UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO
CICERO GONÇALVES OLIVEIRA DA SILVA
O TRABALHO NA TERCEIRA IDADE COMO DIREITO FUNDAMENTAL: SUAS REPERCUSSÕES NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
FORTALEZA 2016
O TRABALHO NA TERCEIRA IDADE COMO DIREITO FUNDAMENTAL: SUAS REPERCUSSÕES NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Monografia apresentada a Faculdade de Direito como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientadora: Professora M.Sc. Fernanda Cláudia A. Silva
CICERO
O TRABALHO NA TERCEIRA IDADE COMO DIREITO FUNDAMENTAL: SUAS REPERCUSSÕES NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do diploma de Bacharel em Direito, sob a orientação da Professora M. Sc. Fernanda Cláudia A. Silva.
Aprovada em: _____ / _____ /_____
BANCA EXAMINADORA:
__________________________________________________ Profa. M.Sc. Fernanda Cláudia A. Silva (Orientadora)
Universidade Federal do Ceará - UFC
__________________________________________________ Prof. M. Sc. Álisson José Maia Melo
Universidade Federal do Ceará - UFC
__________________________________________________ Prof. Mestrando Jacques Henrique Gomes da Silva
Aos meus filhos, Gabriel e Rafael e a minha esposa Fernanda, pelo esforço em ajudar-me em seus moajudar-mentos livres, e pela sua importante presença no decorrer deste estudo.
A DEUS, pela imensa grandeza e compaixão, dando-nos condições e sabedoria, propiciando-nos a oportunidade.
Aos meus pais, Antônio Biana Filho e Raimunda Oliveira da Silva, pelo incentivo na superação dos desafios, pelo apoio e dedicação nos momentos mais difíceis.
Aos meus queridos e estimados irmãos: Francisca, Raulene, Joana e Marcos William.
À Professora Orientadora Fernanda Cláudia A. Silva, cujo incentivo, paciência e dedicação foram cruciais para a conclusão deste trabalho.
Ao professor Álisson José Maia Melo e ao professor Jacques Henrique Gomes da Silva por fazerem parte da Banca Examinadora.
Aos professores e funcionários da Faculdade de Direito que engrandeceram minha formação acadêmica e contribuíram de forma direta ou indireta dando suporte a conclusão do meu curso. Em especial ao Prof. Marcos Colares por ter auxiliado na escolha do tema.
Ao corpo discente, pelo companheirismo e convívio no decorrer deste curso.
A minha tia Fátima, pela atenção e carinho neste decorrer de vida.
Aos amigos, pessoas imprescindíveis, que me auxiliam continuamente em praticamente todos os momentos da minha vida.
“A vida com suas fases de infância, juventude, madureza, é uma experiência constante. Cada fase tem seu encanto, sua doçura, suas descobertas. Sábio é aquele que desfruta de cada uma das fases em plenitude, extraindo dela o melhor. Somente assim, na soma das experiências e oportunidades, ao final dos seus anos, guardará a jovialidade de um homem sábio. Se você é idoso, guarde a esperança de nunca ficar velho.”
(Autor desconhecido)
Por conta da tendência atual e global do envelhecimento populacional, seus
reflexos, bem como a inserção do profissional idoso no mercado de trabalho,
entende-se a importância de estimular o Estado ao desenvolvimento de políticas
públicas em parceria com a iniciativa privada ou organizações não governamentais
que promovam o trabalho da terceira idade. Ressalta-se também que seria
importante instigar as empresas à contratação do profissional idoso com a adesão
de incentivos fiscais e parafiscais que poderiam ser criados pelo Poder Público. O
estudo tem como objetivo analisar a legislação nacional, bem como os artigos
científicos publicados entre 2006 e 2016 relacionados ao direito do idoso ao trabalho
numa perspectiva de evolução histórica da categoria. A metodologia utilizada foi a
pesquisa doutrinária e bibliográfica, seguindo-se uma análise crítica dos estudos
científicos, do ordenamento jurídico e das legislações relativas. Os dados foram
analisados com base na literatura. A partir da análise das legislações brasileiras foi
observado que o ordenamento jurídico atual contempla o trabalho do idoso como
direito fundamental, porém não com plenitude, havendo a necessidade da criação de
legislação infraconstitucional específica que coloque em prática os incentivos fiscais,
mencionados no Estatuto do Idoso e, desta forma, contemplar a temática de forma
mais abrangente. As publicações destacam as legislações nacionais e o
ordenamento jurídico como guardiões dos direitos assegurados ao trabalho do
idoso, porém há necessidade de complementação jurídica para concretização das
conquistas do idoso no âmbito trabalhista.
Palavras-chaves: Idoso. Ordenamento jurídico. Direito fundamental.
Due to the current and global trend of the aging of population, its effects as well as
the inclusion of the elderly professional people in the labor market, it is understood
the importance of encouraging the state to the development of public policies in
partnership with the private sector or non-governmental organizations to promote the
work of the seniors. It is also relevant that it would be important to instigate the
companies to hire the elderly professional people with the accession of fiscal and
parafiscal incentives that the Government should create. This study has the purpose
to analyze the national legislation, as well as scientific articles published between
2006 and 2016 related to the right of the elderly people to work from a perspective of
historical evolution of the category. The methodology used was the doctrinal and
bibliographical research, followed by a critical analysis of scientific studies, the legal
system and related laws. The data had its analysis based on the literature. According
to the analysis of Brazilian legislation, it demonstrates that the current legal
framework includes the work of the elderly people as a fundamental right, but not in
its plenitude. There is a necessity to create specific infra legislation to put in place tax
incentives mentioned in the Statute of the Elderly People and in this way to consider
the issue in a broadly way. The publications highlight the national legislation and the
legal system as the guardians of the rights guaranteed to the work of the elderly
people, but there is huge necessity for legal complement to materialize the elderly
people achievements in the workplace.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ANG Associação Nacional de Gerontologia BANESTES Banco do Estado do Espírito Santo
CGD Coordenação Geral dos Direitos do Idoso
CLT Consolidação das Leis do Trabalho
CNBB Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) ECA Estatuto da Criança e Adolescente
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
OAB Ordem dos Advogados do Brasil
OIT Organização Internacional do Trabalho
ONU Organização das Nações Unidas
PAAV Plano Antecipado de Afastamento Voluntário
PNDH Plano Nacional de Direitos Humanos
SBGG Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia
SEDH Secretaria de Especial de Direitos Humanos
TST Tribunal Superior do Trabalho
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO...11 2 DIREITOS FUNDAMENTAIS: DEFINIÇÃO, EVOLUÇÃO E SUA
INTERFERÊNCIA NO TRABALHO DA TERCEIRA IDADE ... 15
2.1 Evolução histórica dos direitos fundamentais...16 2.2 Dignidade da pessoa humana: suas relações entre os indivíduos e o Estado...18
2.3 Origens históricas das atividades laborais e seus reflexos...20 2.4 O trabalho na terceira idade para o sistema capitalista: breve análise...26 2.5 Atividades laborais na sociedade capitalista e os impactos na terceira
idade até a atualidade
... 28
3 O TRABALHO NA TERCEIRA IDADE COMO DIREITO FUNDAMENTAL
NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
... 30
3.1 O direito ao trabalho do idoso no contexto constitucional brasileiro 30
3.2 Direito a não discriminação no trabalho
31
3.2.1 Princípio da Igualdade
31
3.2.2 Discriminação por motivo de idade
32
3.4 O trabalho do idoso face a OIT 35
4 CONQUISTAS SOCIAIS DOS IDOSOS NO SÉCULO XX: REFLEXOS NO
BRASIL E MEDIDAS PROTETIVAS CONTRA A DISCRIMINAÇÃO AO
TRABALHO DA TERCEIRA IDADE
...
37
4.1 Direitos humanos das pessoas idosas: uma breve narração sobre
convenções e tratados internacionais
...
37
4.2 Discriminação relacionada ao trabalho das pessoas na terceira idade e
medidas protetivas
...
40
4.3 Responsabilidade social do Estado e da iniciativa privada: perspectivas
e inclusão social dos idosos
... 47
4.4 Princípio do pleno emprego...48 4.5 Avaliação da proteção do idoso no ordenamento jurídico brasileiro sem
prejuízo de outras medidas
... 51
4.5.1 A proteção do idoso na Constituição Federal de 1988 ... 52
4.5.2 O Estatuto do idoso (Lei 10.741)
... 53
REFERÊNCIAS 58
ANEXO A - PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 372, DE 2003 65
1 INTRODUÇÃO
A população mundial atualmente está passando por um rápido processo
de envelhecimento que se percebeu com mais veemência desde o final do século
passado. Isto ocorreu principalmente devido aos avanços médicos que contribuíram
para o aumento da expectativa de vida, elevando o contingente de idosos (Maria
Tatiana Guimarães, 2007).
Segundo projeções do IBGE, a população de idosos representa um
contingente de quase 15 milhões de pessoas com 60 anos ou mais de idade (8,6%
da população brasileira). As mulheres são maioria (8,9 milhões). Do total, 62,4%,
dos idosos são responsáveis pelos domicílios e têm, em média, 69 anos de idade e
3,4 anos de estudo. Com um rendimento médio de R$ 657,00, o idoso ocupa, cada
vez mais, um papel de destaque na sociedade brasileira (IBGE, 2002).
Muitas políticas de inclusão para as pessoas idosas tornaram-se urgentes não somente para o Brasil, como também para os demais países do mundo, ante o acelerado processo de envelhecimento da população.
Desta forma, seria interessante articular um ensaio que abordasse a questão do direito ao trabalho do idoso no ordenamento jurídico brasileiro, como um direito fundamental alicerçado pela Constituição Federal de 1988 e sedimentado por legislações específicas que apresentassem uma nova perspectiva sobre o assunto.
Uma vantagem dessa faixa etária (do que já se encontram trabalhando em seus ramos específicos) é o baixo custo de qualificação, pois estes já têm a primazia das experiências e práticas adquiridas ao longo dos anos, sendo
efetivamente entre 40 e os 70 anos que o trabalhador vive a plenitude de sua
capacidade (Furtado, 2004).
Podemos inferir que a abordagem relacionada ao direito dos idosos antes da atual Lei maior de nosso país era deveras superficial, ou seja, localizava-se em um campo de direitos rarefeitos, quase artificial, no mundo das ideias ou da boa intenção, mais teórica do que prática.
A partir da promulgação da Carta Magna de 1988 ocorreram conquistas importantes para grupos ditos minoritários, surgiu a oportunidade de se implementar
direitos importantes antes não contemplados. Tais direitos eram omissos ou havia
poucas pretensões para efetivá-los até antes da atual Constituição.
O grupo das mulheres, a título de exemplo, obteve várias conquistas. No
âmbito sociofamiliar se nivelaram aos companheiros ou parceiros pela guarda e proteção dos filhos, extinguindo o antigo pátrio poder (nomenclatura do Código Civil de 1916 que atrelava o poder austero sobre os filhos e a esposa ao progenitor). Na esfera penal conseguiram a proteção jurídica contra maus tratos sofridos por seus companheiros, através da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, Lei Maria da Penha (BRASIL, 2006, online).
Continuando nessa análise, as crianças e os adolescentes passaram a ser protegidos pelo Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) – Lei nº 8069, de 13 de julho de 1990 (BRASIL, 1990, online). Seus preceitos abrangem todas as crianças e adolescentes, estando ou não em condições de vulnerabilidade, ficando conhecido pelas medidas preventivas, socioeducativas e protetivas que resguardavam meninos e meninas do trabalho infantil e da violência física aos quais estivessem expostos (GARCIA, 2009).
1990, objetivando garantir e preservar direitos fundamentais desta classe, tais como o direito ao trabalho e à profissionalização, dentre outros.
A reinserção de trabalhadores de faixa etária mais avançada se consolida pela escassez de profissionais qualificados e pelo alto custo de especializar novos profissionais em ramos específicos que demandam despesas e tempo adicional. De acordo com Silva e Feitosa (2013, online, grifo do autor): “Estudos sobre idosos e mercado de trabalho confirmam também que a maior participação de idosos no mercado de trabalho e a sua permanência trabalhando, nos últimos anos, é devido a suas qualificações”.
A exigência do mercado de trabalho por mão-de-obra especializada
concatenou-se com perfeição às necessidades internas de complementação de
renda do idoso, permitindo a decisão pela continuidade de suas atividades laborais,
adiando em alguns casos a aposentadoria. Conforme Kubo e Golveia (2012, p. 540):
“O trabalho tem sido visto não somente como forma de obter a renda, mas também
como atividade que proporciona realização pessoal, status social e possibilidade de
estabelecer e manter contatos interpessoais, entre outros”.
A relevância desse trabalho está no reconhecimento do trabalho do idoso como direito fundamental no ordenamento jurídico brasileiro e sua aplicabilidade prática. Assim, seu objeto de estudo são as legislações que constam no ordenamento jurídico brasileiro, além dos tratados que foram a ele incorporados e
artigos científicos relacionados ao tema.
O objetivo geral do estudo é analisar a legislação nacional que trata sobre
o direito ao trabalho do idoso desde 1988 até os dias atuais, sua garantia
constitucional e o que se tem feito na área jurídica para a efetivação desse direito.
Portanto, além desta seção introdutória, o estudo apresenta na seção 2
uma distinção entre direitos humanos e fundamentais, a evolução histórica dos
direitos fundamentais, uma explanação sobre os direitos fundamentais e sua
interferência no universo do trabalho, além de um histórico das atividades laborais
da terceira idade na sociedade capitalista, estabelecendo suas origens, evolução e a
Na seção 3 é dada ênfase ao estudo do trabalho na terceira idade como
um direito fundamental, sua evolução nos âmbitos constitucional e
infraconstitucional.
Na seção 4 são apresentadas as conquistas sociais do idoso na
Constituição Federal, além da análise de outras legislações, tais como o Estatuto do
Idoso, Tratados e Convenções internacionais que foram incorporados ao
Ordenamento Jurídico. Também na mesma seção se discute a discriminação do
idoso no trabalho e as responsabilidades atribuídas ao Estado e às empresas por
tais atos, além das medidas protetivas. Nesta seção também são expostas
perspectivas do trabalho do idoso e sua inclusão social. Finalmente, na seção 5 são
apresentadas as considerações finais.
Espera-se, portanto, com esse trabalho, contribuir para a produção científica acerca do direito ao trabalho do idoso, auxiliando também outros pesquisadores a trabalharem nesta temática, tão carente de estudos e incentivos.
2 DIREITOS FUNDAMENTAIS: DEFINIÇÃO, EVOLUÇÃO E SUA INTERFERÊNCIA NO TRABALHO DA TERCEIRA IDADE
Esta seção trata sobre uma noção doutrinária dos direitos fundamentais buscando relacioná-los como o trabalho na terceira idade. Nesse aspecto, Norberto Bobbio (1992, p. 5) afirma que:
Os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizados por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas.
Doutrinadores de destaque referendam em seus escritos não haver
diferença relevante entre as expressões "direitos fundamentais" e "direitos
humanos"; aliás, rotineira é a identificação de autores que as têm por sinônimas.
Nada obstante, majoritariamente a doutrina identifica uma diferença entre os termos, referente ao plano em que os direitos são consagrados: enquanto os direitos humanos são identificáveis tão somente no plano contrafactual (abstrato), desprovidos de qualquer normatividade, os direitos fundamentais são os direitos humanos já submetidos a um procedimento de positivação, detentores, pois, das exigências de cumprimento (sanção), como toda e qualquer outra norma jurídica.
A doutrina utiliza diversas expressões análogas para direitos humanos,
dentre elas podemos citar: direitos do homem, liberdades fundamentais, direitos
naturais, direitos individuais, direitos públicos subjetivos, liberdades fundamentais,
liberdades públicas, direitos fundamentais do homem, direitos humanos
fundamentais etc. Sobre a questão Canotilho (1995, p. 393) discursa:
As expressões ‘direitos do homem’ e ‘direitos fundamentais’ são frequentemente utilizadas como sinônimas. Segundo a sua origem e significado poderíamos distingui-las da seguinte maneira: direitos do homem são direitos válidos para todos os povos e em todos os tempos (dimensão jusnaturalista-universalista); direitos fundamentais são direitos do homem, jurídico-institucionalmente garantidos e limitados espacio-temporalmente. Os direitos do homem arrancariam da própria natureza humana e daí o seu caráter inviolável, intemporal e universal; os direitos fundamentais seriam os direitos objectivamente vigentes numa ordem jurídica concreta.
As inúmeras conceituações, no entanto, não afetam o entendimento da definição apresentada nesse trabalho, preferindo o uso do termo “direitos fundamentais”, pois a análise do tema se concentra na legislação pátria.
2.1 Evolução histórica dos direitos fundamentais
Os direitos fundamentais devem ser relacionados ao campo histórico, pois não surgiram de uma repentina descoberta da sociedade ou de um grupo ou de indivíduos; sendo, na realidade, uma construção progressiva, resultado de lutas e conquistas sociais ao longo dos anos.
Doutrinariamente, os autores dividem estas conquistas de direitos
fundamentais em gerações. Esta divisão serve para análise e fins didáticos,
históricos e doutrinários.
fazendo-se uma analogia com os ideais da Revolução Francesa, nos quais a
liberdade surge em primeiro lugar em sua trilogia liberté, égalité, fraternité.1Assim
conclui Romita (2007, p. 104):
Por outra óptica, os direitos fundamentais do primeiro naipe podem ser classificados em: direitos pessoais (vinculados à autonomia, à liberdade e à segurança da pessoa) e direitos políticos (ajustados à ideia de participação) Os primeiros são os voltados à proteção da expansão da personalidade sem interferência do Estado. Os outros são os direitos da pessoa em face do Estado ou no Estado, vale dizer, direitos de tomar parte na vida pública e na vida política, correspondentes ao status activae civitatis de Jellinek”.
De acordo com o entendimento de Lenza (2013, p. 1028), os direitos da
primeira geração, portanto, marcam a passagem do Estado autoritário ao Estado de
Direito com respeito às liberdades individuais. Os mencionados direitos são
relacionados às liberdades públicas e aos direitos políticos, ou seja, direitos civis e
políticos a traduzir o valor da liberdade. São localizados temporariamente nos
séculos XVII, XVIII e XIX. São documentos históricos marcantes a Magna Carta de
1215, assinada pelo rei inglês “João Sem Terra”, a Paz de Westfália (1648) e as
Declarações americanas (1776) e a francesa (1789).
A segunda geração de direitos humanos está relacionada à ideia de
igualdade. Pode-se dizer que, se por um lado os direitos fundamentais de primeira
geração estão jungidos ao Estado liberal, os de segunda geração estão atrelados ao
welfare state, Estado do bem-estar social. São direitos sociais, culturais e econômicos bem como coletivos ou de coletividade. Os direitos fundamentais de
segunda geração ou dimensão foram inspirados pelo princípio da igualdade
(FURTADO; MENDES, 2008, p. 6975).
A segunda dimensão de direitos é localizada temporalmente no final do
século XIX, no período da Revolução Industrial europeia, adentrando o século XX e
é fruto de reivindicações trabalhistas contra as péssimas condições laborais. Sobre
tal dimensão de direitos, analisa Bonavides (2011, p. 568):
Se na fase da primeira geração os direitos fundamentais consistiam essencialmente no estabelecimento das garantias fundamentais da liberdade, a partir da segunda geração tais direitos passaram a
compreender, além daquelas garantias, também os critérios objetivos de valores, bem como os princípios básicos que animam a lei maior, projetando-lhe a unidade e fazendo a congruência fundamental de suas regras.
Os direitos fundamentais de terceira geração ou dimensão estão
relacionados a direitos transindividuais que ultrapassam os interesses do indivíduo e
preocupam-se na proteção do gênero humano com alto teor de humanismo e
universalidade. São identificados nessa dimensão cinco direitos: ao
desenvolvimento, a paz, ao meio ambiente, a propriedade sobre o patrimônio
comum da humanidade e a comunicação (LENZA, 2013, p. 1030).
Com respeito à Quarta Geração pontuam Furtado e Mendes (2008, p.
6977):
A quarta geração de direitos humanos está ligada à questão do biodireito. Foi, sem dúvida, por conta das atrocidades ocorridas durante a 2ª. Grande Guerra Mundial, mormente no que se refere a experimentos genéticos manietados pelos campos de concentração do nazismo que o direito moderno passou a se preocupar com a ética voltada para o trato das experiências com a genética e demais experiências e procedimentos médicos e biológicos, preocupação que deveria redundar na proteção da pessoa humana, quer de forma física, quer em sua dignidade, ocasionando, por sua vez, uma humanização do progresso científico.
Segue a essa mesma compreensão o mestre italiano Norberto Bobbio,
conforme Lenza (2013, p.1030). Porém Bonavides (2011, p. 571) entende que a
globalização política na esfera normativa jurídica introduz os direitos de quarta
geração, possuindo entendimento diverso. Destacam-se, neste âmbito, os direitos à
democracia, à informação e ao pluralismo.
O professor Bonavides entende que o direito à paz, classificado como
direito de terceira dimensão, deve ser elevado ao grau de direito fundamental da
quinta geração ou dimensão, ideia firmada no 9º Congresso Ibero-Americano de
Direito Constitucional. A paz logrou, ali, a dignidade teórica de um direito e de um
princípio constitucional (BONAVIDES, 2011, p. 582).
A partir da descrição das gerações dos direitos fundamentais propicia-se
o arcabouço para se construir a dignidade da pessoa humana, ponto importante a se
2.2Dignidade da pessoa humana: suas relações entre os indivíduos e o Estado
Assim, os direitos fundamentais e os direitos humanos buscam assegurar
e promover a dignidade da pessoa humana, sendo interligados a valores caros à
sociedade tais como a liberdade e a igualdade.
Observa-se que a dignidade da pessoa humana sempre esteve presente
na história, sendo alvo de luta no decorrer dos tempos. Passou por vários períodos
históricos, sendo muitas vezes mutilada, havendo outrora avanços. Através dessas
conquistas no decorrer do tempo foi inserida no ordenamento jurídico pátrio,
denominada com o termo “direitos fundamentais”.
Na Carta Encíclica Laborem Exercens, em comemoração aos 90 anos da carta Rerum Novarum, o Papa João Paulo II refere-se ao trabalho como "dimensão fundamental da existência humana, pela qual é construída cada dia a vida do homem, da qual esta recebe a própria dignidade específica" (João Paulo II, 1981, online).
Neste contexto, o reconhecimento da dignidade da pessoa humana é observado em diversos textos antigos. Sendo uma temática abordada não somente por obras de cunho religioso, mas também por obras do ramo filosófico e literário.
Pode-se citar, por exemplo, a obra Antígona do filósofo grego Sófocles, na qual a protagonista, Antígona, busca realizar rituais fúnebres dignos para um de seus irmãos, que foi morto em batalha, contrariando o decreto real de Creonte, seu tio (SÓFOCLES, 1999).
Sarlet (2001, p. 60) argumenta a importância e a necessidade da garantia
desse direito como forma de coexistência pacífica entre os homens e o equilíbrio da
vida, definindo bem a dignidade da pessoa humana:
ve-nham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida sau-dável, além de propiciar e promover sua participação ativa co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão dos demais se-res humanos.
Dessa forma, a dignidade da pessoa humana influencia toda uma ordem
social e política, podendo ser aceita como requisito para a efetivação das
potencialidades do ser humano. Seu reconhecimento será fundamental como
modelo que guiará todo o Direito, e todo o conjunto de vínculos intrínsecos de poder,
delimitando as relações entre os indivíduos e entre esses e o Estado,
implementando toda uma estrutura sócio-jurídico-política, a qual dará
sustentabilidade à sociedade democrática.
O ser humano deve possuir garantias e proteções estatais. Assim, a pessoa passa a ser finalidade primordial da atividade estatal. Nestes termos
assevera a Constituição Federal (BRASIL, 1988, online):
Art.1oA República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos:
I - a soberania; II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político.
Alexandre de Moraes (2001, p. 48) comenta o Art. 1º da Constituição Federal, o qual dispõe que a República Federativa do Brasil se constitui em Estado Democrático de Direito e tem como fundamento:
[...] a dignidade da pessoa humana: concede unidade aos direitos e garanti-as fundamentais, sendo inerentes às personalidades humangaranti-as. Esse funda-mento afasta a idéia de predomínio das concepções transpessoalistas de Estado e Nação, em detrimento da liberdade individual. A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constitu-indo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a ne-cessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos.
Faz-se necessária a superação do legalismo exegético-dogmático no ensino jurídico, mormente no tocante à conscientização e educação dos direitos fundamentais em todas as suas dimensões (individuais, sociais ou coletivos) uma vez que a concretização dos aludidos direitos ocorre em diversos âmbi-tos.
[...]
Os direitos fundamentais (que abrangem os direitos humanos constituciona-lizados) surgem e se desenvolvem a partir das Cartas Constitucionais nas quais foram reconhecidos e assegurados, carecedores de implementação pelos Poderes Constituídos dos Estados através de políticas públicas [...].
Sendo assim, é importante observar a evolução das atividades laborais
tendo como foco a dignidade da pessoa humana para posteriormente entender seus
reflexos no universo do trabalho dos idosos.
2.3 Origens históricas das atividades laborais e seus reflexos
Na antiguidade, o ser humano necessitava de instrumentos para a
aquisição de alimentos, buscando, assim, suprir suas necessidades básicas e de
seu grupo social. Desde modo, se inicia a fabricação de armas e instrumentos. Tais
utensílios eram apropriados a duas vertentes: a primeira, para a caça, em que eram
adquiridos alimentos; a segunda vertente para a defesa, tanto de animais ferozes ou
ante o ataque de outros grupos humanos rivais que buscavam a manutenção de
suas tribos pela pilhagem ou mesmo objetivavam conquistas territoriais que
possibilitavam a sobrevivência imediata de suas vidas e de seus descendentes.
Destarte, no período paleolítico, surge a fabricação das primeiras lanças e
machados usados para caça de animais e para lutas entre tribos adversárias.
Nestas lutas, os adversários que sobreviviam tornavam-se prisioneiros para prevenir
o fato de tê-los novamente como oponentes em outros combates. Com o tempo, o
custo de mantê-los se tornara bastante oneroso, passava-se então, a utilizar este
contingente humano de forma mais proveitosa, escravizando e assim locupletando
desta mão-de-obra de forma mais útil e de diversas as formas (SÜSSEKIND et al,
2005, p. 27).
Afirmam Jorge Neto e Cavalcante (2005, p. 3): o trabalho possuía este
O trabalho, na Antiguidade, representava punição, submissão, em que os trabalhadores eram os povos vencidos nas batalhas, os quais eram escravizados. O trabalho não era dignificante para o homem. A escravidão era tida como coisa justa e necessária. Para ser culto era necessário ser rico e ocioso. A escravidão, como um sistema social, apresenta os seres humanos divididos em duas classes: senhores e escravos. Para os escravos não se concede o reconhecimento da personalidade jurídica; equiparam-se às coisas, sendo objeto de uma relação jurídica (alienados como qualquer bem jurídico), não tendo direitos ou liberdade; são obrigados a trabalhar, sem qualquer tipo de garantia, não percebendo nenhum salário.
Portanto, podemos equiparar estas pessoas a res (coisas ou objetos) já que se equiparavam a objetos de compra e venda, ficando a mercê da utilização de
seus donos. Nesse diapasão sustentam Süssekind et al (2005 p. 27):
Os mais valentes e os chefes, faziam maior número de prisioneiros, não podendo utilizar a todos em seu serviço pessoal, passaram a vendê-los, trocá-los ou alugá-los. Aos escravos eram dados os serviços manuais exaustivos não só por essa causa como, também, porque tal gênero de trabalho era considerado impróprio e até desonroso para os homens válidos e livres.
Neste sentido confirma Barros (2012, p.43):
Na Antiguidade Clássica, no mundo grego-romano, o trabalho possuía um sentido material, era reduzido a coisa, o que tornou possível a escravidão. A condição de escravo derivava do fato de nascer de mãe escrava, de ser prisioneiro de guerra, de condenação penal, de descumprimento de obrigações tributárias, de deserção do exército, entre outras razões. Nessa forma de trabalho, o homem perde a posse de si mesmo. Ao escravo era confiado o trabalho manual, considerado vil, enquanto os homens livres dedicavam-se ao pensamento e à contemplação, para os quais os escravos eram considerados incapazes.
As funções mais exaustivas ficaram por conta dos escravos, pois os
homens livres viam essas atividades como desonrosas. A própria etimologia da
palavra trabalho remete a condição brutal, vem do latim tripalium, que era uma espécie de instrumento de tortura de três paus ou uma canga que pesava sobre os
animais. Assim, os romanos consideravam o trabalho desonroso (MARTINS, 2004,
p. 4).
uma penalidade imposta por Deus pelo pecado humano, apresentando um aspecto de castigo atrelado às atividades laborais. De acordo com Süssekind et al (2005, p. 83):
A evolução do cristianismo, valorizando o trabalho, não representava, também, nos primeiros séculos, a criação de condições fundamentais para um direito novo. Valorizava-se o trabalho, mais do que como dever social, como um corretivo ao ócio, uma humilhação do corpo, e para assegurar a manutenção própria sem ter de obtê-la de mãos estranhas; era assim entre os beneditinos.
Em todo o período da antiguidade a escravidão era considerada devida e
imprescindível, tendo defensores, dentre outros, os filósofos gregos Platão e
Aristóteles que entendiam, ainda, que o trabalho possuía um sentido pejorativo.
Neste período, e especificamente na Grécia, o cidadão não trabalhava em atividades
pesadas, era função do bárbaro, ou do escravo, do não cidadão, do homem não
heleno: em suma, não era um ato nobre a um cidadão, contrariando sua natureza.
Ficando este encargo aos inferiores, pois esta noção de raça superior já se
encontrava nesta sociedade: o trabalho era algo desdenhoso e envolvia apenas
força física bruta, enquanto a dignidade do homem heleno consistia em participar
dos negócios da polis por meio da palavra. Assim comentava Aristóteles (1985, p. 19):
Na verdade, a utilidade dos escravos pouco difere da dos animais; serviços corporais para atender às necessidades da vida são prestados por ambos, tanto pelos escravos quanto pelos animais domésticos. A intenção da natureza é fazer também os corpos dos homens livres e dos escravos diferentes – os últimos fortes para as atividades servis, os primeiros erectos, incapazes para tais trabalhos, mas aptos para a vida de cidadãos [sic].
Neste trecho percebemos a apologia feita pelo escritor à segregação dos
escravos e dos homens helenos. Uma superioridade que não permitia que o homem
civilizado grego se contaminasse como o trabalho, delegado aos homens inferiores
assemelhados a animais, ou pouco se diferindo destes.
Os escravos fabricavam flautas, facas, ferramentas agrícolas e de
combate, móveis na Grécia Antiga. Com isso, foram fomentadas as primeiras
atividades artesanais. Apesar desta situação de dor e inferioridade, alguns escravos
em dias festivos. Não tendo outros meios de se sustentarem, passaram a trabalhar
em seus antigos ofícios, com a vantagem de serem ressarcidos pelos seus esforços
de forma remunerada: surgiam, assim, os primeiros grupos de trabalhadores
assalariados que a posteriori dariam origem e sustentáculo à sociedade capitalista (SÜSSEKIND et al, 2005, p. 28).
Na Europa, na Idade Média, surge o instituto da servidão, adotado dos
séculos X ao XIII, e representa o regime no qual em troca de proteção militar e
política, os servos, que não eram livres, tinham que prestar serviços e entregar parte
de sua produção rural aos senhores feudais. Por consequência, os servos se
tornavam vassalos de um senhor. Tal sistema representa uma bilateralidade nas
relações de trabalho, algo inexistente na escravidão. A extinção desde sistema servil
ocorreu no final da Idade Média com o fim do feudalismo (JORGE NETO;
CAVALCANTE, 2005, p. 5).
Paralelamente ao sistema servil surgem as corporações de ofício
compostas de homens livres, os quais eram categorizados em mestres,
companheiros e aprendizes. Os “mestres” eram os proprietários das oficinas. Os
companheiros percebiam salários dos mestres. Além dos aprendizes, menores que
recebiam dos mestres o ensino metódico do ofício ou profissão. Com este método
de produção caracteriza-se certo grau de liberdade ao trabalhador assalariado,
antecipando-se ao capitalismo, porém sem qualquer tipo de proteção aos
empregados. As corporações foram suprimidas e extintas de vez pelo Decreto
d’Alllarde e a Lei Le Chapelier de 1791, por serem incompatíveis com o ideal de
liberdade do homem (MARTINS, 2004, p. 5). Analisa Delgado (2013, p. 82-83):
O pressuposto histórico-material (isto é, trabalho livre) do elemento nuclear da relação empregatícia (trabalho subordinado) somente surge, na história ocidental, como elemento relevante, a contar da Idade Moderna. De fato, apenas a partir de fins da Idade Média e alvorecer da Idade Moderna verificaram-se processos crescentes de expulsão do servo da gleba, rompendo-se as formas servis de utilização da força de trabalho. Esse quadro lançaria ao meio social o trabalhador juridicamente livre dos meios de produção e do proprietário desses meios.
Simultaneamente, nesse mesmo período da Idade Moderna, com a
o trabalho escravo. Entretanto o índio não se adaptou ao sistema devido seu estilo
de vida natural e às limitações que a escravidão lhe condicionava. Portanto houve
necessidade de utilização da mão-de-obra escrava de povos africanos. Através de
incursões na Costa Africana que levavam homens e mulheres ao Novo Mundo, as
atividades comerciais de compra e venda de escravos foram incrementadas.
A Revolução Francesa proclama este sistema como indigno, sendo
golpeado crucialmente em 1857, quando a Inglaterra oficialmente também o
extingue de seus territórios. Apesar disso, oitenta anos depois a Liga das Nações
reconhecia a existência de escravos na Ásia e na África (JORGE NETO;
CAVALCANTE, 2005, p. 4).
Destarte, os ideais liberais que dariam sustentáculo ao emergente
sistema capitalista viram a escravidão como um empecilho ao sistema. Nessa
época, a intelectualidade e a filosofia consideram-na degradante. O escravismo
declina e começa a predominar uma nova força de trabalho: a assalariada,
vulgarmente avocada de proletariado.
Além da mão-de-obra assalariada, o Estado Liberal propiciou uma nova
perspectiva para as atividades laborais eliminando os vínculos que a escravidão
impunha, permitindo o exercício de atividades da livre iniciativa, reflexo disso é a
explanação do texto constitucional no artigo 5º, XIII, que diz: “É livre o exercício de
qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a
lei estabelecer” (BRASIL, 1988, online).
Assim, o antigo sistema (escravocrata) que dera sustentáculo às sociedades das mais diversas épocas se tornara assunto ultrapassado. O proletariado, nova força de trabalho emergente, engrenagem essencial às expectativas capitalistas, se tornara agente propulsor do sistema vigente, pela exploração de sua força de trabalho, produzindo em alta escala, destarte, produtos que não poderiam consumir. Conforme Carmo (s.d., online):
raro, tidos por negligentes e insubordinados pelos seus empregadores, ainda que tal se desse pela exaustão física. Ademais, tiveram que aprender a trabalhar de maneira regular e ininterrupta, de forma que o trabalho rendesse. Além disso, utilizavam meios de produção que não lhes pertenciam e geravam excedentes que, da mesma forma, nunca iriam lhes pertencer, com a única finalidade de produzir o lucro para os burgueses. Esses patrões os utilizariam para continuar a financiar a industrialização, ou seja, enriquecendo frente ao contínuo empobrecimento dos proletários, o que levava os segundos à insatisfação, muitas vezes ocasionando conflitos. Vemos assim que o proletário era alienado do seu trabalho, pois além de não saber qual era o fim da sua produção, não podia usufruir o produto que era destinado a outros.
Surge, portanto, o sistema capitalista moderno, que se baseia na busca por produção, que resultou numa submissão total do trabalhador. Acerca da origem do trabalho livre e subordinado, Hobsbawm (1977, p. 44) narra:
O que significa a frase ‘a revolução industrial explodiu’? Significa que a certa altura da década de 1780, e pela primeira vez na história da humanidade, foram retirados os grilhões do poder produtivo das sociedades humanas, que daí em diante se tornaram capazes da multiplicação rápida, constante, e até o presente ilimitada, de homens, mercadorias e serviços. Este fato é hoje tecnicamente conhecido pelos economistas como a ‘partida para o crescimento autossustentável’. Nenhuma sociedade anterior tinha sido capaz de transpor o teto que a estrutura social pré-industrial, uma tecnologia e uma ciência deficientes, e consequentemente o colapso, a fome e a morte periódicas, impunham à produção. A ‘partida’ não foi logicamente um desses fenômenos que, como os terremotos e os cometas, assaltam o mundo não-técnico de surpresa.
Assim, se inicia uma nova fase no sistema produtivo, passa o modo de produção artesanal a industrial e em série, modo este presenciado até hoje, ocasionando uma revolução tecnológica e crescimento econômico com reflexos no
padrão de vida das pessoas, seja no consumo ou nas relações trabalhistas. Fato
que mudou significativamente o comportamento e os padrões sociais anteriores à
Revolução Industrial, objetivando a fabricação em massa e o acúmulo de capitais.
2.4 O trabalho na terceira idade para o sistema capitalista: breve análise
Substancialmente pode-se considerar que a base da sociedade capitalista
que presenciamos atualmente remonta a estrutura surgida no final da Idade Média e
início da Moderna, fato já explicado, quando o proletariado servia de força de
trabalho e os burgueses detinham os meios de produção. Segundo Delgado (2005,
Evidentemente, embora ampla, tem uma inquestionável delimitação: refere-se a dispêndio de energia pelo refere-ser humano, objetivando resultado útil (e não dispêndio de energia por seres irracionais ou pessoas jurídicas). Trabalho é atividade inerente à pessoa humana, compondo o conteúdo físico e psíquico dos integrantes da humanidade.
As definições de trabalho são as mais amplas possíveis, tendo em sua essência um ponto comum: ou seja, um conjunto de atividades humanas produtivas ou criativas para atingir um fim específico.
Corrado (apud MARANHÃO; CARVALHO, 1993) comenta acerca do conceito jurídico de trabalho: supõe que este se apresente como objeto de uma prestação devida ou realizada por um sujeito em favor de outro. Isso ocorre quando uma atividade humana é desenvolvida por uma pessoa física, essa atividade é destinada à criação de um bem materialmente avaliável, quando surgir de relação por meio da qual um sujeito presta, ou se obriga a prestar, pela própria força de trabalho em favor de outro sujeito, em troca de uma retribuição. Contudo, de fato, prevalece na sociedade brasileira a ideia de exploração e sofrimento vinculado à palavra trabalho e não uma forma de ascensão, enriquecimento e melhoria de vida.
A Revolução Industrial acabou transformando o trabalho em emprego; a maioria dos trabalhadores passou a receber salário, sendo consumidas todas suas forças, pois eram explorados de forma brutal, sem garantias ou direitos mínimos de
proteção (vale ressaltar que a mão-de-obra deveria ser paga por valor ínfimo para
substituir a anterior: escrava). Neste plano, o trabalho era vinculado ao sistema
capitalista através da exploração e do desgaste físico, aspecto que se prolongaria
por muito tempo e, em parte, ressoa até os dias de hoje na sociedade. Nesse
sentido nos assevera Nascimento (2009, p.15):
A imposição de condições de trabalho pelo empregador, a exigência de excessivas jornadas de trabalho, a exploração das mulheres e menores, que constituíam mão-de-obra mais barata, os acidentes ocorridos com os trabalhadores no desempenho das suas atividades e a insegurança quanto ao futuro e aos momentos nos quais fisicamente não tivessem condições de trabalhar foram as constantes da nova era no meio proletário, às quais podem-se acrescentar também baixos salários.
Ainda nesse período da Revolução Industrial abusos frequentes eram
O trabalho das mulheres e menores foi bastante utilizado sem maiores preocupações. Na Inglaterra, os menores eram oferecidos aos distritos industrializados, em troca de alimentos, fato muito comum nas atividades algodoeiras de Lancashire [...]
Houve verdadeiros contratos de compra e venda de menores, estabelecidos entre indústrias e administradores de impostos dos pobres. O industrial de algodão Samuel Oldknow, contratou, em 1796, com a paróquia a aquisição de um lote de 70 menores, mesmo sem a vontade dos pais. Yarranton tinha, a seu serviço, 200 meninas que fiavam em absoluto silêncio e eram açoitadas se trabalhavam mal ou demasiado lentamente. Daniel Defoe pregava que não havia nenhum ser humano de mais de quatro anos que não podia ganhar a vida trabalhando. Se os menores não cumpriam as suas obrigações na fábrica, os vigilantes aplicavam-lhes brutalidades, o que não era geral mas, de certo modo, tinham alguma aprovação dos costumes contemporâneos. Em certas fábricas, a cisterna de água pluvial era fechada à chave.
Preocupada com a questão dos trabalhadores e de suas famílias, a
doutrina social da Igreja Católica condena os excessos capitalistas, socialistas e
comunistas editando as Encíclicas Rerum Novarum (1891), de Leão XIII, passando
pela Quadragessimo Anno (1931) ou pela Divini Redemptores (1931) ambas de Pio XI (Barros, 2012, p. 60).
Embora as Revoluções Francesa e Industrial exaltassem a liberdade
individual com reflexos nas relações empregatícias, pouco se refletiu nas condições
dos trabalhadores. Era necessária a criação de leis trabalhistas e medidas protetivas
que resguardassem o ser humano de modo a assegurar o bem comum, pois não
sendo a propriedade um direito absoluto, cabe ao Estado o dever de intervir nas
relações de trabalho para garantir o bem comum (BARROS, 2012, p. 60).
A velhice nunca foi tema que tivesse grande relevância no contexto
capitalista, não incidindo sobre ela valor algum, ou muito pouco. Passa a ser
sinônimo de degeneração e decadência quando o sistema capitalista começa a
atribuir para cada faixa etária humana valores diferenciados de acordo com sua
força produtiva e a possibilidade de produção de riquezas.
2.5 Atividades laborais na sociedade capitalista e impactos na terceira idade
Dessa maneira, os mais velhos não eram bem vistos no sistema
capitalista, por serem tidos como empecilho à engrenagem mercantil e à produção
do trabalho. Barros (2012, p. 51) comenta sobre a Revolução Industrial:
O emprego generalizado de mulheres e menores suplantou o trabalho dos homens, pois a máquina reduziu o esforço físico e tornou possível a utilização das “meias forças dóceis”, não preparadas para reivindicar. Suportavam salários ínfimos, jornadas desumanas e condições de higiene degradantes, com graves riscos de acidentes.
A lógica de mercado e produção do sistema industrial não poupava
métodos para otimizar seus lucros. Utilizava-se mão-de-obra feminina e infantil na
diminuição dos custos, e os mais velhos eram rejeitados pelo mercado.
Posteriormente quando o trabalho intelectual se sobrepôs ao manual,
iniciou-se uma valorização dos profissionais com mais experiência para a execução
diversos trabalhos. Nesse contexto entende-se que os idosos em relação aos
trabalhadores mais jovens possuem acúmulo de conhecimento, seja pelas suas
experiências mercadológicas ou experiências de vida. Neste aspecto temos as
palavras de Maria Tatiana Guimarães (2007, p. 44):
O decorrer do tempo e o aumentar da idade não traz apenas efeitos negativos para a capacidade em relação ao trabalho, pois, anos de trabalho trazem também a acumulação de experiências profissionais que facilitam muitas vezes a realização de tarefas. A capacidade do idoso não pode ser avaliada somente levando-se em conta suas limitações, mas também devem ser valorizadas as suas possibilidades.
No mesmo entendimento, afirma Furtado (2004, p. 294):
É certo que essa precocidade em se enxergar no trabalhador a mais idade tanto é maior quanto mais modesta for sua atividade laboral, não se podendo deixar de admitir que em atividades intelectuais e de altos cargos há uma rarefação de mencionada precocidade em se enxergar a mais idade, sendo, ao reverso, fator mais idade muitas vezes status positivo para o desempenho daquela função intelectual ou de mando.
Na atualidade, como complementação de renda, os idosos retornam ao
mercado ou frequentemente permanecem em seus postos de trabalho sem
aposentar-se, sendo esta uma tendência mundial. Este retorno ao trabalho dos
aposentados de classe baixa ocorre devido à dificuldade em manter o mesmo
padrão de vida que possuíam antes da aposentadoria. Conforme entendimento de
[...] as classes média-alta e alta podem usufruir o tempo livre, possuem oportunidades de lazer, condições para acompanharem as mudanças no mundo do trabalho, e assim continuarem trabalhando como profissionais li-berais. Já para os indivíduos de classe média e baixa, a aposentadoria re-presenta a continuação das dificuldades para manter o mesmo padrão de vida, pois para estes, na maioria das vezes, a inatividade implica em queda dos rendimentos [...].
A garantia de educação, saúde e a possibilidade de trabalho e lazer,
segurança e habitação tornam-se ganhos possíveis e reais para eles. Tudo isto, com
a perspectiva de ter suas decisões reconhecidas pelo grupo familiar e pela
comunidade; ou seja, fazer parte da vida, sendo agente ativo da realidade que os
rodeia: garantindo o reconhecimento a sua cidadania. Isso os incentiva a continuar
trabalhando.
3 O TRABALHO NA TERCEIRA IDADE COMO DIREITO FUNDAMENTAL NO
ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Com o advento da Constituição Federal de 1988 ocorreu a positivação
dos direitos fundamentais na ordem jurídica brasileira, o direito a velhice ou a uma
velhice digna também teve sua positivação efetiva, amparando a pessoa idosa nos
princípios da cidadania e dignidade da pessoa humana.
3.1 O direito ao trabalho do idoso como direito fundamental no contexto constitucional brasileiro
A proteção da pessoa idosa amparada nos princípios da cidadania passa
a fazer parte do universo de direitos que irão produzir uma sociedade justa e
igualitária, fundamentos estes a serem alcançados pelo Estado brasileiro.
Novamente cita-se o Art. 1º da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988, online):
Art.1° A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos:
I - a soberania; II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
V - o pluralismo político.
A dignidade da pessoa humana, a cidadania, os valores do trabalho são
reconhecidos como direitos fundamentais, expressamente inclusos no texto
constitucional brasileiro, a partir de sua aceitação no plano político interno das linhas
mestras relativas aos direitos humanos, reconhecidos a nível universal, nas quais se
insere a dignidade do idoso, evidentemente em todos os seus aspectos. Paulo
Roberto Barbosa Ramos (2003, p. 149) comenta que:
Assegurar os direitos fundamentais das pessoas idosas é uma alternativa inteligente para a garantia de todos os seres humanos. Todavia, fez-se observar que somente serão assegurados os direitos fundamentais aos idosos na medida em que aos seres que envelhecem seja garantido, durante a existência, o direito à dignidade.
O texto da Carta Magna (BRASIL, 1988, online), no seu artigo 3º, IV
preconiza que a República Federativa do Brasil tem como objetivos fundamentais,
entre outros: “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo,
cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
Portanto, nossa Constituição objetiva assegurar a promoção do bem de
todos, incluindo os idosos, quando afirma que é seu objetivo eliminar os
preconceitos de idade, também os ocorridos em ambiente laboral.
A Constituição Federal vigente (BRASIL, 1988, online) dispõe sobre pessoa idosa em seu Art. 230: “A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida”.
Foi focalizado pelo constituinte apresentar como prioridade o direito à dignidade das pessoas idosas, favorecendo sua participação na comunidade e propiciando seu direito à vida.
3.2 Direito a não discriminação no trabalho
igualdade social.
3.2.1 Princípio da Igualdade
Pelo princípio da Igualdade, que objetiva nivelar a desigualdade existente entre os homens, Jorge Neto e Cavalcante (2010, p. 1089) afirmam: “os seres humanos são desiguais pela natureza, cada um com suas aptidões, todavia, sem exceção, todos devem ter um tratamento justo em face da lei”.
Nesse entendimento, o princípio da igualdade confere um tratamento igualitário para todos em face da lei, razão pela qual se justifica o comportamento diferenciado de algumas categorias que necessitam de proteção especial. Nestes termos, Bandeira de Mello (1993, p. 79) assevera: “Os tratamentos diferenciados são compatíveis com a Constituição Federal quando verificada a existência de uma finalidade razoavelmente proporcional ao fim visado”.
3.2.2 Discriminação por motivo de idade
A Constituição Federal veda qualquer ato discriminatório em seu artigo 7°, XXX, conforme afirma Jorge Neto e Cavalcante (2010) citam outro dispositivo legal, a Lei 9.029 de 13 de abril de 1995, em seu artigo 1°: “É proibida a prática discriminatória limitativa para efeito de acesso ou manutenção da relação empregatícia, em função de sexo, origem, raça, estado civil, situação familiar ou idade” (BRASIL, 1995, online). Continuando nessa análise, os mesmos doutrinadores Jorge Neto e Cavalcante (2010) salientam que:
O Estatuto do Idoso (Lei 10.741) tipifica como crime, por motivo de idade, obstar o acesso de alguém a qualquer cargo público e negar a alguém emprego ou trabalho (art. 100, I, II), punível com reclusão de 6 meses a um ano de multa.
3.3 O direito do idoso ao trabalho no âmbito infraconstitucional: Estatuto do Idoso
O movimento social do idoso se constituiu em um dos protagonistas do Estatuto, diferente do que aconteceu com a Lei 8.842 de 04 de janeiro de 1994, que implantou a Política Nacional do Idoso, tendo como destaque a pressão da sociedade civil, onde se destacaram a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG) e a Associação Nacional de Gerontologia (ANG) (PAZ E GOLDMAN, 2006, online). Essa lei, em seu artigo 1°, afirma que a Política Nacional do Idoso tem como finalidade: “[...] assegurar os direitos sociais do idoso, criando condições para promover sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade” (BRASIL, 1994, online).
Para regular a Lei supracitada foi publicado o Decreto n° 1.948, de 03 de
julho de 1996 (BRASIL, 1996, online), que dentre outras regulamentações definiu as várias modalidades de atendimento às pessoas idosas, articulando e estruturando uma política nacional de proteção e defesa dos direitos da pessoa idosa (RAMOS, 2014, p. 158).
Posteriormente, como reconhecimento a esta demanda, foi publicado o
Estatuto do Idoso, Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003, que nasce regulando
direitos e fixando obrigações às entidades de atendimento a essa faixa etária da
população. Iniciando-se uma nova fase de reconhecimento de direitos destes
senhores e senhoras, antes negligenciados. Assim, estes homens e mulheres, que
tiveram seus direitos não reconhecidos ou aviltados pela sociedade por anos, finalmente encontraram novas perspectivas às suas condições. Paz e Goldman (2006, p. 3-4) discursam sobre sua elaboração:
Idoso, após o debate em conjunto com a representação da sociedade civil e que se definissem os parâmetros e diretrizes para futuras Leis e tivessem o caráter de assegurar direitos aos idosos. Este encontro gerou o denominado Seminário sobre o Estatuto do Idoso que contou com mais de 500 participantes que trabalharam na discussão dos referidos projetos e com a perspectiva de condensá-los num único Projeto.
Dessa forma intentou-se escrever uma legislação para esta faixa etária
oportunizando dignidade e reconhecendo direitos para as pessoas idosas. Desta
maneira, no âmbito infraconstitucional, foi incluído em nosso ordenamento jurídico o Estatuto do Idoso,Lei nº 10.741 (aprovada e sancionada em 2003).
Em seu artigo 1º:“É instituído o Estatuto do Idoso, destinado a regular os direitos assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos” (BRASIL, 2003, online).
Veio com a proposta de garantir a condição digna e plena da cidadania, ou seja, tal procedimento visa amenizar a atroz lei mercantilista que reduz tudo e todos a cifras. Sobre este aspecto negativo da sociedade, Paulo Roberto Barbosa Ramos comenta (2003, p. 133):
Sabe-se que a velhice é visualizada pela sociedade brasileira de forma ne-gativa. Em regra, as pessoas fazem de tudo para evitar a velhice, apesar de a natureza empurrar os homens, salvo motivo de força maior, para essa etapa da vida. A visão consoante a qual a velhice é um ciclo faz com que ho -mens e mulheres abdiquem, quando chegam a essa fase da existência, de seus direitos, como se a velhice acarretasse a perda da condição humana. A incorporação dessa idéia torna os idosos seres que ruminam o passado e digam, dia após dia, que seu tempo já passou, esquecendo-se que é o tem-po que está no homem e não o contrário. Disso tudo decorre uma séria con-seqüência: a apatia política dos idosos. Se o tempo de quem é idoso já pas-sou, já não há como interferir no presente. Assim, os idosos são sutilmente excluídos da sociedade em que vivem.
Constata-se formalmente a preocupação com a dignidade da pessoa
idosa nos artigos 2º, 9º e 10 do Estatuto do Idoso (BRASIL, 2003, online):
Art. 2° O idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegu-rando-se-lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilida-des, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade. [...]
envelhecimento saudável e em condições de dignidade. [...]
Art. 10. É obrigação do Estado e da sociedade, assegurar à pessoa idosa a liberdade, o respeito e a dignidade, como pessoa humana e sujeito de direi-tos civis, políticos, individuais e sociais, garantidos na Constituição e nas leis.
Assim, pode-se afirmar que assegurar a dignidade na velhice é proporcionar ao idoso a oportunidade de trabalho e a manutenção de emprego daqueles que ainda se encontram trabalhando (LINDOSO, 2001, online).
Consequentemente, o Capítulo VI do Estatuto do Idoso (BRASIL, 2003, online) consagra o direito ao trabalho e a profissionalização deste grupo de pessoas. Segue:
CAPÍTULO VI - Da Profissionalização e do Trabalho
Art. 26. O idoso tem direito ao exercício de atividade profissional, respeitadas suas condições físicas, intelectuais e psíquicas.
Art. 27. Na admissão do idoso em qualquer trabalho ou emprego, é vedada a discriminação e a fixação de limite máximo de idade, inclusive para concursos, ressalvados os casos em que a natureza do cargo o exigir. Parágrafo único. O primeiro critério de desempate em concurso público será a idade, dando-se preferência ao de idade mais elevada.
Art. 28.O Poder Público criará e estimulará programas de:
I – profissionalização especializada para os idosos, aproveitando seus potenciais e habilidades para atividades regulares e remuneradas;
II – preparação dos trabalhadores para a aposentadoria, com antecedência mínima de 1 (um) ano, por meio de estímulo a novos projetos sociais, conforme seus interesses, e de esclarecimento sobre os direitos sociais e de cidadania;
III – estímulo às empresas privadas para admissão de idosos ao trabalho.
Assim, buscando minimizar e coibir formas de preconceito, atos discriminatórios e vexatórios, o legislador buscou a inserção deste grupo de forma mais participativa nos meios sociais e laborais, objetivando minimizar atos que desvalorizassem estas pessoas e estimulando sua inclusão social como pessoas dignas e produtivas à sociedade.
Nesse contexto, entende-se que os idosos devem ter o poder de decisão sobre inserir-se ou não no mercado, compreendendo este ato como uma proteção aos direitos fundamentais desta classe.
3.4 O trabalho do idoso face a OIT
A respeito dos princípios e direitos fundamentais do trabalho, a
Organização Internacional do Trabalho (OIT) versa em sua declaração de 19 de
junho de 1998 (OIT, 1998, online):
a) a liberdade sindical e o reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva;
b) a eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou obrigatório; c) a abolição efetiva do trabalho infantil; e
d) a eliminação da discriminação em matéria de emprego e ocupação.
Houve a preocupação desta relevante declaração em propor a eliminação da discriminação relacionada ao emprego. Com o objetivo de assegurar o cumprimento dos direitos e estabelecer padrões internacionais mínimos de relações trabalhistas, os tratados e convenções internacionais podem inspirar nosso ordenamento pátrio para elaboração de novas leis que contemplem o direito do
idoso ao trabalho, sendo descritos na próxima seção.
4 CONQUISTAS SOCIAIS DOS IDOSOS NO SÉCULO XX: REFLEXOS NO
BRASIL E MEDIDAS PROTETIVAS CONTRA A DISCRIMINAÇÃO AO
TRABALHO DA TERCEIRA IDADE
Os idosos obtiveram importantes conquistas a partir do século XX,
caracterizadas principalmente por alguns progressos, também, na área trabalhista.
Esta seção trata dessas conquistas, dos tratados internacionais e das medidas
protetivas.
4.1 Direitos humanos das pessoas idosas: uma breve narração sobre
No âmbito do Sistema Interamericano de Direitos Humanos, no final da
década de 1980, foram incorporadas medidas específicas em favor das pessoas
idosas. O Protocolo Adicional à Convenção Americana de Direitos Humanos,
conhecido como o Protocolo de São Salvador, é, até o momento, o único
instrumento vinculativo que incorpora especificamente os direitos das pessoas
idosas. Quatorze países da região já ratificaram o Protocolo de São Salvador, e
apenas oito deles promulgaram uma lei específica de proteção aos direitos das
pessoas idosas (NOTARI; FRAGASO, 2010, online).
O Decreto n° 3.321, de 30 de dezembro de 1999 ratificou o Protocolo de
São Salvador. Este tratado foi assinado em São Salvador, El Salvador, em 17 de
novembro de 1988, iniciando sua vigência apenas em 16 de novembro de 1999.
Seguem descritos os pontos relativos à pessoa idosa, em seu artigo 17
(ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS, 1988, online):
Toda pessoa tem direito à proteção especial na velhice. Nesse sentido, os Estados Partes comprometem-se a adotar de maneira progressiva as medidas necessárias a fim de pôr em prática este direito e, especialmente, a:
a. Proporcionar instalações adequadas, bem como alimentação e assistência médica especializada, às pessoas de idade avançada que careçam delas e não estejam em condições de provê-las por seus próprios meios;
b. Executar programas trabalhistas específicos destinados a dar a pessoas idosas a possibilidade de realizar atividade produtiva adequada às suas capacidades, respeitando sua vocação ou desejos;
c. Promover a formação de organizações sociais destinadas a melhorar a qualidade de vida das pessoas idosas.
As Nações Unidas convocaram a primeira Assembleia Mundial sobre o
Envelhecimento em 1982, que originou o Plano de Ação Internacional de Viena
sobre o Envelhecimento, com 62 pontos sobre o tema. Constam no documento
ações temáticas sobre saúde, nutrição e proteção aos consumidores idosos,
habitação e meio ambiente, família, bem-estar social, educação, segurança de renda
e emprego (ONU, 2016, online).
O debate durante a I Conferência Internacional sobre Envelhecimento das
Nações Unidas reconheceu a dificuldade da priorização de políticas públicas pelas