F O N T E S D E P Ó L E N E X P L O R A D A S P O R Melipona compressipes
manaosensis (APIDAE: M E L I P O N I N A E ) , A B E L H A D A A M A Z Ô N I A
C E N T R A L .
A n t o n i o C a r l o s Μ A R Q U E S S O U Z A 1
R E S U M O — Analisou-se os pólen transportados por operárias de Melipona compressipes
inanaosensis Schwarz, 1932, durante o período de um ano, entre agosto de 1988 ejulho de 1989. Foram encontrados 30 tipos polínicos distribuídos em 22 gêneros e 19 famílias. Das espécies vegetais coletadas pelas abelhas, as cássias representaram as principais fontes de pólen, seguidas de duas espécies de Miconia e de três espécies de Solarium. Outras espécies como Tapirira guianensis, Doliocarpus sp., Lindackeria sp., Mimosa pudica, etc., foram bem coletadas pelas operárias, mas em períodos intercalados. Tudo indica que as coletas de pólen de Melipona compressipes inanaosensis podem sofrer influências com as mudanças climáticas, pois no período chuvoso, que correspondeu ao mês de maio, houve uma diminuição no número de espécies de plantas coletadas. Quando das chuvas, não foi observado operárias saindo ou retornando à colméia. As abelhas aproveitavam os intervalos de chuvas para retornarem as suas atividades externa.
Palavras chave: Pólen, plantas apícolas, Melipona compressipes manaosensis, abelha sem ferrão.
Pollen Sources Used by Melipona compressipes manaosensis (Apidae: Meliponinae), a Cen tral Amazonian Bee.
ABSTRACT — T h e pollen transported by worker bees of Melipona compressipes manaosensis
Schwarz, 1932, was studied from August 1988 to July 1989. Thirty types of pollen were en-countered, distributed among 22 genera and 19 families of plants. Cassia spp. were the most important pollen source, followed by two species of Miconia and three of Solanum. Additional important pollen sources, exploited only at specific times of the year, were: Tapirira guianensis, Doliocarpus sp., Lindackeria sp. and Mimosa pudica. There are strong indications that seasonal intensity of rain affected foraging intensity in Melipona compressipes manaosensis. Few plant species were collected during the very rainy month of May, 1989. During rainy periods no workers were observed entering or leaving the hive, but during breaks in the rain the workers returned to the hive.
Key words: Pollen, bee plants, Melipona compressipes manaosensis, stingless bees.
ACTA AMAZÔNICA 26(1/2): 77-86. 1996. I N T R O D U Η Γ O
Um d o s vários p r o b l e m a s enfrentado pelos apicultores da região a m a z ô n i c a está na falta de conhecimentos da biologia das abelhas nativas sem ferrão e de como elas se relacionam com o meio ambiente.
E n t r e os p o u c o s t r a b a l h o s existentes sobre os meliponíneos da região, destacam-se o de ABSY &
KERR (1977), ABSY et al. (1980) e (1984), ENGEL & D I N G E M A N S B A K E L S ( 1 9 8 0 ) , M A R Q U E S S O U Z A ( 1 9 9 3 ) e M A R Q U E S -SOUZA et ai (1995) que estudaram os tipos de plantas que são utilizadas para pólen por essas abelhas, o de R E N N E R ( 1 9 8 3 ) e M A R Q U E S -SOUZA et al. (1993a) que observaram a e s t r a t é g i a d a c o l e t a de a l g u n s m e l i p o n í n e o s para a o b t e n ç ã o do
1
alimento nas flores e o de PERALTA (1983) e R O U B I K & P E R A L T A (1983) que observaram os fatores climáticos que podem influenciar nas atividades externas e internas de duas espécies de Melipona.
C o m o na A m a z ô n i a em d e t e r m i n a d o s p e r í o d o s há u m a diminuição na oferta de alimentos (ABSY et al., 1980) e que,.no caso da secreção nectarífera, corresponde a estação chuvosa (GORENZ, 1967) que pode influenciar diretamente sobre o comportamento das abelhas, todo o estudo que venha levantar o h á b i t o d e a l i m e n t a ç ã o dos meliponíneos, é de importância para a região, pois esses insetos estão entre os polinizadores mais efetivos da maioria das plantas que compõem a vegetação (KERR, 1978).
Este trabalho é, portanto, mais uma contribuição para o entendimento dessas abelhas, tendo como finalidade o levantamento de plantas que são utilizadas como fontes de pólen por Melipona compressipes inanaosensis S c h w a r z , 1932, e de p o s s í v e i s preferências alimentares. A época de floração das plantas aqui levantadas, poderão ser utilizadas em futuros estudos fenológicos.
M A T E R I A L E M Ι T O D O S
Um ninho de Melipona compressipes manaosensis foi introduzido no Campus do Instituto Nacional de Pesquisas de Amazônia-INPA ( 3o
08" S e a 60° 10' W) que fica a uma altitude de 40,33 metros (MARQUES-SOUZA,
1993). A vegetação da área é de floresta
secundária com muitas espécies de floresta primária, e -apresentando um estádio de regeneração de uma vegetação que foi cortada mas não queimada (PRANCE,
1975; GENTRY, 1978).
Para a obtenção das amostras, foram aprisionadas, diariamente, cinco abelhas que possuíam carregamento de pólen em suas corbículas. Para isso, foi fechada a entrada da colméia e capturadas aleatoriamente as abelhas. Após a retirada das bolotas de pólen as abelhas foram libertadas.
N a s a m o s t r a s de p ó l e n foi adicionado 1 ml de ácido acètico gla-cial, onde após um repouso de 24 hs. foram a c e t o l i s a d o s ( E R D T M A N ,
1960), montadas em lâminas e lutadas com parafina.
A i d e n t i f i c a ç ã o dos tipos polínicos foi feita por comparação com as l â m i n a s de r e f e r ê n c i a j á existente e consultando-se a literatura especializada sobre o assunto.
De cada amostra foram contados em torno de 600 grãos e os resultados, e x p r e s s o s em p o r c e n t a g e n s , d i s t r i b u í d o s em suas r e s p e c t i v a s famílias vegetais.
R E S U L T A D O S E D I S C U S S Γ O
coletadas: Beliucia grossularioides, Miconia myrianthera e Miconia sp. Em seguida veio a família Solanaceae com 23,2% também com três espécies coletadas: Solarium caavurana, Solarium juripeba e Solarium sp.
N o s m e s e s s u b s e q u e n t e s de s e t e m b r o e o u t u b r o , h o u v e u m a estabilização tendo as operárias coletado nove tipos polínicos, com oscilações nas coletas nos meses seguintes (Tab. 2). A família Caesalpiniaceae, a partir desses dois meses, foi a mais visitada pelas operárias, sendo as espécies Cassia quangulata, Cassia sp. e Swartzia sp. as suas principais fontes de pólen, apesar das operárias continuarem com as coletas de pólen de espécies das famílias Melastomataceae, Solanaceae e Myrtaceae entre outras, com menos intensidade (Fig.l).
Espécies da família Caesalpiniaceae estão amplamente distribuídas por vários
habitats, e são presenças constantes em qualquer levantamento de plantas visitadas por abelhas. LE THOMAS et al (1988), em e s t u d o s na C o s t a do M a r f i m , constataram que 6 , 1 % de diferentes reservas alimentares de Trigona subg. Liotrigona boteggoi e 4 0 % de Hypotrigona n.sp. continham pólen de Cassia siamea e Cassia javanica, o que foi posteriormente ratificado por LOBREAU-CALLEN et al (1990) ao analisarem os estoques de pólen e mel em colônias de Hypotrigona pothieri. HEYTHAUS (1979; 1979a) observou na Costa Rica que de 192 espécies de abelhas, 11,1% visitaram espécies de Caesalpiniaceae, sendo no total a terceira família mais visitada pelas a b e l h a s e p o r 1,8% d e v e s p a s . SOMMEIJER et al. ( 1 9 8 3 ) ao analisarem os carregamentos polínicos de quatro espécies de meliponíneos e de Apis mellifera em T r i n i d a d e ,
Tabela 2. Distribuiηγo mensal das coletas de pσlen por Melipona compressipes manaosensis.
N٥mero N٥mero de N٥mero d e Distr. d a s
Ano M κ s d e e s p ι c i e s % g κ n e r o s % c o l e t a s por %
Amostras c o l e t a d a s c o l e t a d o s famνlia
A o s t o 21 12 13.6 0 9 13.0 0 7 10.8
1 S e t e m b r o 18 0 9 1 0 . 2 08 11.6 06 9.2
9 Outubro 10 0 9 10.2 08 11.6 07 10.8
8 Novembro 06 0 4 4.5 04 5.8 04 6.2
8 D e z e m b r o 0 9 08 9.1 0 6 8.7 05 7.7
Janeiro 0 9 10 11.4 0 7 10.1 0 9 13.8
Fevereiro 07 0 5 5.7 04 5.8 05 7.7
1 Marηo 08 06 6.8 05 7.2 05 7.7
9 Abril 08 09 10.2 0 7 10.1 0 6 9.2
8 Maio 0 5 04 4.5 03 4 . 3 0 3 4,6
9 Junho 07 06 6 . 8 04 5.8 0 4 6.2
Julho 05 06 6.8 04 5.8 04 6.2
7 5 %
5 0 %
2 5 %
-0 o
/
A S O N D J F M A
MESES
J J
Caesalpiniaceae
Mimosaceae
E! Melasíomataceae
^ Solanaceae
I^Flacourtiaceae
[ |Fobaceae
^ Myrtaceae
PI Outras
Figura 1. Representaηγo das famνlias botβnicas nas amostras de pσlen de Melipona compressipes
manaosensis (em n٥mero de espιcies vegetais).
2 0 UMID. %
M E S E S
constataram a presença de espécies de C a e s a l p i n i a c e a e . O u t r o s a u t o r e s , ABSY & KERR (1977), ABSY et al. (1980), MARQUES-SOUZA (1993) e MARQUES-SOUZA et al. (1993b) na Amazônia, KERR et al. (1986/87) no Maranhão (Brasil), ENGEL & DINGEMANS-BAKELS (1980) no Suriname, CORTOPASSI-LAURINO & RAMALHO (1988), IMPERATRIZ-FONSECA et al. (1989), RAMALHO (1990) e RAMALHO et al. (1994) em São Paulo (Brasil) também constataram a importância de espécies da família Caesalpiniaceae, na dieta de várias espécies de meliponíneos e de Apis mellifera, com uma maior freqüência de coleta de pólen para as abelhas sem ferrão.
A família C a e s a l p i n i a c e a e possue várias espécies - as cássias por exemplo - com anteras poricidas, o que obriga os visitantes a coletarem o pólen por vibração "buzz pollination" (MICHENER, 1962; WILLE, 1963; BUCHMANN, 1974). Como as Apis não v i b r a m as a n t e r a s , elas têm dificuldades na coleta do pólen dessas espécies (MARQUES-SOUZA et ai.,
1993b). As trigonas, que também não coletam por vibração, contornam o problema cortando as anteras das cássias, e de outras espécies poricidas e, assim, têm acesso ao alimento (LAROCA, 1970; RENNER, 1983; MARQUES-SOUZA et ai, 1993a). Já as operárias de Frieseomelitta varia coletam o pólen restante de Cassia sp., logo após o abandono das flores por Melipona compressipes manaosensis e Melipona seminigra merrillae, abelhas que utilizam o método de vibração em suas coletas (MARQUES-SOUZA, 1993).
No c o m p u t o g e r a l , foram coletados pelas operárias durante o período de um ano, o pólen de 30 espécies distribuídos em 23 gêneros e 19 famílias. É pouco, se levarmos em consideração a grande variedade de espécies vegetais que existem na área, muitas delas com grandes floradas o ano todo como Warczewiczia coccinea (Ruhiaceae), Tahebuia serrati/olia e Arrabidaea s p . ( B i g n o n i a c e a e ) , Schefflera morototoni (Araliaceae), Bixa ore liana (Bixaceae), Swietenia macrophylla (Meliaceae) entre outras, que foram d e s p r e z a d a s p o r e s s e meliponíneo, mas em cujas flores fo-ram observados espécies de Trigonini e borboletas coletando pólen e néctar.
Geralmente a exploração de uma fonte p o d e estar relacionada com possíveis preferências florais e/ou redução sazonal de alimentos (GUIBU et ai, 1988; MARQUES-SOUZA et ai, 1993b) o que pode ter levado as operárias de Melipona compressipes manaosensis a coletarem plantas com curtas fl oradas como Tapi rira guianensis que teve seu pólen coletado nos meses de agosto com 0,8% de freqüência, setembro com 8,2% e outubro com 7,6% de freqüência. Doliocarpus sp., cujo pólen foi coletado somente em junho, representou 11,1% de freqüência nas coletas desse meliponíneo. Mabea sp. que teve o pólen coletado somente em agosto, representou 4,9% de freqüência nas coletas. Lindackeria sp., coletada em dois meses (setembro e outubro), teve freqüência de 3,2% e 17,3%, respectivamente. Physocalymma scaberrimum que teve seus grãos de pólen coletados em março e abril com 5,4% e 4,5% de freqüências. Byrsonima sp. que teve o pólen coletado em novembro e janeiro e com freqüências de 0,1% e 5,1% nas coletas. Leucaena sp. cujos pólen foram coletados somente em agosto com 4,5% de freqüência. E Mimosa pudica cujos pólen foram coletados nos meses de janeiro, março e abril e que representaram 12,3% de freqüência para o último mês (Tab. 1 ).
As plantas com curtas floradas são importantes para a manutenção das c o l m é i a s de meliponíneos na Amazônia, principalmente na estação c h u v o s a , d e v i d o à d i m i n u i ç ã o na oferta de a l i m e n t o s o n d e várias espécies de abelhas chegam a ter
dificuldades em se manter (GORENZ, 1967a). Há porém abelhas em que as c h u v a s não influem no seu d e s e m p e n h o e x t e r n o , c o m o a Melipona seminigra merrillae e a Melipona rufiventris paraensis, que se beneficiam d o dossel fechado da floresta, que impede que a chuva caia direto sobre o solo, para fazerem suas coletas (MARQUES-SOUZA, 1993). Nos trabalhos de A B S Y & KERR (1977) e ABSY et al. (1980) foi constatado que não há correlação entre as chuvas e as coletas desses dois meliponíneos, e os autores concluíram que a busca do alimento, e de outros materiais, pode estar associada a problemas de economia de energia e às necessidades das colônias.
das peças florais dessas espécies de Cassia pelos outros visitantes na obtenção do pólen, e de outros fatores, levou esse meliponíneo a intensificar suas coletas para um número reduzido de plantas, ser eficiente nas coletas e, com isso, evitar a competição inter e intra-específica com outras abelhas, comum quando há deficit de alimentos (HUBELL & JOHNSON, 1977; 1978).
As operárias de Melipona compressipes manaosensis aproveitaram os intervalos de chuva para coletar os alimentos, pois não foi observado abelhas saindo e/ou retomando às colméias quando estava chovendo. É como se cessassem as suas atividades externa, o que não deixa de ser curioso, pois segundo KERR ( 1969) os ninhos desse meliponíneo sobrevivem a períodos submersos as margens de rios da Amazônia sem que as águas interfiram no seu desempenho interno.
AGRADECIMENTOS
Agradecemos a Cleonice de Oliveira Moura e José Benayon Bessa de Moura pela preparação das amostras de pólen, ao Francisco Javier Aguilera Peralta pelo acompanhamento dos meliponíneos, ao Dr. Warwick Estevam Kerr e Dra. Maria L ú c i a Absy p e l a s s u g e s t õ e s no trabalho e ao Gláucio Bélem pela confecção dos desenhos.
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