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PRECISAMOS CONVERSAR SOBRE PARADOXOS E DEMOCRACIA NA AMÉRICA LATINA 1

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Academic year: 2021

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PRECISAMOS CONVERSAR SOBRE PARADOXOS E DEMOCRACIA NA AMÉRICA LATINA1

Larissa Borges Fortes2 Sergio Ricardo Fernandes de Aquino3 “[...] Num tempo Página infeliz da nossa história Passagem desbotada na memória Das nossas novas gerações Dormia A nossa pátria mãe tão distraída Sem perceber que era subtraída Em tenebrosas transações [...]”

(Vai passar – Chico Buarque) Antes de iniciar qualquer argumento, pedimos vênia para as nossas leitoras e leitores sobre o tom mais informal do texto desta semana. Hoje, não trataremos de especulações mais abstratas de uma Razão puramente lógica ou de uma postura mais ácida originária do pensamento empirista, mas de um diálogo franco sobre os atuais eventos vividos pela Democracia Latino-Americana e Brasileira.

Parece estranho, no mínimo paradoxal, que a letra de uma música escrita em pleno apagar das luzes de um período ditatorial possa soar tão

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Texto publicado originalmente no sítio do Empório do Direito. Disponível em:

«http://emporiododireito.com.br/paradoxos-e-democracia-na-america-latina/». Acesso em 14 de abril de 2016.

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Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Faculdade Meridional - IMED. Mestranda em Direito pela Faculdade Meridional - IMED, na linha de pesquisa "Fundamentos do Direitos e da Democracia", sob orientação do Prof. Dr. Sergio Ricardo Fernandes de Aquino. É advogada e sócia do escritório Fortes & Tusset Advogados Associados. Curriculo Lattes:

http://lattes.cnpq.br/6228368628395288 - E-mail: lari_bf@yahoo.com.br

3 Doutor e Mestre em Ciência Jurídica pela Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI. Professor Permanente do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu – Mestrado – em Direito da Faculdade Meridional – IMED. Pesquisador da Faculdade Meridional. Membro do Grupo de Estudos Interdisciplinares em Ciências Humanas, Contingência e Técnica na linha de pesquisa Norma, Sustentabilidade e Cidadania da Universidade Federal do Maranhão - UFMA. Membro associado do Conselho Nacional de Pós-Graduação em Direito - CONPEDI. Coordenador do Grupo de Pesquisa em Ética, Cidadania e Sustentabilidade no Programa de Mestrado em Direito (PPGD) da Faculdade Meridional - IMED. Membro do Grupo de Pesquisa sobre Direitos Culturais e Pluralismo Jurídico da Faculdade Meridional - IMED. Membro do Grupo de Pesquisa sobre Transnacionalismo e Circulação de Modelos Jurídicos da Faculdade Meridional - IMED. Líder, em participação com o Professor Dr. Neuro José Zambam, no Centro Brasileiro de pesquisa sobre a teoria da Justiça de Amartya Sen. Membro associado da Associação Brasileira de Ensino de Direito - ABEDi. Membro do Grupo de Pesquisa em Direito Empresarial e Sustentabilidade, do Instituto Blumenauense de Ensino Superior. Passo Fundo. RS. Brasil. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/1318707397090296 - E-mail: sergiorfaquino@gmail.com

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atual, tão vivo. O nosso cotidiano, em suas galerias subterrâneas, fervilha de dicotomias partidárias, as quais todas carregam a flâmula da Democracia. Paradoxal, para não dizer, no mínimo, ambíguo4.

Paradoxo... eis uma palavra que expressa bem nossa humanidade compartilhada, mas tão pouco compreendida, inclusive para se consolidar nossa jovem experiência democrática em terrae brasilis. Toda situação paradoxal envolve conflitos, angústias, medos, porém não são cenários que devam promover a falta de tolerância5, mas de nos permitir saber quais estratégias, quais critérios favorecem a integração, o aperfeiçoamento, a disseminação de uma vida democraticamente sadia.

Ao se debruçar, de modo mais contemplativo, acerca de nosso dia a dia, sente-se, mais e mais, certa nostalgia daquele Brasil no qual não é efeito do homem cordial de Sérgio Buarque de Holanda, muito menos das oligarquias retratadas pela obra Casa Grande e Senzala de Gilberto Freyre, mas é constituído de pessoas as quais apostam na força arquitetônica das utopias6 cheias de esperança.

Ah, o Brasil... lugar de incontáveis poesias, de belezas naturais, de gente trabalhadora. É aqui que a alma canta e se encanta. No entanto, é,

4 “[...] O que é a ambiguidade? Ela se traduz pelo fato de que uma realidade, pessoa ou sociedade se apresenta sob o aspecto de duas verdades diferentes ou contrárias, ou então apresenta duas faces não se sabendo qual é a verdadeira”. MORIN, Edgar; VIVERET, Patrick. Como viver em tempos de crise? Tradução de Clóvis Marques. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2013, p. 9.

5 “A afirmação da Tolerância como um valor fundamental para a avaliação da arquitetura, do funcionamento, das garantias de estabilidade social e política, das políticas de desenvolvimento e das relações entre culturas ou concepções diferentes, inúmeras vezes conflitantes, representa a convicção moral e uma conquista histórica com condições de impulsionar os diferentes campos de relacionamento, organização e funcionamento das sociedades caracterizadas pelas deficiências e dificuldades para compreender e efetivar o exercício da práxis (sempre mais) tolerante. O valor da Tolerância precisa integrar o que se pode chamar de imaginário social ou, também, a compreensão de razão pública da sociedade democrática. Entretanto, a ausência de um exercício intrassubjetivo sobre o reconhecimento dos limites e deficiências humanas e sociais cria o self deception (autoengano) acerca do que é ser humano e, portanto, incita práticas sempre mais intolerantes”. ZAMBAM, Neuro José; AQUINO, Sérgio Ricardo Fernandes de. Tolerância: reflexões filosóficas, políticas e jurídicas para o século XXI. Revista da AJURIS. Porto Alegre, v. 142, n. 137, p. 382, março de 2015. Disponível em: http://www.ajuris.org.br/OJS2/index.php/REVAJURIS/article/view/389/323. Acesso em 22 de fev. de 2016.

6 “Apelando à utopia, abrem-se os obstáculos para o desenvolvimento das paixões brilhantes. Dessa forma, vive-se a crítica à sociedade e ao seu saber”. WARAT, Luis Alberto. A ciência

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também, aquele país assombrado por profundas misérias, por segregação, violências desmedidas, de incontáveis atentados contra a Dignidade Humana na história dessa jovem república. Hoje, o cenário político, social e jurídico insiste na eliminação das adversidades e reivindica, como na Guerra de Canudos, a presença de um Antônio Conselheiro, alguém livre de sua humanidade, alguém “santo” capaz de nos salvar dessa maldição que se chama responsabilidade radical pelo Outro7.

Cada vez mais as pessoas insistem em esquecer ou transfigurar a História da América Latina, e, no nosso caso, a do Brasil. Passou-se por fases terríveis – etnocídios cometidos pelos colonizadores, escravidão de índios e, mais tarde, de afro descendentes. Precarização do trabalho de imigrantes italianos, fortalecimento da cultura de empoderamento das oligarquias e sua disseminação pelo cenário político, entre outros momentos.

Enfim, trata-se de uma história marcada por violência, mas principalmente por encobrimento. Essas experiências já nos demonstraram a necessidade de se avançar, de se apostar habitualmente na Democracia e todos os seus desafios. A desejada integração na América Latina não é uma utopia abstrata, mas concreta, que precisa, aos poucos, superar sua tradição colonial e demandar outros cenários que tirem esse véu acerca das inseguranças comuns diante de realidades mais complexas. Essa não pode ser a continuidade do projeto civilizatório proposto pelo século XX e intitulado por Hobsbawm de a “Era dos Extremos”, mas da busca pela emancipação das terras do sul.

Essas fases todas vividas pelo jovem Brasil acabaram por gerar uma miséria imensa para uma enorme parcela de seu povo. Ah, sabe quem é esse povo do Brasil? Certamente um dos povos mais plurais do mundo. No entanto, infelizmente, essa pluralidade foi ignorada em detrimento ao exercício do

7 “[...] A responsabilidade é o que exclusivamente me incumbe e que, humanamente, não posso recusar. Este encargo é uma suprema dignidade do único. Eu, não intercambiável, sou eu apenas na medida em que sou responsável. Posso substituir a todos, mas ninguém pode substituir-me. Tal é aminha identidade inalienável de sujeito”. LÉVINAS, Emmanuel.

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poder, do acúmulo (desmedido) de propriedades e de capital, ou seja, de como utilizar o país para atender tão somente os interesses particulares.

Essa situação se amplia na medida em que as pessoas não conseguem identificar quais condições expressam o nosso bem comum. Nenhuma Nação, especialmente na perspectiva da cooperação, se desenvolve, se aperfeiçoa no tempo sem identificar aquilo que expressa a vida digna para todos.

Aos poucos, o continente latino-americano amadurece na sua dimensão social, histórica, política, jurídica, científica e tecnológica. A partir de pequenos passos, todos caminham para a libertação da corrupção, da segregação, das formas de dependências que a colonização lhes atribuiu. A passos curtos, os povos reconheceram seu valor e sua identidade, de sua história, de sua memória, de suas crenças, de suas raízes. Eis aquilo que integra, que descreve as nossas identificações multiculturais e nos conduzem à solidariedade.

Aos poucos, a Democracia se tornou realidade. Aliás, somente quando a diferença é compreendida como fundamento de transformação, essa germina outras possibilidades de vida desejável nesse vasto continente. Aos poucos, esse povo, até então acanhado, ressabiado, desfigurado, ganhou voz, ocupou espaços de poder, conquistou sua Dignidade.

Nesse momento, a Democracia floresceu. Assemelha-se à planta que acede aos céus, porém sabe que suas raízes estão fixadas na terra. O agir democrático ainda é frágil na América Latina, mas já apresenta sinais da sua importância e continuidade como projeto social e histórico. Afinal, não existe Democracia sem pluralidade, sem o reconhecimento da diversidade humana.

A História, no entanto, rememora experiências passadas e as contrapõe ao momento presente. Mostra-nos fatos, documentos, estudos daquilo que constitui nossa convivência nesse theatrum mundi. Mas, vejam só... Pasmem! Todos preferem desprezar as nossas identificações, nossos estilos de vida. Prefere-se – e se insiste – em acreditar na Opinião Publicada e não na Opinião Pública.

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Prefere-se a comodidade (e a cegueira) das certezas habituais em detrimento àquilo que, não obstante as suas dificuldades, se revele como algo indispensável para a preservação da Liberdade, a amplitude da Igualdade e o exercício de uma virtude (esquecida) chamada Fraternidade.

Por que a opinião de mais de 54 milhões de eleitores deve ser ignorada, ou melhor, mais uma vez encoberta? Por que a opinião de uns deve valer mais que a de outros? Por que negamos o que a História no elucida a fim de compreender a intensidade do momento presente? Por que devemos tratar todos os seres humanos como inimigos? Por que não reconhecemos a importância cultural de nossas raízes comuns? Por que criminalizamos a opinião alheia? Por que criminalizarmos o movimento social que “eu” não pertenço? Por quê?

Ora, simplesmente porque os paradoxos de um “processo democrático” precisam insistir que o improvável se torne “de carne e osso”. Eis a necessidade do resgate dessa dimensão surreal, carnavalizada8, especialmente da dimensão política, para uma vida plenamente digna no Brasil e América Latina.

8 “A visão carnavalesca do mundo nos revela a grandeza arlequinal do cotidiano, que assume o primado crítico frente aos labirintos obscuros e às situações de estancamento a que chegam os intelectuais burocratizados, tendo respostas feitas para todos os dilemas”. Pela via da carnavalização, podemos dar asas a uma busca erótica, lúdica, mágica, poética e fundamentalmente política. Nessa via, a revelação do autoritarismo servirá para perseguir, aprendendo o que é a vida, a democracia. O espaço político que assim se desenha é um processo lúdico que permite perseguir os sinais do novo e escapar (marginal e maliciosamente) à paz das intoxicações ideológicas. A carnavalização é uma tentativa de fuga dos discursos ideológicos pela reconciliação dos corpos com os desejos. A carnavalização é uma maneira lúdica de conta a vida. Um espaço para preencher. Um mundo para criar junto o político ao erótico, e o corpo às significações. Na carnavalização, não pode existir um discurso longe dos corpos sem o cheiro dos desejos”. WARAT, Luis Alberto. A

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