarcar o tempo de ensino, é o professor. Ele acelera ou retarda o tempo dedicado ao ensinamento de determinado conteúdo. Sobre isso, Chevallard descreve que “[...] o professor se distingue do aluno enquanto ao eixo temporal da relação didática, porque é capaz de antecipar: o aluno pode dominar perfeitamente o passado- admitamos, ao menos por um instante- mas só o professor pode dominar o futuro” (CHEVALLARD, 2005, p.85).

Porém, por mais que tenha essa função de programar o tempo de ensino, o professor não é capaz de investigar se todo o conteúdo ministrado foi aprendido no exato momento que fora ensinado. Para isso, seria necessário um instrumento de verificação de aprendizagem. A cronogênese coloca discente e docente em patamares distintos, sendo o professor aquele que detém melhor o domínio do saber. No entanto, por mais que aluno e professor se igualem nessa relação é somente o professor quem

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domina o que os discentes irão aprender futuramente, mantendo o domínio do tempo didático.

Em relação a construção do saber, a topogênese determina em quais posições aluno e professor encontram-se nessa relação. O professor é quem programa as etapas da construção do saber sendo o programador. Ele elabora a sequência de passos, iniciando por elementos básicos e insere o conteúdo que quer ensinar acrescentando, aos poucos, novos elementos que serão essenciais para avançar em uma nova etapa. O aluno não consegue ordenar as etapas da construção do conhecimento sozinho, pois são necessários outros saberes além do científico cabendo ao professor essa função.

1.1.4 Obsolência externa e obsolência interna

Os saberes escolares na concepção da didática, assim como outras formas de saberes, vão envelhecendo conforme o modelo de sociedade vigente. Esse envelhecimento obriga os saberes a se apresentarem sob uma nova forma, uma nova

“roupagem”. Sobre isso Chevallard descreve que

[...] os objetos de ensino são vítimas do tempo didático, estão sumbetidos a uma erosão e a um desgaste “moral”, que pressupoem sua renovação no curso de um ciclo de estudo. Podemos dar o nome de obsolência interna ou relativa a esse fenômeno de desgaste dentro de um ciclo de ensino, para opor-se a obsolência externa ou absoluta, relativa à sociedade em geral (CHEVALLARD, 2005, p. 79, grifo do autor, tradução nossa)6.

A obsolência externa só ocorre se a distância que separa professor e aluno em relação ao domínio de um saber em questão diminui ou se anula. Essa aproximação é decorrente do envelhecimento de um saber escolar em relação a sociedade, sendo, portanto, histórico e cultural. Se aluno e professor dominam de igual modo o saber, esse torna-se obsoleto e deverá ser retirado dos programas escolares, uma vez que já não é necessário ir à escola para aprendê-lo.

Já a obsolência interna refere-se ao envelheciemnto dos saberes escolares em relação a um ciclo de ensino. Se o objeto de ensino em questão tornou-se obsoleto o seu funcinamento didático termina. Chevallard ironiza ao dizer que quando um saber

6 [...] los objetos de enseñanza son víctimas del tiempo didáctico, están sometidos a una erosión y a un desgaste “morales”, que presuponen su renovación en el curso de un ciclo de estudio.

Podemos dar elnombre de obsolescencia interna o relativa a ese fenómeno de desgaste dentro de un ciclo de enseñanza, para oponerlo a la obsolescencia externa o absoluta, relativa a la sociedad en general. (CHEVALLARD, 2005, p.79, grifo do autor).

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torna-se obsoleto qualquer pai poderia ensiná-lo, subsitituindo o professor em sua função de ensinar, se não fosse por questão de tempo material disponível.

1.1.5 Envelhecimento biológico e moral do saber

Qualquer texto seja este acadêmico, literário, histórico ou jornalístico passa por um processo de envelhecimento, no sentido de ter informações ultrapassadas para a época que está sendo reportado. De igual modo a linguagem do texto pode não ser mais compatível com o novo público alvo.

Portanto, a TD tem por finalidade fazer com que o saber sábio chegue até a sala de aula numa linguagem compatível e condizente à geração que o estuda. A noosfera tem papel fundamental nessa chegada, pois ela averigua a compatibilidade entre a linguagem dos textos e as exigências da sociedade vigente.

Se determinado saber tornou-se obsoleto, de modo que qualquer pai possa ensiná-lo, a comunidade recicla esse saber afim de fazer com que os pais não possam mais ensiná-lo. Essa ação da TD só é possível devido ao envelhecimento biológico e o envelhecimento moral.

O envelhecimento biológico trata das definições, conceituações e conjecturas explicitadas de forma científica, por uma comunidade científica que com uma mudança de paradigma torna-se obsoleto. O envelhecimento biológico pode ser entendido como uma ruptura, a descoberta de novas evidências, fatos empíricos que abalam uma comunidade científica em um determinado momento e que fazem os saberes serem reformulados. Hipótese refutadas favorecem o envelhecimento biológico (CHEVALLARD, 2005).

O envelhecimento moral é definido como um desgaste natural do saber ensinado quando o desgate ocorre em relação às exigências da sociedade, pois os objetos de ensino são vítimas do tempo didático, sendo submetidos a erosão e desgaste moral. Dizemos que um objeto de saber a ensinar possui uma vida útil temporária podendo, inclusive, ser descartado. Já o saber sábio é uma proposição humana e uma vez aceita e universalizada passa a pertencer a cultura humana.

A noosfera determina quais os conteúdos sofreram uma transposição e a partir do momento que um determinado objeto de ensino não apresentar mais significado no espaço escolar, banalizando-se no contexto sócio-cultural, deixa de ser objeto de ensino e, portanto, é descartado.

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Para que o objeto de ensino que sofreu desgaste moral ou biológico seja convertido novamente a saber sábio é necessário aprimorar a diálética antigo/novo inerente a qualquer texto do saber.

1.1.6 Dialética Antigo/novo

Toda vez que o professor inicia um novo conteúdo a dialética antigo/novo se faz presente, desde o momento que busca os conhecimentos prévios dos alunos até quando apresenta novos problemas a eles. A partir de então os alunos deverão encontrar estratégias para solucionar os novos desafios, pois novos conceitos serão introduzidos.

Para que um objeto de saber possa integrar-se a um objeto de ensino, nesse processo, a sua introdução deve ocorrer como um objeto de duas caras, antigo/novo, num determinado momento da duração didática. Para isso, o objeto de saber deve produzir uma abertura nas fronteiras do universo dos conhecimentos já explorados.

Num segundo momento, o novo saber já tornou-se antigo e assim a dialética antigo/novo entre os saberes continua. Mas é necessário que o saber novo, que tornou-se antigo, continue aparecendo no decorrer do ensino possibilitando a identificação do aluno com o universo formado de antigos saberes (CHEVALLARD, 2005).

Nesta perspectiva, o professor traz para a sala de aula novos saberes e ao mesmo tempo insere saberes antigos já dominados pelos discentes. O saber novo envelhece com elementos antigos e o professor incita os alunos a pensar em algo ainda desconhecido.

Essa dialética antigo/novo que legitima o lugar do professor como dominador do tempo didático burocrático. Somente o professor pode conduzir essa dialética e somente ele determina qual saber se tornará antigo e qual se apresentará como novo.

1.2 A Didática das Ciências e a Transposição Didática

Embora o termo TD perpasse as mais diversas áreas do conhecimento é no campo da didática da Matemática que se encontram as raízes dessa teoria. A didática da Matemática é uma tendência de uma grande área da educação e ensino da Matemática.

Seu objeto de estudo é a elaboração de conceitos e teorias que sejam compatíveis com a especificidade educacional do saber escolar matemático, procurando manter fortes

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