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Artigo. Colapso estrutural: ruptura brusca de pilar

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Colapso estrutural: ruptura brusca de pilar

Edição 172 - Julho/2011

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A indústria da construção civil participa com aproximadamente 10% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional e gera um grande número de empregos. A engenharia civil brasileira está entre as melhores do mundo.

Participa de importantes obras em outros países, além de contribuir para o desenvolvimento de novas técnicas e novos materiais.

A cultura da engenharia civil no Brasil, característica de um País jovem, valoriza muito a construção de novas estruturas, mas se esquece da necessidade de manter e reabilitar as estruturas existentes. Caso a Copa de 2014 não fosse realizada no Brasil, quando se destinariam tantos recursos, como hoje, para a recuperação dos estádios de futebol e outras estruturas de concreto armado de grande porte?

A cidade de Belo Horizonte foi pioneira ao criar uma lei específica de vistoria de estruturas. O decreto 9.005, de 26 de novembro de 1996, regulamentou a lei no 4.695, de 22 de abril de 1987, que institui a

obrigatoriedade de Laudo Técnico de Condições de Segurança para Edificações e Estruturas. No Capítulo I, Disposições Gerais, artigo 1o, a lei estabelece o seguinte: "Os prédios comerciais acima de dez pavimentos, as lojas de departamentos, os magazines, supermercados com área superior a 1.000 m2, hotéis, motéis, grandes depósitos públicos, obras de arte correntes e especiais, tais como pontes, viadutos, túneis, galerias subterrâneas e similares, e todos os tipos de edificações cuja classe de ocupação esteja relacionada na Tarifa de Seguro Incêndio do Brasil, com mais de dez anos de construção, e os estabelecimentos de diversão, ficam obrigados a elaborar Laudo Técnico anual descritivo de suas condições de estabilidade e segurança".

Rodrigo Moysés Costa

Engenheiro civil, doutor em Engenharia de Estruturas, coordenador do Curso de Engenharia Civil da Universidade de Itaúna e diretor técnico do Ibracon em Minas Gerais - Regional Belo Horizonte rodrigo@moyses.com.br

Ubirajara Alvim Camargos

Engenheiro civil, especialista em Estruturas Membro da Abece e diretor geral do Ibracon em Minas Gerais - Regional Belo Horizonteuac.bh@terra.com.br

Em Belo Horizonte, como ocorre em outras grandes cidades do Brasil, vêm ocorrendo dois fenômenos: o colapso de estruturas e a degradação acelerada de construções. O primeiro, muito mais sério, é resultado da negligência dos riscos, quando eles se apresentam, e da descrença do construtor e do usuário que isso venha a

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acontecer em sua obra ou moradia. Devido às vantagens econômicas, verifica-se no momento um boom de construção de edificações de alvenaria estrutural.

Apesar da tecnologia amplamente disseminada, infelizmente algumas construções não são projetadas com os critérios técnicos adequados, principalmente no que se refere ao

"colapso progressivo". A previsão desse aspecto de projeto é fundamental, como sabemos, para que não ocorram

desabamentos como aqueles verificados durante o recente terremoto do Haiti, onde muitas edificações ruíram quase da mesma forma.

O segundo fenômeno - a degradação acelerada - também é muito preocupante e nos leva a perguntar: por que estruturas recentes já apresentam anomalias tão graves? Nesse ponto surgem importantes variáveis que podem nos ajudar a entender essa cultura: crescimento do volume de obras devido ao aquecimento da economia; globalização dos serviços de Engenharia; mecanização e industrialização

visando a redução de mão de obra; medidas de racionalização de materiais; e, finalmente, a perigosa

"teorização" da atividade de Engenharia em detrimento da vivência profissional e da "prática de canteiro".

Figura 2 - Locação dos pilares da obra

Um colapso recente e suas causas

Em janeiro de 2008, na cidade de Belo Horizonte, um edifício residencial de aproximadamente 25 anos, com três pavimentos, sofreu um repentino colapso de pilar, sem aviso, gerando um estrondo forte e intensa vibração.

Os trabalhos de investigação mostraram se tratar de um edifício com estrutura mista, em concreto armado no Figura 1 - Colocação dos blocos

cerâmicos utilizados como alvenaria

estrutural

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térreo e alvenaria estrutural com blocos cerâmicos a partir do primeiro pavimento.

A despeito do uso do bloco cerâmico, trata-se de tipologia bastante comum, com estrutura inferior servindo de transição para os demais pavimentos. Porém, outra característica comum foi revelada na investigação:

assim como faziam diversos construtores na época, este edifício também fora construído com blocos de alvenaria assentados indevidamente na horizontal (figura 1), comprometendo assim sua capacidade de resistência.

A figura 2 mostra o posicionamento dos pilares do prédio, para melhor entendimento. As figuras 3a e 3b mostram o pilar rompido, o pilar P6.

Figuras 3a e 3b - Pilar rompido - P6

Como primeira medida, a Defesa Civil evacuou e interditou o prédio. Em seguida, solicitou medidas

imediatas de reforço para se restabelecer as condições de segurança do prédio. A edificação poderia ruir sobre prédios vizinhos. Os pilares P5, P6 e P7 foram envolvidos com dormentes de madeira intercalados, técnica conhecida como "fogueira". Escoramentos metálicos também foram posicionados abaixo da primeira laje, nos alinhamentos entre pilares, conforme as figuras 4a e 4b.

Em um segundo momento, peritos realizaram a inspeção de todo o prédio para avaliarem a extensão dos danos nas estruturas e na alvenaria estrutural. Nos primeiros 75 cm do pilar P6 (contados a partir do bloco de fundação) foram verificadas condições intrigantes. Praticamente todos os estribos se encontravam em avançado estado de deterioração corrosiva, e algumas barras longitudinais, sem contraventamento. Foram verificados, ainda, nichos e brocas na massa do concreto e evidências que caracterizavam desidratação do concreto, conforme mostra a figura 5.

Após a estimativa das cargas atuantes (permanentes e acidentais), peritos realizaram um ensaio de ultrassonografia dos pilares P1 a P10, com transdutores de 54 kHz de

frequência. O método utilizado foi o direto, dispondo-se os transdutores em duas faces opostas do pilar. As leituras foram feitas nos terços superiores e médios dos pilares, para

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se verificar a possibilidade de variações significativas entre trechos de concreto do mesmo pilar. Os resultados indicaram que os concretos dos pilares P1 e P10 apresentaram boa qualidade; os pilares P2, P3, P4, P5, P7, P8 e P9, qualidade duvidosa; e o pilar P6, baixa qualidade, como era de se esperar, conforme mostra a tabela 1.

Os resultados referentes à qualidade do concreto são analisados em conjunto com os dados fornecidos por Neville (1981), conforme a tabela 2.

Após o levantamento dos resultados, os terços inferiores de todos os pilares foram escarificados até se obter a visualização completa das armaduras longitudinais e transversais. Deficiências acentuadas de adensamento do concreto e corrosão de armaduras foram verificadas nos pilares P2 e P7, como mostram as figura 6a e 6b.

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A partir da observação do modo de ruptura do pilar P6, das condições de corrosão de suas armaduras

longitudinais e transversais, das cargas instaladas nos pilares, dos resultados do ensaio de ultrassonografia elaborado nos pilares, pode-se afirmar que a ruptura ocorreu por insuficiência de capacidade resistente.

Simplificadamente, a capacidade resistente de um pilar é a soma da capacidade resistente do concreto e do aço, diretamente proporcional às suas resistências à compressão.

A capacidade resistente das barras de aço está relacionada diretamente ao espaçamento entre seus estribos, que contraventam às barras longitudinais para garantir-lhes esbeltez adequada. A corrosão observada nos quatro primeiros estribos, com seu rompimento total, fez com que as barras longitudinais do pilar P6 ficassem com "espaçamento" entre estribos de aproximadamente 75 cm.

Considerando o grande "espaçamento entre os estribos"

do pilar P6 e adotando-se os conceitos apresentados no item 5.3.2 da NBR 8800:2008 (Projeto de Estruturas de Aço e de Estruturas Mistas de Concreto e Aço de Edifícios), sobre "Força axial resistente de cálculo, de uma barra, associada aos estados limites últimos de instabilidade por flexão, torção ou flexotorção e de flambagem local", foram elaborados diagramas relacionando à tensão em serviço de uma barra de aço de 12,5 mm (CA-50) em relação ao espaçamento de seus estribos, de forma a avaliar o quinhão de cargas a ser suportado por essas armaduras, e consequentemente a parcela a ser suportada pelo concreto do pilar (figuras 7 e 8).

Considerando uma barra longitudinal de um pilar contraventada por seus estribos, não é possível afirmar as reais condições de contorno deste "nó" - se o trecho da barra do pilar é engastado ou simplesmente rotulado.

É difícil determinar se o comprimento dos trechos de barras longitudinais de um pilar, entre dois estribos, caracteriza-a como barra rotulada ou engastada, pois se verificam diferenças significativas de capacidade resistente entre essas duas condições de contorno.

Observou-se, no pilar P6, que os primeiros quatro estribos estavam rompidos devido à oxidação, e o espaçamento entre o primeiro estribo remanescente e a fundação era de aproximadamente 75 cm. Considerando os diagramas acima, pode-se estimar que as referidas barras suportavam apenas tensões entre 6,4% (barra apoiada) e 10,6% (barra

Figuras 4a 4b - Escoramento da

edificação

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engastada), transferindo o restante das forças de compressão para o concreto, congenitamente deficiente.

Considerando-se as cargas estimadas solicitantes do pilar P6 em 391 kN (cargas

permanentes) e 59 kN (cargas eventuais), a seção transversal bruta do pilar e a pequena contribuição de suas armaduras longitudinais (10 Ø 12,5 mm), pode-se estimar que as tensões solicitantes de compressão no concreto do referido pilar seriam da ordem de 10 MPa.

Figura 5 - Vista aumentada do pilar P6 Figuras 6a e 6b - Pilares P2 e P7

Em Belo Horizonte, na época da construção do prédio, os concretos estruturais utilizados para projetos e obras de edificações eram especificados para atingir resistência à

compressão entre 13,5 MPa e 15 MPa. Atualmente, sabe-se que quando os concretos atingem tensões acima de 60% da carga última, verifica-se a manifestação e propagação de microfissuras, que podem gerar instabilidade na interface matriz-agregado.

O valor para a tensão atuante do concreto foi estimado a partir dos seguintes critérios:

Carga atuante = 391 kN (cargas permanentes) + 59 kN (20% cargas eventuais) = 450 kN

Carga resistente das barras de aço = 12,5 cm² (10 Ø 12,5 mm) x 3,2 kN/ cm² (6,4% sobre 50 kN/cm² - tensão máxima do aço CA-50) = 40 kN

Carga atuante no concreto = 45040 = 410 kN

Tensão média atuante no concreto = 410/(20x20) ~ 1 kN/cm² = 10 MPa.

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Figura 7 - Diagrama considerando "barra apoiada"

Figura 8 - Diagrama considerando "barra engastada"

Considerando que o pilar rompeu com tensão média de 10 MPa, isso equivale a aproximadamente 74% da resistência esperada para o concreto. Segundo a literatura internacional, esse nível de tensão causa instabilidade na zona de transição entre a matriz e o agregado, propagando-se fissuras na própria matriz, o que fragiliza cada vez mais o concreto como elemento estrutural.

Durante a fase de investigação e avaliação, o síndico, pessoa leiga na área de

Engenharia, formulou a seguinte pergunta: "Se o pilar P6 quebrou e o prédio não caiu, esse pilar é necessário?"

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Para responder essa pergunta foi elaborada uma análise linear da estrutura do prédio, considerando seus elementos estruturais - concreto e alvenarias - de forma a estimar, sem maiores refinamentos, as tensões atuantes na estrutura, principalmente nas alvenarias estruturais, como mostra a figura 9.

Podemos verificar, na figura 10, o modo de deformação da estrutura antes do rompimento do pilar P6.

Na figura 11, observa-se que as duas estruturas têm comportamento muito similar - modo e intensidades - justificando a redistribuição das cargas por todos os elementos que compõem o sistema estrutural: lajes, vigas, pilares (concreto armado) e alvenarias estruturais. Na alvenaria estrutural, é possível observar a manifestação de microfissuras

"ajustando-se" as tensões solicitantes até seu equilíbrio final, se houver.

Na época que essa obra foi concebida (década de 1980), o estado da arte desse tipo de construção não contemplava os conhecimentos atuais, assim como as normas e as ferramentas para análise e dimensionamento: as cargas eram somadas nível a nível e simplesmente transmitidas aos pilares, sem maiores preocupações com as alvenarias estruturais.

A tudo isso, associa-se o fato de que o prédio foi construído por um engenheiro

independente, em regime de administração, o que leva a crer, pelas condições verificadas no concreto, que não houve controle tecnológico dos materiais e total falta de critério técnico com o lançamento, adensamento do concreto e talvez até com a dosagem, tendo em vista que em Belo Horizonte, nessa época, muitos encarregados de obra eram os responsáveis pela definição do "traço do concreto". Usualmente, esses profissionais utilizavam a Tabela Caldas Branco, mas não possuíam informações quanto à necessidade do controle do consumo de água na mistura, fundamental para o bom desempenho e durabilidade desse material.

Sendo assim, vale ressaltar que, tão importante quanto ter um bom controle tecnológico do concreto, é fundamental a existência de uma cultura da manutenção periódica das

estruturas de concreto armado, independentemente se suas características visuais

mostrarem plena "saúde", assim como é importante manter controle sistemático quanto às condições de integridade das armaduras que compõem as estruturas, principalmente pilares.

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Figura 9 - Modelo matemático

Clique para ampliar Figura 10 - Estrutura deformada - sem falhas

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Clique para ampliar

Figura 11 - Estrutura deformada com pilar P6 rompido (a) e estrutura

deformada sem pilar P6 (b)

Disponível em http://techne.pini.com.br/engenharia-civil/172/colapso-estrutural-ruptura- brusca-de-pilar-286838-1.aspx. Acesso 17/09/2013

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