• Nenhum resultado encontrado

JONLANG-CRIANDOATEORIADAARQUITETURA-CAP.2

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "JONLANG-CRIANDOATEORIADAARQUITETURA-CAP.2"

Copied!
15
0
0

Texto

(1)

CRIANDO TEORIA DA ARQUITETURA: O

PAPEL DAS CIÊNCIAS

COMPORTAMENTAIS NO PROJETO

AMBIENTAL

(CREATING ARCHITECTURAL THEORY: THE ROLE OF THE BEHAVIORAL SCIENCES IN THE ENVIRONMENTAL DESIGN1)

JON LANG

CAPÍTULO 2

A NATUREZA E UTILIDADE DA TEORIA

TRADUÇÃO DE FREDERICO FLÓSCULO PINHEIRO BARRETO

(Prof. da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília)

Teoria é palavra ambígua. Ela significa coisas diferentes para pessoas

diferentes. Para algumas pessoas, uma teoria é um sistema de idéias ou de declarações – um esquema mental – que se acredita descrever e explicar um fenômeno ou grupo de fenômenos. Esse esquema pode ser um ato de fé não-examinado ou, idealmente, um ato de fé que tenha sido testado usando-se métodos científicos. Esse tipo de teoria será referida aqui como teoria positiva. Isso pode causar alguma confusão. O termo teoria positiva é usado porque consiste de declarações positivas, afirmações sobre a realidade. De modo algum isso implica em coincidência com os princípios da epistemologia

(2)

positivista, que afirma não haver verdade alguma além do domínio possível de verificação e falsificação (Ricouer, 1977).

A palavra “teoria” é usada pelo menos em outras três acepções. Pode ser referir a um modelo, um modo de perceber a realidade que impõe uma estrutura a essa realidade. O modelo de interesses do projeto ambiental apresentado no próximo capítulo é desse tipo; mais corretamente, trata-se de uma posição filosófica. Teoria pode também se referir a uma predição de que um certo resultado será alcançado por uma determinada ação; tais predições serão aqui referidas como hipóteses. A outra forma pela qual a palavra “teoria” será referida aqui é como prescrição para a ação; essa é a teoria normativa. Na arquitetura, “princípios de projeto”, “standards” e “manifestos” são exemplos de tais teorias. Elas são fundamentadas em uma definida posição ideológica sobre como mundo, a boa arquitetura, as paisagens e os projetos das cidades

devem ser.

TEORIA POSITIVA

Consciente ou inconscientemente nós, projetistas, como todos as demais pessoas, construímos teorias positivas sobre o mundo e como ele funciona como parte de nossas atividades ordinárias. As partes do mundo ocorrem em padrões. Alguns desses padrões são invariantes, alguns ocorrem com um elevado grau de regularidade, e outros ocorrem de forma aleatória. A habilidade de prever como esses padrões ocorrerão é fundamental para a existência humana. Ações são baseadas nessa habilidade.

As regularidades do mundo podem ser observadas e descritas casual ou sistematicamente. Muito do nosso conhecimento do mundo provém das

observações casuais que fazemos como parte do nosso cotidiano, o que as faz distorcidas, tendenciosas. Os procedimentos científicos ou mesmo os quase-científicos reduzem tais distorções (Conant, 1953). Afirmações sobre a

realidade, contudo, em geral não vêm das pesquisas científicas. Uma hipótese científica é “uma pré-concepção imaginativa sobre o que a verdade pode ser” (Medawar, 1983).

A construção de teorias envolve mais que a descrição do mundo.

Envolve a sua explicação. É um processo criativo que envolve a construção de estruturas conceituais usadas tanto para ordenar quanto para explicar as

observações. O objetivo é ser capaz de usar essas estruturas para descrever o que está acontecendo e predizer o que acontecerá. O valor da teoria positiva depende de seu poder explanatório e preditivo. Abraham Kaplan (1964) nota que:

“Uma teoria é um modo de dar sentido a uma situação

perturbadora, de forma a que possamos aplicar sobre ela o nosso repertório de ações e, de forma ainda mais importante, que possamos modificá-las ou mesmo descartá-las,

substituindo-as por novas outras, na medida em que essa situação requeira”

Teorias bem-sucedidas consistem de generalizações simples, mas poderosas sobre o mundo e como ele funciona, que nos habilitam a predizer com acurácia as conseqüências de ações futuras. Tais teorias são essenciais para campos aplicados tais como as profissões do projeto ambiental.

(3)

É tentador pensar em teorias positivas como sendo uma acumulação de informações sobre o mundo. A história da ciência nos adverte a sermos mais cautelosos. Teorias positivas são “intrinsecamente tentativas e sujeitas a revisões em face do primeiro caso desviante, que não se conforme à sua explicação e predição” (Roberts, 1969). Uma teoria não pode ser provada. Ela continua válida até que seja negada, não mais confirmada.

Os cientistas podem usar técnicas empíricas para testar teorias, mas em campos como os da história, e muito freqüentemente na arquitetura, temos que nos fiar em métodos quase-científicos. Uma teoria positiva da arquitetura não preenche os requisitos da filosofia do positivismo lógico propostos por A. J. Ayer (1936). Todavia, é possível, pelo uso das abordagens quase-científicas, construir teorias sistemáticas que sejam abertas à discussão e mesmo a serem desafiadas. As profissões do projeto ambiental têm sido lentas nesse trabalho. Projetistas comumente adotam a posição de que um judicioso senso comum é tudo o que precisam para uma boa prática profissional. As complexidades do mundo sugerem que essa posição desloca enormes expectativas com relação às capacidades mentais do projetista. Outra posição que também deve ser registrada é de que a teoria e a prática são mutuamente exclusivas – o que, como se argumenta neste livro, tornaria a teoria irrelevante. A teoria deve se referir às questões da prática (ver Rosmarin, 1984).

Críticos recentes das profissões do projeto ambiental sugeriram que uma das principais razões para essa ausência de uma teoria positiva é o receio dos projetistas de que a pesquisa sistemática irá levar a uma confrontação pública entre alguns de suas mais caras e cultuadas crenças acerca da

natureza da arquitetura, do paisagismo e do desenho urbano. Há, certamente, enorme oposição a novas informações e teorias que impliquem em modificação ou no descarte de formas tradicionais, sedimentadas, de trabalhar. Aquelas pessoas com um grande investimento profissional nas práticas tradicionais são, compreensivelmente relutantes em abdicarem delas. Os projetistas sabem muitas coisas sobre as questões relacionadas às pessoas e aos projetos, mas se reconhecermos as limitações de conhecimento nas profissões – os limites da teoria funcional tradicional que os arquitetos e urbanistas herdaram do Movimento Moderno – então as pessoas compreendem os benefícios que podem surgir do domínio de uma positiva base teórica de maior poder.

A Função da Teoria Positiva

Em resposta à necessidade de ampliar a base de conhecimentos necessários à prática do projeto ambiental, educadores desenvolveram currículos mais abrangentes para os estudantes de projeto. A educação dos arquitetos nos EUA pode exigir sete anos de estudo em dedicação integral. Muitos teóricos do projeto, entre os quais Horst Rittel (1971), citam Kenneth Boulding (1956) quanto a isso:

“... o mundo acadêmico parecer acreditar que quanto mais nós sabemos de tudo, melhores somos... o estudante sempre soube algo ainda melhor que isso. Ele acaba por aplicar-se segundo o princípio de saber o mínimo necessário para que possa seguir adiante. Talvez seja este o tempo de ser

(4)

tornar mais respeitável esse princípio... A economia que se possa operar no aprendizado, portanto, é altamente desejável.”

Boulding também sugere como isso poderia ser alcançado: “Se um singelo princípio teórico pode claramente

aplicável a uma ampla gama de situações do mundo empírico, isso representa economia para o processo de aprendizado.”

Essa função da teoria tem sido chamada de “economia do pensamento”. O objetivo básico da teoria positiva é tornar as pessoas capazes de extrair um grande número de asserções descritivas de um simples argumento explicativo. Se for possível compreender, por exemplo, a natureza das marcações

simbólicas do ambiente pelas pessoas, então podemos gerar um grande número de configurações envolvendo edificações e outros espaços

construídos, que vão ao encontro dos requisitos de marcação territorial. Desse modo, as teorias podem substituir o conhecimento de uma miríade de

asserções descritivas sobre o mundo.

Essa economia do conhecimento é tão-somente um subproduto do que é o propósito central da teoria positiva, que é dar sentido a tudo o que, de outra forma, permaneceria irrazoável, despropositado. Nas profissões do projeto, uma das funções da teoria positiva é trazer à consciência os comportamentos ocorrentes no ambiente construído que são importantes para as pessoas e que, por conseqüência, devem ter impacto ns decisões de projeto. Explorações recentes nos campos do comportamento territorial e ambiente construído (ver, por exemplo, Hall, 1966; Newman, 1972, 1979, Becker, 1978; El-Sharkawy, 1979) têm trazido à atenção dos projetistas relacionamentos que eram compreendidos inconscientemente. Agora as questões sobre territorialidade podem ser discutidas com alguma clareza. Antes de isso ser possível, alguns projetistas pareciam ter sido capazes de formular soluções de forma intuitiva, ou até mesmo por coincidência, na direção das necessidades territoriais humanas. Essas necessidades, contudo, não eram satisfeitas, ou sequer consideradas em muitos aspectos envolvidos, ainda que o comportamento territorial seja exibido por quase todas as pessoas. É esperado que ocorram lapsos entre as nossas habilidades de comportar-nos de forma inconsciente e as nossas habilidades, como projetistas, de formular intuitivamente soluções para esses mesmos comportamentos.

Na atualidade, há muito conhecimento disponível e acessível a todos os projetistas (e ao público em geral sobre o comportamento territorial humano, que pode ser considerado explicitamente no projeto de compartimentos, edifícios, e espaços abertos públicos ou privados. O melhor exemplo disso é dado pelo conjunto de princípios dados por Oscar Newman para o projeto de espaços defensáveis, baseados em formas de controle territorial. Suas descrições explícitas desses princípios tornam-nos acessíveis a todos os projetistas. Tais descrições, e a compreensão de seus métodos de pesquisa, tornam o projetista consciente do como esses princípios foram estudados, como se aplicariam, e quais as suas possíveis limitações – o que também é explorado em pesquisas mais recentes (Brower, 1980; Brower e outros, 1983).

O mundo da teoria é freqüentemente contrastado com o mundo real. Essa distinção deve ser percebida no seu devido contexto. Freqüentemente

(5)

ouve-se o comentário: “esse projeto pode funcionar na teoria, mas não

funcionará na prática”. Muitas teorias reconhecidamente “práticas” especificam condições que não existem no mundo real – como condições de competição perfeita entre agentes econômicos, ou condições de movimento físico sem atrito, por exemplo. Tais teorias, apesar disso, ampliam a nossa compreensão dos fenômenos. O impacto de outras variáveis deve, é claro, ser

compreendido. Se uma teoria positiva dirigida às profissões do projeto não for instrumental na tomada de decisões projetuais, sem que leve aos resultados previstos, então ela é irrelevante. Abraham Kaplan (1964), que escreveu com admirável clareza sobre a natureza das teorias, observa:

“Teoria se pratica, e deve consistir e existir nessa sua

praticalidade, considerados os modos e contextos de sua aplicação, apropriadamente definidos”

Isso é particularmente verdadeiro nos casos de campos aplicados como os da arquitetura, do paisagismo, entre outros. Se a teoria não se pratica, é irrelevante.

Uma explícita base teórica positiva é necessária para qualquer disciplina, caso ela se veja compelida a responder às questões que lhe são colocadas, bem como venha a conduzir as pesquisas necessárias a seu progresso, e venha a compreender os limites do que pode efetivamente explicar (ver Churchman e Ginsberg, 1984). Ela apresenta as bases para a discussão sobre qual direção uma profissão deve tomar. A construção de teorias, sua verificação através de pesquisas ou da prática, e sua avaliação, são coisas ligadas entre si num processo contínuo. É assim que uma disciplina vai adiante, progride.

Uma Teoria Positiva é Livre de Valores ?

Uma teoria positiva é eventualmente apresentada como se fosse livre de valores. Muitos estudiosos têm desafiado essa premissa – e

fundamentadamente. Um pesquisador toma a decisão de estudar determinadas questões por que elas lhe parecem profícuas ou interessantes, ou mesmo atrativa para os órgãos de fomento e financiadores. A escolha é baseada em conceitos que as pessoas portam (Lee, 1971). A apresentação de uma teoria positiva em arquitetura, na Parte 2 deste livro, é, como exemplo, baseada em um modelo de interesses do projeto ambiental que, por sua vez, é baseada numa posição ideológica específica. Além disso, a pesquisa freqüentemente é financiada por organizações que possuem objetivos bem definidos em mente. De modo similar, as explicações que uma pessoa cria para explicar os

fenômenos que observa são alteradas por sua própria visão de mundo. Isso é indubitavelmente verdadeiro para o caso da disciplina da economia, onde explicações marxistas e capitalistas existem lado a lado. O mesmo é verdadeiro para a teoria positiva das profissões do projeto ambiental.

O objetivo de uma teoria positiva é, apesar de tudo, ser livre de valores, ser isenta de vieses, o de permitir a busca de explicações alternativas, bem como a aplicação das regras do método científico às observações e suas elucidações. Isso envolve a definição operacional das variáveis sob análise, de modo que não haja ambigüidade na interpretação dos termos utilizados,

(6)

fazendo-se a seguir observações controladas e repetidas. É freqüentemente impossível conduzir esse tipo de estudo em muitos tópicos que interessam às profissões do projeto. Temos então que nos valer de procedimentos quase-científicos. A compreensão do processo científico e de sua base intelectual dá-nos um padrão de comparação contra o qual podemos avaliar os dá-nossos próprios métodos de pesquisa – seus pontos fortes e seus pontos fracos. As explicações devem ser consistentes, e devem confirmar as nossas descrições. Se elas não confirmarem estudos já realizados, temos que há um problema com as presentes explicações, ou com as explicações anteriores. A abertura desse tipo de pesquisa torna-a acessível ao exame e a seu desafio, reduzindo os vieses que venham a incidir sobre a série de explicações. O objetivo de ser, da algum modo, livre de valores, é, em si mesmo, uma pretensão carregada de valoração !

TEORIA NORMATIVA

Teoria Normativa é um termo ambíguo. Para alguns significa “aquilo com que se tem convencionado como normas, por um tempo determinado”; para outros consiste em afirmações sobre “o que deve ser seguido para que se tenha um mundo melhor”. Esse último significado foi adotado para este texto (ver Lynch, 1981). Uma teoria normativa consiste de declarações ou instruções feitas por filósofos, por políticos, por arquitetos, entre outras possibilidades, sobre o que deve acontecer. Algumas pessoas têm descrito suas declarações normativas como sendo científicas. Essa é uma contradição em termos. O método científico nos dá regras para descrever e explicar, mas não para criar. Um projeto pode ser fundamentado em uma teoria positiva cientificamente formulada, mas isso não faz dele algo “científico”. Uma teoria normativa é baseada em uma ideologia ou numa visão do mundo, mesmo que isso não seja afirmado de um modo explícito. A teoria normativa de muitas das profissões orientadas para a ação, tal como a engenharia, a enfermagem, a arquitetura, geralmente consiste em preceitos de natureza ética. A razão para isso é simples: a posse de princípios e linhas de ação facilita o processo de tomada de decisões. Mas isso também leva a desastrados resultados.

Teorias normativas são construídas a partir de teorias positivas. Elas são baseadas em percepções de como o mundo funciona, mas elas também são baseadas em percepções acerca do que seja bom ou mau, do que seja certo ou errado, do que seja desejável ou indesejável, do que funciona bem ou funciona mal. Algumas vezes a relação entre teorias normativas e positivas é explícita, mas freqüentemente não é. Nas profissões do projeto, tal relação raramente é explicitada. Além disso, a posição normativa que seja professada por um projetista freqüentemente difere do seu correlato comportamental – ou seja, de sua prática. Isso pode ocorrer por uma variedade de razões. A pessoa pode simplesmente estar a equivocar-se, ou um maior esforço deve ser feito ou exigido para a prática seja coerente com a normatividade, ou a pessoa

realmente acredita que teoria e prática são coisas independentes. De fato, de acordo com alguns críticos, essa é uma característica do Movimento Moderno (ver, por exemplo, Rowe, 1972; Gadamer, 1975, 1976). Eles dizem que as declarações do Movimento Moderno acerca da funcionalidade e da

(7)

CONCEPÇÕES DA TEORIA NOS CAMPOS DO PROJETO

Tanto neste capítulo quanto no capítulo anterior, tem-se sugerido que uma das coisas a retardar o desenvolvimento intelectual das profissões do projeto é a falta de um corpo explicitado de teoria positiva. Essas profissões comportam disciplinas descritivas e prescritivas, além de serem de caráter normativo – apesar de suas posições normativas terem uma base ideológica freqüentemente inconsistente, pouco clara. É importante que compreendamos o desenvolvimento das posições normativas dos projetistas ao longo da

história. Isso nos trará maior discernimento acerca das profissões e da sociedade de que fizeram e fazem parte.

A ênfase que ocorre na teoria do projeto, particularmente na teoria da arquitetura, tal como é ensinada nos cursos universitários da atualidade, e tal como discutida pelos profissionais, é a do projetista como um criador e no conjunto de princípios que ele ou ela utiliza para projetar um edifício, um complexo de edifícios ou um espaço aberto. Essa ênfase é mostrada na seqüência da figura 2-1ª. Robert Gutman (1972) observa que quando nós estamos falando acerca de teoria da arquitetura, em geral queremos nos referir a:

“...o conjunto de princípios que guiam os arquitetos na tomada de decisões acerca dos complexos problemas que surgem na tradução do programa em um projeto de um edifício.”

Os conjuntos de princípios de projeto que tradicionalmente têm

constituído, digamos, a teoria da arquitetura, têm-se dirigido primariamente ao delineamento de um sistema lógico em que os componentes do ambiente são relacionados uns com os outros de forma mais abrangente e intensa do que com a própria experiência humana. E onde a experiência humana é levada em consideração, ela é compreendida como aquela experiência que se supõe ser detida pelas pessoas, e não aquela experiência que as pessoas efetivamente possuem. Se a experiência que as pessoas efetivamente possuem é diferente daquela que os projetistas acreditam que elas teriam, então as pessoas

passam a ser desqualificadas como pouco educadas, ou como

desconhecedoras dos modos de uso correto do ambiente (Perin, 1970). A posição que se toma aqui é de que, ao considerar-se que uma das obrigações das profissões do projeto é educar, não se pode alegar que a falta de

conhecimento por parte dos usuários possa se constituir na razão de os projetos não satisfazerem as necessidades desses mesmos usuários.

Os princípios de projeto usados nos campos do projeto são baseados em algumas assertivas positivas acerca da natureza do mundo feito pelo ser humano e da experiência humana. Essas assertivas são largamente baseadas na compreensão intuitiva e na experiência pessoal de cada profissional, mais que num corpo sistemático e bem formulado de conhecimentos, baseado em pesquisa metódica e/ou na experiência cumulativa dos praticantes. Apesar de isso significar que é difícil aprender com o corpo dessa experiência, não se deve pensar que tais teorias positivas individuais são incorretas, simplesmente por serem baseadas em pressuposições, em casos pessoais, em preconceitos da cultura ou do indivíduo, ou mesmo em informações auto-referentes, como

(8)

as que foram produzidas pela imaginação do projetista. Muitas dessas teorias baseiam-se em processos que se aproximam do método científico, em termos da repetição das observações. Muitos projetistas ambientais são pessoas notavelmente observadoras; muitos, no entanto, não são. Por mais observador que um projetista possa ser, as conclusões que formula acerca de como o mundo funciona são enviesadas pelos contatos que esse mesmo indivíduo tem com o mundo.

As profissões do projeto, como se tem crescentemente reconhecido, devem recolher, tornar explícitas, e disseminar aquelas observações que ocasionam resultados previsíveis. O psicólogo ambiental Harold Proshansky (1974), observou que:

“É minha opinião que a maior parte dos arquitetos, dos

projetistas e planejadores, têm uma riqueza de idéias e dados brutos, não-refinados, acerca das pessoas e com relação ao espaço físico e à sua organização, que ainda não foram recolhidos e tratados por qualquer abordagem

sistematizadora.”

À medida que esses dados não-refinados estiverem contidos nos princípios de projeto – como verdadeiros truísmos que se ensina por sobre as pranchetas dos projetistas –, é impossível testar a sua exatidão ou especificar o contexto em que são válidos. Do mesmo modo é impossível discuti-los racionalmente ou tentar propagá-los por toda parte. O resultado disso, como coloca Christian Norberg-Schulz (1965), “ao discutirmos questões de

arquitetura, nós raramente vamos muito além de arengas sobre o que você gosta e o que eu gosto”. Um corpo de conhecimentos que seja explícito e positivo eleva o nível da discussão, mesmo que o debate sobre o que se gosta e o que não se gosta persista.

(9)

A NATUREZA DA TEORIA POSITIVA PARA O PROJETO AMBIENTAL

Qualquer exposição sobre o que uma teoria positiva deve abranger é baseado em um julgamento de valor. A posição assumida aqui é de que, dados os muitos problemas que temos ao projetar ambientes em que as pessoas possam realizar suas aspirações a uma boa qualidade de vida, e o número de falhas que cometemos ao tentar prever como será o desempenho dos edifícios e seu entorno em termos humanos, nós precisamos conhecer mais sobre o modo pelo qual diferentes pessoas experienciam, usam e avaliam o ambiente (ver Michelson, 1968). Essa não é uma posição isolada. Dificilmente tratar-se-ia apenas de uma coincidência que o crescimento do interesse em que uma teoria positiva da arquitetura concorre com o desenvolvimento de um novo pluralismo em termos de teorias normativas da arquitetura. Esta ideologia reconhece a diversidade das pessoas e a necessidade de o ambiente construído corresponder a essa diversidade. O resultante ponto de convergência dessas preocupações é mostrado no diagrama 2.1.

PROJETISTA INTENÇÕES MEIOS OBJETO IMPACTO NO OBSERVADOR (OU NO USUÁRIO)

PRINCÍPIOS ESTÉTICOS OU DE COMPOSIÇÃO

(a) Um modelo conceitual de Teoria Normativa para os campos do projeto

FOCO DE

CONCENTRAÇÃO

IMPACTO NO OBSERVADOR OBJETO / AMBIENTE MEIO IMPLICAÇÕES (OU NO USUÁRIO) PARA O PROJETO

PRINCÍPIOS DE EXPERIÊNCIA AMBIENTAL

(b) Um modelo conceitual de Teoria Positiva para os campos do projeto

FOCO DE

CONCENTRAÇÃO

Diagrama 2.1 -Teoria Normativa, Teoria Positiva

Dessa forma, uma teoria positiva abrange a nossa compreensão dos ambientes natural e construído, e o seu papel na vida das pessoas. A teoria preocupa-se ainda com a compreensão do processo de projeto. Esses corpos de conhecimento devem consistir de definições e explicações que sejam logicamente relacionadas, completas, internamente consistentes e

(10)

externamente válidas. O conhecimento parece propagar-se por si mesmo quando é reunido e organizado em teorias (Kaplan, 1964). Tem-se observado que teoria, pesquisa e prática positivas devem ser associadas de forma contínua. Isso é feito através da verificação de hipóteses – e entenda-se que todo projeto urbano, paisagístico, de edificação é, em si mesmo, uma hipótese ou conjunto de hipóteses – que são componentes da teoria. Isso pode ser feito pela avaliação sistemática da forma construída, desde os pontos de vista do projetista, do empreendedor, financiador ou proprietário, e do usuário, depois de executada e em uso efetivo.

Ao longo da década passada [anos 1970] ocorreu um crescimento dramático na quantidade de pesquisa feita por arquitetos e cientistas do comportamento tanto acerca do ambiente construído quanto da prática do projeto. Agora é possível tentar traçar uma síntese dessa pesquisa visando entender o nosso nível de conhecimento na atualidade.

FIGURA 2-2. Teoria Positiva e intuição.

Se o nosso conhecimento acerca de algo ou de determinadas pessoas é

insuficiente ou falho, temos que nos

amparar em nossas próprias experiências e intuições ao tentarmos superar dessas deficiências. Na medida em que nossas experiências mostram-se válidas,

superando consistentemente essas

deficiências, tudo vai bem. Este desenho de uma rica mulher americana-do-norte, feito por um artista japonês do século 19, é

baseado em alguma imagem que ele teria de como americanos-do-norte assemelham-se. Ao completar as informações sobre essa aparência, ele utilizou suas próprias

intuições. Boa parte das críticas dos projetos arquitetônicos, urbanísticos e paisagísticos recentes diz respeito às lacunas percebidas entre as

imagens dos usuários, suas necessidades e seus valores, tal como

expressados e mantidos pelos projetistas, e seus atributos nas situações reais (Michelson, 1968). Uma base teórica positiva aplicada à projeto poderia auxiliar na superação dessa crítica.

UM MODELO CONCEITUAL DA TEORIA DA ARQUITETURA Em primeiro lugar, é importante diferenciar entre dois tipos de teoria fundamentalmente diferentes, a teoria positiva e a teoria normativa.

Teoria Positiva

Uma teoria positiva no campo do projeto, assim como para outros campos de tomada de decisões visando sua aplicação, consiste em dois componentes: uma teoria substantiva e uma teoria de procedimentos. A teoria substantiva se ocupa da natureza dos fenômenos com os quais os arquitetos e

(11)

os demais projetistas lidam em seu trabalho. Seu interesse se dá sobre a natureza do ambiente tanto num nível molar quanto num nível molecular, suas qualidades e como funciona, o que possibilita para as pessoas em termos de atividades, de suporte ao seu bem-estar fisiológico, de experiência estética. Ocupa-se principalmente com o ambiente a um nível molar, com uma

abrangente variação de escala, desde quilômetros a milímetros, desde cidades a texturas de superfícies. Esse é o nível ao qual as profissões do projeto

trabalham. Em contraste, os físicos e os químicos estão interessados no ambiente ao nível molecular, enquanto as preocupações do astrônomo se postam a escalas de anos-luz.

A teoria substantiva pode ser dividida em dois componentes inter-relacionados: a teoria ambiental natural e a teoria pessoa-ambiente. A teoria ambiental natural lida com a natureza física, química e geológica que jaz à volta dos organismos vivos, das pessoas. Seu objetivo é descrever e explicar a natureza dos materiais, a natureza da geometria, a natureza das estruturas, e a natureza da interação entre as forças naturais (o vento, a chuva, o sol, por exemplo) e o ambiente artificial. O propósito do desenvolvimento desse aspecto da teoria positiva é produzir o conhecimento básico sobre como o mundo pode ser estruturado em diferentes modos, e como a natureza física dessas estruturas interagem com outros aspectos do ambiente natural. Os maiores tributários à compreensão desses fenômenos são as ciências naturais – a física, a química, a biologia.

É nesse ponto que os interesses de cada profissão do projeto fazem com que se diferenciem, correta ou incorretamente. Os paisagistas possuem uma muito maior compreensão de determinados processos do ambiente natural que os arquitetos. Eles devem entender bem mais que os arquitetos, por exemplo, acerca de vegetais (dado o modo em que as profissões do projeto estão estruturadas na atualidade). Já os arquitetos possuem uma maior

compreensão da natureza dos materiais e da estruturação física do mundo artificial dos edifícios. Os engenheiros civis, por sua vez, dão uma maior ênfase à teoria das estruturas.

A teoria pessoa-ambiente poderia ser melhor denominada “teoria organismo-ambiente”, pois ela deve lidar com a descrição e a explicação do que se torna possível, através da organização tridimensional do ambiente, aos diferentes organismos, como seus habitats. Neste livro preocupa-nos a

organização do ambiente no nível molar e, primariamente, com respeito ao animal humano. Essa preocupação, portanto, se dá nos âmbitos dos

relacionamentos pessoa-ambiente e pessoa-a-pessoa, dentro do ambiente. Por esta razão serão referidos aqui somente como teoria pessoa-ambiente. Isso implica na compreensão do animal humano como um ser biológico, psicológico, social e cultural. O propósito do desenvolvimento desse aspecto da teoria do projeto ambiental é ampliar a compreensão daquilo que os arquitetos têm tradicionalmente chamado “a forma arquitetônica” e sua utilidade para as pessoas tanto num nível de ação quanto num nível emocional. Uma maior compreensão desses relacionamentos é derivada do discernimento ou insight que os próprios projetistas têm e, mais recentemente, das ciências

comportamentais e da pesquisa que as ciências comportamentais realizam em associação com as profissões do projeto.

A teoria de procedimentos interessa-se com a natureza da prática

(12)

sujeitos a um detalhado – ou mesmo científico – escrutínio, apesar de isso raramente ocorrer. Isso não significa que o processo de projeto possa ser científico – por definição, o projeto não pode ser científico. Isso significa, de preferência, que o processo de projeto pode ser descrito e explicado com o uso de métodos de pesquisa científica ou quase-científica.

As questões básicas com que os pesquisadores terão que lidar ao desenvolverem uma teoria de procedimentos incluem: a natureza do processo de projeto como um todo; a natureza da criatividade humana; a natureza dos processos analíticos, de síntese e de avaliação. Muito de nossa atual

compreensão desses processos foi gerada pela pesquisa em outras áreas de tomada de decisões, e das ciências do comportamento em geral.

Teoria Normativa

Uma teoria normativa nos campos do projeto também se preocupa com questões substantivas e de procedimentos. Em contraste com teoria positiva, a teoria normativa preocupa-se com as diferentes posições e pontos de vista existentes ou em definição acerca do que o ambiente construído e/ou o processo de projeto devem ser. Essa teoria preocupa-se com os pontos de vista dos diferentes projetistas, ou das diferentes escolas de projeto, acerca do papel a ser desempenhado pelo projetista, acerca do que vem a ser um bom ambiente, e como o processo de projeto deve ser conduzido. A teoria

normativa é assim preocupada com a posição assumida pelos projetistas e escolas de projeto face aos vários aspectos de seu objeto e seu processo de trabalho. Pode-se ainda distinguir entre aquelas posições efetivamente

professadas pelos projetistas e aquelas posições efetivamente praticadas por

eles.

SUMÁRIO

Os principais componentes da teoria da arquitetura podem ser apresentados em uma matriz “dois-por-dois”:

Como se orienta a Teoria Do que trata a Teoria

Positiva Normativa Professada Sobre Procedimentos Praticada Professada Substantiva Praticada

O objetivo deste livro é descrever e explicar a atual e a potencial contribuição das ciências comportamentais ao desenvolvimento deste corpo teórico. Dessa forma, muitas das questões que lidam com as ciências naturais, com algumas exclusões, como determinados aspectos da biologia humana, caem fora do nosso perímetro de interesse. Este livro concentra-se na descrição e na explicação de nosso conhecimento atual acerca do

relacionamento entre atividades humanas, valores estéticos e padrões do ambiente construído, por um lado, e acerca dos processos de projeto, por outro.

(13)

Ao mesmo tempo em que tem havido um diminuto esforço no sentido da construção uma base teórica positiva e sistemática para as profissões do

projeto, alguns esforços esporádicos nesse sentido têm sido demonstrados, em alguns casos por arquitetos de destaque. Tais esforços, apesar de terem sido limitados pela falta de clareza entre as posições normativa e positiva, não devem ser descartados. Os esforços de pesquisa e o questionamento sistemático dos últimos 25 anos tem tornado muito mais fácil que estabeleçamos agora uma base teórica adequada.

LEITURAS ADICIONAIS

Banham, Reyner. Theory and Design in the First Machine Age. Nova Iorque: Praeger, 1960.

Deutsch, Morton; e Robert M. Kraus. Theories in Social Psychology. Nova Iorque: Basic Books, 1965.

Kaplan, Abraham. The Conduct of Inquiry. Scranton, Pennsylvania: Chandler, 1964.

Lynch, Kevin. “Is a General Normative Theory Possible ? Em Good

City Form. Cambridge Massachusets: MIT Press, 1981.

Medawar, P. B. The Limits of Science. Nova Iorque: Harper & Row, 1983.

Perin, Constance. With Man in Mind. Cambridge Massachusets: MIT Press

Rosmarin, Adena. “Theory and Practice from Ideally Separeted to Pragmatically Joined”. Journal of Aesthetics and Art Criticism 43, nº 1 (Fall 1984):31-40.

(14)

PLANO DA TRADUÇÃO PARA A REVISTA ELETRÔNICA “PARANOÁ” - São 22 (vinte e duas) “apostilas”, capítulo a capítulo do livro, com o

agrupamento das introduções a cada uma das Partes e seções do livro, e seus respectivos capítulos iniciais. A presente “apostila” é mostrada em vermelho, contra o conjunto das demais “apostilas”. Com isso se pretende que o livro

Creating Architectural Theory, de Jon Lang, possa servir como livro texto em

disciplina sobre teoria da arquitetura e do projeto. Prefácio

PARTE 1. O MOVIMENTO MODERNO, TEORIA DA ARQUITETURA E AS CIÊNCIAS SOCIAIS

1.O Legado do Movimento Moderno 2.A Natureza e Utilidade da Teoria

3.As Ciências Comportamentais e a Teoria Arquitetônica

PARTE 2. TEORIA ARQUITETÔNICA EXPLÍCITA: Conceitos de Práxis e Conceitos de Ambiente

TEORIA DE PROCEDIMENTOS Metodologia de Projeto

4.Modelos de Práxis do Projeto Ambiental

5.Atividades de Inteligência e a Fase de Inteligência 6. Projetação e a Fase do Projeto

7. Decisão e a Fase da Decisão TEORIA SUBSTANTIVA

O Ambiente e o Comportamento Humano

CONCEITOS FUNDAMENTAIS SOBRE AMBIENTE E COMPORTAMENTO HUMANO

8.A Natureza do Ambiente

9.Processos Fundamentais do Comportamento Humano 10.O Ambiente Construído e o Comportamento Humano PADRÕES DE ATIVIDADES E O AMBIENTE CONSTRUÍDO

11.A Situação Física Envolvente do Comportamento: Uma Unidade para a Análise e Projeto Ambientais

12.Antropometria e Ergonomia

(15)

14.Privacidade, Territorialidade e Espaço Pessoal – Teoria Proxêmica 15.Interação Social e o Ambiente Construído

16.Organização Social e o Ambiente Construído

VALORES ESTÉTICOS E O AMBIENTE CONSTRUÍDO 17.Teoria Estética

18.Estética Formal 19.Estética Simbólica

PARTE 3. TEORIA NORMATIVA DO PROJETO AMBIENTAL Polêmica e Prática

20.Compreendendo as Teorias Normativas do Projeto Ambiental

21.Questões Sócio-Físicas Contemporâneas no Projeto Ambiental – Uma Instância Normativa

Referências

Documentos relacionados

Compostos de coordenação com 2-(metiltio)-benzoico e íons trivalentes lantânio, cério, túlio e itérbio foram sintetizados pelo método de sistema aberto, seguindo o

A prevalência de TEPT em estudantes universitários vítimas de traumas sexuais, físicos e psicológicos ocorridos em ambientes domésticos, vivenciados na infância e na adolescência,

E tendo em vista a significativa presença do mobile-learning nos dias atuais, tanto na Educação a Distância, como para pessoas com deficiência visual por suas características

Verificou-se assim, que no final dos anos de 1980 ocorreram algumas modificações na postura profissional dos Assistente Sociais na saúde, a exemplo de uma

Utilizando os dados de fotoidentificação, acumulados desde 1989 no catálogo do Instituto Baleia Jubarte, com fotos obtidas regularmente utilizando cruzeiros de

Marido este que configurou a formação do campo artístico na cidade do Recife durante os anos trinta, reabrindo o Museu de Arte e História Antiga de Pernambuco e inaugurando

Portanto, o objetivo do presente estudo foi avaliar aspectos nutricionais, físicos, químicos, microbiológicos e sensoriais de linguiças elaboradas com filés de bagres brancos

Nesse sentido, para demonstrar melhor a compreensão alcançada, a discussão segue a ordem dos objetivos propostos para esta pesquisa e que compreendem as áreas e