• Nenhum resultado encontrado

Coleta de dados na pesquisa clínico-qualitativa: uso de entrevistas não-dirigidas de questões abertas por profissionais da saúde.

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2017

Share "Coleta de dados na pesquisa clínico-qualitativa: uso de entrevistas não-dirigidas de questões abertas por profissionais da saúde."

Copied!
10
0
0

Texto

(1)

COLETA DE DADOS NA PESQUI SA CLÍ NI CO-QUALI TATI VA: USO DE ENTREVI STAS

NÃO-DI RI GI DAS DE QUESTÕES ABERTAS POR PROFI SSI ONAI S DA SAÚDE

Bruno José Barcellos Font anella1 Claudinei José Gom es Cam pos2

Egbert o Ribeiro Turat o2

Entrevistas não- dirigidas constituem o principal instrum ento de coleta de dados nas pesquisas qualitativas no cam po da saúde. Est es est udos est ão consolidados na lit er at ur a int er nacional. Par a os pr ofissionais de saúde, saber o que as pessoas sent em e im aginam perm it e- nos um a relação clínico- pacient e m ais adequada. É indispensável saber o que os fenôm enos da vida significam para os indivíduos, porque os significados t êm um a função est rut urant e: em t orno do que as coisas significam para nós, organizam os nossas vidas, incluindo os cuidados com nossa pr ópr ia saúde. A par t ir de pesquisas concluídas j unt o ao Labor at ór io de Pesquisa Clínico- Qualitativa da Universidade Estadual de Cam pinas, Brasil, os autores abordam , neste artigo, os seguintes pont os: car act er ização de ent r ev ist as não- dir igidas, dir et iv idade das ent r ev ist as, t écnicas de abor dagem , obser v ação de m anifest ações não- v er bais e par a- v er bais, t écnicas de r egist r o e t r anscr ição do discur so e validade/ confiabilidade das ent revist as não- dirigidas. O t ext o quer ser út il para int eressados em pesquisa da gr aduação e pós- gr aduação.

DESCRI TORES: ent revist a psicológica; pesquisa qualit at iva; validade

DATA COLLECTI ON I N CLI NI CAL-QUALI TATI VE RESEARCH: USE OF NON-DI RECTED

I NTERVI EW S W I TH OPEN-ENDED QUESTI ONS BY HEALTH PROFESSI ONALS

Non- directed interviews constitute the m ain data collection instrum ent in qualitative health research. Studies in which t his is evident are well docum ent ed in int ernat ional lit erat ure. For healt h professionals, knowing what people feel and im agine m ak es it possible t o dev elop a m or e adequat e clinician- pat ient r elat ionship. I t is indispensable to know what the life phenom ena m ean for individuals, because the m eanings have a structuring funct ion. People organize t heir lives around t he m eaning t hey at t ribut e t o sit uat ions or obj ect . This is also relevant to their health care. From research conducted at the Laboratory of Clinical- Qualitative Research, State University of Cam pinas, Cam pinas ( São Paulo) , Brazil, the authors address, in this article, the following m atters: charact erizat ion of non- direct ed int erviews, direct iveness of int erviews, approach t echniques, observat ion of non- verbal and paraverbal m anifest at ions, regist ry t echniques / speech t ranscript ion, and validit y/ reliabilit y of non- direct ed int erviews. This is useful for people int erest ed in research at graduat e and undergraduat e level.

DESCRI PTORS: int erview, psychological; qualit at ive research; validit y

COLECTA DE DATOS EN LA I NVESTI GACI ÓN CLÍ NI CO-CUALI TATI VA: EL USO DE

ENTREVI STAS NO-DI RI GI DAS DE PREGUNTAS ABI ERTAS POR LOS PROFESI ONALES DE SALUD

Las entrevistas no- dirigidas constituyen el principal instrum ento de colecta de datos de la investigación cualit at iva en el cam po de la salud. Est os est udios est án consolidados en la lit erat ura int ernacional. Para los profesionales de salud, saber lo que sient en e im aginan las personas cont ribuye para la const rucción de una r elación m edico- pacient e m as adecuada. Es indispensable saber el significado de los fenóm enos de la vida para los individuos, porque tiene una función estructurante: alrededor de lo que significan organizam os nuestras vidas, incluyendo los cuidados con nuest ra salud. A part ir de invest igaciones realizadas en el Laborat orio de I nvest igación Clínico- Cualit at iva, Universidad Est at al de Cam pinas, Brasil, los aut ores t rat an de: caract erización de ent r ev ist as no- dir igidas, cont inuum dir ect iv o de ent r ev ist as, t écnicas del acer cam ient o, obser v ación de m an if est acion es n o- v er bales y par av er bales, t écn icas del r egist r o/ t r an scr ipción del discu r so, y v alidez/ con f iabilidad de en t r ev ist as n o- dir igidas. Es ú t il par a los in t er esados en in v est igación de gr adu ación y posgr adu ación .

DESCRI PTORES: ent revist a psicológica; invest igación cualit at iva; validez

1 Dout or, Professor da Universidade Federal de Minas Gerais, Mem bro do Laborat ório de Pesquisa Clínico- Qualit at iva; 2 Dout or; Professor da Faculdade de

(2)

I NTRODUÇÃO

E

nferm eiros, m édicos e out ros profissionais d e saú d e n ecessit am , com f r eq ü ên cia, am p liar a

com preensão cient ífica de fenôm enos acerca da vida e da doença, t ais com o v iv enciados e sim bolizados por seus pacient es. Conseqüent em ent e, eles passam a assum ir o papel específico do clínico- invest igador. Est es profissionais part em da prem issa de que seus pacient es det êm experiências de vida e inform ações e sp e cíf i ca s q u e l h e s a j u d a r ã o a co m p r e e n d e r profundam ente vários problem as de saúde e de vida, en t ão f ocalizad os p ar a u m a in v est ig ação clín ico-p sicológ ica. O en con t r o clín ico- p acien t e com eça, assim , a adquirir caract eríst icas peculiares a am bos, e deve ocorrer de um a m aneira m et odologicam ent e acurada, t al com o é realizada em qualquer pesquisa cient ífica.

Os profissionais de saúde estão acostum ados a coletar dados para chegar a um diagnóstico clínico. Ent r et ant o, o r ecur so da anam nese, com o bem se sabe, difere de um rot eiro de ent revist a da pesquisa qualit at iva( 1) .Enquant o a anam nese represent a um a e n t r e v i st a d i r i g i d a , p o r t a n t o co m q u e st õ e s preestabelecidas para um a coleta ordenada de dados, or ganizando a m em ór ia do ent r ev ist ado ( pacient es e/ ou acom panhant es) , v isando dar diagnóst ico em clín ica ou em p esq u isa, a en t r ev ist a d a p esq u isa qualit at iva é igualm ente um encontro interpessoal para a obt en ção de in f or m ações v er bais e/ ou escr it as, porém de um a m aneira não- dirigida, consist indo em um instrum ento de pesquisa científica a fim de gerar conhecim ent os novos sobre vivências hum anas. Um profissional clínico, devido a sua habit ual prát ica de assist ência t erapêut ica, e em bora agora j á com o um in v est ig ad or q u alit at iv ist a, p od er á in t er ag ir ain d a ingenuam ente com a pessoa doente, coletando dados aut om at icam ent e at r av és de num er osas per gunt as se q ü e n ci a i s, a t é m e sm o so l i ci t a n d o r e sp o st a s padr on izadas, com o ger alm en t e ocor r e qu an do se visam descr ições clínicas apr endidas nos am bient es e nos t rat ados m édicos.

D e u m p o n t o d e v i st a m e t o d o l ó g i co , se a l g u é m q u i se r e x p l i ca r ci e n t i f i ca m e n t e ce r t o fenôm eno, por exem plo, r elacionado à dependência de drogas, este seria um assunto para investigadores em psiqu iat r ia, em epidem iologia ou f ar m acologia clínica. Mas se alguém quiser com preender o que este fenôm eno significa para um paciente dependente, este é um t em a par a inv est igador es qualit at iv ist as, que

p o d em ser p si có l o g o s, p si can al i st as, so ci ó l o g o s, ant ropólogos ou educadores. Ent ret ant o, seria m uit o in t er essan t e se en f er m eir os, m éd icos e t od os os outros profissionais de saúde, eles m esm os pudessem em p r eg a r m ét o d o s q u a l i t a t i v o s. Est es t r a zem a v ant agem - dev ido a sua ex per iência de cuidado à saúde - de trazer um a atitude clínica e existencialista inerent es( 1), que lhes perm it irá execut arem valiosas co l e t a d e d a d o s e f a ze r e m i n t e r p r e t a çõ e s d o s result ados com aut oridade.

Em r ecen t e ed i t o r i al , o r en o m ad o j o r n al brit ânico Medical Educat ion anunciou um a nova série so b r e p e sq u i sa q u a l i t a t i v a p a r a a u m e n t a r a co n sci ên ci a d o s l ei t o r es acer ca d a v ar i ed ad e d e m étodos disponíveis( 2). O assistente editorial enfatizou que, nos últ im os dez anos, os m ét odos qualit at ivos de pesqu isa, cada v ez m ais, t êm se t or n ado bem aceit os em per iódicos da saú de. Div er sas r ev ist as t êm publicado regularm ent e pesquisas qualit at ivas e dispõem de árbitros com claras diretrizes para avaliar os respectivos artigos. É difícil encontrar profissionais d a sa ú d e q u e a i n d a n ã o t e n h a m ci ê n ci a so b r e m ét od os q u alit at iv os e sob r e su a con t r ib u ição às bases de conhecim ent o.

A respeito do problem a a ser eleito para um a pesquisa qualitativa, este não deve ter sido explorado cientificam ente de m odo extenso. No caso da pesquisa clín ico- q u alit at iv a, a in f or m ação qu e in t er essa ao inv est igador necessit a ser encont r ada do pont o de v ist a su b j et iv o d os in d iv íd u os em est u d o ( sej am pacien t es, par en t es ou m esm o os pr ofission ais de saúde) . Esta é a cham ada perspect iva êm ica de um a pesquisa genuína(3), ist o é, o invest igador respeit a a p osi ção d o i n si d er, com f i d el id ad e à f ala d est es ent revist ados, int erpret ando os result ados de acordo

com a própria lógica deles considerando as relações

de significado que est abelecem . Conseqüent em ent e, isto perm itirá gerar, de fato, um conhecim ento original. A confrontação com os dados de literatura tem então um a função com plem ent ar, com o um a est rat égia de

t r ian gu lação t eór ica. Mas n u n ca dev e ser v ir com o pont o inicial da discussão, na qual a apr esent ação das cit ações, ex t r aída do m at er ial das ent r ev ist as, som ente aj udaria a confirm ar teorias j á estabelecidas. Considerando ser, infelizm ent e, um a pr át ica m uit o com um nas produções acadêm icas, o conhecim ent o cient ífico, nest e m odo, realm ent e não avança.

(3)

d ad os d ev e colocar as d u as p essoas f ace- a- f ace, pr ocur ando desenv olv er um set t ing nat ur al. Cer t os f e n ô m e n o s v i t a i s sã o m a i s e v i d e n ci a d o s n e st a situação, particularm ente aqueles colocados em níveis m ais profundos da realidade( 4), tais com o: as reações p sicológ icas e cu lt u r ais a r esp eit o d o r isco e d o p r o ce sso d e a d o e ce r ; a s cr e n ça s/ a t i t u d e s d o s p a ci e n t e s o u d o s p r o f i ssi o n a i s a r e sp e i t o d a co m p r e e n sã o cl ín i ca d a d o e n ça ; a a d e sã o a o s t r at am ent os e às m edidas de pr evenção; o m anej o do est igm a da doença e assim por diant e.

As ferram ent as de pesquisa m ais adequadas a t ais peculiaridades são as ent revist as não- dirigidas

em seus subt ipos, a saber: as ent revist as abert as e as en t r ev ist as sem id ir ig id as. Nest es m ét od os, os ent revist ados falarão sobre os significados que eles atribuem a suas experiências de vida e da doença. É i n t er essa n t e n o t a r q u e est e m o d o p o d e l ev a r o e n t r e v i st a d o r a a p r o x i m a r - se d e d a d o s n ã o e sp e r a d o s( 5 ), q u e sã o o s f a m o so s a ch a d o s d e

ser en d ip id ad e: aq u eles q u e são en con t r ad os p or acaso. O investigador terá que descrever e interpretar t ais dados, com o pode ser lem brado o exem plo bem conhecido de serendipidade da descobert a cient ífica da penicilina no cam po das ciências nat urais.

Em cont r ast e com as t écnicas da pesquisa e x p e r i m e n t a l , a s e n t r e v i st a s n ã o - d i r i g i d a s sã o i n st r u m e n t o s i n t e r a t i v o s co m p l e x o s, e m q u e o in v est ig ad or n ão d ev er ia e d e f at o n ão p od e -co n t r o l a r v a r i á v e i s e m o ci o n a i s, -co g n i t i v a s e com portam entais. Um a verdadeira pesquisa de cam po deveria ir além do histórico papel passivo de confirm ar ou de r efut ar hipót eses. As ent r ev ist as qualit at iv as têm que produzir dados a fim de realizar, pelo m enos, quatro im portantes funções que deveriam desenvolver os m odelos t eór icos, nom eadam ent e: os r esult ados i n i ci a m , r e f o r m u l a m , r e d i r e ci o n a m e cl a r e i a m t eorias( 5).

DEFI NI ÇÃO E OBJETI VO

A Met odologia Clínico- Qualit at iva - um a das m u it as ab or d ag en s q u alit at iv as - é u m p ar t icu lar refinam ento da genérica m etodologia qualitativa vinda das ciências hum anas. É definida com o se segue: “ É o est u d o t eór ico - e seu u so cor r esp on d en t e em investigação - de um conj unto de m étodos científicos, t écnicas e procedim ent os adequados para descrever e int erpret ar os sent idos e os significados at ribuídos

a fenôm enos e r elacionados à v ida dos indiv íduos, sej am pacientes ou qualquer outra pessoa participante d o set t in g d os cu id ad os com a saú d e ( p ar en t es, m e m b r o s d a e q u i p e p r o f i ssi o n a l e d a com unidade) ”(6).

Frente ao delineado acim a, o arrazoado deste ar t igo for nece est r at égias par a m elhor conhecer o q u e a s p e sso a s se n t e m e i m a g i n a m so b r e o s fenôm enos da saúde. De pesquisas conduzidas j unt o ao Labor at ór io da Pesqu isa Clín ico- Qu alit at iv a, da Un i v er si d a d e Est a d u a l d e Ca m p i n a s, o s a u t o r es

alm ej am discut ir seis pr oblem as: car act er ização de entrevistas não- dirigidas; diretividade das entrevistas; técnicas de abordagem ; observação de m anifestações n ão- v er bais e par av er bais; t écn icas de r egist r o e t r an scr ição d o d iscu r so; e, f in alm en t e, v alid ad e/ confiabilidade das ent revist as não- dirigidas.

A CARACTERI ZAÇÃO D E EN TREVI STAS

NÃO-DI RI GI DAS

Cert os t ext os que definem ent revist as não-dirigidas têm indicado dois aspectos específicos deste instrum ento de coleta de dados, a saber: seu intento ex plor at ór io e seu car át er de assim et r ia( 7). Quant o m enos dir igidas, as ent r ev ist as puder em ser, m ais eficient es se apr esent ar ão. Em cont r ast e com um a co n v e r sa çã o d i á r i a , sã o co n d u zi d a s d e m o d o m et odologicam ent e acurado por um invest igador. De um lado, há um a pessoa que é um t écnico no papel d e d et en t or d e cer t o con h ecim en t o cien t íf ico - o p e sq u i sa d o r, e d e o u t r o l a d o , h á u m a p e sso a co n v i d a d a q u e a ssu m e o p a p e l d o r e ce p t o r d a abordagem t écnica - o ent revist ado.

(4)

p esq u isa d e acor d o com su a p ar t icu lar est r u t u r a psicológica, m odu lan do- a em con for m idade com o que lhes acont ece e não em conform idade com um quest ionário previam ent e organizado e fechado que lhes tenha sido m ostrado. Com preender a m odulação, a ssi m co m o p e r m i t i r a l i v r e m a n i f e st a çã o d o s en t r ev ist ad os, é p ap el d o en t r ev ist ad or. I st o n ão i m p l i ca e m u m a a t i t u d e p a ssi v a f r e n t e à q u e l e s prim eiros, m as ao contrário, o entrevistador deve usar tanto seu conhecim ento técnico com o o conhecim ento d o u n i v e r so cu l t u r a l d o s e n t r e v i st a d o s. O entrevistador deve aplicar sua habilidade ao problem a sob inv est igação, dev e usar t écnicas de ex plor ação e , f i n a l m e n t e , d e v e m o d u l a r a d i r e t i v i d a d e d a entrevista. Cada conduta tom ada durante a entrevista é usada na exploração daquilo a que se propôs.

A DI RETI VI DADE

DAS ENTREVI STAS

As in t er v en ções d o p esq u isad or f or n ecem m aior ou m en or dir et iv idade à en t r ev ist a, cr ian do

desse m odo um cont inuum de possibilidades ent r e

d u a s e x t r e m i d a d e s - a e n t r e v i st a i n f o r m a l e a e n t r e v i st a p a d r o n i za d a . Na p e sq u i sa cl ín i co -qualitativa, o instrum ento de escolha poderia ser tanto a entrevista aberta ou a ent revist a sem idirigida ( com pergunt as abert as) . Quant o m enos se sabe sobre o problem a que est á sendo pesquisado, m enos dirigida deve ser a entrevista. Em pesquisas de natureza m ais explorat ória, poucos t em as devem ser propost os.

Os ant ropólogos aplicam freqüent em ent e as r e f e r i d a s e n t r e v i st a s i n f o r m a i s n a s si t u a çõ e s cham adas observação part icipant e, em sua im ersão n a co m u n i d a d e e m e st u d o . Est a e st r a t é g i a f o i d esen v olv id a a p ar t ir d e f am oso est u d o sob r e os nat iv os da Oceania, há quase um século( 10). Esses p e sq u i sa d o r e s p r e ssu p õ e m t e r a ssi m m a i s com pr eensão do pr oblem a do que ser ia alcançado por qualquer t ipo de quest ionár io ( longo ou cur t o, m ú l t i p l a e sco l h a , e sca l a s o u o u t r o s) . Al g u m a s vant agens dessa t écnica são as seguint es: garant ia de t er acessado a font e or iginal, alt a v alidade dos dados colet ados e, por fim , gr ande confiança com baixo cust o operacional.

Sabe- se que a ex plor ação cient ífica de um t em a clínico dev e abranger, além do conhecim ent o teórico do entrevistador, um conj unto de conteúdos e h a b i l i d a d e s, a d v i n d a s d e e n t r e v i st a s cl ín i ca s p r e v i a m e n t e r e a l i za d a s d u r a n t e a t i v i d a d e s

assist enciais. At ravés dessa experiência profissional, o investigador clínico- qualitativo j á terá fam iliarização com o seguint e: o vocabulár io acer ca do t em a que será pesquisado; o m odo de ser dos suj eit os com os q u a i s e l e i n t e r a g i r á ; e a s h a b i t u a i s d e m a n d a s e m o ci o n a i s e so ci a i s d e ssa p o p u l a çã o . Co n se q ü e n t e m e n t e , a s e n t r e v i st a s cl ín i ca s conduzidas durant e a vida acadêm ico- profissional do pesquisador t er ão assegur ado div er sas habilidades sociocu lt u r ais, t écn icas e p sicológ icas, t ais com o requeridas para a pesquisa clínico- qualit at iva.

Os p esq u isad or es q u alit at iv ist as m an t êm t am bém um a valiosa at it ude clínica de acolhida dos sofrim ent os em ocionais da pessoa, inclinando- lhes a escut a e o olhar, m ovidos pelo desej o e pelo hábit o d e f or n ecer aj u d a( 1 ). Tais h abilidades clín icas são si m i l a r es à co m p e t ê n ci a cu l t u r a l b u sca d a p e l o s ant ropólogos durant e a fase inform al da ent revist a, q u a n d o q u e r e m co n h e ce r o f u n ci o n a m e n t o sociocult ur al cot idiano no cam po em obser vação. A com pet ência cult ur al, r equer ida par a o pesquisador clínico- qualitativo, consiste em um certo conhecim ento do problem a da pesquisa e do cam po, evitando erros que com prom et eriam a validade dos dados obt idos, t ais com o im por pr oblem as est r anhos ao univ er so sócio- psicológico das pessoas ou usar conceit os não-corrent es na população pesquisada.

As denom inadas ent r ev ist as de acult ur ação

são necessárias, devido às m esm as razões, ou sej a p a r a f a m i l i a r i za çã o d o p esq u i sa d o r f r en t e a u m e sp e cíf i co se t t i n g e n v o l v e n d o e n t r e v i st a d o r -en t r ev i st ad o . As -en t r ev i st as d e acu l t u r ação d as i n v e st i g a çõ e s q u a l i t a t i v a s co r r e sp o n d e m , m etodologicam ente, às clássicas ent revist as pilot o das pesquisas quant it at ivas( 1) . Com relação à ent revist a sem idir igida de per gunt as aber t as, t ais ent r ev ist as liv r es pr eceden t es ser v em par a adapt ação de seu roteiro. Elas perm item ratificar a adequação do roteiro previam ent e elaborado ou m esm o incluir t ópicos não planej ados ant eriorm ent e, em caso de cert a ênfase e sp o n t â n e a , p o r p a r t e d o s e n t r e v i st a d o s, se r percebida para um a questão específica. As entrevistas p r e l i m i n a r e s p e r m i t e m t a m b é m a o p e sq u i sa d o r a v a l i a r se u p r ó p r i o co m p o r t a m e n t o n o ca m p o , “ calibrando” a si m esm o enquanto pesquisador- com o-inst rum ent o e reduzindo suas ansiedades ( norm ais) nest e part icular set t ing de pesquisa.

(5)

o s p r ó p r i o s p r o b l e m a s v i v e n ci a d o s, i n t e r e sse s, p r e o cu p a çõ e s, o p i n i õ e s, e x p e ct a t i v a s, m e d o s, fant asias, dev aneios e assim por diant e. Esper a- se que os entrevistados se expressem com suas próprias palavras, com port ando- se com o um suj eit o at ivo na ent revist a. As ent revist as não- dirigidas podem durar m a i s t e m p o , m a s co m p e n sa n d o e st a a p a r e n t e d esv a n t a g em p r á t i ca d o i n st r u m en t o p o ssi b i l i t a possível m enos vieses nas fases da colet a de dados e da int er pr et ação, sendo conseqüent em ent e m ais eficazes em sit uações de pesquisa explorat ória.

No caso do subt ipo da ent r evist a aber t a, o pesqu isador pr opõe u m assu n t o e post er ior m en t e apenas catalisará o discurso do entrevistado, usando-se est ím ulos sonoros de com unicação, que facilit am a m anifest ação das possibilidades de ex pr essão do entrevistado. Freqüentem ente, é descrita com o sendo u m a en t r ev ist a em pr of u n didade( 3 ), r ef or çan do as possibilidades ilim it adas de considerações por part e do ent revist ado, acerca do t em a propost o e de suas associações, podendo ir além do que o pesquisador havia im aginado ou cat egorizado previam ent e.

O subt ipo da ent revist a sem idirigida é um a espécie de guia tem ático, m ais curto, que serve com o rot eiro para o encont ro. Algum as quest ões- t ópicos j á são suficientem ente conhecidas para serem propostas, porém o todo da entrevista não está predeterm inado e nem as respost as est ão predit as( 1). A diret ividade é sublim inarm ente alternante entre am bos participantes e, por conseguint e, t am bém não t r anscor r endo ao acaso , n ão é g u i ad a p el o d esej o ex cl u si v o d o en t r ev ist ad or ou d o en t r ev ist ad o. As en t r ev ist as sem i d i r i g i d as são al t am en t e d i n âm i cas e, con seq ü en t em en t e, as con sid er ações sob r e com o realizá-las são som ente tentativas de esquem atizá-las. Tipicam ente, a entrevista sem idirigida deveria ter um caráter aberto ao início, quando um a prim eira p er g u n t a é con sid er ad a - a ch am ad a a q u est ão disparadora. Ela focaliza o t rabalho de invest igação, encorajando a geração de idéias, deve ser bem entendida para a respost a ser suficient em ent e desenvolvida. A pergunta não deve se referir a um assunto am bíguo, nem deve endereçar- se a um t ópico sobre o qual o entrevistado não tenha habilidade emocional ou cognitiva para falar. A frase usada para focar o problem a não deve ser m uito geral, nem m uito específica, im pedindo desenvolvimentos que não tenham sido de interesse do entrevistador. Obviam ente, a pergunta disparadora está relacionada diretam ente ao objetivo geral da pesquisa. Todas as per gu n t as dev er iam m ot iv ar u m discur so r espeit ando o pr incípio da livr e associação

d e id éias( 1 1 ). Por ou t r o lad o, o p esq u isad or p od e ret om ar pont os j á abordados pelo ent revist ado, caso não t enham sido clar am ent e ex pr essos - fat o que caract eriza um a alt ernância de diret ividade. Quando u m p o n t o f o i a d e q u a d a m e n t e a b o r d a d o , o en t r ev i st ad o r i n t r o d u z en t ão o u t r o s t ó p i co s, em concor dância com o que foi incluído no pr oj et o de pesquisa. O pesquisador verifica quais t ópicos ainda n ão f or am ab or d ad os e en t ão os p r op õe d e u m a m aneir a neut r a e aber t a. Est as per gunt as r eflet em naturalm ente os obj etivos específicos da pesquisa que t inham sido definidos, sem pr e em cor r espondência com as hipót eses inicialm ent e for m uladas. Não se espera que o t em a e seus subt em as sej am sem pre p r o p o st o s a d i f er en t es en t r ev i st a d o s d a m esm a m aneira. As perguntas e o m odo com o são expressas v ar iar ão obv iam ent e de acor do com car act er íst icas pessoais de cada inform ant e.

Com o inst rum ent o da pesquisa em m ãos, o invest igador acom panha as variações do cam po e as e st i m u l a , se m p e r d e r d e v i st a o s o b j e t i v o s d a p e sq u i sa . A l i st a d o s su b t e m a s a d q u i r e m a i o r relevância dependendo da fluência dos ent revist ados, quando est es focalizam a infor m ação que se r efer e ao t em a principal. Em geral, é preferível abordar os e n t r e v i st a d o s so m e n t e u m a v e z. Um a se g u n d a entrevista pode ser desnecessária, em bora em alguns casos ela possa t er u m efeit o de m ax im ização da validade dos dados colet ados nest e m ét odo.

Op o n d o - se a t a l n ã o - d i r e t i v i d a d e , a s

(6)

AS TÉCNI CAS DE ABORDAGEM

Abor dar in div ídu os at r av és de en t r ev ist as não- dirigidas im plica em intervir cuidadosam ente para se ob t er o m áx im o em p r of u n d id ad e sob r e seu s pont os de vist a. Os indivíduos podem falar sobre os t ó p i co s al m ej ad o s, m as t am b ém so b r e q u est õ es int roduzidas por eles m esm os durant e a ent revist a, obviam ente se forem úteis aos obj etivos da pesquisa. I n t er v en ção m ín im a pode sign if icar sim plesm en t e perm it ir um m om ent o ao ent revist ado para que ele p e n se so b r e o q u e e st a v a d i ze n d o , f i ca n d o o ent r ev ist ador sem int er v ir dur ant e esses inst ant es. O si l ê n ci o d o e n t r e v i st a d o n ã o si g n i f i ca necessar iam ent e um a conclusão de seu r aciocínio, cer t a in ib ição ou u m d esin t er esse, m as p od e t er d i v e r so s si g n i f i ca d o s p si co l ó g i co s a se r e m int er pr et ados, t al com o por ex em plo, a pr ocur a da m elhor form a de elaborar m entalm ente o que ele está sent indo ou im aginando. Por sua vez, o silêncio do p esq u isad or p od e cor r esp on d er a u m a eloq ü en t e linguagem de sentim entos angustiantes e até m esm o u m a r e l a çã o a f e t i v a p r a ze r o sa e st a b e l e ci d a inconscient em ent e.

Certas expressões faciais podem m ostrar que o o b se r v a d o r e st á se g u i n d o o r a ci o cín i o d o ent revist ado. Movim ent os afirm at ivos com a cabeça, lev es int er j eições ou em issão de sons est im ulant es são outras pequenas intervenções do pesquisador que m ost r am ao en t r ev ist ad o q u e su as r esp ost as são pertinentes e úteis e, conseqüentem ente, o inform ante verá ist o com o um a oport unidade de expandir suas r espost as. Par a ex plor ações m ais det alhadas, sem t en t ar d ir ig ir o en t r ev ist ad o, in d ica- se r ep et ir as últ im as palavras dit as pelo inform ant e, t ransm it indo a idéia de que é desej ável que ele desenvolva m ais o ar gum ent o em andam ent o.

I nt roduzir um subt em a novo represent aria a m ais r adical in t er v en ção em u m a en t r ev ist a n ão-d ir ig ião-d a. O p esq u isaão-d or est ar ia an t ecip an ão-d o u m a p o ssív e l r e sp o st a e sp o n t â n e a d o e n t r e v i st a d o . Te o r i ca m e n t e , e st a p o si çã o p o d e i n d i ca r ce r t a an sied ad e p or p ar t e d o en t r ev ist ad or, m as é u m fenôm eno que nem sem pr e dim inui a v alidade dos dados colet ados. En t r et an t o, est a possív el at it u de cont r at r ansfer encial ( um deslocam ent o inv olunt ár io dos sent im ent os do ent r ev ist ador ao ent r ev ist ado) deveria ser usada com o um elem ent o de sua aut o-observação a fim de com preender m elhor, na fut ura fase de t rat am ent o dos dados, com o a dinâm ica da

en t r ev ist a ocor r eu . O cit ado com por t am en t o pode t am b ém r esu l t ar d a b o a i n t er ação d a d u p l a, d a co o p er ação en t r e as p ar t es, co r r esp o n d en d o ao inst ant e exat o em que um a nova pergunt a, devido a r a zõ e s d i v e r sa s, t e r i a q u e se r a p r e se n t a d a . O ent revist ador est aria dem onst rando, por exem plo, j á t er com p r een d id o o con t eú d o lat en t e d o q u e f oi revelado de algum m odo pelo ent revist ado.

Para conduzir um a entrevista de pesquisa de um a m aneira satisfatória, reconhecendo o fato de que ela con sist e em u m en con t r o in t er p essoal r ico e m ult idim ensional, as caract eríst icas de personalidade

do ent revist ado deveriam t am bém ser reconhecidas. Essas car act er íst icas m odu lam in ex or av elm en t e o co n t e ú d o e a f o r m a d o d i scu r so d e q u a l q u e r inform ant e e, conseqüent em ent e, t odo o set t ing da e n t r e v i st a . Pe l o m e n o s se i s t i p o s d e r e l a çõ e s p si co l ó g i ca s p o d e m se r si st e m a t i za d a s co m o elem ent os aux iliar es às considerações inv est igador, com o os tipos: histérico, fóbico, obsessivo, paranóide, sociopát ico e esquizóide( 12). No set t ing da ent revist a, o i n v e st i g a d o r a p r e n d e co m o d e t e ct a r t a i s car act er íst icas e adm in ist r á- las, assim com o pode instruir- se previam ente pela literatura científica e por aulas/ conferências sobre o assunt o.

A OBSERVAÇÃO D AS M AN I FESTAÇÕES

NÃO-VERBAI S E PARAVERBAI S

(7)

ou divergência, frent e ao que ela havia expressado de um m odo verbal e conscient e.

Obser v ar e r eagir às m an ifest ações acim a m encionadas não constitui propriam ente um a técnica, m as sobretudo, um a conseqüência das características pessoais do pesquisador. O entrevistador procura fazer g e r a l m e n t e u so m á x i m o d e su a ca p a ci d a d e d e observação. Observar e reagir aos com port am ent os não- verbais da am ost ra sob est udo reflet e a em pat ia

d o p esq u isad or com essa p op u lação esp ecíf ica -capacidade que não é facilm ent e at ingível com m ero t r e i n a m e n t o . Em ca d a p e sq u i sa d e ca m p o , r e i v i n d i ca m p e sq u i sa d o r e s co m h a b i l i d a d e s esp ecíf icas d e r esp eit o ao ou t r o, q u e sej am , em co n se q ü ê n ci a , se n sív e i s à s n u a n ça s d o com port am ent o singular de seu ent revist ado.

As t é cn i ca s d e o b se r v a çã o e m ci ê n ci a s h u m a n a s se a p e r f e i ço a r a m co m o r e su l t a d o d a e x p e r i ê n ci a d o s a n t r o p ó l o g o s e m ca m p o , par t icular m ent e em sua int er ação com pessoas de diferent es crenças e valores, com o part icipant es da cult ura. O diário de cam po t ransform ou- se em um a t é cn i ca b á si ca p a r a r e g i st r a r a s o b se r v a çõ e s conhecidas com o anotações de cam po. Em entrevistas não- dir igidas, t alv ez as anot ações t enham que ser feitas durante seu andam ento, m inim izando o posterior v iés de um a m em ór ia diluída. Mas par a facilit ar a espontaneidade dos entrevistados, é preferível anotar os dados da linguagem não- verbal logo em seguida à ent revist a.

A S T ÉCN I CA S D E R EG I S T R O E

TRANSCRI ÇÃO DAS FALAS

As ent revist as não- dirigidas são regist radas geralm ent e em gravador de fit a ou digit al ou ainda, m en os f r eqü en t em en t e, em v ídeo, per m it in do u m t r at am ent o post er ior de t al m at er ial. A t r anscr ição do áudio para texto facilita alguns aspectos da análise d a e n t r e v i st a, a t r a v é s d e l e i t u r a e r e l e i t u r a s f l u t u a n t es, en q u a n t o a s r ep et i d a s a u d i çõ es d o s r egist r os em áudio per m it em um a r ecor dação m ais precisa do cont ext o afet ivo, at ravés do novo cont at o com as variações em ocionais do t om e da voz, t ais co m o o co r r er a m d u r a n t e o set t i n g . A f o r m a d e transcrição costum a variar de acordo com os obj etivos d o e st u d o . Na p e sq u i sa cl ín i co - q u a l i t a t i v a , a s t r an scr ições n a in t eg r a são g er alm en t e a op ção, refletindo acuradam ente as palavras dos entrevistados

e do ent revist ador, porém sem a considerar ecos ou int erj eições, que poderiam t er um efeit o negat ivo de d i f i cu l t a r a l ei t u r a , p a r t i cu l a r m en t e q u a n d o sã o n u m er osos.

Os pr esen t es au t or es escolh er am com eçar ex p o n d o o p r o cesso d a t r an scr i ção u t i l i zad o em pesquisas j á publicadas( 13- 14). É aconselháv el que a t ranscrição sej a feit a na form a de um t ext o lit erário com um . As adapt ações são feit as de acordo com um equilíbrio ent re a fidelidade ao áudio, a com preensão do m aterial transcrito e o conforto psicológico para a leitura. Por exem plo, freqüentes superposições de fala são transcritas com o se a contribuição de cada locutor fosse respeitada. Estes investigadores optam tam bém pela or t ogr afia et im ológica ( pr eser v ando a r edação d as p alav r as d e acor d o com a n or m a cu lt a) , em det r im en t o da or t ogr afia fon ét ica ( qu e escr ev e as palavras correspondendo aos sons pronunciados pelos ent revist ados) , porque m ant er pronúncias “ erradas” n a t r a n scr i çã o r e su l t a g e r a l m e n t e e m u m a i n t e r p r e t a çã o p o u co p r o d u t i v a e i n a p r o p r i a d a . Co n st r u çõ e s g r a m a t i ca i s d i f e r e n t e s d a n o r m a acadêm ica, indicat iv as do univ er so sociocult ur al do e n t r e v i st a d o sã o m a n t i d a s ca so r e p r e se n t e m significados int er pr et áv eis.

Part es inint eligíveis, com ent ários descrit ivos e anotações explícitas sobre as pessoas e instituições m encionadas são indicados com obser v ações ent r e colchetes, com o: [ trecho ininteligível de 5 segundos] , [ ele/ ela riu] , [ fim da fit a] , [ irm ão do ent revist ado] . Nom es pessoais são subst it uídos por nom es fict ícios. Nom es de instituições ou cidades que não identificam o en t r ev i st ad o p o d em ser m an t i d os. Ret i cên ci as i n d i ca m p a u sa s e n t r e p a l a v r a s e f r a se s n ã o -concluídas. Ent onações enfát icas são m arcadas com pontos de exclam ação. Referências ao discurso direto de out ras pessoas ou dos próprios pensam ent os do ent revist ado são t ranscrit as ent re aspas. Hesit ações para pronunciar palavras são indicadas pela prim eira let r a ou sílaba seguidas por r et icências. Sinais de p a u sa ( p o n t o , v ír g u l a , e t c. ) d e v e m se r u sa d o s adequ adam en t e.

(8)

A V ALI D AD E E CON FI ABI LI D AD E D AS

ENTREVI STAS NÃO-DI RI GI DAS

As en t r ev ist as d ir ig id as são id en t if icad as prim am pelo at ribut o da confiabilidade, enquant o as não- dirigidas são distinguidas pelo rigor m etodológico da validade dos dados obtidos. De acordo com o MeSH - Medical Subj ect Headings - da Bibliot eca Nacional d e Me d i ci n a d o s EUA, co n f i a b i l i d a d e é a

r epr odut ibilidade ou a r epet it iv idade est at íst ica das m e n su r a çõ e s, f r e q ü e n t e m e n t e e m u m co n t e x t o clínico, incluindo o teste de instrum entos ou de técnicas p ar a o b t er r esu l t ad o s r ep r o d u t ív ei s( 1 5 ). Val i d ad e corresponde aos t rês seguint es pont os: o m ét odo de pesquisa escolhido; as t écnicas de colet a de dados e m p r e g a d a s; e cu i d a d o s t o m a d o s co m o s p r o ce d i m e n t o s e m ca m p o o s q u a i s p e r m i t e m o invest igador capt urar os fenôm enos sob observação. A co n f i a b i l i d a d e d a s en t r ev i st a s n ã o - d i r i g i d a s é avaliada de m odo próprio, sendo tam bém um aspecto a se r co n si d e r a d o n a “ ca l i b r a g e m ” d o r i g o r m etodológico das pesquisas qualitativas, em bora nem todos os pesquisadores qualitativistas vej am isto com o um a necessidade.

A validade de um inst rum ent o de colet a de d a d o s r e f e r e - se à su a ca p a ci d a d e d e r e v e l a r a verdade, perm itindo em ergir conteúdos que espelham a realidade. As pergunt as a ser respondidas são as seguintes: O instrum ento revela ( m ede) corretam ente o que pret ende revelar ( m edir) ? É um a t écnica que leva o invest igador a focalizar a essência do obj et o? Os result ados diferent es obt idos reflet em diferenças r eais ou ocasionais? Sabe- se que os inst r um ent os diferent es devem t er a propriedade de se referirem às m ed i d as d a r eal i d ad e em p ír i ca. As p esq u i sas q u a l i t a t i v a s b a se i a m - se n a v a l i d a d e i n t e r n a

det er m inada pelos gr aus de cor r eção da apr eensão e pela abordagem adequada do obj eto que está sendo ex am inado( 16).

Em i n v e st i g a çõ e s cl ín i co - q u a l i t a t i v a s, v i v ê n ci a s d e v e m se r a p r e e n d i d a s e m si t u a çõ e s específicas da vida dos ent revist ados. O inst rum ent o de coleta terá que capturar isto com acurácia, de um m odo a assum ir que as m anifestações estão revelando essas ex per iências, gar ant indo assim sua v alidade int erna. Por est ar na área das ciências hum anas, a v alidade cient ífica v er ifica- se na plausibilidade dos elem ent os apr eendidos na int er subj et iv idade, haj a v i st a q u e o o b j et o d e est u d o d as h u m an i d ad es, diferentem ente das ciências exatas, é um ser hum ano

t al com o o pesquisador. Além disso, um dos crit érios d e v a l i d a d e d a s e n t r e v i st a s n ã o - d i r i g i d a s é o e st a b e l e ci m e n t o d e u m a t r a n sf e r ê n ci a p o si t i v a

ent revist ado- pesquisador, de m odo que ao ocorrer, o infor m ant e dem onst r a um a at it ude de colabor ação confiável, passando t am bém a perseguir os obj et ivos da pesquisa.

Out r as t écnicas que m ax im izam a v alidade d est e i n st r u m en t o , p o r f a ci l i t a r a ex p r essã o d a subj et iv idade dos ent r ev ist ados, são os seguint es: g ar an t ia d o an on im at o; con f or t o f ísico d u r an t e a ent r ev ist a; disponibilidade da dupla para est ender, se necessár io, o t em po pr ev ist o do pr ocedim ent o; setting fam iliar da entrevista para o entrevistado ( sua casa ou, pr efer encialm ent e, o ser viço de saúde em qu e cost u m a ser at en dido, sen do est e u m set t in g t a m b é m f a m i l i a r a o e n t r e v i st a d o r ) ; r e l a çã o d e confiança ent re ent revist ador e ent revist ado; m esm o espaço físico par a t odas as ent r ev ist as e som ent e um ent revist ador para a am ost ra int eira ( perm it indo que as variações das ent revist as som ent e acont eçam devido às variações dos ent revist ados) ; com pet ência sociocult ural do ent revist ador frent e ao ent revist ado; possibilidade de m ais de um encont ro com o m esm o entrevistado ou, se o aspecto da catarse da entrevista t enha sido especialm ent e r elev ant e, a ev it ação de um a segunda ent revist a.

A v a l i d a çã o f e i t a p e l o s p a r t i ci p a n t e s, r efer en t es aos dados t r at ados ( a r at ificação pelos ent revist ados acerca da análise feit a post eriorm ent e pelo investigador) é incom um na pesquisa em settings cl ín i co s. D e u m l a d o , se o e n t r e v i st a d o t i v e r oport unidades de explicar- se m elhor, o invest igador pode ser percebido com o alguém digno da confiança. Por ou t r o lado, a ex posição dos su j eit os a cer t as int erpret ações psicológicas ou sociológicas feit as pelo pesquisador, quando realizadas fora do setting clínico, pode result ar em iat rogenias para o ent revist ado. A validação pelos part icipant es dest ina- se a pesquisas sobre t em as que não se referem diret am ent e a eles próprios, à subj et ividade do indivíduo ent revist ado e nem à sua vida íntim a, tal com o ocorre nas pesquisas hist or iogr áficas ou m acr ossociais.

A co n f i a b i l i d a d e r e f e r e a o s g r a u s d a co n f i a n ça r e l a ci o n a d o s a ce r t o m é t o d o o u inst r um ent o, que r epr oduzir ia os m esm os achados, se out r os pesquisador es est udassem out r a am ost r a de su j eit os - por ém de m esm o per fil - em ou t r os set t ings ou out r os m om ent os. Há idéias polêm icas q u e d ef en d em q u e a en t r ev ist a em p r of u n d id ad e d e t é m u m a co n f i a b i l i d a d e b a i x a , p o r q u e ca d a

(9)

ent r ev ist ador, dev ido à sua pr ópr ia per sonalidade, t rabalharia de m aneiras dist int as. Não haveria razão p a r a d i sco r d a r d e st e p e n sa m e n t o , se a m e sm a definição e as m esm as m edidas da confiabilidade, tais co m o u sa d a s em est u d o s q u a n t i t a t i v o s, f o ssem ap l i cáv ei s à p esq u i sa cl ín i co - q u al i t at i v a e a seu instrum ento de coleta de dados. Mas a discussão sobre a generalização das conclusões é colocada em outros term os no caso das pesquisas qualitativas(17-18).

Devido ao reconhecido fato de que os estudos q u a l i t a t i v o s n ã o se p r o p õ e m a g e n e r a l i za r o s r e su l t a d o s m a t e m a t i ca m e n t e co n st r u íd o s, o s q u est ion am en t os acad êm icos cor r esp on d en t es ao atributo da confiabilidade não são, portanto, aplicáveis a est es est udos. No caso da pesquisa qualit at iva, se o s r e su l t a d o s o b t i d o s co m e n t r e v i st a s m et odologicam ent e corret as ( acessíveis aos leit ores a t r a v é s d a s t r a n scr i çõ e s, q u e sã o a n e x a d a s a o relatório final da pesquisa) forem adm it idos e aceitos

pelos pares da com unidade cient ifica, com o gozando d e p lau sib ilid ad e, en t ão os con su m id or es d est es estudos tentarão aplicá- los a outros settings para ver se t ais conclusões lhes fazem sent ido. Se aqueles result ados que forneceram conhecim ent o original se relacionarem ao t em a do novo est udo, t erão j ogado luz na com preensão dos elem entos neste outro setting, podem os dizer que o car át er da gener alizabilidade

acont eceu( 19).

CONCLUSÕES

En t r ev i st as n ão - d i r i g i d as n ão d ev em ser vistas com o sim ples veículos de m anifestações clínico-psicológicas das pessoas est udadas em set t ings da saúde. Elas consist em realm ent e de inst rum ent os da exploração de problem as novos para a ciência, sendo assim : ( a) elas são em preendidas para fazer em ergir si g n i f i cad o s at r i b u íd o s a f en ô m en o s, at é aq u el e m om ent o um a exclusiva “ propriedade” ( nem sem pre conscient es) dos ent revist ados; ( b) podem produzir

novos e relevant es fenôm enos a part ir da int eração entrevistador- entrevistado; e ( c) registram tais dados, p er m i t i n d o - l h es t r a t a m en t o s/ a n á l i ses. Os d a d o s colet ad os ser ão cien t if icam en t e ú t eis som en t e se forem conduzidos rigorosam ent e pelo invest igador no relat ório da pesquisa.

A h ip ót ese d a in v est ig ação p od er á, d est a m an eir a, ser r ev ist a, assim com o os leit or es d os relat órios poderão aum ent ar seu conhecim ent o sobre o co m p o r t a m e n t o e a s r e a çõ e s d a p o p u l a çã o est udada, m elhorando sua prát ica clínica e aj ust ando m ais efet iv am en t e os r ecu r sos assist en ciais. Além d i sso , u m a d a s p r i n ci p a i s co n se q ü ê n ci a s d o s conhecim ent os pr oduzidos a par t ir das ent r ev ist as não- dir igidas na ár ea clínica, é lev ant ar pr oblem as nov os par a pesquisa, assim com o a for m ulação de hipót eses cient íficas novas para serem conferidas e expandidas qualit at ivam ent e ou m esm o t est adas por m eio de out ros m ét odos.

En t r e v i st a s a b e r t a s e se m i d i r i g i d a s sã o tam bém úteis particularm ente nos segm entos técnico-ci e n t íf i co s r e l a técnico-ci o n a d o s à s se g u i n t e s á r e a s m ult idisciplinar es: cuidado em saúde ger al, Saúde Mental, Saúde Coletiva, Saúde da Fam ília, da Criança, d o Ad olescen t e e d o I d oso, Saú d e Rep r od u t iv a e á r e a s co r r e l a t a s. En t r e t a n t o , a s á r e a s cl ín i co -cir ú r gicas e a epidem iologia poder iam t am bém se beneficiar dos est udos qualit at iv os, pr incipalm ent e quando t ais est udos invest igam os problem as novos o u r a zo a v e l m e n t e d e sco n h e ci d o s, a sso ci a d o s a a d a p t a çõ e s p si co sso ci a i s a d o e n ça s cr ô n i ca s, com portam entos de risco para doenças transm issíveis ou am bient ais, ou pr át icas t er apêut icas infor m ais, com plem ent ares e alt ernat ivas, e assim por diant e. Apesar dos n u m er osos t ex t os j á pr odu zidos sobr e en t r ev i st as q u al i t at i v as, as r esp ect i v as t écn i cas d e v e r i a m e st a r e m u m co n t ín u o p r o ce sso d e refinam ent o. Finalm ent e, espera- se que os assunt os discut idos nest e art igo possam ser út eis para os que se int er essam por pesquisa, est udant es gr aduados ou gr aduandos.

REFERÊNCI AS BI BLI OGRÁFI CAS

1. Turat o ER. Trat ado da m et odologia da pesquisa clínico-qu alit at iv a: con st r u ção t eór ico- epist em ológica, discu ssão com parada e aplicação nas áreas da saúde e hum anas. 2a ed.

Pet r ópolis ( RJ) : Vozes; 2003.

2. Br it t en N. Mak ing sense of qualit at iv e r esear ch: a new series ( edit orials) . Med Educ. 2005 January; 39( 1) : 5- 6. 3. Morse JM, Field PA. Qualit at ive research m et hods for healt h professionals. 2nd ed. Thousand Oaks ( CA) : Sage; 1995.

4 . Mi n a y o MCS. O d e sa f i o d o co n h e ci m e n t o : p e sq u i sa qualit at iva em saúde. 8a ed. São Paulo ( SP) : Hucit ec; 2004.

5. Mert on RK. On t heoret ical sociology: five essays. Old and new. New York ( NY) : Free Press; 1967.

(10)

7. Rubin HJ, Rubin I S. Qualit at iv e int er v iew ing: t he ar t of hearing dat a. 2nd ed. Thousand Oaks ( CA) : Sage; 2004.

8. Bleger J. Tem as de psicologia: ent revist a y grupos. Buenos Air es: Nuev a Vision; 1995.

9. Kvale S. I nt erview: an int roduct ion t o qualit at ive research int erviewing. Thousand Oaks ( CA) : Sage; 1996.

10. Malinow ski BK. Argonaut s of t he West ern Pacific. Long Grove ( I l) : Waveland Press; 1984.

11. Freud S. The dynam ics of t ransference. I n: Freud S. The st an d ar d ed it ion of t h e com p let e p sy ch olog ical w or k s of Sigm und Freud. London: Hogart h Press; 1958. p. 97- 108. 12. MacKinnon, Michels R. Psy chiat r ic I nt er v iew in Clinical Pract ice. Philadelphia ( PA) : WB. Saunders; 1990.

1 3 Fon t an ella BJB, Tur at o ER. Doct or - pat ien t r elat ion sh ip bar r ier s t o subst ance dependent s seek ing t r eat m ent . Rev Saude Publica. 2 0 0 2 August ; 3 6 ( 4 ) : 4 3 9 - 4 7 .

14. Cam pos CJG, Turat o ER. The healt h professionals’ t eam , t h e p a t i e n t w i t h r e n a l d i se a se i n h e m o d i a l y si s, a n d i n t e r p e r so n a l r e l a t i o n s. Re v Br a s En f e r m a g e m 2 0 0 3 Sept em ber - Oct ober ; 5 6 ( 5 ) : 5 0 8 - 1 2 .

1 5 . U. S. Nat ional Libr ar y of Medicine [ hom epage on t he I nt ernet ] . Bet hesda: The Library. [ upt aded 2005 January 31; cit ed 2 0 0 5 Apr il 9 ] . Medical Su bj ect Headin gs. Av ailable from URL: ht t p: / / www.nlm .nih.gov/ m esh/ 2005/ MBrowser.ht m l. 1 6 . Alm eid a Filh o N, San t an a VS, Mar i JJ. Pr in cíp ios d e epidem iologia par a pr ofissionais de saúde m ent al. Br asília ( DF) : Cent ro de Docum ent ação do Minist ério da Saúde; 1989. 1 7 . Ap p l e t o n JV. An a l y si n g q u a l i t a t i v e i n t e r v i e w d a t a : addressing issues of validity and reliabilit y. J Adv Nurs. 1995 Nov em ber ; 2 2 ( 5 ) : 9 9 3 - 7 .

18. Sandelowski M. Rigor or rigor m ort is: t he problem of rigor in qualit at iv e r esear ch r ev isit ed. ANS Adv Nur s Sci. 1993 Decem ber ; 16( 2) : 1- 8.

19. Turat o ER. Qualit at ive and quant it at ive m et hods in healt h: definit ions, differences and research subj ect s. Public Healt h [ ser ial on t he I nt er net ] 2005 June [ cit ed 2005 Decem ber 18] ; 39( 3) : [ 8 p.] . Available from : ht t p: / / www.scielo.br/ pdf/ r sp/ v 3 9 n 3 / en _ 2 4 8 0 8 . pdf.

Referências

Documentos relacionados

Taking into account that the abdominal cavities of the four survival rats after 45 days of severe autogenously fecal peritonitis were almost free of any sign of infection after

Segundo Éric Laurent, a psicose ordinária se caracteriza pela não resposta aos significantes-mestres tradicionais, manifestando o fim do poder do Nome-do-Pai como

O objetivo do curso foi oportunizar aos participantes, um contato direto com as plantas nativas do Cerrado para identificação de espécies com potencial

O valor da reputação dos pseudônimos é igual a 0,8 devido aos fal- sos positivos do mecanismo auxiliar, que acabam por fazer com que a reputação mesmo dos usuários que enviam

Seja P a função que ao número de anos decorridos desde 2014, n, faz correspon- der o preço a pagar pelo bilhete de época do F.. Em que ano um bilhete de época no Estádio de

da quem praticasse tais assaltos às igrejas e mosteiros ou outros bens da Igreja, 29 medida que foi igualmente ineficaz, como decorre das deliberações tomadas por D. João I, quan-

Apresentaremos a seguir alguns resultados que serão fundamentais para obtermos uma generalização dos teoremas das seçãos anterior para uma versão com tempo contínuo. Consideremos