• Nenhum resultado encontrado

FORMAÇÃO DO PEDAGOGO BILÍNGUE NAS UNIVERSIDADES FEDERAIS DO ESTADO DE SÃO PAULO: problematizações acerca da aprendizagem de Libras no Ensino Superior

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "FORMAÇÃO DO PEDAGOGO BILÍNGUE NAS UNIVERSIDADES FEDERAIS DO ESTADO DE SÃO PAULO: problematizações acerca da aprendizagem de Libras no Ensino Superior"

Copied!
20
0
0

Texto

(1)

FORMAÇÃO DO PEDAGOGO BILÍNGUE NAS UNIVERSIDADES FEDERAIS DO ESTADO DE SÃO PAULO: problematizações acerca da aprendizagem de Libras no

Ensino Superior

Bianca Salles Conceição1 Andressa Lopes2 Suelen Priscila Macedo Farias3 Resumo

A história do movimento surdo é marcada por diversas lutas até a conquista do direito à Libras como disciplina obrigatória nos cursos de licenciaturas da Universidades do país. Coloca-se como necessário, portanto, verificar como está sendo organizado o ensino desta língua para os futuros pedagogos que possivelmente, ao longo de suas carreiras, entrarão em contato com o alunado surdo. Por isso, o presente artigo tem como objetivo problematizar a formação do pedagogo com base no que é determinado pelo Decreto 5.626/05 em relação à formação de professores bilíngues Libras/Português nos anos iniciais. Trata-se de uma pesquisa documental qualitativa descritiva. Foram selecionadas duas Universidades Federais do Estado de São Paulo e coletados os planos de ensino das disciplinas de Libras. Verificou-se que a carga horária destinada a essas disciplinas é insuficiente para que Verificou-sejam contemplados os aspectos de constituição da língua na formação do pedagogo bilíngue e que não existe uma padronização das disciplinas. Além disso, constata-se a existência de uma formação que não contempla o que fora determinado legalmente, tornando restrito aos professores o conhecimento necessário e suficiente para que conheçam as particularidades da surdez para lecionar diretamente por meio da Libras. Conclui-se, portanto, que o processo de inclusão ainda tem sido pensado e organizado de modo a promover a inserção de alunos surdos em contextos de classes predominantemente ouvintes, sem haver a preocupação com o processo formativo docente.

Palavras-chave: Formação de professores. Educação bilíngue. Libras. Surdez. Introdução

1 Doutoranda em Educação Especial (PPGEES/UFSCar). Graduanda em Tradução e Interpretação de Libras/

Língua Portuguesa (TILSP/UFSCar). Mestra em Educação Especial (PPGEES/UFSCar). Licenciada em Pedagogia (UFSCar). E-mail: bianca.csalles@gmail.com

2 Doutoranda em Educação Especial (PPGEES/UFSCar). Mestra em Educação Especial (PPGEES/UFSCar).

Licenciada em Pedagogia (FFCLRP/USP). E-mail: andressa_lopesl@hotmail.com

3 Mestra em Educação Especial (PPGEES/UFSCar). Especialista em Análise do Comportamento Aplicada a

Educação de Pessoas com Transtorno do Espectro Autista e com Atraso do Desenvolvimento – (LAHMIEi/UFSCAR). Especialista em Didática e Metodologia do Ensino Superior (UNIMONTES). Graduada em Psicologia (FIPMoc). E-mail: suelen_psicologia@yahoo.com.br

(2)

O objetivo deste trabalho é problematizar a formação do pedagogo se visa atender a demanda estabelecida pelo Decreto 5.626/05 em relação à formação de professores bilíngues Libras/Português nos anos iniciais. Para isso, é necessário fazermos alusão ao percurso que permeou as resistências surdas (MARTINS, 2008a) e que culminaram na criação do Decreto 5.626/05, que regulamenta que todas os cursos de fonoaudiologia e licenciaturas tenham a Língua Brasileira de Sinais (Libras) como disciplina obrigatória em seus currículos acadêmicos.

A história dos surdos vem produzindo inúmeras práticas enviesadas por diversas concepções sobre esse sujeito, sua linguagem, língua e formas de conceber sua relação corporal com a sociedade. Esse percurso de resistência começou há séculos atrás e foi grandemente marcado pela presença da esfera religiosa e social até ganhar espaço nas salas de aulas – mesmo que primeiramente, com o ensino oralista. Assim, tinha-se uma filosofia de ensino da fala oral considerada como primordial e obrigatória (LACERDA, 1998). Posteriormente a isso, como opção pelo fracasso nítido do oralismo dos surdos nas instituições escolares, surgiu a comunicação total, na qual os gestos e a fala oral eram levados em consideração para comunicação entre professor e aluno, porém, sempre salientando o produto final: o aprendizado do Português oral, no caso do Brasil (MARTINS; DINIZ, 2017). Podemos dizer que essa prática escolar era mais um método que abarcava técnicas variadas do que uma abordagem educacional com uma concepção de sujeito e linguagem fortemente empregada e, embora tenha trazido espaço para a gestualidade, ou seja, para a língua de sinais, fazia-se uso dela como uma tecnologia para a oralização e não como língua de instrução efetivamente.

Somente após muita lutas, conflitos, discriminações e marginalização desses sujeitos, os surdos conseguiram se valer dos direitos hoje conquistados, como, por exemplo, o reconhecimento, pela Lei 10.436/02 da Libras no Brasil, como meio legal de comunicação e expressão das comunidades surdas (posteriormente regulamentada por meio do Decreto 5.626/05), como também a grande vitória do bilinguismo em sala de aula, no qual se prevê a Libras como língua de instrução, ou primeira língua, e o português na modalidade escrita como adicional.

Nessa perspectiva, no que compete à base educacional bilíngue, um dos documentos mais relevantes para os surdos, o Decreto 5.626, afirma que:

Art. 14. As instituições federais de ensino devem garantir, obrigatoriamente, às pessoas surdas acesso à comunicação, à informação e à educação nos processos seletivos, nas atividades e nos conteúdos curriculares desenvolvidos em todos os

(3)

níveis, etapas e modalidades de educação, desde a educação infantil até à superior (BRASIL, 2005, p. 3).

Dessa forma, para chegarmos ao sistema de educação bilíngue que consiste no ensino baseado pela língua de sinais como primeira língua e a língua da comunidade ouvinte como segunda – na modalidade escrita, foi preciso muitas lutas para a valorização da importância do desenvolvimento da Libras no surdo desde criança e para a quebra de paradigmas criados sobre esta língua. Foi necessária a produção de trabalhos acadêmicos como o de Stoke em 1969 nos Estados Unidos evidenciando que a língua de sinais americana (ASL) tinha em si todos os aspectos gramaticais de uma língua para que só assim sua disseminação no Brasil pudesse ser realizada e a história educacional pudesse ser narrada de outro modo. Além disso, no que se diz respeito a essa relação criança x família é necessário salientar que 95% das crianças surdas são filhas de pais ouvintes, sendo que o primeiro contato com a Libras é feito, na maioria dos casos, a partir do ambiente escolar (RODRIGUERO; YAEGASHI, 2013).

Em suma, a educação bilíngue surge em um contexto de ganhos devido aos embates travados pelas comunidades surdas que passaram por todo um processo de escolarização voltada às práticas educacionais pensadas para ouvintes, com estratégias de oralização fortemente empregada em métodos pedagógicos. Não podemos afirmar que essas práticas oralistas foram banidas das salas de aula, pois existem duas concepções de se enxergar o sujeito surdo na sociedade. Uma delas parte da concepção clínica, na qual o indivíduo é concebido como deficiente auditivo baseado na quantidade de decibéis que escuta, sendo necessário o reparo que é realizado por meio do uso de aparelhos auditivos, implantes cocleares e sessões de oralização (CONCEIÇÃO; MARTINS, 2019). Já o segundo consiste em uma perspectiva social, chamada pelos estudos na área da surdez como “socioantropológica” (SKLIAR, 2001). Nessa concepção, a surdez é tomada pela diferença linguística, reiterando-se o uso da Libras para que os indivíduos se comuniquem com o mundo. Diante disso, destaca-se que essas concepções, a clínica e a socioantropológica, se imbricam nas malharias sociais se espalhando por diversas instituições, inclusive as escolares (CONCEIÇÃO; MARTINS, 2019).

Diante das dificuldades e inconsistências desses dois modelos educacionais, as contribuições advindas das pesquisas acadêmicas promoveram significativas discussões em torno de uma proposta de educação bilíngue, conhecida também como “bilinguismo na educação de surdos” (LACERDA, 1998; SOARES, 1999). No Brasil, a abordagem ficou conhecida como uma proposta que engloba o ensino e aprendizagem dos alunos surdos com

(4)

base primeiramente no desenvolvimento da Língua Brasileira de Sinais (Libras) reconhecida como primeira língua e posteriormente a Língua Portuguesa (LP) em sua forma escrita. Para tanto, conforme determinado pelo Decreto 5.626/05, essa proposta bilíngue deverá ser desenvolvida nas:

1º (...) denominadas escolas ou classes de educação bilíngue, aquelas em que a Libras e a modalidade escrita da Língua Portuguesa sejam línguas de instrução utilizadas no desenvolvimento de todo o processo educativo.

2º Os alunos têm o direito à escolarização em um turno diferenciado ao do atendimento educacional especializado para o desenvolvimento de complementação curricular, com utilização de equipamentos e tecnologias de informação (BRASIL, 2005, p. 5).

Lacerda, Santos e Martins (2016), desenvolveram uma pesquisa baseada em uma escola-pólo4 no município de Campinas, com salas multisseriadas e regulares nomeadas classes língua de instrução Libras, na Educação Infantil e Ensino Fundamental I – foco do atendimento dos futuros pedagogos. Os resultados obtidos indicaram grande êxito com o desenvolvimento linguístico como o referente ao conteúdo programático dos alunos surdos que desse projeto fizeram parte.

Todavia, mesmo com o desenvolvimento do modelo de projeto proposto e a criação de documentos de cunho legal a favor de uma educação pautada na Libras e não na língua portuguesa na modalidade oral, há uma resistência forte dentro da perspectiva inclusiva em relação à forma e organização escolar. Com o advento da inclusão radical, as salas de instrução Libras são vistas como classes especiais com matrículas só de estudantes surdos. No entanto, vale ressaltar que essas salas não são exclusivamente para esse público, porém, como a Libras ainda não é uma língua de prestígio social, acabam tendo somente alunos surdos (CONCEIÇÃO; MARTINS, 2016).

Ainda segundo Conceição e Martins (2016), essa tensão possibilita verificar ainda que no contexto do cotidiano escolar essa lei não é aplicada, ou então é desconfigurada: não há a defesa do educador surdo nem do professor bilíngue que conhece as particularidades da surdez para lecionar diretamente pela língua de sinais tampouco daqueles que fazem parte dessa proposta educacional regulamentada pelo Decreto 5.626/05. Há na inclusão uma proposta de inserção de surdos num ensino regulado para pessoas ouvintes, cuja ação fere a forma como o referido Decreto propõe a educação de surdos – inclusive no que se entende

4 Escolas que tenham projetos bilíngues de salas que englobam a Libras como língua de instrução e o Português

como segunda língua. Nesses ambientes escolares os surdos devem se dar em pares para trocas linguísticas e terem os profissionais adequados para essa instrução, sendo esses o instrutor surdo, o professor bilíngue e o intérprete de Libras educacional (LACERDA; SANTOS; MARTINS, 2016).

(5)

sobre o processo de aquisição de linguagem em crianças surdas.

Sobre esse processo, Vygotsky (1995) pontua que a linguagem social, aquela constituída nas trocas com o ambiente – seja ele familiar ou, neste caso, escolar, é fundamental para o processo de subjetivação e para a constituição da identidade, sendo possível apenas no processo relacional haja vista que é por meio do processo realizado com outros falantes da mesma língua que a criança se humaniza. Diante disso, reitera-se a necessidade da aquisição da língua de sinais em crianças surdas o mais cedo possível e de um espaço escolar favorável para as trocas linguísticas. Em outras palavras, é fundamental que se possa

Oferecer oportunidades para que a criança se torne bilíngue, esteja em interação com os pares em sua língua e tenha contato com a comunidade surda, podendo se reconhecer como pertencente a ela e (re)conhecer aspectos pertinentes a surdez (GURGEL; et al., 2016, p. 66).

Sendo essa condição primordial para o desenvolvimento da mesma para que possa estar em sociedade obtendo informações, transmitindo conhecimentos e aprendizagens de modo a constituir sua identidade cultural surda e se reconhecer na comunidade em que faz parte, o pedagogo bilíngue se torna indispensável nesse processo pois entende-se que é o profissional que terá mais contato com a criança surda em sala de aula e que poderá utilizar metodologias de ensino adequadas a partir da Libras. Todavia, cabe-nos questionar: como está sendo feita essa formação nos cursos de Licenciatura em Pedagogia espalhados pelo país? Eles estão de acordo com o proposto legalmente no que concerne aos pedagogos bilíngues? O Decreto 5.626/05 discorre sobre esse processo formativo da seguinte maneira ao determinar que:

Art. 5ºA formação de docentes para o ensino de Libras na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental deve ser realizada em curso de Pedagogia ou curso normal superior, em que Libras e Língua Portuguesa escrita tenham constituído línguas de instrução, viabilizando a formação bilíngue (BRASIL, 2005, p. 1).

Lodi e Albuquerque (2016) desenvolveram um estudo no contexto de uma escola que possuía as salas de instrução Libras no ano de 2010 com professores que conheciam a Libras mesmo não tendo o curso de pedagogia bilíngue devido à escassez dessa formação. Segundo as autoras, foi possível identificar uma contribuição positiva no que se tratava de aquisição de linguagem pois, tanto a aquisição da Libras quanto da língua portuguesa escrita, possibilitou que as crianças surdas viessem a dialogar com esta língua e construir conceitos abstratos e referentes às diferentes áreas do conhecimento a partir da língua que as constitui surdas. Isso se deu pelo fato de que a professora bilíngue desenvolveu com seus alunos projetos que iam

(6)

desde produção de textos em diferentes níveis de ensino em relação aos ouvintes, às suas especificidades linguísticas, até a valorização de conhecimentos prévios dos alunos – sempre levando-se em consideração a bagagem que já possuíam antes de chegarem à escola. O tema principal do mesmo intitulava-se “Crianças no Mundo” e a professora desenvolveu visitas, atividades com telas que tratavam de jogos infantis, temas como “Copa do Mundo”, apresentações, atividades com globo terrestre e muitos outros recursos.

A partir dessa experiência, identificamos que só o docente com formação específica em conteúdos pedagógicos como em Libras é capaz de fornecer um aprendizado significativo e organizado para o aluno surdo. Destacamos ainda a importância para a educação bilíngue desde o Ensino Infantil e até mesmo no Fundamental Ciclo I (período de aquisição de linguagem dentro do ambiente escolar), de modo que os conteúdos sejam preparados e pensados anteriormente pelo professor bilíngue, que seria o docente fluente na língua de sinais e com formação para ensino de surdos, apoiado com a presença do instrutor ou educador surdo, o que exige dos mesmos a adoção de uma perspectiva visual de ensino que contenha recursos imagéticos (CAMPELLO, 2008), jogos e brincadeiras para que seja possível o processo de desenvolvimento e elaboração de situações nas quais são associadas a imagem apresentada à língua de sinais e a linguagem. Além disso, é importante que os discursos sejam produzidos pela referida língua numa perspectiva dialógica (LODI; ALBUQUERQUE, 2016) e que as propostas educacionais englobem a realidade e a identidade de crianças surdas.

Desse modo, a garantia da educação bilíngue para os surdos possibilita avanços significativos na vida desse alunado uma vez que, estando em contato com seus pares, professores bilíngues, instrutores surdos e adquirindo e captando informações tanto de cunho escolar como pessoal, familiar e cultural, estará construindo sua identidade em meio a uma comunidade que partilha a experiência visual e surda de modo positivo.

Por isso, diante da necessidade de formação adequada do professor bilíngue o presente estudo se orienta pela seguinte questão: os planos de ensino das disciplinas de Libras oferecidas no curso de Licenciatura em Pedagogia de duas Universidades Federais do Estado de São Paulo visam atender a demanda legal do Decreto 5.626/05 em relação à formação de professores bilíngues nos anos iniciais?

Dado essa questão, retoma-se que o presente estudo tem como objetivo problematizar se a formação do pedagogo tem atendido a demanda estabelecida pelo Decreto 5.626/05 em relação à formação de professores bilíngues Libras/Português nos anos iniciais.

(7)

Espera-se, portanto, que esse trabalho possa trazer discussões que contribuam para a reflexão sobre os currículos dos cursos de pedagogia das Universidades em relação a disciplina de Libras e a formação que o futuro pedagogo terá com base nesse aprendizado e com as expectativas do encontro no futuro com o alunado surdo.

Metodologia

Esta pesquisa se caracteriza como sendo um estudo de delineamento qualitativo descritivo de cunho documental. No que se refere a pesquisa qualitativa, Godoy (1995) afirma que esse tipo de estudo não pretende enumerar eventos e se apegar em dados numéricos, mas sim destacar que determinadas questões são refletidas e analisadas a partir de dados descritivos procurando entender os fenômenos, os processos da situação estudada e não somente os resultados finais. As pesquisas qualitativas estão inteiramente ligadas as pesquisas descritivas e, de acordo com Gil (2002), possuem como objetivo primordial a descrição de fenômenos e técnicas padronizadas de coleta de dados. Além disso, salienta-se que as pesquisas documentais se tratam de estudos que fazem um trabalho analítico com diversos tipos de materiais: cartas, jornais, correspondências pessoais, ou documentos públicos (GIL, 2002) – como é o caso deste estudo.

Com base nos documentos, foram selecionados dois planos de ensino das disciplinas de Língua Brasileira de Sinais dos cursos de Licenciatura em Pedagogia de duas Universidades Federais do Estado de São Paulo, sendo nomeadas de modo fictício para este artigo visando o atendimento às questões éticas. Assim, as instituições foram denominadas como Instituição de Ensino Superior 1 (IES) e IES 2.

Primeiro elegeu-se as Universidades Federais do Estado de São Paulo que possuíam os cursos de Licenciatura em Pedagogia e, posteriormente, foi realizado o acesso aos sites de cada uma das universidades e de cada curso para obtenção dos planos de ensino em questão.

A partir da coleta desses dados, as autoras foram de encontro às ementas das disciplinas, assim como da grade curricular que apresentava as cargas horárias e o semestre em qual a Libras estava presente em ambas as IES.

As análises foram tecidas à luz do Decreto 5.626/05 e estudos da temática da surdez e ensino de línguas visando identificar a forma de organização da disciplina de Libras em relação a sua nomenclatura, carga horária, conteúdo programático, departamento responsável, objetivos do plano de ensino e processos avaliativos para que se pudesse verificar a existência

(8)

ou não de uma sistematização e, para além disso, identificar condições adequadas de formação ao pedagogo bilíngue.

Resultados e Discussão

O Decreto 5.626/05 propõe, a partir da perspectiva socioantropológica, que a educação bilíngue seja um direito dos estudantes surdos do Brasil desde a educação básica até o ensino superior. Estabelece, dessa forma, que as instituições de ensino devem se organizar e serem responsáveis pela inclusão desses alunos em diferentes ambientes, referindo-se às

I- escolas e classes de educação bilíngue, abertas a alunos surdos e ouvintes, com professores bilíngues, na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental;

II- escolas bilíngues ou escolas comuns da rede regular de ensino, abertas a alunos surdos e ouvintes, para os anos finais do ensino fundamental, ensino médio ou educação profissional, com docentes das diferentes áreas do conhecimento, cientes da singularidade linguística dos alunos surdos, bem como com a presença de tradutores e intérpretes de Libras – Língua Portuguesa (BRASIL, 2005, p. 5).

Além da estrutura adequada de escola e de instrução para alunos surdos que fora garantido em relação à educação bilíngue nas salas de aula do país, outra questão tratada neste documento refere-se à formação dos profissionais que atuam com esse público específico podendo ser os instrutores surdos, interpretes de Libras e, no caso deste artigo, os educadores bilíngues. Para isso o Decreto 5.626/05 estabelece que:

Art. 3º A Libras deve ser inserida como disciplina curricular obrigatória nos cursos de formação de professores para o exercício do magistério, em nível médio e superior, e nos cursos de Fonoaudiologia, de instituições de ensino, públicas, privada, do sistema federal de ensino e dos sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

§ 1º Todos os cursos de licenciatura, nas diferentes áreas do conhecimento, o curso normal de nível médio, o curso normal superior, o curso de Pedagogia e o curso de Educação Especial são considerados cursos de formação de professores e profissionais da educação para exercício do magistério. (BRASIL, 2005, p. 5).

Diante disso, entende-se que a proposta de inserção da Libras como disciplina curricular torna-se fundamental na medida em que apresenta aos futuros profissionais questões da surdez e da língua de sinais, objetivando diminuir as representações equivocadas sobre questões culturais e de identidade dos surdos. Além disso, este documento apresenta ainda aspectos da formação dos profissionais que atuarão com as pessoas surdas e estabelece que:

Art. 5º A formação de docentes para o ensino de Libras na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental deve ser realizada em curso de Pedagogia, ou curso normal superior, em que a Libras e Língua Portuguesa Escrita tenham constituído línguas de instrução, viabilizando a formação bilíngue (BRASIL, 2005,

(9)

p. 1).

O Decreto 5.626/05 que regulamenta a Lei de Libras, aponta que o profissional deve ter sua formação no curso de Pedagogia para que possa atuar no ensino de Libras. Porém, este curso forma professores de caráter polivalente, ou seja, que lecionam todas as disciplinas, o que nos permite afirmar que a intenção do documento é pensar a formação de docentes nos anos iniciais para além do ensino da língua de sinais.

Dessa forma, pode-se observar que a atuação desse profissional acaba sendo comprometida: primeiramente por não se ter a formação especializada como o Decreto 5.626/05 propõe e porque na maioria das vezes se coloca o intérprete como o profissional responsável para a aquisição de linguagem do aluno surdo. Sobre isso, reitera-se que a colocação do intérprete nos anos iniciais da educação básica ainda é corriqueira uma vez que se tem atribuído a este profissional a responsabilidade pelo ensino e aprendizagem da Libras para o alunado surdo.

Conceição e Martins (2016) salientam que os cursos e graduações oferecidos atualmente voltados à formação de intérprete focam em questões do aprendizado da língua de sinais, sua tradução e interpretação, porém, não farão o proposto na educação bilíngue no que se refere a Educação Infantil e ao Ensino Fundamental I – que é estudar o modo de alfabetizar as crianças surdas, maneiras didáticas de ensinar a língua em questão, atividades pedagógicas que englobem a Libras como língua matriz, ensino do português como segunda língua na modalidade escrita e assim por diante. É pertinente destacar que não cabe a esse profissional a responsabilidade por esse processo, embora isso acabe acontecendo.

Análise dos planos de ensino das disciplinas de Língua Brasileira de Sinais

De acordo com o plano de ensino da disciplina de Libras do curso de Licenciatura em Pedagogia na IES 1, é determinada a carga horária de setenta e cinco horas para que a disciplina seja desenvolvida, sendo que, desse total, 35,5h são destinados aos aspectos teóricos e 35,5h aos aspectos práticos, ficando exclusas 4 horas dessa programação sem definição aparente. Diante disso, considera-se que, para se ter um aluno surdo em sala de aula, 35,5h práticas é um período breve e relativamente insuficiente para que se possa aprender uma nova língua que carrega consigo todo o processo de luta das comunidades surdas dentre outros elementos importantes de sua constituição.

(10)

ensino, percebeu-se uma alteração no que diz respeito às horas destinadas para a prática e para a teoria. Na grade curricular, têm-se as 75h divididas, já no plano de ensino diz-se que 70% das horas são destinadas à prática e 30% à teoria. No tocante a essa questão, mesmo que seja uma língua de modalidade diferente – no caso a Libras gesto-visual e a inglesa oral- auditiva, Carvalho (2008), em sua tese de doutorado desenvolvida em uma determinada cidade do país, afirma que a totalidade de 360h de inglês oferecidas no curso referente à língua eram insuficientes para formação dos futuros professores de Letras que poderiam lecioná-la futuramente, o que nos faz refletir sobre as 75h de Libras que o curso de licenciatura oferece para os estudantes e como se configura a relação e comunicação entre professor e aluno.

No que se diz respeito ao departamento que assegura o desenvolvimento da disciplina na IES 1, tem-se o curso de Pedagogia que, em sua grade curricular, possui uma disciplina denominada como “Educação Bilíngue: Libras/ Língua Portuguesa”. Entretanto, ao se comparar o conteúdo pragmático – que é a única parte que se fala da Educação Bilíngue, a mesma destaca que a temática será desenvolvida apenas de maneira introdutória, não havendo adensamento de como promover a educação bilíngue em sua totalidade e de aspectos voltado a alfabetização e letramento de surdos. Sobre isso, tal como afirma Lacerda, Santos e Martins (2016), a educação bilíngue é algo complexo a ser estudado para além da Libras como primeira língua e português como segunda.

No que se diz respeito aos objetivos do plano de ensino da disciplina, são indicados aspectos como o conhecimento das políticas educacionais que versam sobre os direitos linguísticos e inclusão social do surdo, reflexão sobre o contexto educacional e a efetividade das políticas públicas por meio de vivências na Residência Pedagógica ou em experiências pedagógicas diversas, história, fundamentos e perspectivas sobre a educação dos surdos no contexto brasileiro, metodologias envolvendo o ensino e aprendizagem de Libras, compreensão quanto ao papel do professor e do gestor no contexto escolar quanto a inclusão de alunos surdos na escola.

A partir desses objetivos propostos no plano, reitera-se que a disciplina tem como carga horária setenta e cinco horas para que sejam desenvolvidos todos esses quesitos, o que pode provocar um aligeiramento de tais conteúdos devido ao tempo escasso, impedindo assim um aprofundamento mais amplo de discussões consideradas importantes para a formação do pedagogo bilíngue. Dessa forma, pensando a partir do processo de aquisição da língua portuguesa ou a partir do exposto na pesquisa de Carvalho (2008) com a língua inglesa, são necessários anos de estudo e vivência em ambientes que utilizam a língua como forma de

(11)

comunicação para que haja um aprendizado efetivo. Diante disso, questiona-se: Como então aprender uma segunda língua, depois da fase adulta, para ser modelo linguístico de crianças surdas, se participasse ativamente de sua alfabetização com somente 75 horas de curso disponibilizado? Se entendermos que a Libras é uma língua com todos os quesitos de uma língua oral, tal proposta parece insuficiente e audaciosa. Ou, na pior das hipóteses, reflete a falta de reconhecimento linguístico devido à manutenção da língua portuguesa como único meio de formação para os surdos na escola comum.

Nesse contexto, identificou-se ainda que não existe um momento que se discuta e debata as questões de uma pedagogia bilíngue, que seria a parte fundamental da formação desse profissional. O mais próximo que se chega são questões metodológicas do ensino e aprendizagem da Libras, das quais não se especifica a formação bilíngue. Além disso, com relação ao conteúdo programático da disciplina ofertada, podemos perceber que a única atividade de leitura dirigida seria sobre o Decreto 5.626/05 – o qual se destaca como essencial para o entendimento da complexidade de formação dos profissionais da educação bilíngue. No entanto, essa bibliografia não é a única que deveria ser lida durante o percurso uma vez o documento apresenta diversos direitos em relação a pessoa surda, mas não faz o leitor refletir sobre ele. É necessário a complementação com estudos de pesquisadores da área (SKLIAR, 2001; MARTINS, 2008b; LACERDA; NAKAMURA; LIMA, 2000; LODI, 2013) para problematizar como está sendo feito esse ensino e as questões específicas referentes a surdez.

Outro aspecto abordado no conteúdo diz respeito à introdução da educação bilíngue: a história da educação de surdos revela muita opressão em relação ao atendimento do aluno surdo no Brasil (GESSER, 2009) e, devido a isso, é de fundamental importância analisar os percursos e problemas recorrentes nas abordagens oralistas e na comunicação total (LACERDA, 1998; MARTINS; DINIZ, no prelo, 2017). Os percalços que se deram e que ainda se mantém nas escolas da rede de ensino podem ser decorrentes da formação superficial que é ofertada – seja devido a carga horária presente em relação a Libras como também pelo não investimento na formação de pedagogos bilíngues para a promoção de escolas plurais.

O plano traz ainda a utilização dos seguintes recursos instrucionais: bibliografia básica e complementar, aparelho de datashow e materiais impressos (apostilas), indicando que seria importante o incentivo e produção de materiais bilíngues pois, sendo a Libras uma língua gesto-visual, materiais impressos nem sempre são os melhores facilitadores para o aluno ouvinte em processo de aprendizagem dessa língua. Pode-se, nestes casos, usar recursos imagéticos, espaços virtuais, investimento da expressão visual e corporal, teatro, filmes, ou

(12)

seja, elementos visuais que provocassem debates, mapas conceituais, etc. como meios para utilizar da potência visual que a língua de sinais tem (LACERDA; SANTOS; CAETANO, 2011).

Sobre os processos avaliativos propostos, além das participações das aulas e frequências – aspectos importantes para o aprendizado do aluno, identificou-se a ausência de avaliação das práticas que foram aprendidas, ou seja, do que o pedagogo em formação conseguiu adensar em seu conhecimento em relação à língua e de como se comunicar com o aluno surdo. Diante disso, seria interessante a realização de seminários para que o docente que leciona a disciplina possa verificar, mesmo que basicamente, a fluência e o domínio da língua de sinais de cada discente apresentam para que o processo de inclusão do surdo seja feito de forma efetiva e com participação dos professores. Desse modo, ressalta-se que, quando se coloca em prática o aprendido em sala de aula, isso pode trazer subsídios para o que o futuro professor construa a relação de comunicação com seu aluno, podendo “construir conceitos e os colocar em tensão [...] dando oportunidade para uma aprendizagem mais reflexiva e efetiva” (p. 106).

Em suma, pode-se perceber referente à IES 1 que muitos são os conceitos apresentados ao longo do plano de ensino e que estes deveriam ser debatidos além do ensino prática da língua de sinais; porém, o que é oferecido em relação a carga horária são apenas 75h para o aprendizado da teoria e prática, permitindo-nos identificar que a disciplina obrigatória em pauta no Decreto 5.626/05 está sendo cumprida, mas a forma que tem sido realizada é motivo de problematização. Portanto, reitera-se que a colocação da Libras no ensino superior é um ganho na comunidade surda, mas a impressão que se tem a partir da análise dos planos de ensino é que a aprendizagem dos futuros professores por ser superficial à língua de sinais e pode ter um efeito perverso na futura relação entre professor e aluno, o ensino da Libras, bem como em relação ao desenvolvimento cognitivo e conteúdos pragmáticos escolares.

Nesse contexto, diante da análise referente ao plano de ensino de Libras da IES 1, adentraremos neste momento na análise do plano de ensino referente a graduação de Licenciatura em Pedagogia da IES 2 para verificarmos se a disciplina segue formato parecido como o da anterior ou se segue percurso mais adensado e aprofundado no tocante à prática e a teoria.

A disciplina intitulada como “Introdução a Língua Brasileira de Sinais – Libras I” difere da nomenclatura correspondente à disciplina ofertada pela IES 1, possibilitando-nos

(13)

identificar que não há um padrão estabelecido em relação as nomenclaturas das disciplinas ofertadas entre as Universidades, ou seja, estas variam conforme regimento interno de cada uma. Desse modo, nota-se que a existência de certa fragilidade na definição de padrões para designar tais disciplinas.

No que diz respeito aos objetivos gerais, tem-se estabelecido o intuito de propiciar a aproximação dos falantes do português de uma Língua viso-gestual usada pelas comunidades surdas. Entretanto, cabe-nos a seguinte indagação: como garantir a formação de pedagogos bilíngues somente com uma aproximação com a língua de sinais sendo esta uma língua que possui especificidades assim como quaisquer outra língua? Reitera-se, assim, que são necessárias vivências significativas para que haja o domínio da mesma, o que, consequentemente, demanda tempo e aprofundamento nos diversos aspectos que envolvem sua constituição e seu uso. Nesse sentido, Martins (2008) afirma que é preciso refletir sobre essa colocação da disciplina nos currículos de licenciatura tendo em vista que a partir desta ação dois caminhos podem ser seguidos, de modo que esta possa se colocar enquanto

[...] promotora de visibilidade linguística às diferenças surdas, de um lado, mas de outro possível agenciadora do discurso de uma hostil inclusão que mascara politicamente as mudanças que seriam, de fato, necessárias na sala de aula e no currículo, mantendo e contribuindo com um discurso e apelo de atos “politicamente corretos” (p. 194).

Diante do exposto por Martins (2008), um dos objetivos da referida disciplina é o de promover uma melhor comunicação entre surdos e ouvintes em todos os âmbitos da sociedade, especialmente os espaços educacionais, sendo fundamental considerar o aspecto social da língua e a sua importância para a identidade e constituição da pessoa surda. Assim, não se deve deixar de mencionar o reconhecimento da língua e sua consequente valorização social e o fato de que a disciplina em questão pode ser capaz de oferecer o aprendizado básico da Libras, mas pode ainda se configurar como insuficiente a ponto de os professores não sentirem segurança e domínio para, por exemplo, ministrar uma aula para alunos surdos. Por isso, Martins (2008) reitera a importância e o cuidado de não tornar o ensino da língua superficial em uma única disciplina semestral “como manual de inclusão dos surdos na escola e na sociedade” (p. 195).

Nessa perspectiva, foi possível verificar que os objetivos específicos repetem alguns quesitos definidos no objetivo geral, trazendo para além deles a relevância de proporcionar aos discentes em formação a realidade dos surdos na atualidade propondo uma reflexão sobre cultura – entendendo que cultura é segundo Guatarri e Rolnik (2005) como

(14)

[...] uma maneira de separar atividades semióticas (atividades de orientação ao no mundo social e cósmico) em esferas, as quais os homens são remetidos. Tais atividades, assim isoladas, são padronizadas, instituídas potencial ou realmente e capitalizadas para o modo de semiotização dominante - ou seja, simplesmente cortadas de suas realidades políticas” (p. 15).

Dando continuidade ao plano de ensino, a ementa da IES 2 define os seguintes quesitos: surdez e linguagem, papel social da Língua Brasileira de Sinais, Libras no contexto da educação inclusiva bilíngue, parâmetros formacionais dos sinais, uso do espaço, relações pronominais, verbos direcionais e de negação, classificadores e expressões faciais em Libras e por fim, o ensino prático da Língua.

Diante disso, ao relacionarmos tal ementa com o número de créditos oferecidos no plano, que se constitui numa totalidade de 30 créditos sendo 2h de aulas semanais, concluímos que o aluno do curso de Licenciatura em Pedagogia pode de fato ter contato com todos os tópicos presentes da ementa, todavia, tendo em vista o tempo limitado que acaba sendo direcionado à realização das discussões e atividades, não há a possibilidade de aprofundamento do que se propôs desenvolver o que, por conseguinte, acaba por promover uma formação aligeirada e insuficiente que possa oferecer condições ao pedagogo de atuar no âmbito da educação bilíngue.

Como abordado anteriormente, essa carga horária é ainda menor para ministrar todas as aulas e abordar os assuntos. Carvalho (2008) apresenta a dificuldade dos alunos em lidar com a língua em tão poucas horas e aulas semanais, sendo a carga horária insuficiente de modo a justificar “a necessidade de mudanças na disciplina em questão, no sentido de adequar melhor o curso às necessidades dos alunos” (p. 103).

Além disso, constatou-se que o plano apresenta os horários definidos para cada conteúdo que será abordado, sendo organizados da seguinte maneira: uma hora para apresentação da disciplina e para os conceitos de comunidade e identidade surda, duas horas para introdução do conhecimento de Libras; duas horas para noções de tempo, ação, uso do espaço na enunciação, e formas básicas do contato cotidiano; duas horas de alfabeto digital e assim sucessivamente para os demais aspectos, sendo eles: numerais e cumprimentos em Libras; vocabulários básicos de situações cotidianas; desenvolvimento da percepção visual dos alunos quanto aos parâmetros de formação dos sinais, pronomes pessoais e suas relações espaciais constitutivas; verbos direcionais; uso de expressão facial em diferentes contextos de frases, desenvolvimento de diálogos e narrativas em Libras; conceito de Educação Bilíngue e, por fim, apresentação de seminários que deverão ser ministrados em Libras. Dessa forma,

(15)

podemos perceber a grande quantidade de conceitos a serem aprendidos e aprofundados tendo-se disponível, para tanto, uma carga horária curta em relação a complexidade da totalidade da Libras. Um quesito identificado e que a difere da IES 1 é a forma de avaliação e a necessidade da prática com a realização dos seminários em língua de sinais.

Outro fator identificado na análise desse plano de ensino que divergiu do pertencente a IES 1, foi em relação ao Departamento responsável pela oferta da disciplina: na IES 2, o departamento responsável é o de Psicologia e na primeira é o de Pedagogia, ou seja, dado que a Libras é uma língua em sua totalidade, entendemos que esta deveria ser ofertada pelo departamento de Letras em ambos os lugares e, pensando na pedagogia bilíngue, a própria área da educação poderia gerenciar o professor que trabalhasse especificamente com essa aprendizagem, pois entende-se que se trata mais do que o ensino da língua em si, mas o processo que envolve elementos como a própria didática e o ensino para crianças surdas, o letramento, os aspectos lúdicos etc.

No tocante à bibliografia, a leitura do Decreto 5.626/05 também aparece na proposta do plano de ensino da IES 2, tendo-se previsto o estudo de outras duas bibliografias as quais estão, de acordo com o mesmo, disponibilizadas na biblioteca comunitária da Universidade. Essa forma de organização nos permite identificar a preocupação com a acessibilidade do material aos alunos, destacando-se ainda a existência de bibliografia complementar com o objetivo de oferecer aos estudantes ampliação do repertório a ser construído durante a disciplina a respeito do conhecimento produzido sobre a comunidade surda, da Libras, da identidade, cultura, das legislações relacionadas ao tema, a gramática, os discursos atuais etc.

O plano, assim como consta no da IES 1, traz ainda a utilização dos seguintes recursos instrucionais: dvd e tv, retroprojetor, projetor multimídia, bibliografia básica e complementar, aparelho de datashow e filmadora. Reiteramos o que Lacerda, Santos e Caetano (2011) trazem com relação à importância do incentivo na produção de materiais bilíngues pois, sendo a Libras uma língua gesto-visual e o futuro pedagogo aquele que ministrará a aula em Libras, seria fundamental que pudesse vivenciar momentos de aprendizagem práticos nos quais fosse necessário a utilização do material produzido. Assim, tal prática atuaria como incentivadora às práticas futuramente desenvolvidas por estes profissionais ao adentrarem às salas de aula, incentivando-se a utilização de diversos recursos pedagógicos que atendam às especificidades de todos os alunos.

Por fim, no que se refere ao aspecto avaliativo que consta no referido plano de ensino, a avaliação pauta-se na bibliografia estudada, na elaboração de um vídeo com

(16)

narrativas em Libras e por fim um seminário de uma aula em Libras com tema da área de conhecimento escolhida pelo aluno. Entende-se que, ainda que se disponha de uma carga horária reduzida visto à complexidade dos aspectos que envolvem a língua, este modo de avaliação contempla o que fora programado para ser desenvolvido ao longo da disciplina. No entanto, como já discutido neste estudo, acaba sendo insuficiente para a formação do pedagogo bilíngue.

A partir das análises tecidas até o momento, verificou-se ainda que o regimento interno proposto de horas mínimas do ensino de Língua Brasileira de Sinais em relação ao que é indicado no Decreto 5.626/05 é seguido e que cada docente organiza as disciplinas a partir do que é possível lecionar aos discentes, afinal, não há uma diretriz em termos de currículo que norteie o ensino de Libras e aborde aspectos como a organização dos tópicos relevantes da língua de acordo com o período de tempo que lhes é determinado legalmente (LEMOS; CHAVES, 2012).

Considerações finais

Este estudo possibilitou a identificação da importância da educação bilíngue de surdos, ou seja, da Língua Brasileira de Sinais como primeira língua e Língua Portuguesa como segunda em sua modalidade escrita, bem como promoveu significativas reflexões a respeito de como o Decreto 5.626/05 foi um documento fundamental e relevante para que se avançasse na discussão sobre o fortalecimento da implantação de propostas bilíngues nas escolas das redes regulares de ensino.

Outro aspecto de grande relevância é a aquisição de língua na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental em crianças surdas, principalmente as filhas de pais ouvintes. Para que isso se efetive na educação, reitera-se a necessidade de profissionais especializados para esse atendimento, neste caso, o pedagogo bilíngue.

No que se trata da educação bilíngue buscou-se refletir se a formação do pedagogo contempla a proposta trazida pelo Decreto 5.626/05 e se a mesma está sendo de fato atendida. Foram encontradas algumas lacunas na formação desse profissional, como por exemplo o fato de a carga horária – em vista dos conteúdos a serem abordados, não ser suficiente diante da complexidade de uma língua em sua plenitude, pois, sendo a Libras reconhecida como língua e não como um código, essa compreensão de ensino deve ser levado em consideração. Além do tempo disponibilizado para realização da disciplina, também se notou políticas internas

(17)

diferentes, como divergências na nomenclatura e na forma de organização de cada plano de ensino ofertada pelas universidades objeto de estudo deste artigo.

Observou-se ainda que em nenhum caso a Letras é o departamento responsável pela disciplina de Libras, mas sim o da psicologia e o da educação. Como se trata de uma língua, entende-se que o professor deveria ser inserido nesses espaços e a disciplina estar vinculada ao programa de línguas. Além disso, outro ponto a ser destacado neste processo de análise diz respeito às propostas de cada plano de ensino, uma vez que se identificou a determinação de vários objetivos e em determinados casos, estes se mostraram complexos diante do tempo demasiadamente curto no qual seriam desenvolvidos.

Tendo em vista que o recorte dos dados fora realizado de uma realidade demasiadamente ampla, este estudo trouxe como contribuição a constatação de que a formação promovida nos cursos de Licenciatura em Pedagogia do Estado de São Paulo – no caso daqueles aqui analisados em relação ao bilinguismo, tem sido insuficiente para a atuação desse pedagogo no que compete à transmissão de conhecimento da língua e linguagem para a criança surda, tal como propõe o Decreto 5.626/05. Desse modo, entendemos que não há como oferecer escolas bilíngues se a formação ofertada não se alinha a essa perspectiva e, como consequência desse processo, os alunos surdos são destinados a outros profissionais como o tradutor e interprete ou para o próprio educador especial que atende no contraturno em períodos breves.

Nesse contexto, conclui-se que esse estudo é uma importante ferramenta de discussão para que possamos entender como a ideologia inclusiva dirige a formação de professores, descaracterizando o disposto no Decreto 5.626/05, tendo-se atribuído à disciplina de Libras como instrumento de “inclusão”. Possibilitou ainda a reflexão sobre as propostas de organização das disciplinas que estão sendo oferecidas, colocando-se como ferramenta para futuras discussões das grades curriculares das disciplinas de Libras das Universidades do país. É necessário que estudos neste âmbito continuem sendo desenvolvidas futuramente para uma possível reformulação e reorganização dos planos de ensino relacionados as disciplinas de Libras – não somente dos cursos de Licenciatura em Pedagogia como em todos os outros previstos no Decreto em questão.

(18)

TEACHER’S BILINGAL EDUCATION TRAINING OF SÃO PAULO’S UNIVERSITIES: problematizations about learning Libras in higher level educacion institutions Abstract

The history of the deaf movement is driven by several struggles until they have the right to have the discipline of Libras as mandatory in undergraduate courses at Universities in the country. However, it is necessary to verify how this teaching is done for future pedagogues who, possibly throughout their careers, will come into contact with deaf students. Because of that, this presente article aims to discuss the Teacher’s education in order to verify the Brazilian Language of Signals plans that aims to meet the specifications established by the act 5.626/05 in training of bilingal teachers in the early years. The data gathering was fulfilled through documentary analysis. By doing that was possible to conclude that the hours intended to these subjects are insufficient to take into account the aspects of the constitution of the language, the struggles of the deaf communities that reached in the conquest of various rights, such as the bilingual education. As a consequence, there is a formation that does not contemplate what was legally stated, thus restricting teachers the knowledge necessary and adequate to understand the particularities of the deafness to teach Libras directly. In addition, it is clear that the process of inclusiveness still thought and organized in order to promote the insertion of deaf students into teaching contexts for individuals who speak and listen the Portuguese language.

Keywords: Teacher Training. Bilingal Education. Libras. Deafness.

FORMACIÓN DEL PEDÁGOGO BILINGÜE EN LAS UNIVERSIDADES FEDERALES DEL ESTADO DE SÃO PAULO: Problemas sobre el aprendizaje de Libras en la Educación Superior

Resumen

La historia del movimiento de sordos está impulsada por muchas luchas hasta que tienen el derecho de tener la disciplina de Libras como obligatoria en los cursos de pregrado en las universidades del país. Sin embargo, es necesario verificar cómo se realiza esta enseñanza para futuros pedagogos que, posiblemente a lo largo de sus carreras, entren en contacto con estudiantes sordos. Por lo tanto, este artículo tiene como objetivo problematizar la educación del pedagogo si pretende satisfacer la demanda establecida por el Decreto 5.626 / 05 en relación con la formación de maestros bilingües Libras / Portugués en los primeros años. Es una investigación documental cualitativa descriptiva. Se seleccionaron duas universidades en el estado de São Paulo y se recopilaron los planes de enseñanza de las asignaturas de Libra. Se pudo concluir que la carga de trabajo destinada a estas materias es insuficiente para considerar los aspectos de la constitución del idioma, en la formación del educador bilingüe. Hay una capacitación que no incluye lo que se determinó legalmente, lo que limita el conocimiento necesario y suficiente a los maestros para que conozcan las particularidades de la sordera para enseñar directamente por Libras. Se percibe de una manera que el proceso de inclusión todavía se piensa y organiza para promover la inserción de estudiantes sordos en contextos de clases predominantemente auditivas.

Palabras clave: Formación de profesores. Educaión Bilingüe. Libras. Sordera.

Referências

BRASIL. Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/decreto/d5626.htm. Acesso em: 20

abr. 2020.

CAMPELLO, A. R e S. Aspecto da Visualidade na Educação de Surdos. 2008. 245 p. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-Graduação, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2008. Disponível em:

https://cultura-sorda.org/wp-content/uploads/2015/04/Tesis_Souza_Campello_2008b.pdf. Acesso em: 21 abr. 2020.

CARVALHO, K R.R. de. Análise de necessidades para a disciplina língua inglesa em um curso de Letras. 2008. 248 f. Tese (Doutorado em Linguística aplicada e estudos da

(19)

Linguagem), Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2008. Disponível em: https://tede2.pucsp.br/bitstream/handle/13949/1/Keila%20Rocha%20Reis%20de%20Carvalh

o.pdf. Acesso em: 23 abr. 2020.

CONCEIÇÃO, B.S.; MARTINS, V. R. de O. Educação Bilíngue e a possível contribuição da formação em pedagogia: desafios atuais. Rev. Periferia., v. 8, n. 2, p. 66-91, jul-dez. 2016 Disponível em: https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/periferia/article/view/27444. Acesso em: 21 abr. de 2020.

CONCEIÇÃO, B. S.; MARTINS, V. R. de O. Discursos de pais de crianças surdas: educação infantil e a presença da Libras. Rev. Educação., v. 44, p. 1-24. 2019 Disponível em:

https://periodicos.ufsm.br/reveducacao/article/view/38319. Acesso em: 23/05/2020.

CAMPELLO, A. R e S. Um pouco das diferentes abordagens na educação dos surdos. Caderno Cedes, Campinas, vol.19, n.46, set. 1998.

GESSER, A. Libras? Que língua é essa? Crenças e preconceitos em torno da língua de sinais e da realidade surda. São Paulo: Parábola Editorial, 2009. 83 p.

GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4 ed. São Paulo: Atlas, 2002. 176 p. GODOY, A. S. Introdução a pesquisa qualitativa e suas possibilidades. São Paulo, vol. 35, n.2, p. 57-63, mar/abr. 1995. Disponível em:

https://www.scielo.br/pdf/rae/v35n2/a08v35n2.pdf. Acesso em: 27 abr. 2020.

GUATTARI, F.; ROLNIK, S. Micropolíticas: cartografias do desejo. 7. ed. Petrópolis: Vozes, 2005.

LACERDA, C. B. F. de. Um pouco das diferentes abordagens na educação dos surdos. Caderno Cedes, Campinas, vol.19, n.46, set. 1998. Disponível em:

https://www.scielo.br/scielo.php?pid=s0101-32621998000300007&script=sci_abstract&tlng=pt. Acesso em: 22 abr. 2020

LACERDA, C. B. F. de; NAKAMURA H.; LIMA M. C. (org) Fonoaudiologia, surdez e abordagem bilíngue. São Paulo: Plexus, 2000.

LACERDA, C.B. F. de; SANTOS, L. F. dos.; CAETANO, J.F. Estratégias Metodológicas para o ensino de alunos surdos. In: _____. Língua Brasileira de Sinais – Libras: uma Introdução. GOÉS et al. São Carlos: UAB-UFSCar, 2011, p. 101 – 116. Disponível em: http://livresaber.sead.ufscar.br:8080/jspui/bitstream/123456789/690/1/PE_Linguabrasileirade

sinaisLibrasumaintroducao.pdf. Acesso em: 30 abr. 2020.

LACERDA, F. B. C. Intérprete de Libras em atuação na educação infantil e no ensino fundamental. 5. ed. Porto Alegre: Editora Mediação, 2013.

LACERDA, C. B. F. de; SANTOS, L. F. dos; MARTINS, V. R. O. Escola e Diferença: caminhos para educação bilíngue de surdos. São Carlos: EdUFSCar, 2016, p. 65-78.

LEMOS, A. M.; CHAVES, E. P. A disciplina de Libras no Ensino Superior: da proposição à prática de ensino como segunda língua. In: XVI Encontro Nacional de didática e prática de

(20)

ensino. 6., 2012, Campinas. Anais... Campinas: UNICAMP, 2012. p. 2282- 2293. Disponível

em: http://endipe.pro.br/ebooks-2012/2190c.pdf. Acesso em: 24 abr. 2020.

LODI, A.C.B. Educação inclusiva para surdos e inclusão segundo a política nacional de educação especial e o decreto nº 5626/05. Educação e Pesquisa. São Paulo, v. 39, n. 1, p. 49- 63, jan./mar. 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/ep/v39n1/v39n1a04. Acesso em: 1 mai. 2020.

LODI, A.C. B; ALBUQUERQUE, G.K.T.S.de. Sala Libras língua de instrução: Inclusão ou exclusão educacional/social? IN: LACERDA, C.B.F. de; SANTOS, L.F dos; MARTINS, V.R.de O (orgs). Escola e Diferença: caminhos da educação bilíngue para surdos. São Carlos: Edufscar, 2016.

MARTINS, V.R.O. A invenção da surdez na escuta de Michel Foucault. In: ______. Educação de Surdos no Paradoxo da Inclusão com Intérprete de Língua de Sinais: Relações de Poder e (re)criações do sujeito. 2008. 154 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Departamento de Psicologia Educacional, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2008a. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/190439. Acesso em: 19 abr. 2020.

______. Análise das vantagens e desvantagens da Libras como disciplina curricular no ensino superior. Cadernos do CEOM, n. 28, p. 191-206, 2008b. Disponível em:

https://bell.unochapeco.edu.br/revistas/index.php/rcc/article/view/161. Acesso em: 4 maio

2020.

MARTINS, Vanessa Regina de Oliveira; DINIZ, Sarah Leite Lisbão Machado. Libras no Contexto Educacional. 2017. No prelo.

RODRIGUERO, C.R.B.; YAEGASHI, S.F.R. Resultados e discussões. In: ______ Família e o filho surdo: uma investigação acerca do desenvolvimento psicológico da criança segundo a abordagem histórico-cultural. 1 ed. Curitiba: CRV, 2013. p. 13 – 24.

SKLIAR, Carlos. Os estudos surdos em educação: problematizando a normalidade, In: SKLIAR, C. (Org.). A surdez: um olhar sobre as diferenças. Porto Alegre: Mediação, 2001, p. 7-32.

SOARES, M.A.L. A Educação do surdo no Brasil. Campinas: Autores Associados; Bragança Paulista: EDUSF, 1999.

VYGOTSKY, L. S. Historia del desarrollo de las funciones psíquicas superiores. Obras escogidas, vol III. Tradução de L. Kuper. Madri: Visor, 1995.

Referências

Documentos relacionados

Para as fontes oficiais, ou seja, representantes do poder público e ONGs o contato e o agendamento foi pelas vias burocráticas em alguns casos como da CIDASC e da

Programa de Educação Ambiental na Praça Victor Civita tem como principal objetivo promover a Cultura da Sustentabilidade, por meio de diversos.. projetos e

Todas as tomadas e cabos deverão ser identificadas por etiquetas adequadas, com proteção plástica para não permitir seu descoramento e descolamento, em coerência

Os três (3) últimos candidatos que permaneceram na sala só poderão entregar a prova e o cartão resposta ao mesmo tempo e assinarão a ata de sala e acompanharão termo

Além de o mês apresentar uma maior quantidade de dias trabalhados, o abate total de animais di- minuiu 1,30% e totalizou 342,55 mil cabeças em Mato Grosso – cenário que foi

Em seus anos juvenis, a beleza de Akhmátova decerto causou impressão aos artistas de então; mas que tal impressão tenha se gravado nas obras de arte em forma de

Dentro do escopo desse trabalho considera-se, por fim, que a construção do modelo de uma arquitetura de rede para Market Data foi desenvolvido com sucesso, sendo possível utilizar

Também pode enviar um Preset seleccionado para um outro aparelho: para este efeito, mude para o modo EDIT, premindo simultaneamente as duas teclas de cursor no aparelho