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NOME DE ESTABELECIMENTO MARCAS MARCA NOTÓRIA FIRMA INVALIDADE RENÚNCIA SOCIEDADE ESTRANGEIRA

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Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 07B2944

Relator: MARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA Sessão: 10 Julho 2008

Número: SJ200807100029447 Votação: UNANIMIDADE Meio Processual: REVISTA

Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA

PROPRIEDADE INDUSTRIAL REENVIO PREJUDICIAL

LIBERDADE DE ESTABELECIMENTO

CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS REGISTO COMERCIAL

ANULABILIDADE DENOMINAÇÃO SOCIAL

NOME DE ESTABELECIMENTO MARCAS MARCA NOTÓRIA

FIRMA INVALIDADE RENÚNCIA SOCIEDADE ESTRANGEIRA

SUCURSAL

Sumário

1. O disposto nos artigos 43º ( liberdade de estabelecimento) e 28º (proibição de restrições quantitativas à importação, ou de medidas de efeito equivalente, no âmbito da livre circulação de mercadorias) do Tratado CE é aplicável em matéria de propriedade industrial.

2. Cessa a obrigação de envio de um processo ao Tribunal de Justiça para conhecimento, a título prejudicial, de uma eventual contrariedade de normas de direito interno relativamente a normas do Tratado CE, prevista no

respectivo artigo 234º, quando já foi decidida por aquele Tribunal, a título prejudicial e num caso análogo, uma questão materialmente idêntica à que se coloca ao Supremo Tribunal de Justiça;

3. No caso, verifica-se essa não obrigatoriedade, uma vez que foi julgado, no acórdão de 11 de Maio de 1999, relativo ao caso Pfeiffer Grosshandel GmbH/

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Löwa Warenhandel GmbH, análogo ao presente, que tais preceitos (então artigos 30º e 42º do Tratado) “não se opõem a uma disposição de direito

nacional que proíbe, com fundamento em risco de confusão, a utilização de um nome comercial como designação específica de uma empresa”.

4. Não viola o disposto nos artigos 43º e 28º do tratado CE a impossibilidade, resultante da lei portuguesa, de uma sucursal em Portugal de uma sociedade de outro Estado membro utilizar a denominação social desta sociedade, devida à prioridade de registo, em Portugal, da denominação social e nome de

estabelecimento de outras sociedades;

5. Tal regime assenta na prioridade de registo e vale da mesma forma para sociedades portuguesas e para sociedades nacionais de outro Estado membro, não implicando qualquer discriminação contra esta última;

6. Para que o nome comercial de uma sociedade seja protegido, nos termos do artigo 8º da Convenção da União de Paris, em todos os Estados da união, é necessário que seja protegido no país de origem e que seja efectivamente usado no país de importação;

7. Para poder beneficiar da protecção concedida às marcas notórias pelo artigo 190º do Código da Propriedade industrial, é necessária notoriedade em Portugal;

8. Não pode invocar-se o artigo 34º do Regulamento (CE) nº 40/94 do

Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, para beneficiar, relativamente à marca comunitária e para efeitos do disposto no nº 2 do mesmo artigo, quando se não é titular de marca anteriormente registada em Portugal;

9. É sanável a anulabilidade da firma ou do registo de denominação de estabelecimento, prevista nos artigos 5º, nº 4, 244º e 33º do Código da

Propriedade Industrial, nomeadamente pelo decurso do prazo de propositura da correspondente acção de anulação;

10. Ocorrendo a extinção, por renúncia, aliás expressamente prevista no artigo 38º do Código de Propriedade Industrial, do direito cuja preterição justificava a invalidade do direito de propriedade industrial que estiver em causa, cessou o motivo que provocava a invalidade;

11. De qualquer modo, o artigo 8º da Convenção da União de Paris, verificados os respectivos requisitos, protege o nome comercial de uma sociedade,

independentemente de registo no Estado no qual se pretende a protecção;

12. Assim, o titular de uma firma, protegida no Estado de origem, pode utilizá- la num Estado ainda que não seja possível registá-la, por existirem direitos de propriedade industrial de outros titulares que impedem o registo.

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Texto Integral

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça:

1. Em 20 de Maio de 1999, Empresa-A, Lda., com sede na Av. Dr. Antunes Guimarães, ..., sala ..., Porto, e Empresa-B, Lda., com sede na R. Dr. Joaquim A. Pires de Lima, ..., Santo Tirso, propuseram no Tribunal Cível de Lisboa contra Empresa-C, SA, sociedade de direito espanhol com sede em Barcelona e sucursal em Portugal, na Av. da República, edifício República, ...., Lisboa, uma acção ordinária na qual pediram que fosse declarado nulo ou, pelo

menos, anulado, o registo da marca internacional mista da ré, nº 483.246, “...”

e que a ré fosse condenada a abster-se de utilizar a expressão “...” como marca e, em geral, de praticar quaisquer actos que pudessem provocar confusão entre os seus produtos e serviços e os das autoras.

Para o efeito, alegaram que a ré desenvolve actividade em Portugal através da referida sucursal; que a 1ª autora é uma sociedade comercial registada em 6 de Setembro de 1990 com a denominação de “Empresa-A, Lda.”, na

Conservatória do Registo Comercial do Porto, sob o nº 48.259 e que é titular, desde a sua constituição (em 14 de Novembro de 1989) da firma referida; que a 2ª autora é titular do nome de estabelecimento “...”, que utiliza para

designar o seu estabelecimento (pedido em 4 de Setembro de 1987, concedido em 24 de Abril de 1990 e publicado no BPI nº 4 de 1990); que a ré é titular do registo da marca internacional mista “...” nº 483.246, cuja extensão a Portugal foi pedida em 14 de Fevereiro de 1997 (com publicação a 27 de Março de 1997), tendo a ré renunciado a 13 do mesmo mês de Fevereiro, para evitar a respectiva caducidade, por não uso, nos termos do artigo 216º do Código da Propriedade Industrial de 1995, à anterior extensão, de 8 de Março de 1985, assim perdendo os direitos resultantes da anterioridade correspondente; que a extensão de 1997 viola os direitos das autoras, com registos anteriores, pela confusão que se estabelece entre a marca da ré, por um lado, e a denominação da 1ª autora e o nome do estabelecimento da 2ª autora, por outro, sendo certo que os produtos e serviços fornecidos por todos são “completamente

coincidentes”.

Contestando, a 28 de Setembro de 1999, a ré alegou tratar-se de uma sociedade comercial constituída em 1955, com 135 títulos de registo de propriedade industrial entre os quais se encontra a marca internacional “...”, registada em 12 de Março de 1984 e em vigor em Portugal desde 8 de Março de 1985 (sendo esta extensão a Portugal que as autoras põem em causa); que

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acabava de lhe ter sido deferido o pedido de concessão da marca comunitária

“...”; que um dos seus mais antigos estabelecimentos, denominado “...” e no qual sempre usou diversas marcas contendo a expressão “...”, desde 1971, é o de Vigo, através do qual estabeleceu relações com milhares de clientes

(incluindo fabricantes e comerciantes de artigos de óptica) portugueses e se tornou conhecida em todo o norte do país, sendo portanto falso o alegado “não uso” da marca em Portugal, já que a mesma é utilizada ininterruptamente desde 1985; que igualmente vem sendo usada em diversos países do espaço económico europeu; que é, portanto, uma “marca notória no ramo dos

produtores e comerciantes de artigos ópticos”, no sentido do artigo 190º do Código da Propriedade Industrial e “de grande prestígio”, para os efeitos do artigo 191º do mesmo Código.

Assim, os direitos de propriedade industrial das autoras é que seriam

inválidos, “por violarem os prévios direitos registrais da R. e o facto de a sua marca ser (…) uma marca notória e de grande prestígio”; a sua utilização pelas autoras traduzir-se-ia numa prática que se podia considerar como de concorrência desleal; que a firma da 1ª autora se confundia com o nome do estabelecimento da 2ª; que as autoras se conluiaram para a prejudicar, desenvolvendo uma prática proibida porque lesiva da concorrência, nos termos do artigo 2º do Decreto-Lei nº 371/93, de 29 de Outubro; e que, ao apresentarem-se em litisconsórcio nesta acção, o faziam em abuso de direito, o que provocava a respectiva ilegitimidade.

Em reconvenção, requereu a anulação da firma social da 1ª autora e do nome de estabelecimento da 2ª, “porque posteriores e idênticos aos títulos de

propriedade industrial da R.”; pediu, consequentemente, que as autoras, de cuja existência apenas tomou conhecimento quando foi citada para a presente acção, fossem condenadas a abster-se de os utilizar e a pagar-lhe uma

indemnização por danos sofridos, a liquidar em execução de sentença.

Em 22 de Outubro de 1999, a ré pediu a apensação a este processo da acção pendente na 2ª Secção da 17ª Vara Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, na qual as mesmas autoras pediram a declaração de nulidade ou a anulação da sua denominação social, a sua condenação a alterá-la e a abster- se de utilizar o termo “...”, juntamente ou não com o termo “...”, em qualquer actividade comercial que desenvolvesse.

As autoras replicaram, mantendo que a renúncia impedia a ré de invocar qualquer prioridade decorrente do registo da marca internacional,

sustentando que a concessão da marca comunitária referida pela ré não tinha qualquer influência na presente acção e contestando a alegação de uso, de notoriedade ou de grande prestígio da marca da ré; rejeitaram a acusação de concorrência desleal e opuseram que, de todo o modo, teria prescrito a

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possibilidade de a invocar; e negaram que estivessem a exercer abusivamente qualquer direito.

Sustentaram ainda a improcedência da reconvenção e, a fls. 293, opuseram-se à apensação requerida.

A ré treplicou, refutando, segundo explica, as excepções opostas pela autora ao pedido reconvencional.

O pedido de apensação foi deferido, a fls. 327.

A acção prosseguiu os seus termos. A fls. 1313 foi julgada a matéria de facto e, a fls. 1340, foi proferida sentença, julgando a acção procedente, nestes

termos:

“Pelo exposto, julgo a acção procedente e em consequência:

– anulo a extensão de registo de marca internacional mista ..., n.º 483 246;

– anulo o registo da denominação social da sucursal da ré, Empresa-C, S. A.;

– condeno a ré a abster-se de usar, por qualquer forma ou meio, as citadas expressões na qualidade de marca ou firma;

–Faculta-se à ré o prazo de 120 dias, após trânsito da presente decisão, para alterar as designações de marca e firma ora anuladas;

Mais julgo improcedente a instância reconvencional, e absolvo as autoras dos pedidos formulados.”

2. Por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de fls. 2042, foi confirmada a sentença, sendo negado provimento, quer ao recurso principal, interposto pela ré, quer ao recurso subordinado, interposto pelas autoras (quanto a estas, questionando apenas que os 120 dias concedidos à ré para “alterar as designações de marca e firma ora anuladas” se contassem do trânsito em julgado da sentença e não da data em que foi proferida).

Assim, e em primeiro lugar, a Relação manteve a decisão da 1ª Instância relativamente à matéria de facto, não obstante ter sido parcialmente impugnada pela Ré.

A matéria de facto definitivamente assente nesta causa é, portanto, como se transcreve:

“ 1. A ré tem em Portugal uma sucursal sita na Av. da República, Lisboa.

2. A autora Empresa-A é uma sociedade comercial por quotas, registada a 6 de Setembro de 1990, sob a denominação de Empresa-A, Lda., na Conservatória de Registo Comercial do Porto, sob o n.º 48 259.

3. A 1ª autora requereu, em 1989, a admissibilidade de uma firma que

integrou, sem alterações, a expressão ... e foi registada sob essa firma a 6 de Setembro de 1990.

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4. A 2ª autora pediu o registo de direitos de uso exclusivo do nome de

estabelecimento ... em Setembro de 1987, pedido que lhe foi deferido a 24 de Abril de 1990.

5. A ré é titular do registo de marca internacional mista ..., n.º 483 246, que assinala na classe 9ª, entre outros, aparelhos, instrumentos e artigos ópticos e na classe 35ª, a promoção e publicidade de produtos da área de óptica,

fabricados e vendidos pelo titular.

6. Tendo sido pedida a extensão a Portugal em 14 de Fevereiro de 1997, com publicidade a 27 de Março de 1997.

7. A 8 de Março de 1985 foi concedida uma primeira extensão a Portugal da referida marca internacional.

8. As autoras dedicam-se à comercialização de artigos de óptica.

9. O nome de estabelecimento da autora Empresa-B, Lda. é composto única e exclusivamente pela expressão ..., que apenas difere da marca ora impugnada, na sua redacção escrita, ao formar uma só palavra.

10. As expressões ... e ... têm os mesmos caracteres e pronunciam-se de forma idêntica.

11. A actividade exercida pela ré é afim e conexa da exercida pelas autoras, bem como os seus sinais distintivos e objectos sociais respectivos.

12. A ré tem actualmente pelo menos dois estabelecimentos comerciais ostentando a denominação ... em diferentes pontos do país, concretamente, Aveiro, nas Galerias Forum, loja ..., Rua Homem de Cristo e Matosinhos, no Centro Comercial NorteShopping, loja ..., Rua Sara Afonso, n.º ...-... Srª da Hora.

13. A 1ª autora usa a sua firma desde 14 de Maio de 1989.

14. A autora Empresa-B, Lda. é titular do nome de estabelecimento ..., que usa para designar o seu estabelecimento.

15. A ré renunciou à extensão referida no n.º 6, a 13 de Fevereiro de 1997.

16. A denominação social da primeira autora é Empresa-A, Lda., sendo que no giro comercial diário o que se destaca é apenas a expressão ....

17. A ré é uma sociedade comercial sedeada em Barcelona, Espanha,

constituída em 23 de Dezembro de 1958, e desde então dedicada à prestação de serviços e comercialização de produtos ópticos.

18. A ré tem 135 títulos de registo de propriedade industrial que abrangem múltiplos produtos e serviços, entre os quais a sua firma social, o seu nome de estabelecimento e a sua marca, que ou integram a expressão ... ou têm por único objecto a expressão linguística e figurativa ....

19. A 17 de Setembro de 1964, a Oficina Espanhola de Patentes e Marcas deferiu o pedido de registo da ré do nome de estabelecimento ....

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20. Esse nome distinguia o seu estabelecimento, que destina ao fabrico,

compra e venda, importação, exportação, representação e distribuição de toda a espécie de aparelhos, instrumentos e acessórios de óptica.

21. Em Espanha, a protecção dada ao nome de estabelecimento das

sociedades comerciais não goza de protecção em todo o território nacional, pelo que o registo do nome de estabelecimento começou por vigorar em Barcelona, Baracaldo, Bilbao, Corunha, Gijon, Manresa, Oviedo, Sama de Langreo, San Sebastian e Vigo e hoje em mais 90 cidades espanholas, incluindo as capitais de província.

22. Os direitos de marca da expressão ... remontam a 19 de Setembro de 1970, data do registo, com o n.º 624552, da marca ...-G, pela qual se protegia o uso da referida expressão relativamente a serviços e realizações de

propaganda e publicidade relativas aos produtos do ramo óptico.

23. A ré registou, a 10 de Maio de 1971 e 19 de Junho de 1971, as marcas internacionais G-... e Gop ... sob os nºs 377915 e 379264, vigorando os direitos da ré de uso exclusivo das mesmas em Espanha, Áustria, Benelux, Suíça,

França, Itália, Lieschenstein e Jugoslávia.

24. Foi deferido o pedido apresentado pela ré no sentido de lhe ser concedida a marca comunitária ..., nos termos do documento a fls. 551 a 558, cujo teor se dá aqui por reproduzido.

25. Há décadas que, dentro e fora de Espanha, a expressão ... é a

denominação social, o nome de estabelecimento e a marca usada pela ré no exercício da sua actividade comercial e que esta usa ininterruptamente desde a década de 60 até à presente data.

26. A marca da ré engloba, não só a expressão ... como a representação e enquadramento gráfico da mesma, conforme consta a fls. 157 (usada até 1997) e a fls. 158 (depois de 1997).

27. A ré, tanto em Espanha como nos demais países, comercializa, de forma autorizada, produtos com a marca de outras empresas.

28. A marca internacional da ré abrange uma vasta quantidade de produtos e serviços produzidos ou vendidos pelo titular, a ré, e ainda publicidade.

29. A ré empresta todo o prestígio da sua história comercial e do seu nome de estabelecimento, bem como a sua implantação internacional à prestação de múltiplos serviços e à distribuição comercial de produtos de outras marcas, pertencentes a outras empresas.

30. As quais, beneficiam, em contrapartida, da possibilidade de colocar os seus produtos em toda a Península Ibérica e no resto da Europa, em lojas de grande prestígio e dimensão, como são as da ré, do uso da marca ... em Portugal por parte da ré.

31. Um dos mais antigos estabelecimentos comerciais da ré, a que

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corresponde um dos mais antigos registos de nome de estabelecimento com a expressão ... de que a ré é titular, é o que se situa em Vigo, na Galiza, aberto ao público no ano de 1964, no qual a ré sempre usou diversas marcas

contendo a expressão ... desde 1971.

32. O estabelecimento comercial que a ré abriu em Vigo em 1964 sempre teve clientes portugueses.

33. A ré manteve, desde 1985, relações comerciais com os fabricantes e

comerciantes de artigos de óptica referidos nos documentos constantes de fls.

159 a 196, cujo teor se dá por reproduzido.

34. A Empresa-C, S. A., enquanto grupo internacional, facturou no ano de 1998, PTE 22.739.000.000, e previa atingir, em 1999, PTE 23.900.000.000.

35. A sucursal portuguesa da ré obteve, em 1999, o resultado líquido de EUR 62.373,21, nos termos constantes dos documentos de fls. 886 e 887, cujo teor se dá por reproduzido.

36. A Empresa-C, S. A. facturou, em Espanha e no ano de 1998, PTE 15.456.000.000, e previa atingir, em 1999, PTE 16.088.000.000.

37. A denominação social da primeira autora foi sujeita às publicações

obrigatórias, no Diário da República e a registo comercial, e o pedido de nome de estabelecimento da segunda autora, bem como a respectiva concessão foram objecto de destacada publicação no Boletim da Propriedade Industrial.

38. A ré opera em Portugal e, enquanto sucursal, tem firma registada, com o aditamento respectivo, desde 13 de Maio de 1998.

39. A primeira autora utiliza a sua firma e a segunda autora o seu nome de estabelecimento, pelo menos, desde as datas referidas nos nºs 3 e 4.”

Em segundo lugar, a Relação entendeu, em síntese, o seguinte:

– Não poder ser atendida a alegação, pela ré, da violação da protecção que o artigo 8º da Convenção da União de Paris confere ao nome comercial (que a Relação considerou englobar, quer o nome do estabelecimento, quer a firma), porque dos factos provados não resulta demonstrado o respectivo uso em Portugal, faltando, portanto, uma das condições exigidas para essa protecção;

– Não poder proceder a alegação de violação do disposto no artigo 190º do Código da Propriedade Industrial, desde logo por não resultar da matéria provada que a marca da ré fosse notoriamente conhecida em Portugal;

– Também não terem sido violados os artigos 14º, 34º e 35º do Regulamento (CE) nº 40/94, do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca

comunitária. Segundo a Relação, “o alcance de tais preceitos dirige-se àquelas situações em que, ao proceder-se ao registo de uma marca comunitária, é reivindicada a antiguidade de uma marca nacional. E, desta forma, aquela beneficiará, no respectivo território de onde a marca nacional é oriunda e está

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protegida, da antiguidade desta última, valendo, para aquela, a data a partir da qual a marca nacional se mostre protegida.

No caso em análise, o que efectivamente se verifica é que a prioridade

registral é, notoriamente, das AA, atenta a factualidade assente (…) e dado do disposto no artº 37º, nº 1, do Código da Propriedade Industrial/95 (…)”. Ou seja,: pela renúncia de 13 de Fevereiro de 1997, “o direito da R. (…) extinguiu [-se], precisamente em 13 de Fevereiro de 1997”.

– Quanto às restantes questões que lhe foram colocadas, a Relação, enumerando-as “(invalidade originária do direito das AA; regime da

anulabilidade e abuso de direito)”, remeteu para os fundamentos da decisão da 1ª Instância.

Transcreve-se, por esta razão, o que a 1ª instância decidiu sobre estes dois pontos:

“Traçado o quadro legal e factual, verifiquemos dos requisitos de

anulabilidade para cada uma das designações, respondendo ao pedido e à reconvenção:

– A marca ..., da ré, é confundível com a firma e designação de

estabelecimento das autoras, representa produtos da mesma espécie, e tem registo posterior, pelo que é anulável;

– A firma Empresa-C, S. A. da ré, é confundível com a firma e a designação de estabelecimento das autoras, designa empresa que comercializa produtos da mesma espécie e tem registo posterior, pelo que, é anulável;

– A firma Empresa-A, Lda., apesar de confundível, beneficia relativamente à ré de prioridade de registo, pelo que não é anulável;

– A designação de estabelecimento ..., apesar de confundível, beneficia relativamente à ré de prioridade de registo, pelo que não é anulável;

Cumpre apenas ressalvar, em resposta ao argumento da ré, de que o direito das autoras estaria ferido de invalidade originária, por à data do respectivo registo, vigorar direito incompatível anterior.

A este propósito, convém sublinhar que a violação do princípio da novidade e originalidade em matéria de propriedade industrial – ou a concessão de tais direitos de terceiros, fundados em prioridade ou outro título legal – é

sancionado pela lei com a anulabilidade – artigo 29º n.º 1 alínea b) do Código de Propriedade Industrial.

Ora, o regime legal da anulabilidade difere da nulidade em três aspectos:

– não opera ipso iure, ou seja, não pode ser declarada oficiosamente, mas necessariamente tem de ser invocada e pedida - na matéria que nos ocupa, veja-se o artigo 34º n.º 2 do Código de Propriedade Industrial e artigo 287º n.º 1 do Código Civil;

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– é invocável somente pelos interessados a quem beneficia – artigo 34º n.º 2 do Código de Propriedade Industrial e 287º n.º 1 do Código Civil;

– é sanável pelo decurso do tempo – artigo 287 n.º 1 do Código Civil;

Destarte, é legítimo concluir que se o mero decurso do tempo sana a invalidade que feriu o direito das autoras, por maioria de razão o sanará a extinção da causa de tal invalidade, concretamente, por renúncia, do direito prioritário incompatível.

Pelo que, nenhuma invalidade, originária ou não, persiste nos direitos que as autoras se arrogam, pelo menos no que à ré respeita.”

Relativamente à alegação de abuso de direito, a sentença considerara que

“ – ao registarem o seu direito, as autoras não adoptaram qualquer

comportamento que permitisse a terceiros confiar que não o defenderiam contra actos ofensivos do mesmo – pelo contrário, o registo assegura a prioridade e publicidade necessárias e instrumentais à tutela do direito perante todos os demais;

– não existe, por parte da autora [ré], uma situação de confiança com origem no registo promovido pelas autoras – tão-só uma prerrogativa de requerer a sua anulabilidade, uma vez que, originariamente, era titular do benefício da prioridade;

– consequentemente, não poderá considerar-se a renúncia da reconvinte ao seu direito como um investimento na confiança – não foi alegada, nem resulta provada, nem é de senso comum uma relação causal entre elas – ao abdicar da sua posição prioritária, a ré só o poderá ter feito no seu próprio interesse; e não é a inércia da ré em promover a anulação dos direitos das autoras – aliás justificável, considerando que a loja em Vigo era a sua única e indirecta ligação ao mercado português – que a autoriza que as autoras responderão com a mesma postura de inércia;

– por último, nenhuma incoerência assiste à postura das autoras, que registam o seu direito por forma a assegurar-lhe publicidade e prioridade, e o defendem contra direitos posteriormente registados e incompatíveis.

A final, duas notas.

Refere a ré, repetidamente, o facto de os direitos das autoras serem entre si incompatíveis.

É um facto que todas as razões de identidade e novidade tecidas a propósito das firmas, marca e designação de estabelecimento em apreço, são válidas para as autoras, uma relativamente à outra. Todavia, nenhuma expectativa da ré é violada por esse facto, ou merece tutela. Só as próprias autoras, no que a interesses particulares fere, poderão, ou não, escolher demandar-se.

Apenas o interesse difuso dos consumidores poderá sair lesado por tal

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duplicação, mas cumpre ao Ministério Público, e não à ré, a sua defesa – artigo 35º nº 2 do Código de Propriedade Industrial.

Destarte, tal circunstância não funda qualquer abuso de direito por parte das autoras.”

3. Novamente recorreu a ré, agora para o Supremo Tribunal de Justiça. O recurso foi recebido como revista, com efeito devolutivo (despacho de fls.

2092).

Nas alegações apresentadas, a recorrente formulou as seguintes conclusões:

«1. O facto de se impedir uma sucursal em Portugal de uma sociedade de outro Estado Membro de utilizar a denominação social de tal sociedade, em virtude da prioridade de registo em Portugal da denominação social e nome de estabelecimento de outras sociedades, constitui uma restrição ilegítima da liberdade de estabelecimento, consagrada no artigo 43º TCE.

2. O facto de se impedir uma sucursal em Portugal de uma sociedade de outro Estado Membro de utilizar a denominação social de tal sociedade, em virtude da prioridade de registo em Portugal da denominação social e nome de

estabelecimento de outras sociedades, constitui uma restrição ilegítima da liberdade de circulação de mercadorias, consagrada no artigo 28º TCE.

3. Em consequência, devem os presentes autos ser submetidos à decisão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 234º do TCE.

4. A prioridade registral da expressão "..." da Recorrente decorre, desde logo, do facto de o seu nome comercial estar protegido desde a década de 60 ao abrigo do artigo 8º da Convenção da União de Paris (CUP), que consagra a protecção do nome comercial em todos os países da União sem obrigação de depósito ou de registo, quer faça ou não parte de uma marca de fábrica ou comércio.

5. É posição unânime na doutrina nacional e estrangeira e na jurisprudência que a expressão "nome comercial", para efeitos do artigo 8.° da CUP, engloba não apenas o nome do estabelecimento comercial, tal como este é entendido em Portugal, mas também o nome sob o qual o comércio é exercido, ou seja, a firma, seja firma-nome, firma-denominação ou firma mista. Deste modo, a expressão "..." de que a Recorrente é titular é abrangida pelo conceito de

"nome comercial" previsto no art. 8° da CUP, quer por integrar a sua firma- denominação, quer por constituir o nome, devidamente registado, dos seus imensos estabelecimentos comerciais situados em Espanha.

6. O artigo 8.° da CUP não prevê requisitos para a sua aplicação, mas ainda que se exija protecção no país de origem, a protecção do nome comercial da Recorrente em Espanha é inequívoca.

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7. Nos termos do artigo 8º da CUP, o nome comercial estrangeiro será

protegido em qualquer país da União, independentemente de ter sido usado ou não no país onde a protecção é reclamada (no caso, em Portugal).

8. De todo o modo, mesmo que se entenda que é necessário que o nome comercial tenha sido utilizado no país onde se reclama a protecção, ainda assim é de concluir que o nome comercial da Recorrente merece protecção em Portugal anterior à que as Recorridas reclamam. Com efeito, ao contrário do que fez o Acórdão Recorrido, na interpretação do artigo 8.° da CUP não é razoável exigir mais do que uma certa notoriedade, no sentido de

conhecimento, uma qualquer "irradiação" ou "projecção", do nome comercial estrangeiro no país onde a protecção está ameaçada, pelo menos, nos círculos interessados (…).

9. Acresce que a prioridade registral da Recorrente sobre a expressão "..."

resulta ainda da notoriedade da sua marca, nos termos do artigo 190º CPI (…).

10. Além disso, a Recorrente tem ainda direito a essa prioridade em função da titularidade da marca comunitária n° 573 592, que aproveitou a antiguidade da marca internacional 483 246, que tinha extensão a Portugal desde 1985 (...)

11. Determinada a prioridade registral da expressão "..." a favor da

Recorrente, são anuláveis os registos que foram concedidos com preterição dos direitos da Recorrente, nomeadamente a firma da 1ª Recorrida e o nome de estabelecimento da 2ª Recorrida.

12. À data da dedução do pedido reconvencional da Recorrente – 27/09/1999

¬ esta tinha legitimidade e estava em tempo para pedir a anulação judicial da firma da 1ª Recorrida (cfr. art. 62° RNPC/ DL 129/98, de 13 de Maio) e do nome de estabelecimento pertencente à 2ª Recorrida.

13. Com efeito, a anulabilidade prevista do artigo 33° CPI de 1995, que mais não configura do que uma nulidade relativa, pode ser pedida a todo o tempo, com excepção do caso específico do artigo 214º em matéria de marcas, que encurta esta possibilidade em nome da estabilidade dos direitos de

propriedade industrial.

14. Mas ainda que houvesse de se aplicar, analogicamente, algum prazo, ele sempre se haveria de encontrar naquele artigo 214° (de acordo com a solução em vigor no CPI actual) e não no regime normal do art. 287° do Código Civil.

Ora, os factos assentes consubstanciam de forma inequívoca a existência de má fé por parte das Recorridas (que procederam aos seus registos quando a Recorrente tinha em Portugal uma marca registada a seu favor e o seu nome comercial era largamente conhecido), razão pela qual sempre a acção de anulação poderia ser interposta a todo o tempo.

15. Invalidados, por esta forma, os direitos decorrentes dos registos das

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Recorridas, estas não têm qualquer direito de prioridade que possam invocar contra a Recorrente, devendo ser julgada procedente a reconvenção e

improcedente a acção.

16. A Recorrente não renunciou ao seu nome comercial, seja sob a forma de firma denominação, seja sob a forma de nome de estabelecimento comercial, nem existe qualquer preclusão por tolerância relativamente aos mesmos, pelo que deve ser considerada titular do direito de exclusivo sobre eles.

17. Sem prescindir, sempre se dirá que, de qualquer forma, uma vez que a anterioridade do nome comercial da Recorrente, para o efeito, não pode ser ignorada, a única consequência de se considerar eventualmente intempestivo o pedido de anulabilidade dos direitos decorrentes dos registos das Recorridas seria a de reconhecer que o nome comercial da Recorrente, embora protegido, não poderia reconduzir-se a um direito de exclusivo (…).

18. De todo o modo, os direitos das Recorridas, por terem sido constituídos de forma ilegal, sofrem de uma invalidade originária, que não é sanável pelo

mero decurso do tempo, ou pela extinção parcial da causa de tal invalidade, ou seja, a renúncia de direito prioritário incompatível (…).

19. Por outro lado, a legitimidade para a arguição da anulabilidade de DPI's cabe ao Ministério Público e a qualquer interessado nos termos do art. 34°, nº2 do CPI de 1995. Por "qualquer interessado" não pode entender-se apenas o titular de um direito de propriedade inscrito e em vigor. Por isso, a

"renúncia" do direito de marca da Recorrente em 1997 não pode ter como efeito a "validação" automática dos registos dos direitos das Recorridas (…).

20. A conduta das Recorridas é manifestamente violadora de um dos

princípios estruturantes do Direito das Obrigações, e do Direito em Geral, o princípio da boa fé em sentido objectivo (para além da manifesta existência de uma atitude subjectiva de má fé), enquanto norma de conduta que

fundamenta, entre outros, o instituto do abuso de direito previsto no art. 334º do Código Civil, na modalidade de conduta anterior indevida (tu quoque) (…).

21. Assim, ainda que fosse de reconhecer às Recorridas qualquer direito sobre a expressão “...” – o que de modo algum se concede – sempre se teria que concluir que o exercício do direito de arguir a anulabilidade da marca da

Recorrente e da firma-denominação das suas sucursais portuguesas ofende de forma clamorosa o princípio da boa fá que estrutura a nossa ordem jurídica, razão pela qual a pretensão das recorridas sempre deveria ser negada, por constituir um ultrajante abuso de direito, nos termos e para os efeitos do artigo 334º do CC.

22. Por tudo o exposto, o Acórdão Recorrido violou os artigos 28º e 43º TCE, 8º da Convenção da União de Paris, 34º, nºs 1 e 2 do Regulamento da Marca Comunitária, 190º Código da Propriedade Industrial de 1995 e 334º do Código

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Civil, pelo que deve ser revogado, devendo a acção ser julgada improcedente e a reconvenção procedente.»

Em contra-alegações, as recorridas vieram, em primeiro lugar, rejeitar que estivessem reunidas as condições que tornam necessário colocar perante o Tribunal de Justiça, a título prejudicial, a questão da alegada violação dos artigos 43º e 28º do Tratado CE; em segundo lugar, sustentar que deve ser negado provimento ao recurso e confirmado o acórdão recorrido.

4. Estão portanto em causa neste recurso as seguintes questões:

1ª – Violação dos artigos 43º e 28º do Tratado CE, por se “impedir uma sucursal em Portugal de uma sociedade de outro Estado Membro [da União Europeia] de utilizar”, em Portugal, “a denominação social de tal sociedade, em virtude da prioridade de registo em Portugal da denominação social e nome de estabelecimento de outras sociedades”;

2ª – “Prioridade registral da expressão ‘...’ da Recorrente”, resultante do artigo 8º da Convenção da União de Paris (CUP), da “notoriedade da sua marca, nos termos do artigo 190º CPI” ou da “titularidade da marca comunitária nº 573 592”;

3ª – Validade ou invalidade dos registos em causa na presente acção e respectivas consequências, quer relativamente à denominação social da sucursal da recorrente, quer quanto à firma da primeira recorrida e ao nome de estabelecimento da segunda;

4ª – Alegação de abuso do direito de arguir a anulabilidade, por parte das recorridas.

5. Antes de tudo cumpre analisar o pedido de envio dos presentes autos ao Tribunal de Justiça das Comunidades, nos termos do disposto no artigo 234º do Tratado CE (anterior artigo 177º).

A recorrente sustenta que este Supremo Tribunal está obrigado a solicitar a pronúncia do Tribunal CE, a título prejudicial, sobre a questão de saber se a impossibilidade, que resultaria da lei portuguesa, de uma sua sucursal utilizar, em Portugal, a sua denominação social (segundo alega, devidamente registada em Espanha em data anterior à dos registos de que as recorridas se querem prevalecer e acrescida da indicação de ser uma sucursal), não contraria o disposto nos artigos 43º (liberdade de estabelecimento) e 28º do Tratado (proibição de restrições quantitativas à importação, ou de medidas de efeito equivalente, no âmbito da livre circulação de mercadorias).

Em seu entender, trata-se de uma questão cujo esclarecimento (prévio) é

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necessário ao julgamento do presente recurso e não ocorre nenhuma das limitações àquela obrigação, nos termos definidos pelo Tribunal CE: o envio é obrigatório, já que o Supremo Tribunal de Justiça é “um órgão jurisdicional cujas decisões não [são] susceptíveis de recurso judicial previsto no direito interno” (artigo 234º citado).

Não se discute, nem a relevância da questão, nem a consideração deste Supremo Tribunal como um órgão jurisdicional cujas decisões, segundo o direito interno, não são recorríveis, no âmbito do presente recurso e para efeitos do seu julgamento.

Não se acolhe, assim, o argumento, contraposto pelas recorridas nas suas alegações, segundo o qual “as disposições citadas do TCE, salvo melhor opinião, não se aplicam em matéria de propriedade industrial, isto é, não põem em causa o regime de propriedade industrial estabelecida pelos Estados membros, uma vez que o artº 295º do TCE dispõe claramente que «o presente Tratado em nada prejudica o regime do direito de propriedade nos Estados- membros»”.

Está há muito assente que as referidas disposições são aplicáveis em matéria de propriedade industrial (cfr., por exemplo, Pedro Sousa e Silva, Direito Comunitário e Propriedade Industrial, Coimbra, 1996, pág. 107 e segs., ou Alberto Francisco Ribeiro de Almeida, Denominação de Origem e Marca, Coimbra, 1999, pág. 215, nota 2.). Apenas se citam agora, pela relevância que tiveram na evolução da jurisprudência sobre a conciliação entre as exigências das regras de concorrência intra-comunitária e os sistemas nacionais de

protecção dos direitos de propriedade industrial, os acórdãos proferidos nos casos Deutsche Grammophon Gesellschaft mbH/Metro-SB-Grossmärkte Gmbh

& Co., KG, de 8 de Junho de 1971, proc. nº 78/70, SA CNL-SUCAL/HAG GF AG, conhecido por HAG II, de 17 de Outubro de 1990, proc. nº C-10/89, Comissão CE/Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, proc. nº 30/90 e Comissão CE/República Italiana, proc. nº C-235/89, disponíveis em http://curia.europa.eu).

A verdade, todavia, é que o Tribunal de Justiça afastou aquela

obrigatoriedade, ainda que se trate de uma questão pertinente para a

resolução do litígio e que o tribunal onde o mesmo se encontra pendente deve ser considerado um tribunal do qual, na ordem interna, não cabe recurso, quando (1) houver jurisprudência suficiente sobre a interpretação da norma do Tratado em causa, quer porque se trata de “questão materialmente

idêntica a uma outra já decidida a título prejudicial num caso análogo” pelo Tribunal, quer porque “a questão de direito em causa (…) tenha sido resolvida por uma jurisprudência estável”, formada por qualquer via processual, ou quando (2) a norma a interpretar for absolutamente clara.

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Em tais situações, cessa a obrigação de suscitar a apreciação da questão, a título prejudicial, ao Tribunal CE; o Tribunal nacional, no entanto, pode suscitá-la, se o entender: acórdão proferido no caso SRL CILFIT, em liquidação, e outros, e Lanificio di Gavardo SPA/Ministro da Saúde da República de Itália e outros, de 6 de Outubro de 1982, proc. 283/81, igualmente disponível em http://curia.europa.eu)

Tenha-se ainda em conta que, conforme também se esclareceu no acórdão CILFIT, o regime que prevê a intervenção do Tribunal CE para apreciar a questão prejudicial não significa a atribuição às partes de um direito de recurso; estas têm, naturalmente, o direito de o requerer, mas é ao Tribunal da causa que compete decidir sobre a sua utilização.

6. A recorrente aponta, em primeiro lugar, a violação da liberdade de

estabelecimento, nos termos previstos no artigo 43º (anterior 52º) do Tratado CE.

É sabido que, como observa, a liberdade de estabelecimento vale, quer para as pessoas singulares, quer para as entidades colectivas (cfr. acórdãos de 17 de Junho de 1997, proc. C-70/95, caso Sodemare e outras/Regione Lombardia, nº 26, ou de 30 de Novembro de 1995, proc. C-55/94, caso Reinhart Gebhard/

Consiglio dell’Ordine degli Avvocati e Procuratori di Milano, nº 23); e que, quando considerada do ponto de vista de uma sociedade comercial nacional de um determinado Estado membro, a liberdade de estabelecimento se traduz, pelo menos normalmente ou mais significativamente, na possibilidade de instalar sucursais, agências, filiais, etc., nos outros Estados membros (cfr., por ex., acórdãos de 28 de Janeiro de 1986, proc. nº 270/83, caso Comissão/

França, nº 18 ou de 13 de Julho de 1993, proc. 33091, caso The Queen/Inland Revenue Commissioners, ex parte: Commerzbank, nº 13), sendo certo que o artigo 43º (52º) impõe que essa possibilidade se possa exercer “nas condições definidas na legislação do país de estabelecimento para os seus próprios

nacionais” (cfr. os acórdão Gebhard, nº 33 e também, por exemplo, o acórdão de 9 de Março de 1999, proc. 212/97, caso Centros Ltd/Evherus-og

Selskabsstyrelsen, nº 20). A proibição de discriminação em função da nacionalidade (ou da sede, para as sociedades) abrange as discriminações ostensivas mas também as que, embora dissimuladamente, se traduzem,

quanto ao resultado, numa discriminação em razão da nacionalidade (acórdão Commerzbank, nº14).

É ainda sabido que a impossibilidade de utilização da firma da sociedade de que é sucursal pode provocar desvantagens muito relevantes do ponto de vista do sucesso comercial, como a recorrente também observa; e que a proibição genérica imposta aos legisladores nacionais de introduzirem restrições à

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liberdade de estabelecimento abrange os condicionamentos que, por exemplo, tornam menos atractiva, ou menos rentável, a actividade de uma sociedade num Estado membro diverso daquele de que é nacional.

Assim, e recorrendo de novo ao acórdão Gebhard, pode sintetizar-se que

“resulta da jurisprudência do tribunal que as medidas nacionais susceptíveis de perturbar ou de tornar menos atractivo o exercício das liberdades

fundamentais garantidas pelo Tratado devem preencher quatro condições: que se apliquem de forma não discriminatória, que se justifiquem por razões

imperiosas de interesse geral, que sejam adequadas a garantir a realização do objectivo que prosseguem e que não excedam o que é necessário para o

alcançar (cfr. acórdão de 31 de Março de 1993, proc. Kraus, C-19/92, nº 32)” ; a mesma indicação, num caso relativo a alegadas limitações à liberdade de estabelecimento de sociedades, com fundamento em imposições a sucursais em Estados membros, pode ver-se no acórdão de 15 de Maio de 1997, caso Futura Participations SA e Singer/Administration des Contribuitions, proc.

C-250/95, nº 26).

7. A recorrente alega ainda violação da regra da proibição de “restrições

quantitativas à importação, bem como todas as medidas de efeito equivalente”

, constante do artigo 28º do Tratado.

Ora a protecção da propriedade industrial – que assenta nas regras da

territorialidade e da exclusividade, o que torna evidente a facilidade com que conflitua com o princípio da livre circulação de mercadorias entre os Estados membros – figura entre as limitações admissíveis a esta proibição; não pode, todavia, implicar “nem um meio de discriminação arbitrária, nem qualquer restrição dissimulada ao comércio entre os Estados membros” (artigo 30º).

Não vem agora ao caso analisar a evolução da jurisprudência comunitária que, ao longo dos anos, se ocupou, precisamente, da compatibilização entre aquela protecção e esta liberdade; basta observar que se concluiu que o critério essencial de harmonização é o do “objecto específico”: só são admissíveis as restrições justificadas pela protecção do “objecto específico” dos direitos da propriedade industrial ou, melhor dizendo, do direito que, em particular, estiver em causa em cada situação (por exemplo, os acórdãos Deutsche Grammophon ou Hag II ou, ainda, os acórdãos de 31 de Outubro de 1974, proc. nº 15/74, caso Centrafarm BV e outro/Sterling Drug Inc. e nº 16/74, caso Centrafarm BV e outro/Winthrop BV).

8. O acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Maio de 1999, proferido no caso Pfeiffer Groβhandel GmbH/Löwa Warenhandel GmbH, igualmente disponível em http://curia.europa.eu, pronunciou-se sobre um pedido, formulado nos

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termos do (então) artigo 177º do Tratado (actual artigo 234º), de “decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos artigos 30 e 53 do Tratado CE”

(actuais artigos 28º e 43º, respectivamente). Conforme se explica no acórdão, a questão que se colocava ao Tribunal de Justiça era a de saber “se os artigos 30 e 52 do tratado se opõem a uma disposição de direito nacional que proíbe, por haver risco de confusão, a utilização de um nome comercial como

designação específica de uma empresa”, sendo certo que se tinha como assente a verificação do referido risco de confusão.

Em síntese, estava em causa um litígio entre duas sociedades, Pfeiffer Groβhandel GmbHe e Löwa Warenhandel GmbH, sucursal da alemã

Tengelmann Warenhandelsgesellschaft, na qual a primeira, invocando uma disposição da lei austríaca sobre repressão da concorrência desleal, pediu que a segunda fosse impedida de utilizar, com ou sem junção de outras menções, o nome comercial “Plus”.

Por um lado, este termo integrava o nome comercial de uma grande superfície que Pfeiffer explorava desde 1969 na Áustria, bem como a designação de diversos produtos, sobretudo alimentares, que ali eram vendidos. Em ambos os casos, os nomes estavam registados e beneficiavam de uma prioridade referida a 5 de Agosto de 1969 e 2 de Setembro de 1989, respectivamente.

Por outro lado, Tenglemann era titular da marca internacional “Plus”, com prioridade referida a 15 de Novembro de 1989; e Löwa e uma outra sucursal de Tenglemann eram titulares de marcas nominais e figurativas que

integravam o termo “plus”, registadas na Áustria com prioridade referida a 15 de Abril de 1994 e 18 de Dezembro de 1979, respectivamente.

Sucedeu que em 1994 Löwa começou a comercializar na Áustria produtos com o nome “Plus” e a alterar o nome de diversos estabelecimentos que possuía nesse país para uma designação que integrava aquele termo.

Pfeiffer propôs então a acção; e Löwa “invocou, em substância, que a interdição imposta a uma sociedade de utilizar, numa parte do território austríaco, a mesma denominação que é utilizada em outros Estados membros por sociedades pertencentes ao mesmo grupo constitui uma ofensa à livre circulação de mercadorias na medida em que constitui um obstáculo ao desenvolvimento, pelo grupo de sociedades, de um conceito publicitário

uniforme a nível comunitário e constrange portanto o importador a apresentar os seus produtos de forma diferente, consoante o local de comercialização.

Considera, além disso, que a proibição de utilizar um nome comercial poderia igualmente limitar de modo inadmissível a liberdade de estabelecimento, no sentido do artigo 52º do Tratado”.

Analisando a questão, o Tribunal disse:

“17. Em primeiro lugar, convém verificar se uma proibição como a que se

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requer na acção principal é contrária ao artigo 52 do tratado, que prevê a supressão das restrições à liberdade de estabelecimento na Comunidade. (…) 18. Importa recordar que o direito de estabelecimento previsto no artigo 52 do tratado, lido em conjunto com o artigo 58 do tratado CE (que passou a 48 CE) é reconhecido, tanto às pessoas físicas nacionais de um Estado membro da Comunidade, como às pessoas morais, no sentido do artigo 58 do tratado.

Compreende, sob reserva das excepções e das condições previstas, o acesso, em todo o território de qualquer outro Estado membro, a todas as actividades não assalariadas e ao seu exercício, bem como a constituição e gestão de empresas, criação de agências, sucursais ou filiais.

19. Constituem uma restrição ao acesso a estas actividades num Estado membro a definição de medidas nacionais susceptíveis de colocar as

sociedades de outros estados membros numa situação de facto ou de direito desvantajosa em relação às sociedades do Estado membro que as definiu (ver acórdão de 17 de Junho de 1997, Sodemare e outros, C–70/95, Rec. p. I-3395, ponto 33). Uma tal restrição é contrária ao artigo 52 do tratado, lido em conjunto com o artigo 58 do tratado, mesmo se é aplicada de forma não

discriminatória, a não ser que se justifique por razões imperiosas de interesse geral, que seja adequada a atingir o objectivo que visa atingir e que não

exceda o que é necessário para alcançar esse objectivo (ver acórdão de 30 de Novembro de 1995, Gebhard, C–55/94, Rec. p I-4165, ponto 37).

20. Ora, uma proibição tal como a que a requerente formula na acção principal é desvantajosa para as empresas cuja sede se situe num Estado membro no qual utilizam legalmente um nome comercial e que estejam interessadas em estender o uso desse nome para fora desse Estado membro.

Com efeito, a proibição é susceptível de prejudicar o desenvolvimento, por essas empresas, de um conceito publicitário uniforme a nível comunitário, já que pode obrigá-las a definir de forma diferente a apresentação das suas explorações em função do local de estabelecimento.

21. No entanto, uma tal restrição ao direito de estabelecimento, resultante de uma disposição nacional que protege, nomeadamente, nomes comerciais contra os riscos de confusão, justifica-se por razões imperiosas de interesse geral com vista à protecção da propriedade industrial e comercial (ver, neste sentido, o acórdão de 18 de Março de 1980, Coditel, 62/79, Rec. p. 881, ponto 15).

22. Com efeito, a protecção, conferida por um direito nacional, contra esse risco de confusão não pode ser censurada com fundamento no direito comunitário desde logo porque é conforme ao objectivo específico da

protecção do nome comercial que é o de proteger o titular contra o risco de confusão (ver, no mesmo sentido, em relação a marcas, o acórdão de 30 de

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Novembro de 1993, Deutsche Renault, C–317/91, Rec. p. I – 6227, ponto 37).

23. Para além disso, convém realçar que (…) a injunção reclamada por Pfeiffer na acção principal é adequada a garantir a realização do objectivo que

prossegue e não excede o que é necessário para o alcançar, uma vez que o julgador nacional, com base no seu direito nacional, concluiu que existe efectivamente um risco de confusão.

24. Assim, o artigo 52 do tratado não se opõe a uma proibição tal como a que pode vir a ser decretada na acção principal contra Löwa.

25. Em segundo lugar, cumpre verificar se tal proibição é contrária ao artigo 30 do tratado, segundo o qual as restrições quantitativas à importação de mercadorias, bem como quaisquer medidas de efeito equivalente, são proibidas entre os Estados membros.

26. Tal como se realçou nos pontos 17 a 24 deste acórdão, a proibição que o tribunal nacional admite decretar, embora limite as possibilidades para as empresas estabelecidas em outros Estados membros de usar os mesmos nomes comerciais no Estado membro em causa, não contraria o artigo 52 do tratado porque se justifica por razões imperiosas. Não poderia,

consequentemente, ser contrária ao artigo 30 do tratado relativo à livre circulação de mercadorias a não ser se e na medida em que tenha, no que respeita à livre circulação de mercadorias entre os Estados membros, efeitos restritivos para além daqueles que resultam de forma indirecta da restrição à liberdade de estabelecimento.

27. Ora, no caso presente, admitindo que a medida contestada tenha efeitos restritivos sobre a livre circulação de mercadorias, nada indica que não se trate de efeitos resultantes, indirectamente, da restrição à liberdade de estabelecimento.

28. Assim, o artigo 30 do tratado também não se opõe a uma proibição tal como a que é susceptível de ser decretada contra Löwa na acção principal.

29. Nestes termos, cabe responder à questão prejudicial no sentido de que os artigos 30 e 52 do tratado não se opõem a uma disposição nacional que

proíbe, com fundamento em risco de confusão, a utilização de um nome comercial como designação específica de uma empresa.”

É manifesto que a questão que a recorrente pretende que seja submetida à apreciação do Tribunal de Justiça é uma “questão materialmente idêntica” à que foi apreciada neste acórdão, nos termos enunciados no acórdão CILFIT, o que afasta a obrigação de a colocar perante aquele Tribunal.

Assim, pelas razões apontadas neste acórdão de 11 de Maio de 1999,

acabadas de transcrever, conclui-se que não viola o disposto nos artigos 43º e 28º do Tratado CE a impossibilidade, resultante da lei portuguesa, de “uma

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sucursal em Portugal de uma sociedade de outro Estado membro (…) utilizar a denominação social de tal sociedade, em virtude da prioridade de registo em Portugal da denominação social e nome de estabelecimento de outras

sociedades” (conclusão 2ª das alegações de revista). Cabe apenas acrescentar que, contrariamente ao que a recorrente alega, não ocorre nenhuma

discriminação das sociedades nacionais de outro Estado em relação às

sociedades portuguesas; o regime aplicável assenta na prioridade do registo e vale da mesma forma para umas e outras.

9. Cumpre agora determinar se, conforme sustenta a recorrente, se verifica uma situação de “prioridade registral” a seu favor resultante do disposto no artigo 8º da Convenção da União de Paris, da notoriedade da sua marca, nos termos do disposto no artigo 190º do Código da Propriedade Industrial ou da titularidade da marca comunitária nº 573.592.

Para o efeito, e antes de mais nada, convém relembrar dois pontos importantes:

– Em primeiro lugar, o de que, neste recurso, só podem considerar-se assentes os factos que vêm definitivamente provados das instâncias. Recorde-se, a propósito, que o acórdão recorrido não deu provimento à apelação também na parte em que era impugnada a decisão sobre alguns factos;

– Em segundo lugar, o de que não releva a circunstância de estarem em jogo sinais distintivos diferentes. A recorrente invoca em defesa da possibilidade de utilização, em Portugal, da expressão “...” pela sua sucursal, a titularidade da marca “...” e de firmas e designações de estabelecimentos que a contêm;

titularidade essa que, consequentemente, lhe daria o direito de se opor a que as recorridas a utilizassem na sua firma (a primeira recorrida) ou na

designação do seu estabelecimento (a segunda).

Solução diferente conduziria à possibilidade de inutilização ou, pelo menos, de degradação da função individualizadora do sinal em causa, como é evidente (cfr. artigos 189º, nº 1, f) e 231º, nº 1, a) e f) do Código da Propriedade Industrial de aprovado pelo Decreto-Lei nº 16/95, de 24 de Janeiro e artigos 5º, nº 3 do mesmo Código e 10º, nº 2, do Código Comercial).

10. Segundo o disposto no artigo 8º da Convenção da União de Paris, “O nome comercial será protegido em todos os países da União sem obrigação de

registo, quer faça ou não parte de uma marca de fábrica ou de comércio”.

A recorrente sustenta nas suas alegações que, “seja sob a forma de firma- denominação, seja sob a forma de nome de estabelecimento comercial”, o seu nome comercial, ..., “está protegido em Portugal, não apenas por via do direito de marcas, mas por aplicação do artigo 8º da CUP, com data muito anterior à

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dos registos das Recorridas. Recorde-se que os registos destas são apenas de 1990 (sendo o pedido de registo da 2a Recorrida de 1987).”

O acórdão recorrido, no entanto, considerou que uma das condições exigidas para essa protecção – que, tal como a recorrente, entendeu abranger, quer o nome do estabelecimento, quer a firma – não se podia considerar preenchida, por não ter ficado provado seu o uso, em Portugal, em termos que a

justifiquem. A recorrente alega não ser exigido pelo artigo 8º o uso, no Estado onde se quer fazer valer a protecção, de um nome comercial registado num outro Estado abrangido pela Convenção.

Reitera-se que a firma de uma sociedade comercial, como é o caso da

recorrente, se encontra abrangida pela expressão “nome comercial” constante do artigo 8º da Convenção, beneficiando, portanto, da protecção ali prevista, e ressalvada pelo artigo 232º do Código da Propriedade Industrial de 1995

(aprovado pelo Decreto-Lei nº 16/95, de 24 de Janeiro), vigente à data dos pedidos dos registos invocados pelas recorridas e do pedido de registo da sucursal da recorrente em Portugal, bem como da renúncia à extensão da marca internacional mista nº 483.246. O mesmo se decidiu já, neste Supremo Tribunal, por exemplo nos acórdãos de 11 de Dezembro de 1979, in Boletim do Ministério da Justiça nº 292, pág. 391 e segs. ou de 27 de Março de 2003

deste Supremo Tribunal, disponível em www.dgsi.pt como proc. nº 03B322.

Para que o nome comercial seja protegido “em todos os países da União”, nos termos deste artigo 8º, é todavia necessário determinar quais são os requisitos que se têm de verificar e qual é o âmbito da protecção concedida.

Relativamente aos requisitos de protecção, só interessando agora a hipótese de protecção nos Estados abrangidos pela Convenção (no caso, Portugal) que não sejam o Estado de origem (no caso, Espanha) considera-se que é

necessário (1) que seja protegido no país de origem e (2) que o nome seja efectivamente utilizado no país de importação.

Consta da matéria de facto provada que “a ré tem 135 títulos de registo de propriedade industrial que abrangem múltiplos produtos e serviços, entre os quais a sua firma social (…)”. Para além disso, na escritura de alteração dos estatutos da recorrente, junta a fls. 701, figura que foi constituída em 23 de Dezembro de 1958, como sociedade de responsabilidade limitada, e

transformada em sociedade anónima em 10 de Janeiro de 1978, estando inscrita no registo comercial.

Recorde-se que, segundo a Ley de Marcas de 1988, a Lei nº 32/1988, de 10 de Novembro de 1988, vigente à data dos pedidos dos registos invocados pelas recorridas, do pedido de registo da sucursal da recorrente em Portugal e da renúncia à extensão da marca internacional mista nº 483.246, entretanto revogada pela Lei 17/2001, de 7 de Dezembro e ambas aplicáveis aos nomes

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comerciais anteriores (como consta das respectivas disposições transitórias), o registo do nome comercial era potestativo, conferia ao seu titular o direito de uso exclusivo (nº 1 do respectivo artigo 78º) e era protegido nas condições estabelecidas pelos artigos 76º e segs.

Pode, assim, dar-se como assente que o nome comercial da recorrente era e continua a ser protegido em Espanha, para o efeito que agora releva.

Já não é porém possível concluir, da mesma matéria de facto, que, para o fim pretendido pela recorrente (beneficiar de prioridade, nos termos que indica), esteja provada a utilização em Portugal da firma da recorrente, em termos relevantes, nas datas acima indicadas.

Mas está demonstrada a utilização posterior, como decorre dos pontos 12º, 35º e 38º da lista da matéria de facto provada. Esta utilização pode relevar para efeitos de protecção – também posterior – da respectiva firma em

Portugal mas não, como começa por sustentar a recorrente, para lhe conferir uma “prioridade registral” que possa ser invocada como motivo, quer da improcedência da acção, quer da procedência da reconvenção.

Contrariamente ao afirmado pela recorrente, tem toda a justificação a

exigência do uso efectivo no país onde a protecção é reclamada. As limitações impostas a terceiros pela protecção da propriedade industrial – que, em regra, e independentemente de saber se é a que o artigo 8º da Convenção concede

“sem obrigação de registo”, se traduz no poder de aproveitar, em exclusivo, certas vantagens económicas que um determinado bem pode proporcionar – justificam-na plenamente. E essa justificação mantém-se ainda que não exista exclusividade, porque, de qualquer modo, limita relevantemente direitos desses terceiros.

Como observa Oliveira Ascensão (A aplicação do art. 8º da Convenção da União de Paris nos países que sujeitam a registo o nome comercial, Revista da Ordem dos Advogados, ano 56, Agosto 1996, pág. 439 e segs., págs. 457-458), citando o acórdão deste Supremo Tribunal de 11 de Dezembro de 1979, atrás referido, “sendo o uso um requisito do direito ao nome no direito interno”, não é admissível que uma empresa estrangeira que não exerça actividade em

Portugal venha “reclamar aqui a tutela de um nome comercial, invocando a Convenção de Paris”. O que o artigo 2º da Convenção exige é que os nacionais de outros Estados beneficiem, no país de destino, da protecção que, neste, é dada aos seus nacionais, verificadas as necessárias condições.

11. Também não pode ser invocada como fundamento da “prioridade registral”

pretendida a alegada notoriedade da marca ... (ou de diversas marcas ou nomes de estabelecimentos que integram tal expressão), desde logo por não ter ficado provada matéria de facto que permita concluir ser a mesma

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notoriamente conhecida em Portugal.

Com efeito, a notoriedade relevante para efeitos do artigo 190º do Código da Propriedade Industrial (cfr. artigo 6º - bis da Convenção de Paris) – constitui motivo de recusa de registo de outra marca ou de outro sinal distintivo do comércio e, tendo sido efectuado, de anulação do mesmo – é, como ali

expressamente se diz, a notoriedade em Portugal; sempre assim deveria ser, naturalmente, já que é em Portugal que pode ocorrer o risco que justifica a protecção especialmente conferida às marcas notórias (assim, por exemplo, Luís M. Couto Gonçalves, Direito de Marcas, 2ª ed., Coimbra, 2003, págs.

146-147). E, no contexto da protecção dos sinais distintivos do comércio, como é o caso das marcas, tem de significar o conhecimento por parte de quem poderia ser induzido em confusão, no sentido de poder associar

estabelecimentos ou produtos de outras empresas ao titular do direito protegido.

Nem releva, no âmbito deste recurso, determinar se a notoriedade se deve aferir relativamente à generalidade das pessoas ou, diversamente, ao público particularmente interessado (no caso, eventualmente, os profissionais

relacionados com o ramo de actividade das partes), uma vez que, repete-se, a matéria provada não permite concluir, nem num sentido, nem no outro.

Na verdade, apenas está provado – tendo em conta os momentos relevantes para efeitos de prioridade, repete-se – que a recorrente manteve, desde 1985,

“relações comerciais com os fabricante e comerciantes de artigos de óptica referidos nos documentos constantes de fls. 159 a 196 (…)”, e que o

estabelecimento que abriu em Vigo em 1964 “sempre teve clientes

portugueses”, o que é manifestamente insuficiente para se poder concluir pela alegada notoriedade.

12. Finalmente, a recorrente assenta a “prioridade registral” que reclama na titularidade da marca comunitária nº 573.592 ..., que beneficiaria da

antiguidade resultante da extensão a Portugal, em 1985, da marca

internacional mista nº 483.246 ..., por ter aproveitado a antiguidade de registo de “uma marca idêntica em Espanha, antiguidade essa reportada a 15 de

Janeiro de 1997”. Invoca, como fundamento, o disposto nos artigos 34º, nº 2 e 35º do Regulamento (CE) nº 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, dos quais retira a irrelevância “da «renúncia» ao registo da marca

internacional”, de 13 de Fevereiro de 1997: tal renúncia teria “apenas determinado a substituição, sem perda de prioridade, do registo de marca internacional 483.246 pelo registo da marca comunitária 573.592, ambas ...

…”.

Dos nºs 1 e 2 do artigo 34º do Regulamento (CE) nº 40/94 resulta que “o

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titular de uma marca anterior registada num Estado-membro (…) ou de uma marca anterior objecto de um registo internacional com efeitos num Estado- membro, que deposite um pedido de marca idêntica para registo como marca comunitária para produtos ou serviços idênticos àqueles para os quais a marca foi registada, ou que estejam incluídos nesses produtos ou serviços, pode prevalecer-se, em relação à marca comunitária, da antiguidade da marca anterior no que diz respeito ao estado-membro no qual ou para o qual foi registada” (nº 1), sendo certo que (nº 2) “o único efeito da antiguidade, para efeitos do presente regulamento, é o de, na caso de o titular da marca

comunitária renunciar à marca anterior ou a deixar caducar, ser considerado como se continuasse a beneficiar dos mesmos direitos que teria se a marca anterior continuasse registada”.

O artigo 35º, por sua vez, confere ao titular de uma marca comunitária (refere-se, assim, à reivindicação da antiguidade após registo da marca

comunitária, sendo certo que, no caso, a marca comunitária foi concedida em 13 de Setembro de 1999) que “seja titular de uma marca anterior idêntica registada num Estado-membro (…) pode prevalecer-se da antiguidade da marca registada no que diz respeito ao Estado membro no qual ou para o qual ela foi registada”, sendo também aplicável o nº 2 do artigo 34º.

O pedido da marca comunitária em causa data de 10 de Julho de 1997.

A recorrente não tem, todavia, razão. Quando depositou o pedido de marca comunitária, em 10 de Julho de 1997, a recorrente não era titular de nenhuma marca ... registada em ou para Portugal. Não releva aqui a marca registada em Espanha; e a extensão da marca internacional invocada tinha sido objecto de renúncia da sua parte, a 13 de Fevereiro de 1997. Não pode, pois, invocar- se o artigo 34º para beneficiar, relativamente à marca comunitária e para efeitos do disposto no nº 2 do mesmo artigo, da antiguidade de nenhuma marca anterior registada em ou para Portugal.

Também não pode invocar, para o efeito, o disposto no artigo 35º. Na verdade, quando foi concedida e registada a marca comunitária, a recorrente não era titular de nenhuma marca anterior registada em Portugal; e, quanto à

extensão da marca internacional requerida a 14 de Fevereiro de 1997, não pode ser considerada anterior à data da referida renúncia.

13. Cumpre, pois, passar à análise da questão da validade ou invalidade dos registos em causa na presente acção, quer relativamente à denominação social da sucursal da recorrente, quer quanto à firma da primeira recorrida e ao nome de estabelecimento da segunda.

A recorrente sustenta que “determinada a prioridade registral da expressão

«...»” a seu favor, “são anuláveis os registos que foram concedidos com

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preterição dos direitos da Recorrente, nomeadamente a firma da 1ª Recorrida e o nome de estabelecimento da 2ª Recorrida”.

A verdade, no entanto, é que não se verifica a prioridade de que a Recorrente se pretende prevalecer; improcede, portanto, o pedido reconvencional

formulado com o objectivo de ser decretada a anulação da firma e do nome de estabelecimento das recorridas, quer quanto ao pedido de anulação, quer quanto ao pedido de condenação na abstenção do respectivo uso e no pagamento de uma indemnização.

Não se torna, pois, necessário determinar se a recorrente teria legitimidade para os formular, ou se ainda estava em tempo; nem, neste contexto, saber se ocorreu ou não má fé por parte das recorridas, questão suscitada pela

recorrente para sustentar a tempestividade dos pedidos de anulação que formulou.

Há, no entanto, que analisar a questão de saber se a alegada “invalidade originária” apontada pela recorrente aos “direitos das recorridas, por terem sido constituídas em forma ilegal”, é ou não insanável e se, portanto, a

renúncia de 13 de Fevereiro de 1997 pode ter o efeito de convalidação da qual as autoras retiram a prioridade do registo da firma de uma e do nome do

estabelecimento da outra.

Ora, na altura em que foi requerida a admissibilidade da firma da primeira recorrida (1989) e em que a mesma veio a ver registada (6 de Setembro de 1990), bem como quando foi requerido (Setembro de 1987) e deferido o pedido de registo do uso exclusivo do nome de estabelecimento da segunda (24 de Abril de 1990), mantinha-se em Portugal a extensão da marca

internacional mista ... nº 483.246, como se sabe.

Segundo o disposto no nº 3 do artigo 5º, na al. b) do nº 1 do artigo 33º e no artigo 238º do Código da Propriedade Industrial aplicável, deveriam ter sido recusados os pedidos de registo formulados pelas recorridas; não tendo havido recusa, o motivo que a deveria ter determinado provoca a invalidade do

registo da firma (artigo 5º, nº 4) ou do registo da denominação de

estabelecimento (artigo 244º), na modalidade de anulabilidade (artigo 5º, nº 4 244º e 33º do mesmo Código).

Para o pedido de anulação da firma, os interessados que tinham legitimidade dispunham do prazo de 10 anos, a contar da constituição da sociedade, para propor a acção (para o Ministério Público não vale esse prazo) – mesmo nº 4 do artigo 5º; para o caso do nome de estabelecimento, o Código da

Propriedade Industrial não previa qualquer prazo. Isso não significava,

todavia, que a anulabilidade pudesse ser invocada a todo o tempo, conclusão a que se chegava, quer pela via da aplicação do regime geral constante do nº 1 do artigo 287º do Código Civil (neste sentido, embora pronunciando-se

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