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COMPENSAÇÃO TRIBUTÁRIA: ANÁLISE DO PROCESSO DE CAUSALIDADE JURÍDICA PARA FINS DE EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO JURÍDICA TRIBUTÁRIA

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Tiago Cappi Janini

COMPENSAÇÃO TRIBUTÁRIA: ANÁLISE DO PROCESSO DE

CAUSALIDADE JURÍDICA PARA FINS DE EXTINÇÃO DA

OBRIGAÇÃO JURÍDICA TRIBUTÁRIA

MESTRADO EM DIREITO

SÃO PAULO

(2)

Tiago Cappi Janini

COMPENSAÇÃO TRIBUTÁRIA: ANÁLISE DO PROCESSO DE

CAUSALIDADE JURÍDICA PARA FINS DE EXTINÇÃO DA

OBRIGAÇÃO JURÍDICA TRIBUTÁRIA

MESTRADO EM DIREITO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Direito do Estado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob orientação da Profa. Doutora Clarice Von Oertzen de Araujo.

São Paulo

(3)

(4)
(5)

Por problemas de afasia, certamente algum nome ficará de fora desta lista, porém não significa que o meu reconhecimento pelo apoio e conselhos não deixe de atingir a todos que colaboraram com a feitura desta dissertação.

A todos os meus familiares que sempre estiveram presentes no caminho desse estudo.

À Clarice von Oertzen de Araujo, pela inestimável colaboração. Sem seu trabalho de orientação, sempre dedicado, atencioso e cuidadoso, nada teria sido alcançado.

Aos professores com quem tive o privilégio de estudar no COGEAE e no mestrado: Roque Antonio Carrazza, Celso Fernandes Campilongo, Marcelo de Oliveira Figueiredo, Tacio Lacerda Gama, Maria Rita Ferragut, Robson Maia Lins, Tárek Moysés Moussallem, Fabiana Del Padre Tomé, Ercias Rodrigues de Sousa, Daniela de Andrade Braghetta e Eurico Marcos Diniz de Santi. Aos professores de minha graduação, em especial a Julio da Costa Barros.

Aos grandes amigos que o estudo nos proporciona, Frederico Seabra de Moura, Danilo Aoad Gimenez, Raquel Mercedes Motta, Marcos Feitosa, Diego Bomfim, Rodrigo Dalla Pria, Maíra Oltra, Charles McNaughton, Rubya Floriani, Alexandre Pacheco, Samuel Gaudêncio, Patrícia Fudo, Thiago Boscoli Ferreira, Marcelo de Carvalho Lima, Luiz Paulo Gomes, Vanessa Canado, Miguel Martucci e Ronny Pereira.

A todos os amigos do escritório Paiva & Arruda que sempre me apoiaram e me incentivaram no presente trabalho desde o seu nascimento. Taís Amaral, obrigado pela paciência na ajuda da formatação deste trabalho.

Ao professor Paulo de Barros Carvalho, pela oportunidade em participar deste seleto grupo de estudiosos.

(6)

[...] Palavras não são más

Palavras não são quentes

Palavras são iguais

Sendo diferentes [...]

(7)

jurídica para fins de extinção da obrigação jurídica tributária. 2008. 280 f. Dissertação (Mestrado em Direito), Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2008.

RESUMO

O objetivo do trabalho consiste na análise da causalidade jurídica das normas envolvidas na compensação tributária. Descrevem-se as cadeias de positivação das normas que vão constituir o fato jurídico da compensação, ou seja, a formalização do crédito tributário e a constituição da relação de débito do Fisco, e das normas que determinam a relação jurídica da compensação. Dedica-se ao estudo de três maneiras possíveis para se extinguir a obrigação tributária sob a ótica da compensação, de acordo com o sujeito emissor da norma individual e concreta: (i) pela autoridade administrativa; (ii) pelo contribuinte; e (iii) pela autoridade judiciária. Utiliza-se o método do constructivismo lógico-semântico, abordando o direito como um processo comunicacional, construído, modificado e extinto somente por meio de linguagem jurídica competente. Em face das premissas, identificam-se várias cadeias de positivação de normas da compensação tributária, sempre se encerrando com a produção de uma norma individual e concreta cujo conteúdo é a extinção da relação jurídica tributária. Este estudo evidencia que a compensação tributária é um ato jurídico complexo, necessitando de vários fluxos normativos para atingir seu objetivo.

(8)

ABSTRACT

The work’s purpose is to analyse the judicial causality of the rules of law included in the tax compensation. Describe the rules accomplishment series that will compose the compensation judicial fact, that is, the tax credit formalization and the Treasury debit relation, and the rules that composes the compensation judicial relation. Devote to study the three possible ways to supress the tax obligation under compensation view, in accordance with the individual and concrete rule sender: (i) for the administrative authority; (ii) for the taxpayer; (iii) for the judiciary authority. Use the logic-semantic construction method, approaching the law like a communication process, constituted, modified and extinted only for judicial language. In view of the premise, identify several rules accomplishment series of the tax compensation, always finishing with the individual and concrete rule production whose content is the tax judicial relation’s extinction. This study make evident that tax compensation is a complex judicial act, needing several rules accomplishment series to hit yours objective.

(9)

1 INTRODUÇÃO ...12

2 LINGUAGEM E DIREITO...18

2.1 Realidade, conhecimento e linguagem ...18

2.2 O Direito e a virada lingüística ...23

2.3 A realidade social e a realidade jurídica...26

2.4 O direito como um sistema autopoiético...29

3 O DIREITO COMO UM FENÔMENO COMUCACIONAL... 31

3.1 Um modelo comunicacional do Direito...31

3.2 As normas jurídicas como mensagem ...34

3.2.1 Classificação das normas jurídicas...38

3.2.1.1 Normas de estrutura e normas de comportamento...39

3.2.1.2 Norma superior e norma inferior...41

3.2.1.3 Normas gerais e individuais, abstratas e concretas ...43

3.2.1.4 Normas primárias e normas secundárias ...43

3.3 O código no processo comunicacional do direito...45

3.4 O canal físico da comunicação do direito...48

3.5 O destinatário e o emissor da norma jurídica ...51

3.6 O contexto na comunicação jurídica ...51

3.7 A interpretação do direito em conformidade com o modelo comunicacional proposto...53

4 A FENOMENOLOGIA DA INCIDÊNCIA DA NORMA JURÍDICA TRIBUTÁRIA ...56

4.1 Ser e dever-ser: a importância do processo de positivação da norma jurídica .56 4.2 O fenômeno da incidência e a produção da norma individual e concreta...59

4.3 O fluxo da causalidade jurídica...63

4.4 Fontes do direito positivo ...64

4.5 Competência tributária ...68

4.5.1 A questão da validade na produção normativa...72

4.6 Ação, norma e procedimento ...73

4.7 A fenomenologia da produção normativa ...79

5 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ACERCA DA RELAÇÃO JURÍDICA TRIBUTÁRIA ...86

5.1 Uma breve análise sintática da relação jurídica...86

5.2 Descrevendo a relação jurídica: um conceito fundamental ...88

(10)

6 A CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO ...96

6.1 Definindo as expressões crédito tributário e débito do fisco...96

6.2 O processo de positivação de constituição do crédito tributário ...97

6.3 A regra-matriz de incidência tributária...99

6.3.1 O antecedente da regra-matriz de incidência tributária...100

6.3.1.1 Tempo do fato e tempo no fato...102

6.3.2 O conseqüente da regra-matriz de incidência tributária...104

6.4 O ato de aplicação da regra-matriz de incidência tributária ...106

6.5 O processo de positivação da norma jurídica tributária mediante ato de aplicação da autoridade administrativa...107

6.5.1 Acepções para a expressão lançamento tributário...107

6.5.2 O processo de produção do ato-norma lançamento...111

6.5.3 O produto decorrente do ato-fato lançamento...113

6.5.4 Descrição da fenomenologia da incidência da norma jurídica tributária com o ato de aplicação realizado pela autoridade administrativa...115

6.6 O processo de positivação da norma jurídica tributária mediante ato de aplicação do particular (autolançamento ou lançamento por homologação) ...117

6.6.1 O eixo de positivação da constituição do crédito tributário por norma ... individual e concreta expedida pelo particular...119

6.6.1.1 O ato de produção de normas ...121

6.6.1.2 A norma introduzida: o ato-norma autolançamento...122

6.6.2 O ato de homologação na fenomenologia do autolançamento ...123

7 FORMAS DE EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA ...127

7.1 Sobre a extinção da relação jurídica...127

7.1.1 A resolução do conflito de normas ...129

7.2 A extinção da obrigação tributária...133

7.3 Formas de extinção da obrigação tributária...135

7.3.1 O pagamento...136

7.3.2 A transação...139

7.3.3 A remissão...141

7.3.4 A prescrição e a decadência...142

7.3.4.1 A decadência ...143

7.3.4.2 A prescrição...144

7.3.5 A conversão de depósito em renda...146

7.3.6 O pagamento antecipado e a homologação...147

7.3.7 A consignação em pagamento...148

7.3.8 A decisão administrativa irreformável ...149

7.3.9 A decisão judicial passada em julgado ...149

(11)

8.3 A relação de débito do Fisco nos tributos não-cumulativos...152

8.4 A relação de débito do Fisco nos casos de retenção na fonte ...154

8.5 A relação de débito do Fisco nos empréstimos compulsórios...156

8.6 O pagamento indevido e a relação de débito do Fisco repetição ...158

8.6.1 A regra-matriz de repetição...160

8.6.2 Hipóteses de constituição do débito do Fisco repetição...161

8.6.3 A extinção da relação de débito do Fisco ...163

8.6.4 O tributo indevido, a penalidade pecuniária indevida e a correção monetária ...165

9 TEORIA GERAL DA COMPENSAÇÃO TRIBUTÁRIA...169

9.1 Definição do conceito de compensação ...169

9.2 Espécies de compensação ...170

9.3 A compensação tributária e o Direito Civil...172

9.4 Requisitos essenciais para a compensação tributária...176

9.4.1 A exigência de existir a relação jurídica tributária e a relação de débito do Fisco...177

9.4.2 Reciprocidade da relação jurídica tributária e da relação de débito do Fisco...178

9.4.3 Homogeneidade das relações jurídicas envolvidas na compensação...178

9.4.4 A liquidez e certeza do crédito tributário e do débito do Fisco...179

9.4.5 A necessidade de expressa permissão legal ...182

9.4.5.1 Brevíssimo escorço histórico da legislação ordinária acerca da compensação tributária...182

9.5 O processo de positivação da norma de compensação ...183

9.6 A norma individual e concreta da compensação: a extinção da obrigação tributária...189

10 A COMPENSAÇÃO DE OFÍCIO ...192

10.1 A norma geral e abstrata da compensação de ofício ...192

10.2 O procedimento da compensação de ofício e o Decreto 2.138/97...196

11 A AUTOCOMPENSAÇÃO TRIBUTÁRIA...200

11.1 A evolução legislativa no tempo ...200

11.2 A aplicação da legislação da compensação no tempo ...202

11.3 A norma geral e abstrata da autocompensação ...210

11.3.1 A autocompensação das multas pecuniárias ...212

11.4 A norma individual e concreta da autocompensação ...213

(12)

11.6.1.1 A prescrição do Fisco no caso de não homologação da declaração

de compensação...224

11.7 A autocompensação considerada não-declarada...227

11.8 O prazo para o contribuinte produzir a enunciação-enunciada da autocompensação...233

11.8.1 A decadência e a Lei Complementar 118/05...236

11.8.2 Decadência na hipótese de a relação de débito do Fisco ser constituída por decisão judicial ...237

12 A COMPENSAÇÃO JUDICIAL ...240

12.1 A compensação tributária em crise...240

12.2 O prazo prescricional para o contribuinte se valer do processo judicial no caso da compensação ...241

12.3 A norma individual e concreta inserida no sistema pela Autoridade Judiciária ...243

12.4 A compensação judicial e o art. 170-A do CTN ...246

CONCLUSÃO...250

(13)

INTRODUÇÃO

Sabe-se que as palavras são potencialmente vagas e ambíguas, e a expressão

compensação tributária não foge dessa regra. Por isso, muitas vezes, os estudiosos, sem

se atentarem para esse problema, mesclam o instituto sob as perspectivas de norma

jurídica, fato jurídico, relação jurídica, procedimento, veículo introdutor, etc.

A compensação tributária se enquadra como uma das formas de extinção da

obrigação tributária escolhida pelo CTN (art. 156, II). Somente ocorrerá esse

fenômeno com a edição da norma individual e concreta que documente a incidência

da norma de compensação, ou seja, por meio de linguagem jurídica competente.

Apesar de estar previsto no Código Tributário Nacional desde 1966, o

instituto da compensação tributária obteve progressos apenas com a edição da Lei

8.383/91. Posteriormente, adveio a Lei 9.430/96, com as suas ulteriores modificações

pelas Leis 10.637/02, 10.833/03 e 11.051/04, determinando o vigente procedimento da

compensação.

Boa parte da doutrina define a compensação como um encontro de contas1,

em que os sujeitos da relação jurídica são credores e devedores uns dos outros e

aproveitam essa situação para extinguir as obrigações recíprocas. Entretanto,

lembre-se que o termo compensação tributária é usado em diversas acepções. Conforme atesta

Eurico de Santi, compensação é norma, fato e relação jurídica2.

Analisando a fenomenologia da incidência da norma de compensação, fica

assente que é necessária a existência de duas relações jurídicas para que ela ocorra:

uma que determina o crédito tributário; e outra que determina a relação de débito do

Fisco. Além dessas, há uma terceira relação que é a própria compensação cuja

finalidade é extinguir a obrigação tributária.

1 Confira-se, por exemplo, José Eduardo Soares de MELO, Curso de direito tributário, p. 251; Orlando GOMES,

Obrigações, p. 129; Hugo de Brito MACHADO, Curso de direito tributário, p. 232; Ruy Barbosa NOGUEIRA, Curso de direito tributário, p. 315; Maria Helena DINIZ, Curso de direito civil brasileiro, p. 298.

(14)

A primeira relação jurídica, resultado do processo de positivação da

regra-matriz, irá constituir o crédito tributário determinando os sujeitos da obrigação

tributária, bem como a quantia que deve ser recolhida a título de tributo. Esse

vínculo somente ingressa no mundo do direito por meio de uma norma individual e

concreta, que pode ser expedida tanto pela autoridade administrativa (lançamento)

como pelo particular (lançamento por homologação).

O outro eixo de positivação de normas se encerra com a norma individual e

concreta que estipula o débito do Fisco. Aqui se encontra o Fisco na posição de

sujeito passivo; e o contribuinte está no pólo ativo da relação. Inverte-se a situação

prescrita na relação jurídica anterior que institui o crédito tributário: o Fisco é

devedor; e o contribuinte, o credor.

Ao eleger a compensação como forma de extinguir a relação jurídica

tributária, tem-se o início de um novo eixo de positivação de normas, que culminará

com a produção de uma norma individual e concreta cujo conseqüente prevê a

extinção das relações. É outro eixo de positivação de normas que se inicia, a

compensação tributária. Eis o objeto essencial do estudo proposto: analisar o

procedimento a ser seguido para se produzir uma norma individual e concreta de

compensação, fulminando a obrigação tributária. Outro corte metodológico que

delimita o estudo apenas às compensações tributárias realizadas no âmbito federal,

regidas, principalmente, pela Lei 9.430/96.

Parte-se da distinção processo/produto para se analisar com acuidade o

procedimento de produção da norma individual e concreta inserida no sistema

jurídico com o escopo de extinguir a obrigação tributária. É essa norma que irá

realizar o cálculo relacional entre o crédito tributário e o débito do fisco. Assim, a

compensação, consoante observou Eurico de Santi, pode ser vista como processo,

fenômeno interproposicional entre duas relações distintas, e como produto, resultado

dessa interação relacional3.

A compensação é o ato (norma individual e concreta) que encerra a cadeia

(15)

normativa da obrigação tributária. Para que se dê esse término de positivação é

preciso que a pessoa competente para sua emissão observe o procedimento descrito

em normas do direito positivo. São as normas que dizem como produzir outras

normas.

Diante desse fenômeno complexo que é a compensação, julga-se oportuno

realizar um estudo que busque diferenciar o procedimento, o ato e a norma da

compensação tributária, traçando o seu processo de positivação, até atingir o nível

máximo de concretude e individualidade, culminando com a extinção da obrigação

tributária.

O trabalho pretende, portanto, estudar toda a causalidade jurídica que

envolve a compensação tributária, até atingir a finalidade prevista no art. 156, II, do

CTN: extinguir a obrigação tributária. Assim, devem-se analisar a compensação

tributária e seus requisitos, desde o enfoque das normas que constituem o crédito

tributário e a relação de débito do Fisco, bem como a norma jurídica da compensação

cujo conteúdo prescreve a relação jurídica da compensação, o procedimento da

compensação e o fato jurídico da compensação como fenômenos distintos que são.

Toda pesquisa pressupõe um método, entendido como o procedimento de

investigação organizado que garante a obtenção de resultados válidos4. É o caminho

a ser percorrido para se resolver um problema. O direito, como objeto, é

pluridimensional, possibilitando sua abordagem por diversos ângulos5 ou por

diversos métodos.

Toda observação é um procedimento seletivo6. A ciência realiza cortes no real

delimitando o seu objeto, porquanto não é possível esgotar a realidade. Ensina

Lourival Vilanova que: “A realidade é sempre mais rica em determinação que o seu

correspondente conceito, e este mais pobre que a intuição dessa realidade. Da

multiplicidade de coisas, fenômenos, propriedades, atributos, relações, o conceito

4 Nicola ABBAGNANO, Dicionário de filosofia, p. 668.

(16)

escolhe alguns. Tem ele função seletiva do real”7. A descrição de um objeto, portanto,

é sempre feita sob um aspecto, um ponto de vista. Sempre haverá algo mais para se

falar acerca desse objeto. Por isso, imperioso efetuar cortes no sentido de delimitação

do objeto a ser estudado, mesmo assim, alerte-se que não será possível esgotá-lo.

A análise aqui proposta pressupõe a divisão do direito em direito positivo e

ciência do direito. O direito positivo, identificado como o plexo de normas válidas

num certo tempo e espaço, é o objeto de estudo da ciência do direito. O ponto de

partida para se realizar o estudo do direito são os enunciados prescritivos, o que

pode ser feito por meio de três planos: (i) sintático, em que se estuda o processo de

produção do enunciado; (ii) semântico, plano em que o intérprete constrói as normas

jurídicas; e (iii) pragmático, quando a análise se volta para a maneira como os

emitentes e destinatários da linguagem jurídica a utilizam8. Aqui há a primeira

demarcação deste trabalho: o estudo do direito brasileiro positivo. A opção

metodológica consiste em circunscrever a investigação científica às normas válidas

no sistema jurídico positivo, porém sem desconsiderar outras formas de se analisar o

objeto. É o que esclarece José Souto Maior Borges9:

Quando as proposições descritivas da ciência do Direito se voltam exclusivamente sobre o ordenamento jurídico positivo, pode-se dizer que essa orientação envolve uma postura metodológica, consistente na opção pelo positivismo jurídico. Não se trata de uma posição ideologicamente positivista; ela apenas desconsidera, no âmbito de suas investigações, quaisquer outros tipos de abordagem estranhos ao estudo do ordenamento jurídico vigente. Não nega a existência de outros campos de investigação legítima, como a Sociologia do Direito. É metodologicamente positivista, porque o seu método consiste em descrever o direito positivo – e só este.

Já atuando dentro do direito positivo realiza-se outro corte metodológico,

separando-se as normas de direito tributário. E, por fim, ingressando no ramo direito

tributário, a ênfase será nas regras que tratam da compensação como forma de

extinção da obrigação tributária nos dizeres do art. 156 do CTN, principalmente

(17)

quando realizada sob os auspícios da Lei 9.430/96.

Assim, para se estudarem as regras da compensação tributária, o método

jurídico adotado é a análise lingüística do direito positivo, aceitando-o como um

fenômeno comunicacional, de acordo com as teorias de Paulo de Barros Carvalho e

Gregorio Robles. Aceita essa premissa, a Semiótica assume lugar de relevo nesta

pesquisa, permitindo a investigação da linguagem jurídica em três planos: o

sintático, o semântico e o pragmático.

O tema proposto fundamenta-se, portanto, na escola do constructivismo

lógico-semântico, defendida e desenvolvida por Paulo de Barros Carvalho. Com isso,

será traçado um caminho com uma profunda verificação semântica e lógica dos

conceitos jurídicos, tendo como pano de fundo a compensação tributária.

Parte-se da premissa que a linguagem é elemento essencial à constituição do

direito. Dentro do processo de positivação das normas, que consiste no caminho que

se inicia com as normas da mais ampla generalidade e abstração até chegar aos níveis

máximos de individualidade e concreção, o fenômeno lingüístico é imprescindível

para constituir o fato jurídico e determinar a relação jurídica que deve ser seguida.

Nesse ponto cabe destacar a norma individual e concreta como o

instrumento normativo que avança em direção ao comportamento das pessoas, na

tentativa de o sistema jurídico alimentar suas expectativas de efetiva regulação das

condutas humanas.

Para se seguir o encadeamento lógico do processo de positivação das normas

de compensação, serão trabalhadas categorias da Teoria Geral do Direito, da

Epistemologia e da Axiologia jurídicas, bem como os campos da Lingüística, da

Semiótica e da Teoria da Comunicação.

Assim, o desenvolvimento do presente trabalho pode ser divido em três

partes em virtude do objeto de estudo. A primeira, importante para a fixação das

premissas metodológicas, consiste na demonstração do direito como um fenômeno

comunicacional e está identificada nos dois primeiros capítulos. O inicial dedica

(18)

da linguagem que o homem tem acesso ao mundo físico. Nesse contexto deve-se

incluir o direito como objeto cultural que é, constituído essencialmente por

linguagem e, por meio dela, ele se realiza e se transforma. No terceiro capítulo, o

enfoque será o direito como um processo comunicacional. Em razão da sua essência

lingüística, o direito pode ser estudado como um grandioso processo de

comunicação.

A segunda parte da dissertação concentra energia sobre assuntos

relacionados ao âmbito tributário, demarcando, principalmente, as premissas para se

analisar o fenômeno do processo de positivação da compensação tributária. Com

isso, no capítulo quarto, o estudo abrangerá a fenomenologia da incidência da norma

jurídica e o percurso que deve percorrer para atingir os mais elevados níveis de

individualidade e concretude. Analisar-se-ão institutos como: processo de

positivação de normas; fontes do direito; competência tributária; e o procedimento de

produção de normas. Os capítulos quinto, sexto, sétimo e oitavo podem ser incluídos

também nessa etapa, pois versam, respectivamente, sobre a obrigação tributária; a

constituição do crédito tributário; a sua extinção e a formalização do débito do Fisco,

traçando as peculiaridades inerentes a cada eixo de positivação.

Delimitadas as premissas essenciais para o estudo específico da

compensação, a última parte do trabalho enfoca o processo de positivação dessa

modalidade de extinção da obrigação tributária. Assim, no capítulo nono se

estabelece uma teoria geral da compensação tributária para se estudar, em seguida,

separadamente, a compensação de ofício, a autocompensação e a compensação

judicial. O capítulo décimo dedica-se à compensação tributária realizada de ofício

pela autoridade administrativa. Em seguida, analisa-se o procedimento realizado

pelo próprio contribuinte para efetivar a extinção da obrigação tributária pela

(19)

2 LINGUAGEM E DIREITO

2.1 Realidade, conhecimento e linguagem

No começo do século XX, iniciou-se uma nova era filosófica. Tomando como

critério a importância dada pelos filósofos ao objeto de seus estudos, pode-se separar

a filosofia em fases: (i) a investigação do ser, dando maior relevo à ontologia dos

objetos; (ii) a filosofia da consciência, cujo enfoque era a reflexão sobre as

representações da razão; e (iii) a filosofia da linguagem10. Foi com o Giro Lingüístico

que os filósofos deixaram de lado questões relativas ao ser e à consciência e se

atinaram para a temática da linguagem. É o período da filosofia da linguagem como

um verdadeiro marco cultural de nossa época11, reconhecida como a terceira fase da

filosofia.

Passa-se, então, com a virada lingüística, a considerar a linguagem como

elemento essencial ao conhecimento e à realidade, e não mais um simples

instrumento para representar as coisas, conforme entendiam os filósofos dos

períodos anteriores.

Com a nova visão lingüística do mundo, não se fala mais em uma relação

sujeito-objeto de forma direta, em que as palavras tinham uma relação natural com as

coisas que representavam, como se previa na chamada Filosofia da Consciência, em

que a linguagem estava relacionada com a essência dos objetos12.

10 “De forma sintética pode dizer-se que a ‘filosofia primeira’ não é mais a investigação da ‘natureza’ ou da

‘essência’ das ‘coisas’ ou dos ‘entes’ (‘ontologia’), e também não a reflexão sobre as ‘representações’ ou os ‘conceitos’ da ‘consciência ou da ‘razão’ (‘teoria do conhecimento’), mas a reflexão sobre a significação ou o ‘sentido’ das expressões lingüísticas (‘análise da linguagem’)”. Karl Otto-Apel, Apud. CASTANHEIRA NEVES, O actual problema metodológico da interpretação jurídica, p. 117-8.

11Ibid. p. 117.

(20)

Afirma Eugenio Coseriu13:

Durante muitos séculos, o problema da linguagem foi apenas um problema secundário ou ocasional da filosofia: fez-se filosofia com

linguagem, mas nunca sobre a linguagem. E o problema da linguagem

– na medida em que chegou a ser proposto – foi encarado sobretudo como problema metodológico de um instrumento para o tratamento de outros problemas, e não como um problema filosófico em si mesmo.

Na atual época, a linguagem é vista como uma atividade criadora da

realidade. Torna-se “condição necessária para a comprovação da existência das

coisas”14. É somente por meio da linguagem que se tem acesso aos acontecimentos do

mundo físico. Manfredo Araújo de Oliveira noticia a linguagem como condição

necessária para a existência do mundo: “não existe mundo totalmente independente

da linguagem, ou seja, não existe mundo que não seja exprimível na linguagem”15.

Verifica-se, desse modo, a dualidade linguagem e mundo físico como dois conjuntos

distintos.

Para Vilém Flusser16, somente com as palavras atinge-se a realidade

ordenada. O mundo físico existe como um caos a ser organizado e compreendido

pelo ser humano. Tal empreitada é realizada pela linguagem. Conforme Eugenio

Coseriu17, “o mundo das coisas (ou “objetos”) está dado ao homem, mas só através

do mundo dos significados: através da configuração lingüística”. Isso autoriza a

dizer, com Flusser18, que o conhecimento, a realidade e a verdade são aspectos da

língua.

O termo realidade é utilizado de maneira ambígua, referindo-se à realidade

trazida pelas palavras e à realidade do mundo físico. Porém, segundo Vilém Flusser,

a realidade dos dados brutos consiste de palavras in statu nascendi19. Dito de outra

forma, o mundo físico, embora ainda não descrito em linguagem, está apto a ser e só

13O homem e sua linguagem, p. 45-6. (grifo do original). 14Ibid. p. 26.

15Reviravolta lingüístico-pragmática na filosofia contemporânea, p. 13. 16Língua e realidade, p. 41.

(21)

assim chegará ao nosso conhecimento. Para o filósofo tcheco-brasileiro20, os dados

brutos não seriam de fato realidade, e sim potencialidade.

É inegável que exista uma realidade mesmo quando não descrita por

linguagem. Apesar de nada se falar acerca dos dados do mundo físico, lá ele estará e

não deixará de existir. John Hospers também considera que os dados brutos existem

mesmo quando não descritos por uma linguagem: “Sem embargo, quando

aprendemos o significado das nuvens escuras, aprendemos fatos da natureza que

existiriam mesmo que não houvesse convenções humanas”21. O simples fato de dizer

“árvore” não significa que uma brotou na Mata Atlântica ou na Amazônia, mas

deve-se ter consciência de que as “árvores” são conhecidas e compreendidas por meio da

linguagem. O fato bruto continua existindo mesmo sem uma linguagem que o

descreva, porém somente se torna acessível ao ser humano pela via das palavras.

Tárek Moysés Moussallem, em posição que aparenta destoar, afirma que a

realidade é instaurada pela linguagem, e não criada22. Acredita-se que esse autor, ao

introduzir essa distinção, quis ressaltar que a realidade do mundo físico não deve ser

confundida com a realidade criada pela linguagem, por serem dois conjuntos

distintos, inconfundíveis.

Parece que não há uma distinção tão grande entre a afirmação de Tárek

Moussallem e a de Vilém Flusser. Apenas o autor capixaba foi criterioso, no entanto a

conclusão de ambos se aproxima: os acontecimentos do mundo físico somente

atingem o ser humano por meio de linguagem. Isso porque Tárek Moussallem não

nega que é por meio de linguagem que o sujeito tem acesso à realidade: “Ao

descrever eventos ou coisas não se criam fatos ou coisas. Mas claro está que, para se

ter acesso aos fatos ou às coisas, necessária se faz a aquisição de linguagem a eles

referente”23. De forma inversa, sem linguagem não há acesso aos acontecimentos do

20 Gustavo Bernardo KRAUSE, A filosofia da palavra, Revista de direito tributário, n. 97,p. 23.

21 Introducción al análisis filosófico, p. 15 (tradução livre). No original: “Sin embargo, cuando aprendemos el

significado de las nubes oscuras, aprendemos hechos de la naturaleza que existirían aunque no hubiese convenciones humanas”.

(22)

mundo bruto e é como se esses acontecimentos não existissem para o ser humano,

pois ainda não foram por ele apreendidos. São dados brutos que estão aguardando a

linguagem para ingressar no conhecimento humano; mera potencialidade, portanto.

Lenio Luis Streck24 enfatiza a necessidade da linguagem para a construção do

mundo:

A linguagem, então, é totalidade; é a abertura para o mundo; é, enfim, condição de possibilidade. Melhor dizendo, a linguagem, mais do

que condição de possibilidade, é constituinte e constituidora do saber, e, portanto, do nosso modo-de-ser-no-mundo, que implica as condições de possibilidade que temos para compreender e agir. Isto porque é pela linguagem e somente por ela que podemos ter mundo e chegar a esse mundo. Sem linguagem não há mundo enquanto mundo. Não há coisa alguma onde falte a palavra. Somente quando se encontra a palavra para uma coisa é que a coisa é uma coisa.

A importância que a linguagem tem para a realidade apreendida pelo

homem pode ser descrita por um exemplo. Até pouco tempo atrás, Plutão pertencia à

classe dos planetas. Hoje, ao se relacionarem os planetas, deve-se excluir Plutão. E

por quê? Simplesmente porque foram alterados os critérios que permitem classificar

os objetos como planetas. Nenhuma alteração teve a realidade do mundo físico, pois

a massa, a atmosfera e a órbita do ex-planeta continuam as mesmas, apenas a

linguagem que conota planeta é que foi modificada. Com a nova classificação, Plutão

passa a ser um “planeta-anão”.

Só se conhece Plutão em razão da linguagem. O conhecimento tem uma

função: ordenar o mundo caótico na tentativa de melhor compreendê-lo com o

escopo de dominá-lo e modificá-lo. O ser humano, ao nascer, é jogado em um

ambiente e, a partir de então, passa a ajustá-lo. “Dando sentido às coisas que o

cercam, interpretando-as, o ser humano pode viver (ou, no mínimo, sobreviver).

Quer dizer, o ser humano reconhece as coisas, ‘entende-as’, sabe valer-se delas, para

seu benefício”25. Visando a essa finalidade, o sujeito cognoscente apreende um objeto

por meio de atos de percepção e de julgamento para, então, emitir enunciados sobre

24Hermenêutica jurídica e(m) crise, p. 196. (grifo do original).

(23)

suas conclusões.

É por meio da linguagem que se atinge o conhecimento. É o que afirma

Lourival Vilanova: “O conhecimento ocorre num universo-de-linguagem e dentro de

uma comunidade-do-discurso”26. O conhecimento somente é fixado e transmitido

por meio da linguagem27.

Paulo de Barros Carvalho, tratando do “mundo da vida”, ressalta a relação

entre linguagem, realidade e conhecimento:

O que sucede neste domínio e não é recolhido pela linguagem social não ingressa no plano por nós chamado de ‘realidade’, e, ao mesmo tempo, tudo que dele faz parte encontra sua forma de expressão nas organizações lingüísticas com que nos comunicamos; exatamente porque todo o conhecimento é redutor de dificuldades, reduzir as complexidades do objeto da experiência é uma necessidade inafastável para se obter o próprio conhecimento28.

Como é possível notar, o conhecimento é uma relação que ocorre dentro de

um processo comunicacional, entre o sujeito cognoscente, emissor de enunciados

sobre o objeto em direção a outro sujeito, que é o destinatário29. Isso demonstra que o

homem habita um mundo que só existe para ele em virtude da linguagem. Eis a

linguagem constituindo a realidade: “o mundo-realidade sem a linguagem que de

qualquer modo o diga ou se lhe refira (que dele ou para ele diga algo) seria um

acervo absolutamente extensivo de uma indeterminação irracional”30.

Importante abrir um parêntese para distinguir linguagem, língua e fala. Esses

três termos foram abstratamente correlacionados por Roland Barthes da seguinte

forma: “A Língua é então, praticamente, a linguagem menos a Fala”31. A separação

entre língua e fala como elementos da linguagem surgiu com Ferdinand de

Saussure32. A língua pode ser definida como um conjunto de signos que exprimem

26As estruturas lógicas e o sistema do direito positivo, p. 38.

27 Paulo de Barros CARVALHO, IPI – Comentários sobre as regras gerais de interpretação da Tabela NBM/SH

(TIPI/TAB), Revista dialética de direito tributário, n. 12, p. 42.

28Direito tributário, linguagem e método, p. 07.

29 Tárek Moysés MOUSSALLEM, Fontes do direito tributário, p. 29.

30 A. CASTANHEIRA NEVES, O actual problema metodológico da interpretação jurídica, p. 249. 31Elementos de semiologia, p. 17.

(24)

idéias33, em vigor numa determinada comunidade social, cuja principal finalidade é

servir como instrumento de comunicação entre seus membros34.

A fala é um ato individual feito por seleções e combinações elaboradas a

partir de um repertório lexical comum entre os falantes35. Enquanto a fala é inerente a

cada indivíduo de forma isolada, a língua só tem sentido quando vista de forma

social, coletiva, independente do indivíduo.

Assim, a palavra linguagem é mais abrangente, e seu significado consiste na

capacidade de o ser humano utilizar-se da língua para se comunicar. Diante da

dicotomia apresentada por Saussure entre língua e fala como formas de estudo da

linguagem, percebe-se a confusão entre linguagem e fala. Permanecerá, porém, neste

trabalho, o uso do termo linguagem, por razões metodológicas e por sua maior

utilização na doutrina.

2.2 O Direito e a virada lingüística

Hodiernamente, portanto, surge uma nova fase filosófica em que a

linguagem alcançou o status de elemento essencial do conhecimento. É pela

linguagem que se compreende a realidade.

O direito não pode ficar alheio a essa reviravolta lingüística, pois somente é

apreendido por meio da linguagem; e sem ela não existe. A importância da

linguagem para o mundo do direito já havia sido percebida por Alfredo Augusto

Becker: “A linguagem intervem (sic) necessariamente para transmitir o conhecimento

das regras de conduta – regra jurídica – na vida social, porque, em última análise, as

referidas regras de conduta só poderão ser transmitidas através de palavras e

33Curso de lingüística geral, p. 24.

34 É importante ressaltar que os seres humanos se comunicam por meio de inúmeros códigos, não apenas pela

língua. A mímica, o vestuário, a culinária, a música, a arquitetura e até mesmo o silêncio são outras formas que se prestam para fins comunicacionais.

(25)

frases”36.

Gregorio Robles sustenta que a essência do direito é ser texto. “O direito

surge com o homem, como expressão de sua capacidade de configurar a vida em

sociedade. Aparece em sociedade; é um fenômeno social. Mas sua essência consiste

em palavras, sem as quais não é nada”37. Afirma que a única forma de o direito se

expressar é pela linguagem38.

Dessa forma, pode-se perceber que, para construir a realidade jurídica, é

necessária uma linguagem jurídica que a instaure. Conforme ensina Paulo de Barros

Carvalho39:

(...) da mesma forma que a linguagem natural constitui nosso mundo circundante, a que chamamos de realidade, a linguagem do direito cria o domínio do jurídico, isto é, o campo material das condutas intersubjetivas, dentro do qual nascem, vivem e morrem as relações disciplinadas pelo direito.

Sem uma linguagem jurídica específica que introduza no sistema do direito

os acontecimentos sociais, não se pode falar em conseqüências jurídicas desses

eventos. Poderão ter conseqüências sociais, morais e até mesmo religiosas, mas

distantes de serem jurídicas. Tome-se o casamento como exemplo. Num primeiro

momento, conta-se a amigos e familiares que uma pessoa se casou. Nada de jurídico

nesse relato aconteceu. Há apenas conseqüências sociais. Indo-se à igreja,

confirma-se, nos documentos sacros, que em determinado dia e hora houve uma cerimônia

religiosa de casamento naquele templo, gerando aí conseqüências religiosas. Os

efeitos jurídicos somente surgirão com o efetivo relato desse evento em linguagem

jurídica. É por meio da certidão de casamento registrada em cartório que os efeitos

jurídicos para esse casal surgirão.

O direito, portanto, cria suas realidades por meio da linguagem jurídica. É

somente mediante a formulação dessa linguagem que direitos, deveres e qualidades

36Teoria geral do direito tributário, p. 118.

37O direito como texto: quatro estudos de teoria comunicacional do direito, p. 48. 38Teoría del derecho: fundamentos de teoría comunicacional del derecho, p. 67.

39 Paulo de Barros CARVALHO, IPI – Comentários sobre as regras gerais de interpretação da Tabela NBM/SH

(26)

jurídicas existirão40. Os fenômenos jurídicos somente aparecem no mundo lingüístico

do direito. Fato jurídico, norma jurídica, relação jurídica, fontes do direito, coisa

julgada são institutos jurídicos constituídos pela linguagem do direito.

Alerta-se que não há a pretensão de reduzir o direito à linguagem, ao texto,

mas sim alertar que o jurista, ao interpretá-lo, não pode deixar de considerá-lo como

essencialmente formulado mediante linguagem. O direito manifesta-se por uma

linguagem que lhe sirva de veículo de expressão41.

Com essa reviravolta lingüística “salienta-se a importância fundamental da

linguagem para a ciência do direito, pois esta deve construir seu objeto sobre dados

que são expressos pela própria linguagem, ou seja, a linguagem da ciência jurídica

fala sobre algo que já é linguagem anteriormente a esta fala”42.

Posto isso, verifica-se que tanto o direito positivo quanto a ciência do direito

são fenômenos lingüísticos, “cada qual portador de um tipo de organização lógica e

de funções semânticas e pragmáticas diversas”43. O direito positivo é um discurso

lingüístico prescritivo, composto por normas jurídicas válidas num dado espaço

territorial, cuja finalidade é comunicar aos seus destinatários padrões de

comportamentos sociais. Por sua vez, a ciência do direito é formada por um estrato

de linguagem descritiva que se destina a estudar o direito positivo.

Tomado o plano da hierarquia das linguagens, sempre que existir uma

linguagem, encontra-se a opção de emitir outro enunciado lingüístico discorrendo

sobre ela. Nesse caso, podem-se reconhecer nos níveis de linguagem a

linguagem-objeto, que é aquela da qual se fala, e a metalinguagem, utilizada para se falar da

linguagem-objeto. Assim, a ciência do direito é uma metalinguagem de outra, o

direito positivo, ou seja, a linguagem-objeto.

O direito positivo, portanto, consiste nas normas válidas cuja finalidade é

prescrever condutas intersubjetivas. Já a ciência do direito deve descrever as

40 Karl OLIVECRONA, Linguagem jurídica e realidade, p. 62. 41 Paulo de Barros CARVALHO, Curso de direito tributário, p. 109. 42 Luis Alberto WARAT, O direito e sua linguagem, p. 38.

(27)

construções do direito positivo, ordenando-o. Verificam-se profundas diferenças

entre o direito positivo e a ciência do direito, que podem ser sistematizadas da

seguinte forma:

(i) quanto ao tipo de linguagem: o direito positivo se vale da linguagem

prescritiva, e a ciência do direito usa a linguagem descritiva;

(ii) quanto à hierarquia das linguagens: o direito positivo é linguagem-objeto,

e a ciência do direito é metalinguagem;

(iii) quanto à lógica: ao direito positivo corresponde a lógica deôntica,

enquanto a ciência do direito tem a lógica apofântica;

(iv) quanto à valência da linguagem: ao direito positivo aplicam-se os valores

válido ou não-válido, e para a ciência do direito os valores são verdadeiro ou falso44.

Conclui-se que a linguagem é condição necessária para o direito, pois sem

linguagem não existe o direito positivo; sem linguagem não há como construir a

realidade jurídica. É, portanto, com base nesta premissa (de que o mundo jurídico é

construído num universo de linguagem) que o presente trabalho será desenvolvido.

2.3 A realidade social e a realidade jurídica

O Direito Positivo existe para regular as condutas humanas intersubjetivas.

Para isso, seu escopo é a realidade social. Nos dizeres de Lourival Vilanova45:

“altera-se o mundo social mediante a linguagem das normas, uma clas“altera-se da qual é a

linguagem das normas do direito”. O direito, por meio de sua linguagem, visa definir

os comportamentos sociais seguindo determinada ideologia.

Retornando à hierarquia das linguagens, o direito positivo seria uma

metalinguagem, ao passo que a linguagem da realidade social seria a

linguagem-objeto. Assim, o objeto da linguagem do direito positivo são as condutas presentes na

(28)

realidade social. O objeto é sempre mais amplo do que se pode descrever e nunca

poderá ser esgotado pela linguagem. Lourival Vilanova, tratando do conceito

fundamental de uma ciência, ensina que não se consegue captar toda a

multiplicidade do real:

A realidade é sempre mais rica em determinação que seu correspondente conceito, e este mais pobre que a intuição dessa realidade. Da multiplicidade de coisas, fenômenos, propriedades, atributos, relações, o conceito escolhe alguns. Tem ele uma função seletiva em face do real46.

Ressalta-se que, para o saudoso professor pernambucano, o conhecimento

por meio de conceitos requer linguagem. “Mediante a linguagem fixam-se as

significações conceptuais e se comunica o conhecimento”47. Com isso, afirma-se que a

linguagem é redutora do seu objeto. Transportando para o mundo do direito, a

linguagem do direito positivo separa, no mundo social, o jurídico do não-jurídico48.

Em outras palavras, a realidade social é muito mais ampla do que a realidade

jurídica.

Aqui há dois conjuntos distintos: o da realidade social e o da realidade

jurídica. Essa diferença já havia sido percebida por Hans Kelsen, que separou o

mundo do ser do dever-ser49. O direito prescreve uma conduta que deseja ver

realizada, porém o sujeito irá agir de acordo com sua vontade, obedecendo ou não ao

preceito legal.

Ao criar as normas jurídicas, o legislador escolhe acontecimentos do mundo

real e os juridiciza, fazendo-os adentrarem no campo do direito: “o fato se torna fato

jurídico porque ingressa no universo do direito através da porta aberta que é a

hipótese”50. A linguagem jurídica traduz os acontecimentos do mundo social,

imputando-lhes efeitos jurídicos. Todavia, deve-se alertar que essa tradução não é

perfeita, ou seja, o fato social não é idêntico ao fato jurídico, mesmo que tenha

46 Sobre o conceito de direito, Escritos jurídicos e filosóficos, p. 6-7.

47 Lourival VILANOVA, As estruturas lógicas e o sistema do direito positivo, p. 37-8.

48 Paulo de Barros CARVALHO, Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência, p. 13. 49Teoria pura do direito, p. 6.

(29)

servido de suporte para a criação da norma jurídica.

Para Vilém Flusser, não existe uma perfeita tradução entre idiomas, pois

cada língua possui uma personalidade própria, proporcionando uma realidade

específica51. Sendo assim, a tradução somente se daria de forma aproximada, uma

vez que a realidade criada por duas línguas distintas não é a mesma52. Roman

Jakobson aponta um interessante exemplo que serve para mostrar a dualidade das

realidades criada por línguas distintas. A palavra “pecado” em russo é do gênero

masculino e em alemão pertence ao feminino. Diante dessa diferença de gêneros da

palavra “pecado”, causava estranheza ao pintor russo Repin ver o “pecado”

representado por uma mulher pelos artistas alemães53, pois, para a realidade russa,

“pecado” era masculino. Porém, bastava conhecer que a realidade dos alemães para

“pecado” pertencia ao conjunto dos objetos femininos.

O direito positivo, ao traduzir a realidade social, o faz de forma aproximada

e cria suas próprias realidades. O fato social “morte”, ao ingressar no mundo do

direito, é traduzido por “homicídio doloso”, “homicídio culposo”, “sucessão”,

“ausência”54, etc. Dessa forma, o direito positivo mantém uma ampla conversação55

com a linguagem social, permitindo o seu ingresso no mundo do direito por meio

das normas jurídicas.

51Língua e realidade, p. 61.

52 Segundo Benjamin LEE WHORF, “Os fatos são diferentes para pessoas cuja formação lingüística lhes fornece

uma formulação diferente para expressar tais fatos.” Apud Roman JAKOBSON, Lingüística e comunicação, p. 66.

Gustavo Bernardo KRAUSE, baseado em Vilém FLUSSER, afirma que “a cada estrutura de cada língua individual corresponde um cosmos significativo diferente.” A filosofia da palavra, Revista de direito tributário, n. 97, p. 26.

53Lingüística e comunicação, p. 71.

54 Para Gregório ROBLES, “Sempre existirá, na realidade natural, o matar, mas matar não é o mesmo que cometer

homicídio. Para cometer homicídio é necessário cumprir os requisitos exigidos pela norma: capacidade, ação com

determinadas características etc.” O direito como texto: quatro estudos de teoria comunicacional do direito, p. 13

(grifos do original).

55 A conversação, segundo Vilém FLUSSER, é constituída por redes formadas por intelectos que irradiam e

(30)

2.4 O direito como um sistema autopoiético

Entende-se por sistema autopoiético aquele que utiliza seus próprios

elementos para produzir novos elementos. O sistema é que constitui sua organização

e reprodução específica. A teoria dos sistemas desenvolvida por Niklas Luhmann

pressupõe uma diferenciação funcional dos sistemas sociais. Cada sistema possui

uma função que não pode ser realizada por outro sistema. Por isso, afirma-se que o

sistema é fechado, somente reagindo aos estímulos externos de acordo com suas

operações internas. Daí, segundo Raffaele de Giorgi, resulta a auto-referência e a

autopoiese do sistema56.

Será autopoiético o sistema que possui suas estruturas produzidas por

operações internas57. Assim, para elaborar novos elementos em seu interior, um

sistema até pode receber influência de outros, já que é aberto cognitivamente, mas

somente as reproduz conforme suas operações próprias. O ambiente não pode operar

dentro do sistema, apenas provoca irritações, que serão absorvidas de acordo com as

suas estruturas específicas.

O direito pode ser visto como um sistema autopoiético em que “cada

operação do sistema jurídico parte da operação anterior e cria condições para a

operação seguinte, todas elas encerradas no mesmo código recursivo: a distinção

direito/não-direito”58.

O direito regula sua própria criação por meio das normas jurídicas que

prescrevem como novas normas devem ingressar no sistema jurídico. É o que

descreve Lourival Vilanova: “Cada norma provém de outra norma e cada norma dá

lugar, ao se aplicar à realidade, a outra norma. O método de construção de

proposições normativas está estipulado por outras normas”. Em seguida, arremata:

“As normas que estatuem como criar outras normas, isto é, as normas-de-normas, ou

56 Luhmann e a teoria jurídica dos anos 70, in Celso Fernandes CAMPILONGO, O direito na sociedade complexa, p.

191.

57 Niklas LUHMANN, El derecho de la sociedad, p. 118.

(31)

proposições-de-proposições, não são regras sintáticas fora do sistema. Estão no

interior dele”59.

Pode-se verificar, portanto, que o direito cria as normas jurídicas que irão

participar na produção de novas normas jurídicas. São normas que tratam do

procedimento para introduzir novas normas no sistema. Por isso, é um sistema

autopoiético.

(32)

3 O DIREITO COMO UM FENÔMENO COMUCACIONAL

3.1 Um modelo comunicacional do Direito

Consoante se demonstrou, o direito necessita da linguagem jurídica para

construir suas realidades; somente surgem os efeitos jurídicos com a linguagem eleita

pelo sistema do direito como competente. Sem essa linguagem não há conseqüências

jurídicas, fatos jurídicos, normas jurídicas.

John Hospers elenca a linguagem como o principal instrumento da

comunicação60. A comunicação entre os homens se dá por meio de uma linguagem.

Gregorio Robles, ao destacar a linguagem como elemento essencial para a existência

da sociedade, afirma que “toda ação coletiva ou ação em comum (e ação desse tipo é

o mero conviver) precisa da existência de um sistema de signos (isso é a linguagem)

que assegure a comunicação dos seus membros”61. Em outras palavras, a sociedade é

um sistema de comunicação entre seus membros. Para Lucia Santaella, comunicação

significa “a transmissão de qualquer influência de uma parte de um sistema vivo ou

maquinal para uma outra parte, de modo a produzir mudança. O que é transmitido

para produzir influência são mensagens, de modo que a comunicação está

basicamente na capacidade para gerar e consumir mensagens”62.

Como o direito somente se expressa por meio de linguagem, ele pode ser

estudado como um sistema de comunicação em que a linguagem do direito positivo

é usada para comunicar à sociedade as condutas a serem seguidas por meio de

mensagens. Essa forma de pensar segue a doutrina de Paulo de Barros Carvalho,

para quem “o direito se realiza no contexto de um grandioso processo

60Introducción al análisis filosófico, p. 13.

61Teoría del derecho: fundamentos de teoría comunicacional del derecho, p. 65. (grifo do original – tradução livre).

No original: “toda acción colectiva o acción en común (y acción de este tipo es el mero convivir) precisa de la existencia de un sistema de signos (eso es el lenguaje) que asegure la comunicación entre sus miembros”.

(33)

comunicacional”63.

Gregorio Robles toma o direito como um fato comunicacional, de acordo com

a Teoria Comunicacional do Direito. Para o autor espanhol, o direito é uma forma de

comunicação social, cuja finalidade consiste na organização da sociedade por meio

da expressão lingüística dos conteúdos normativos64. Conclui que “o direito é um

sistema de comunicação, cujas unidades de mensagem são as normas. Trata-se de um

sistema de comunicação prescritivo, ordenador, razão pela qual suas unidades

elementares (as normas) são expressões lingüísticas prescritivas”65.

Na teoria dos sistemas sociais apresentada por Niklas Luhmann, o critério

que diferencia a sociedade do ambiente é a comunicação66. Nessa perspectiva, há

duas classes distintas: o sistema social, que inclui todas as comunicações; e o

ambiente, desprovido de comunicação.

Dentro da classe do sistema social é possível ainda visualizar vários

subsistemas: o econômico, o religioso, o político, o jurídico, cada um portador de um

tipo de comunicação específica. A comunicação gerada pelo sistema do direito não se

confunde com aquela produzida por qualquer outro dos subsistemas.

O direito possui, pois, uma forma própria de comunicação que o distingue

dos demais subsistemas sociais. E essa comunicação se dá por meio das normas

jurídicas. Conforme assinala Celso Campilongo, “na rede de comunicações da

sociedade, o direito se especializa na produção de um tipo particular de comunicação

que procura garantir expectativas de comportamento assentadas em normas

jurídicas”67.

63Curso de direito tributário, p. 438.

64O direito como texto: quatro estudos de teoria comunicacional do direito, p. 78. 65Ibid. p. 87.

(34)

Definido o direito como um sistema comunicacional, com seu tipo específico

de comunicação, resta saber como ocorreria esse fenômeno. Para tanto, primeiro

serão descritos os fatores presentes nos processos de comunicação, segundo a teoria

de Roman Jakobson:

O remetente envia uma mensagem ao destinatário. Para ser eficaz, a

mensagem requer um contexto a que se refere (ou ‘referente’, em outra

nomenclatura algo ambígua), apreensível pelo destinatário, e que seja verbal ou suscetível de verbalização; um código total ou parcialmente

comum ao remetente e ao destinatário (ou, em outras palavras, ao codificador e ao decodificador da mensagem); e, finalmente, um

contacto, um canal físico e uma conexão psicológica entre o remetente

e o destinatário que os capacite a ambos a entrarem e permanecerem em comunicação68.

É fácil visualizar a presença dos seis fatores de que necessita o processo de

comunicação: remetente, contexto, mensagem, canal físico, código e destinatário, que

podem ser assim descritos:

(a) emissor: aquele que produz e remete a mensagem;

(b) contexto: a situação a que a mensagem se refere e as circunstâncias de sua

transmissão;

(c) mensagem: é o objeto, o conteúdo da comunicação;

(d) canal físico: a via de circulação das mensagens, que é o ar na comunicação

verbal e o papel na comunicação escrita;

(e) código: é o conjunto de símbolos e suas regras de combinação;

(f) destinatário: aquele para quem a mensagem é enviada.

Ao se comunicar, o remetente tem a intenção de transmitir para o receptor

seus interesses, pedidos, perguntas, informações, exigências ou emoções69. A partir

68 Roman JAKOBSON, Lingüística e comunicação, p. 123. (grifo do original). Deve-se elucidar que o modelo

comunicacional jakobsoniano é diverso daquele apresentado por Luhmann. Jakobson trata a comunicação em conformidade com os modelos lineares, em que se leva a mensagem de um emissor para um receptor, porém com a extração das funções da linguagem conforme a referencialidade da mensagem. Tal modelo recebe o nome de

lingüístico-formal por Lucia SANTAELLA, Comunicação e pesquisa, p. 55. Já a teoria de Luhmann se ampara nos sistemas autopoiéticos, em que a comunicação é compreendida como um sistema fechado completo, capaz de produzir os componentes a partir da própria comunicação. Esse modelo, apesar de antagônico aos modelos dominantes das ciências cognitivas, é incluído, por SANTAELLA como um modelo cognitivo. Comunicação e pesquisa, p. 61.

(35)

daí, mediante um processo de seleção e combinação, o remetente formula as

mensagens que são transmitidas para o destinatário. “Falar implica a seleção de

certas entidades lingüísticas e sua combinação em unidades lingüísticas de mais alto

grau de complexidade”70. Assim, o legislador, diante da sua intenção de receber certa

quantia daquele que aufere renda, seleciona as palavras mais adequadas para

transmitir a mensagem e as combina de forma que seja possível ao receptor

compreendê-la. A próxima etapa consiste na transmissão da mensagem e na sua

recepção pelo destinatário, para que se possa entender o seu conteúdo conforme o

contexto em que foi produzida. Note-se, portanto, que, para a efetiva realização do

processo comunicacional, os fatores descritos devem estar presentes. A existência de

algum problema em qualquer um desses elementos gera um ruído71 na transmissão

da informação.

3.2 As normas jurídicas como mensagem

Utilizando o modelo acima descrito como paradigma, passa-se a aplicá-lo ao

direito. Inicia-se tal empreitada com a mensagem. A mensagem do direito é

prescrever condutas humanas intersubjetivas com o escopo de organizar a vida em

sociedade. Uma lei de trânsito que comunica “é proibido estacionar” tem como

finalidade direcionar os comportamentos para não estacionar em determinado local.

Sendo assim, as unidades de mensagem do direito são as normas jurídicas72.

Por meio delas o legislador se comunica com a sociedade, estipulando quais

comportamentos ele deseja que sejam seguidos. No entanto, para que uma norma

jurídica seja considerada como mensagem, tem de possuir um mínimo de sentido,

70 Roman JAKOBSON, Lingüística e comunicação, p. 37.

71 Décio PIGNATARI define ruído como todas as fontes de erros de um sistema de comunicação. Informação

linguagem comunicação, p. 22. Isaac EPSTEIN denomina ruído como todo fenômeno produzido numa comunicação

que não pertence à mensagem intencionalmente emitida. É uma forma de perturbar a fiel recepção da mensagem, modificando-a. Teoria da informação, p. 21.

(36)

caso contrário jamais poderá ser compreendida pelo destinatário. É, portanto, como

“unidade irredutível de manifestação do deôntico”73 que a norma jurídica aparece

como mensagem no processo comunicacional do direito.

Aqui é necessário ressaltar a distinção feita por Paulo de Barros Carvalho

entre enunciado prescritivo e norma jurídica. Enunciado prescritivo é o resultado da

atividade de enunciação74 do legislador. A norma jurídica é composta por um

antecedente e um conseqüente, na forma de juízo condicional, ligando, pelo

conectivo “dever-ser”, um efeito jurídico à realização de um fato previsto no

antecedente75. Desse modo, não há como confundir o texto de lei com a norma

jurídica.

Por conseguinte, qualquer artigo de lei é um enunciado prescritivo, todavia

nem todo enunciado prescritivo é uma norma jurídica. Para ser norma jurídica em

sentido estrito, necessita-se de um mínimo de significação deôntica na estrutura de

um juízo condicional. O simples enunciado matar alguém não atinge o objetivo de

transmitir uma mensagem, permitindo, proibindo ou obrigando uma conduta. Há aí

apenas o antecedente de uma norma jurídica que se completará com a inclusão do

conseqüente: pena de reclusão de seis a vinte anos. Por isso, muitas vezes, para se

construir uma norma jurídica, não basta um único artigo ou texto de lei.

Apenas será mensagem a norma jurídica cujos enunciados estejam

estruturados na forma de juízos hipotéticos condicionais, regidos pelo princípio da

imputação, em que o modal deôntico “dever-ser” conecta uma conseqüência jurídica

ao fato descrito na hipótese. Conforme Clarice Araujo, somente com esse “mínimo de

significação é que o sintagma alça o status de informação, assim entendida a

inteligibilidade da mensagem jurídica que veicula programação de conduta,

comunicando um dever-ser”76.

73 Paulo de Barros CARVALHO, Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência, p. 20.

74 A diferença entre enunciação e enunciado decorre da dualidade processo e produto. A enunciação é o processo que

resulta no enunciado, este o produto do ato de produção. Confira o item 4.4 do Capítulo 4, para maiores elucidações sobre a distinção.

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