1 Trabalho baseado na Dissertação de Mestrado da primeira autora, desenvolvido sob orientação da segunda.As autoras agradecem aos demaismembrosdogrupodepesquisa InteraçãoSocialeDesenvol-vimentoe,emparticular,aTatianaTarginoeLíviaSantanapeloapoio nacodificaçãodosdados.
2 Endereço:RuaAlfredoPinto25/1106Tijuca,RJ,Brasil20520-000. E-mail:deisefm@hotmail.com
DesenvolvimentodaBrincadeiraeLinguagememBebêsde20Meses
1DeiseMariaLealFernandesMendes2 MariaLuciaSeidldeMoura
UniversidadedoEstadodoRiodeJaneiro
RESUMO–Esteestudoobjetivouanalisararelaçãoentrebrincadeiraelinguagemnodesenvolvimentoinicial.Participaram 30díadesmãe-bebê,dasclassesbaixaemédiadacidadedoRiodeJaneiro,combebêsde20mesesdeidade.Abrincadeira dosbebês(sozinhosecomamãe)foiobservada,registradaemvídeoeclassificadasegundoseucaráterfuncional/simbólico. Sua capacidade de produção de linguagem foi medida pelo instrumentoMacArthurMacArthurMacArthur (Inventário do Desenvolvimento de HabilidadesComunicativas–BATES).Asanálisesenvolveramaindaaspectosafetivosecognitivosdafalamaternaeseu níveldeescolaridade.Nãofoiencontradacorrelaçãoentreosdoisdomínios,suscitandodiscussãometodológicaeacercada hipótesedeinterrelaçãoentredomínioscognitivos.Contudo,severificouumimportanteaspectorelativoàbrincadeiraconjunta: abrincadeiradobebêaos20meses,comaparticipaçãodamãe,ganhaemduraçãoecomplexidade,oquepareceapontarpara ainfluênciamaternanodesenvolvimentodessahabilidade.
Palavras-chave: desenvolvimentodabrincadeira;desenvolvimentodalinguagem;interaçãomãe-bebê.
TheDevelopmentofPlayandLanguagein20MonthsOldBabies
ABSTRACT– Thisstudyaimedatanalyzingtherelationbetweenlanguageandplayininitialstagesofdevelopment.An empiricalresearchwith30dyadsmother-babyoflowerandmiddleclassesinthecityofRiodeJaneiro,wasperformed.The babieswere20monthsold.Babies’play(aloneandwiththeirmothers)wereobserved,registeredinvideo,andclassified according to their functional/symbolic characteristics. Babies’ language production was measured using theMacArthur CommunicativeDevelopmentInventory.Theanalysismadealsoinvolvedcognitiveandaffectiveaspectsofmother’stalkand hereducationallevel.Itwasnotfoundcorrelationsbetweenthetwodomains,inducingdiscussionsaboutboththeinterrelation betweencognitivedomains,andmethodologicalissues.However,animportantaspectwasverifiedwithrelationtocollaborative: playin20monthsoldbabieswithmother’sparticipation,gainsindurationandcomplexity.Perhaps,thisresultpointstothe maternalinfluenceinthedevelopmentofplayability.
Keywords:playdevelopment;languagedevelopment;mother-infantinteraction.
partirdaexploraçãodanaturezaecaracterísticasdestetipo deinteração,valoriza-seadimensãodasinteraçõessociais, especificamente das interações mãe-bebê, dentro de uma abordagemsociocultural(SeidldeMoura&Ribas,2000).
Parte-se do princípio de que a relação do bebê com a mãeéfundamentalparaoestudodasraízesgenéticasdos processosdedesenvolvimento.Assume-setambémque,tanto abrincadeiraquantoalinguagem,têmumahistóriaevolu-cionáriaeumaontogênese,ecumprempapelfundamental nodesenvolvimentodoserhumano,emespecialnoseupro-cessodesocialização.Discute-seaindaapossibilidadedas capacidadesinfantisexpressasnabrincadeiraenalinguagem estarem alicerçadas em uma capacidade representacional, tambémprodutodeumahistóriaontoefilogenética.
Asustentaçãoteóricaparaavalorizaçãodaparticipação maternapodeserencontradanasformulaçõesdeVygotsky (1978/2000a,1962/2000b)aodefiniroconceitodezonade desenvolvimento proximal, e na noção de zonas de cons-trução(Newman,Griffin&Cole,1989).Éapartirdaidéia decriaçãodeumespaçodetrocaseinfluênciasmútuasnas interações,queseentendeaimportânciadaparticipaçãoda mãe.Nabrincadeiraconjunta,acriançaeamãeinteragemem umcontextoqueseacreditaserpromotordodesenvolvimento emocionaledecapacidadessociocognitivas.
Odesenvolvimentodalinguagemedabrincadeiraéum temadenaturezamuitoabrangenteecontroversa,alémde instiganteparaquemquerqueseinteressepeloestudodo desenvolvimento humano. Na psicologia do desenvolvi-mento,évastaaproduçãovoltadaparaasdiversasquestões quesuscita.Noentanto,háumanítidatendênciaafocali-zarcadaumdessesdomíniosdeperperpersi,sendoescassasas iniciativas voltadas para o exame de possíveis influências recíprocas.Essetrabalhopodeservistocomoumainserção nestalacuna.
Um número expressivo de estudos empíricos voltados paraabrincadeiraprivilegiaanálisesenvolvendoaparticipa-çãomaterna.Algunsressaltamopapeldamãenosurgimento dascapacidadessimbólicasdacriança,sejafornecendoapoio concretoparaqueasestruturascognitivaspossamemergir, sejapromovendoumasensaçãodesegurançatãonecessária paraasexploraçõesdomundo(Bornstein,Haynes,Reilly &Painter,1996;Slade,1987).Outrosobservamoquantoàs atividadescompartilhadaspodemlevaracriançaadesenvol-verseupotencialdebrincadeira.Damast,Tamis-LeMondae Bornstein(1996),porexemplo,mostramcomoasmãescom maiorconhecimentosobredesenvolvimentodabrincadeira tendemaproporbrincadeirasmaissofisticadasqueasapre-sentadaspelacriança.Consideramqueessetipodeatuação podefavoreceroincrementodoseudesenvolvimentoreal emdireçãoaumpotencialjásinalizado.
Também Venuti, Rossi, Spagnoletti, Famulare e Bornstein,(1997)mostramhaverumaumentonaduraçãoda brincadeirasimbólicaembebêsde20meses,comapresença damãe.Nesteestudoéencontradaumadiferençasignifica-tivaentreafreqüênciadebrincadeirasimbólica(menor)e não-simbólica(maior),independentementedeestarobebê brincandosozinho(situaçãoA)oucomamãe(situaçãoB) (situaçãoA:ttt=-5,23,g.l.=39,p<0,001;situaçãoB:ttt= -2,90,g.l.=39,p=0,006).Entretanto,noquedizrespeito àduraçãodabrincadeira,estadiferençasófoiencontrada paraasituaçãoemqueobebêbrincavasozinho(situação A:t=-2,30,g.l.=339,p=0,027),oquelevouosautoresa interpretarqueaparticipaçãodamãepromoveumamaior duraçãodebrincadeirasimbólica.
Abrincadeirasimbólicaealinguagempodemsertomadas comoduasmodalidadesdafunçãosemiótica,segundoPiaget (1945/1990),oquepermiteahipótesedecorrelaçãoentre ambasemesmodeumabasecomum.Algumaspesquisas empíricasrelatamobservaçõesdeumacertasobreposição deconquistasexplicitadasnessesdoisdomínios(Fein,1981; McCune,1995;McCune-Nicolich,1981;Tamis-LeMonda & Bornstein, 1989; Tamis-LeMonda & Bornstein, 1990; Ungerer & Sigman, 1984;Vibbert & Bornstein, 1989). Essas evidências sugeriram a alguns estudiosos que essas duascapacidadessemióticaspudessemrefletiraemergência eodesenvolvimentodeumabasecomumdecompetência representacional(Bornstein&Lamb,1992).
Defato,levando-seemcontaosaspectosmarcantesde seudesenvolvimentonosprimeirosdoisanosdevida,cria-se umatendênciaaadmitirfortesrelaçõesconceituaisetempo-raisentreelas.Numbreveresumo,duranteoprimeiroano devida,ascomunicaçõesvocaisdobebê(pré-lingüísticas) consistem, basicamente, de balbucios e sua brincadeira é quaserestritaàexploraçãosensorialdeobjetos.Emseguida, aolongodosegundoano,emgeral,obebêjápodeservisto utilizandopalavrasdemodomaisespontâneoebrincando com objetos através de ações exploratórias funcionais e concretas. Gradativamente, passa a produzir palavras re-presentativasdeobjetoseeventosprópriosaoseuambiente maispróximoe,maisoumenosaomesmotempo,começa aapresentarumabrincadeirasimbólica.Posteriormente,é crescenteatendênciapararepresentaçãomentaldomundo, tantonalinguagemquantonabrincadeira(Bornstein,Selmi, Haynes,Painter&Marx,1999).
Umapossibilidadedesustentaçãoteóricaparaainvesti-gaçãoqueaquiseapresenta,podeseromodeloRR,proposto porKarmiloff-Smith(1995).Atravésdestemodelo,pode-se pensar o desenvolvimento sociocognitivo a partir de uma visãosistêmicaedinâmicaemqueforçasdeintegraçãoe interaçãoatuamemseussubsistemas.Estaspodemservistas comofrutodomovimentoespontâneogeradopor“redes-criçõesrepresentacinais”(RR)–mecanismosdefinidosno modeloquecriamrelaçõesintra-domínioeinter-domínio. Parece razoável considerar que a disseminação das infor-mações “redescritas”, de acordo com as necessidades do funcionamentodamente,alimenteosistemacomoumtodo epropicieumamaiorcoesãoentreosdiferentesdomínios.
Oexamedaliteraturarevelaaexistênciadealgunsestudos voltadosàinvestigaçãodepossíveis“interveniências”entre abrincadeiraealinguagem.Parteindicaresultadosemque ambasascapacidadesnãoapresentamclarasincroniauma com a outra no momento do desenvolvimento estudado –geralmenteemtornodofinaldosegundoano.Emumde-les,Bornstein,Vibbert,TaleO’Donnell(1992)realizaram umapesquisalongitudinalcomfamíliasdeclassemédia.A linguagem (compreensão e produção) e a brincadeira dos bebêsforamaferidas,aos13e20meses.Osbebêsmostra-ramestabilidadeindividualnalinguagemdos13paraos20 meses,masnãonabrincadeira.Quantoàrelaçãoentreessas duashabilidades,foiencontradaumacorrelaçãomoderada aos13,masnãoaos20meses.
Emumaoutrapesquisa,realizadaporBornsteinecols. (1999),participaramcriançasdedoisanosesuasmães,sendo umgrupodecriançasemãessurdaseoutrodeouvintes.A intençãofoiexaminarcomoalinguagemeabrincadeirapode-riaminfluenciarumaàoutraemumasituaçãoemqueumdos sistemassimbólicosestivessepotencialmentecomprometido. Alinguagemrepresentacionaleabrincadeirasimbólicanão apresentaramrelaçãoemcriançasouvintesdemãesqueouvem eemcriançassurdasdemãessurdas,masasduashabilidades estavamassociadasemcriançasnosoutrosdoisgrupos.As conclusõesdosautoressugeriramquealinguagemebrinca-deiranãoestãoassociadasaofinaldosegundoano,mastalvez reflitamumsistemaintegradoembebêspequenos.
Outrapartedosestudosrevela,aindaquetimidamente, umacorrespondênciademarcosevolutivosecorrelaçõespo-sitivasentreelas.Assim,Tamis-LeMondaeBornstein(1989) examinaramahabituaçãoeoincentivomaternoàatenção como determinantes da competência representacional, da linguagemebrincadeiraembebês,echegaramaresultados que apontam para possibilidades de relações entre essas habilidades.Verificaram que crianças com bons níveis de habituaçãoaos5mesesapresentavammaiorcompreensãode linguagem,maisepisódiosdebrincadeira“faz-de-conta”e exibiammaiorhabilidaderepresentacionalaos13meses.
Tamis-LeMondaeBornstein(1990),umanomaistarde, buscaramexaminaraexistênciadeinterrelaçõesentrepro-duçãoecompreensãodalinguagem,brincadeiraecontrole daatenção.Participaramdoestudo43bebêsde13meses. Relaçõesentrecompreensãoeproduçãodelinguagem,entre compreensãodelinguagemebrincadeiraeentrebrincadeira eatençãoforamencontradasemantidasmesmoquandoa estimulação materna era suprimida, sugerindo que essas associaçõesnãosãounicamentemediadaspelamãe.
Apolêmica,contudo,émaisampladoqueumasimples dicotomiapodesugerir.Algunsautorespropõemummodelo cognitivoderepresentaçãodelinguagememquehabilidades lingüísticasespecíficas(compreensãoeprodução,semântica efluência)serelacionamcomcapacidadescognitivasespecí-ficasemperíodosdedesenvolvimentoespecíficos.Assim,a naturezadasassociaçõeslinguagem-brincadeiraidentificadas emestudosempíricoséinterpretadadeformaque,relações entrecapacidadeslingüísticaseoutrasconquistascognitivas existirãoquandoprincípioseestruturascomunsforemre-queridos(Tamis-LeMonda&Bornstein,1994).
Opanoramaquesetem,apartirdaanálisedaliteratura específicaedasinvestigaçõesexaminadas,éodeumagrande escassezdeiniciativascomparáveisàdesteestudo,associada acertacontrovérsiadeinterpretaçõesedivergênciaderesul-tados.Configura-se,portanto,umespaçoabertoapesquisas empíricascomofocodeinteresseeobjetivoscomoosaqui demarcados,quesão:(a)examinararelaçãoentreabrinca-deiradobebêbrincandosozinho,brincandocomamãeesua produçãodelinguagem,aos20meses;(b)analisarotipo delinguagemdamãedirigidaaobebê(conteúdosafetivos e cognitivos) e o desenvolvimento da brincadeira aos 20 meses;e(c)analisararelaçãoentreograudeescolaridade damãeeodesenvolvimentodabrincadeiraedalinguagem aos20meses.
Método
Participantes
Os participantes desta pesquisa foram 30 díades mãe-bebê,oriundasdefamíliasintactas(famíliasconstituídasde maridoemulher,nãonecessariamentecasadoslegalmente). Asmãeseramadultas,provenientesdasclassesbaixaemédia urbanasdacidadedoRiodeJaneiroeapresentavamnível deescolaridadequevarioudoprimeirograuincompletoà pós-graduação. Os bebês eram saudáveis, sem problemas dedesenvolvimento,eforamobservadosaos20mesesde idade.Asfamíliasforamrecrutadasemdiversasfontes:as unidadesdePediatriaeObstetríciadedoisimportanteshos-pitaisuniversitáriosnoRiodeJaneiro(federaleestadual); oHospitaldaForçaAérea;oInstitutoPediátricodaUniver-sidadeFederaldoRiodeJaneiro;umamaternidadepública doEstadodoRiodeJaneiro;epediatraslocais.
Paraqueadíadefosseselecionada,deveriamseraten-didososseguintescritérios:(1)mãeepaidobebêvivendo juntos,namesmaresidência;(2)mãecomidadeigualou superiora18anos;(3)mãeprimípara;(4)partosemin-tercorrências;e(5)bebênascidoatermo,semdeficiências identificáveis.Emtodososcasos,parafinsdeinformação sobreopartoeascondiçõesdesaúdedobebê,seobteveo
relatodospais.Emalguns,alémdorelatodospaisseteve acessoaoprontuáriodohospitalouaregistrosmédicos. Emumavisitaàsdíades,nãoconsideradaparafinsdeste estudo,realizadaaos5mesesdeidadedobebê,emsuas casas, o projeto foi explicado e formulários de consen-timento (Termo de consenconsen-timento livre e esclarecido) e permissãoparausodeimagensdevídeoforamassinados. Nestaocasião,asfamíliaspassaramatomarconhecimento, formalmente,doscritériosdapesquisa.
Instrumentos
Foiutilizadocomoinstrumentoparacoletadedadosda produçãodelinguagemdobebê,oInventáInventInvent riodoDesenvol-vimentodeHabilidadesComunicativas(MacArthur). Trata-sedeuminventárioconstituídode400itens(porexemplo, substantivos,adjetivos,verbos).Estesitensestãodispostos noquestionáriogrupadosem22diferentescategorias(por exemplo,animais,brinquedos,verbos,qualidadeseatributos, etc.).Naaplicaçãodesseinstrumento,amãeésolicitadaa informarquaisdaspalavrasapresentadasjáforamditaspor seufilho.Foiutilizadaaadaptaçãobrasileiraautorizadae desenvolvidaporElizabethReisTeixeira,daUniversidade FederaldaBahia.
Aprimeiraversão,eminglês,desseinstrumentoéoBates EarlyLanguageInventory(BATES).Comoreferência,para finsdeinformaçãosobrevalidadeefidedignidade,sugere-seoestudorealizadoporLarryecols.(1994).Osautores relatamaltaconsistênciainternaparaasescalaseescores Alfaacimade0,90.Afidedignidadeteste-retestefoiacima de0,85.Sãorelatadosestudosdevalidadedecritériocom diversosinstrumentoseavaliaçõesnolaboratórioquevaria-ramde0,33a0,85,commédiade0,61.Algunsestudosque utilizaraminventárioBatessão:(1)Bornsteinecols.(1992); (2)Tamis-LeMondaeBornstein(1994);e(3)Bornsteine cols.(1999).
Procedimentos
Aos20mesesdeidadedobebê,adíadefoivisitadaem suaresidêncianoperíodoemqueacriançaestavaacordada, emumasituaçãoemqueapenasamãeeacriançaestavam emcasa.Acriançafoifilmadaemdoisepisódiosconsecutivos debrincadeirapordezminutoscada:(1)acriançabrincando sozinhacombrinquedose(2)acriançaeamãebrincando juntascombrinquedos.Amãefoiinformadaqueoobserva-dorestavainteressadonodesenvolvimentodalinguagemeda brincadeiradacriançaeerasolicitadoaelaqueprocurasse agirdomodomaisnaturalpossívelapesardapresençado observador.Umconjuntocompletodebrinquedospadroni-zados,apropriadosparaaidade,foiutilizadoduranteambos osepisódiosdebrincadeira.Esteconjuntofoicompostode boneca,cobertor,buledechácomtampa,duasxícarasde chá,doispires,duascolheres,telefonecelulardebrinquedo, carrinhodeplásticocomumcordãozinhodebarbante,dois livrosdeestóriascomfiguras,bolinhadeborrachaeumjogo depotesdeencaixe.Emseguidaàfilmagem,foiaplicadoo instrumentomencionado.
formuláriodefinidopelaequipedoprojetobrasileiro,para este fim específico. Neste, foram registrados os episódios ocorridos na sessão de brincadeira do bebê sozinho e na sessãodebrincadeiracomamãe.Oregistroerafeitoporuma dupladeobservadores,paralelamenteedemodoindependen-te,trabalhandosobreomaterialfilmado.Apósconfrontação, possíveisdivergênciaseramlevadasaumterceiroobservador quecumpriaopapeldejuiz,demodoaseproduzirumre-gistroúnico.Todososparticipantesdessasatividadesforam previamentetreinadosnastécnicasdeobservaçãoeanálise dabrincadeira.
Constavamdesteformulário,alémdocódigodadíade,do sexodobebê,daidentificaçãodosresponsáveispeloregistro edata,asseguintesinformações:(a)nasessãodebrincadeira dobebêsozinho–paracadaepisódiodebrincadeira:hora/ min/segdeinícioefimdoepisódio,níveldabrincadeira, objeto(s) utilizado(s) e atividade realizada; (b) na sessão debrincadeiraconjuntacomamãe–paracadaepisódiode brincadeira:hora/min/segdeinícioefimdoepisódio,nível dabrincadeiraapresentadapelobebê,objeto(s)utilizado(s) nesta brincadeira, atividade realizada pelo bebê, nível da brincadeiraapresentadapelamãe,objeto(s)utilizado(s)nesta brincadeiraeatividade realizadapelamãe.
Foram ainda transcritas as falas da mãe durante as sessões de brincadeira conjunta, procedendo-se à identi-ficaçãoecontabilizaçãodeaspectosafetivosecognitivos presentes. Os dados de produção de linguagem do bebê foramlevantadosdiretamentedoquestionáriopreenchido, registrando-seonúmerodeitensassinalados(extensãode vocabulário) e o de diferentes categorias envolvidas (di-mensãosemântica).Participaramdareduçãoecodificação dosdados,aprimeiraautoraebolsistasquepassarampor processodecapacitação.
Categoriasdeobservação
Ascategoriasdebrincadeiraaquiutilizadasforamde-finidaspelasautoras,apartirdoscritériosdeclassificação adotadospeloprotocologeraldoprogramatransculturalde pesquisas de âmbito internacional, coordenado por Marc BornsteindoNationalInstituteofChildHealthandHuman Development(
Development
Development NICHD,EUA).Oestudoapresentadonesteartigo
éparteintegrantedobraçobrasileirodesseprograma,que, porsuavez,seinsereemumprojetodepesquisaemcurso. Nele, as díades foram visitadas aos 5 e 20 meses, foram realizadasobservaçõesefoiaplicadoàmãeumconjuntode instrumentos(SeidldeMoura,1999).Comoreferênciapara oscritériosdeclassificaçãomencionados,sugere-searecor-rênciaaosseguintesestudos:(1)Bornsteinecols.(1996); (2)Bornstein,Haynes,Pascual,PaintereGalperin(1999); e(3)Tamis-LeMondaeBornstein(1994).
CategoriaA–Brincadeirafuncional–produçãodeum efeitoparticularemumúnicoobjetooubuscadirigidaao conteúdodeumlivro.Ex.:chutarbola.
CategoriaB–Brincadeiracombinatória–justaposição oucombinaçãodedoisoumaisobjetosouainda,atividade com motivação suscitada pelas imagens do livro, direta-menteassociadaàconfiguraçãoetexturadafigura.Ex.:ver asimagensdolivroetocarfigurasnasregiõesdestinadasà estimulaçãotátil.
CategoriaC
–Brincadeiratransicional–indíciosdefaz-CategoriaC CategoriaC
de-conta,porémsemevidênciasqueoconfirme.Ex.:colocar otelefonenoouvidosemvocalizar.
CategoriaD–Brincadeirasimbólicadirigidaasipróprio – atividade simbólica evidente dirigida a si mesmo. Ex.: fazer-de-contaquebebedeumaxícara.
CategoriaE–Brincadeirasimbólicadirigidaaooutro
CategoriaE CategoriaE
–atividadesimbólicaevidentedirigidaaoutrapessoa.Ex.: fazer-de-contaqueestálendoolivroparaabonecaoupara amãe.
CategoriaF–Brincadeirasimbólicaseqüencial–duas
CategoriaF CategoriaF
oumaisaçõessimbólicasligadas.Ex.:comercomacolher edardecomeràboneca.
Categoria G – Brincadeira simbólica de substituição –atividadesimbólicaenvolvendoumaoumaissubstituição deobjetos.Ex.:fazerdecontaqueopoteéumchapéu.
Análisedosdados
Aanálisedosdadoscompreendeu:(1)aanálisedare-laçãodabrincadeiradobebêaobrincarsozinhocomasua brincadeiraaobrincaremconjuntocomamãe–atravésda análisedopercentualdeduraçãodasdiferentescategorias debrincadeira–não-simbólica,simbólicaetotal–dobebê sozinhoecomamãe,dacategoriadebrincadeirademaior duração,dobebêsozinhoecomamãeedograudecom-plexidademaisaltoatingidopelobebê,aobrincarsozinhoe comamãe;(2)aanálisedarelaçãodabrincadeiradobebê comsuadeproduçãodelinguagem;(3)aanálisedarelação dalinguagemmaternaemtermosdefreqüênciadeaspectos cognitivos e afetivos com as categorias de brincadeira do bebêsozinhoecomamãe;(4)aanálisedarelaçãodograu de escolaridade da mãe com as categorias de brincadeira dobebêsozinhoecomamãe;e(5)aanálisedarelaçãodo graudeescolaridadedamãecomamedidadeproduçãode linguagemdobebê.
Resultados
Asmãesresponderamsemdificuldadeaparenteàsoli-citação de que, na sessão conjunta, brincassem com seus filhos.Independentementedeseuníveldeescolaridadeou meiosocioeconômico,cadaumaaseumodo,eemgrausde intensidadevariados,engajou-se,promoveubrincadeirase incentivousuacriançaabrincar.Emalgunsmomentos,esse convite à criança era feito através de solicitações verbais (sugerindo/pedindoàcriançaqueabraçasseaboneca,por exemplo)eemmuitosoutros,asmãesfuncionavamcomo modelos fazendo alguma brincadeira (encaixando potes, fazendodecontaquefalavamaotelefone,porexemplo)e convidando a criança a fazer o mesmo.Tais observações sugeremalgumainfluênciadecaráterculturalquepermitea essasmãesencararemcom“naturalidade”asituaçãodesentar ebrincarcomseufilho.Talvez,essadisponibilidadetenha atémesmoumaconotaçãopositivanoquedizrespeitoasuas crençaseconvicções,aindaquenãofaçapartedodia-a-dia efetivodessasmães.
maisde80%doscasos.Brincadeirasenvolvendoousoda colherealgumoutroobjetonaaçãodemexer(porexemplo, mexeracolherdentrodaxícaraemexercomacolherno prato)foramapresentadaspormaisde70%dosbebês.Em maisdametadedestasatividades,umnívelsimbólicomais elaboradoeraatingido,eacriança,depoisdemexercoma colhernoprato,faziadecontaquecomiadacolherouofe-reciaàmãe.Casocontrário,apenasfaziamençãoaoatode comertocandocomacolhernoslábiosou,simplesmente, colocavaacolhersobreoprato,porexemplo.
Tambémasbrincadeirascomotelefoneforambastante freqüentes,sendoapresentadaspormaisde85%dosbebês. Emalgunsepisódios,ascriançasapenaspunhamotelefone noouvido,masemmaisde70%dassessõesemquehavia brincadeiracomtelefone(tantonassessõesdebrincadeira sozinho,quantonasdebrincadeiracomamãe),punhamno ouvidoevocalizavam,fazendodecontaquefalavamcom alguém (brincadeira simbólica). Note-se que, do total de bebêsqueapresentouvocalizaçãoaotelefonenabrincadeira conjuntacomamãe,apenascercade36%mostrouessames-mabrincadeiraquandonasessãodebrincadeirasozinho.
Aindacomrelaçãoaointeressepelosdiferentesbrinque-dosdisponíveis,chamouaatençãoagrandeincidênciade brincadeirascomlivroemtodaaamostra.Em93,4%dos casos, o bebê apresentou algum episódio em que brincou comessematerial.Comrelaçãoàduraçãodestesepisódios, viu-se que chegavam a alcançar intervalos de tempo bem maiselevadosdoqueamédiadeduraçãodebrincadeiras deoutrotipo.Nassessõesemqueobebêbrincavasozinho, chegouaalcançar180segundosdeduraçãoenasquetiveram aparticipaçãodamãe,336segundos.
Deummodogeral,oquesepodeperceberéqueosbebês pareciamterinteresseecuriosidadeemexplorarebrincar comosobjetosedemonstraramfamiliaridadequantoàfun-cionalidadedecadabrinquedo.Aduraçãodecadaepisódio debrincadeiratendeuaserrelativamentecurta(emmédia, maisdametadedosepisódiosapresentadosporcadabebênão ultrapassava20segundos),dadasascaracterísticaspróprias dafaixadeidadeestudada.Quantoàpresençadamãe,mar-cadamente,asbrincadeirasconjuntascresciamemrelação àsuacomplexidadeegraudesimbolização.
Comrelaçãoàdistribuiçãodotempodebrincadeirapor categoria,oqueseverificoufoiquedasmédiasdepropor-çãodetempoemqueobebêbrincousozinho,amaisalta ocorreunacategoriaA–não-simbólica–(10%),enquanto que na sessão de brincadeira com a mãe a mais elevada foiadacategoriaF–simbólica–(24%).Freqüentemente, observava-seamãeiniciandoalgumabrincadeirasimbólica como,porexemplo,fazerdecontaquecomiacomacolhere opratoequedavacomidaàbonecae,emseguida,acriança reproduziaouseengajavanabrincadeira.
Observe-seaindaque,nasessãode“brincadeirasozinho”, amédiadetempoemqueobebênãobrincouounãoapre-sentoubrincadeirapassíveldeclassificaçãodeacordocom oscritériosutilizadosfoide72%.Ocasodevalormáximo atingiuumpercentualde99%.Muitasvezes,obebêusava partedotempodasessãocomdeslocamentosemudanças de brincadeira, demonstrando alternâncias de motivação e interesses a intervalos de tempo relativamente curtos. Emváriosoutrosmomentos,obebêficavaumbomtempo
explorandoosobjetos(brinquedos)oufazendotentativasque acabavampornãoatingiroobjetivo.Aotentarencaixarpotes, porexemplo,somenteastentativasbemsucedidas,segundo asregrasseguidas,foramclassificadascomobrincadeira.O tempodespendidocomasdemaisnãofoiconsideradodentro denenhumadascategoriasdeclassificação.Diferentemente, nasessãodebrincadeiracomamãe,amédiadeproporção detempoemquenãoapresentounenhumacategoriadefinida foide60%.
Paralelamente,foiencontradaumamédiadeproporção detempoembrincadeirasimbólicanasessãode“brincadeira sozinho”de10%,enquantonasessãodebrincadeiracoma mãefoide29%.Ocasodevalormáximoocupou84%do tempodasessãoemumaespéciede“leitura”conjuntados livrosquecompõemokitkitkitdebrinquedos.Ambosolhavam asimagens,viravampáginas,tocavameapontavamfiguras e “faziam comentários”. Mesmo que a iniciativa da brin-cadeiranãopartissedamãe,foicomumobservarcomoela incentivava,atravésdecondutasporgestose/ouverbal,o envolvimentodacriançaembrincadeirassimbólicas.Ainda nasessãocomparticipaçãodamãe,seconsideradaacategoria Fisoladamente,observou-seaocorrênciadeumcasoemque ovalormáximofoide77%.
Nocálculodotestetparavariáveispareadasforamen-contradasalgumasdiferençassignificativasentreasmédias, comosepodevernaTabela1.
Tabela 1.Teste de diferenças entre médias pareadas: % de tempo de brincadeirasimbólicaenãosimbólica,comesemamãe
Média PadrãoDesvio t
Par1 TNSS 0,179 0,134
TNSCM 0,110 0,090 2,308*
Par2 TSS 0,103 0,119
TSCM 0,289 0,186 -4,784*
Par3 TBS 0,282 0,155
TBCM 0,399 0,151 -2,820*
*p ** <0,05
Nota:TNSSeTNSCM-%detempodebrincadeiranãosimbólica(bebê sozinhoecomamãe);TSSeTSCM-%detempodebrincadeirasimbólica (bebêsozinhoecomamãe);TBSeTBCM-%detempototaldebrincadeira (bebêsozinhoecomamãe).
Dosaspectosquesepodeconstatarapartirdessesresul-tados,destacam-se:
1. A média de proporção do tempo em brincadeira não-simbólica,nasessãoemqueobebêbrincasozinho,foi significativamente superior à média de proporção do tempo em brincadeira não-simbólica na sessão com a mãe;
2. Amédiadeproporçãodotempoembrincadeirasimbó- lica,nasessãoemqueobebêbrincasozinho,foisignifi-cativamenteinferioràmédiadeproporçãodotempoem brincadeirasimbólicanasessãocomamãe;
4. Comamãe,asbrincadeirastenderamatermaiorduração eaapresentarmaiorgraudesimbolismo.
Das correlações encontradas, verificou-se que quem brincavamaiscomamãe,ofaziaembrincadeirassimbóli-cas(rrr=0,497,p<0,01)equeacategoriadebrincadeirade maiorcomplexidadee/ougraudesimbolismoqueobebê apresentava,tendiaaserelacionarcomademaiorduração, tantonassessõesemqueobebêbrincavasozinho(rrr=0,395, p<0,05),quantonasquebrincavacomamãe(rrr=0,486,
p<0,01).Nãohouvecorrelaçãosignificativadasmedidas queexpressamabrincadeiradobebê,manifestadasozinho ecomamãe,eafaladobebêaos20meses.
Aanálisederegressãorealizadaobjetivavaexaminara possibilidadedealgumadasvariáveisrelacionadasàmãe (aspectosafetivosecognitivosdafalaegraudeescolaridade) terpoderpreditorsobrevariáveisdabrincadeiradobebê.Para nenhumadasvariáveisavaliadas(%deduraçãodebrincadei-ra–não-simbólica,simbólicaetotal–sozinhoecomamãe, categoriadebrincadeirademaiorduração–sozinhoecoma mãe,ecategoriademaiorgraudecomplexidade–sozinhoe comamãe)essapossibilidadeseconfirmou.
Em síntese, considerando-se os objetivos específicos desseestudo,observou-seque:
1. Abrincadeiradobebêaos20meses,comaparticipação da mãe, ganha em duração (brinca mais tempo) e em complexidade(atingegrausdecomplexidademaisele-vados);
2. Examinando-seasmedidasaquidefinidasparaabrin-cadeiradobebêesuaproduçãodelinguagem,nãofoi encontradacorrelaçãoentreosdoisdomínios;
3. Otipodelinguagemdamãedirigidaaobebê(conteúdos afetivosecognitivos)nãoapresentouqualquerrelação comasvariáveisutilizadasparaavaliaçãodabrincadeira dobebêaos20meses;
4. Ograudeescolaridadedamãenãoapresentouqualquer relação com as variáveis utilizadas para avaliação da brincadeiraedalinguagemdobebêaos20meses.
Discussão
Opropósitomaiordesseestudofoiodediscutireavaliar aexistênciaderelaçãoentredesenvolvimentodabrincadei-raedalinguagememetapasiniciaisdodesenvolvimento. Partiu-sedeumavisãosistêmicadofuncionamentomental, dinamizadoporforçasprovenientesdeumprocessodere-descriçõesrepresentacionaisdefinidasnomodeloRR,emque
habilidadescomoasassociadasàbrincadeiraeàlinguagem seremetemaumabasecomumdecompetênciarepresenta-cional.Entende-sequeacriança,aoatuareinteragir,gera suasrepresentaçõesdomundoquevivencia,criandodesse modoumabasereferencialparaqueasnovasexperiências sejaminterpretadaserepresentadas.Considera-seaindao pressupostodeumainfluênciamaternafortenoprocessode desenvolvimentosociocognitivo.
Confirmandoestahipótese,osresultadosobtidos(vide
Tabela 1) indicam que a presença da mãe parece fazer diferençaparaacomplexidadedabrincadeiraapresentada pela criança. Neste sentido, são convergentes com o que mostramalgunsestudosqueavaliamaparticipaçãomaterna ematividadesconjuntasdebrincadeirae/ouasassociações
decaracterísticasdabrincadeiradacriançacomaspectosda suainteraçãocomamãe(Bornstein&cols.,1992;Bornstein &cols.,1996;Damast&cols.,1996;Slade,1987Venuti& cols.,1997;Vibbert&Bornstein,1989).
A presença da mãe parece ser fator de promoção de brincadeirasmaiselaboradasemaisduradouras.Queaspecto ou combinação de aspectos relativos a essa presença são especialmenteresponsáveisporesseresultado,nãosepode identificar,mascomoargumentamBornsteinecols.(1996), há evidências da importância das interações interpessoais paraabrincadeirasimbólica.Acrescentamainda,apossibi-lidadedesepensarqueamerapresençaouparticipaçãoda mãenasbrincadeirasconjuntaspromoveaelevaçãodograu decomplexidadedabrincadeiradacriança.
Provavelmente,maisdoqueasimplespresençaesim apresençadeumamãeatuante,que,dealgummodo,par-ticipadabrincadeira,pareceseroquefazdiferença.Seja criandoumaatmosferaemocionalpositivaacompanhada dasensaçãodesegurança(Slade,1987),sejamotivando acriançaainteragir,experimentar,criar,reproduzirmo-delos,ouefetivamentebrincandojunto,oenvolvimento damãepressupõeinvestimento.Aobrincarcomseufilho, a mãe, necessariamente, mobiliza uma parcela de seu tempo,energia,capacidadeintelectualedisponibilidade emocional.
Anaturezacomplexaesingulardasinteraçõesmãe-bebê parecesereafirmarcomoforteevidência.Assiméquenão sepodeapontarquaisquerdascaracterísticasmedidasrela-cionadasàmãecomopreditoradascaracterísticasavaliadas dabrincadeiradobebê.Salvoanecessidadedealgumajuste metodológico, que se deve sempre levar em conta, talvez issopossaserexplicadoemfunçãodaessênciamultifatorial dapresençamaterna.Nenhumadasvariáveisconsideradas, isoladamente, determina características da brincadeira da criança,mastalvezdeterminadascombinaçõesdevariáveis, emdeterminadoscontextosinteracionaispossamlevarauma correlaçãopositiva.
Umoutroaspecto,indicadopelosresultadosdesseestu-do,mostraqueacategoriadebrincadeirasmaiselaboradas, apresentadapelacriança,tendeaserelacionarcomademaior duração,tantonassessõesdebrincadeirasozinha,quantocom amãe.Umapossívelinterpretaçãoéadequeaconquistade habilidadeseexperiênciasquefavoreçamosurgimentode umabrincadeiramaiselaborada,suscitaanecessidadee/ou satisfaçãodacriançaemprolongarestetipodebrincadeira. Muitoemboraemtodasasidadesseobserveapresençade brincadeirasdediferentesgrausdecomplexidade,asdegrau maiselevado,maisrecentementeadquiridas,parecemdes-pertarmaiorinteresseou,dealgummodo,manteracriança pormaistempoenvolvida.
temseusentidoeinteressepróprios.Ademais,acriançanão demonstranecessitardoexercícioconstantedesuacapaci-dadedefazer-de-conta.Tãoimportanteparaaconstruçãode seusmodelosdemundo,nãosedeveteraexpectativadeque acriançaaempregueemtodososmomentosemqueestá brincando,amenosqueseesperequeelavivatodooseu tempodebrincadeiranummundoimaginário.
Noquedizrespeitoàbuscadealgumainterrelaçãoentrea brincadeiraealinguagem,osresultadosobtidosnesseestudo sealinhamaosquenãoencontramcorrelaçãosignificativa entreosdoisdomínioscognitivos.Certasconsiderações,con-tudo,devemserfeitasparanortearessadiscussãoepermitir que sejam extraídas algumas conclusões. Primeiramente, é importante entender-se que tanto a linguagem quanto a brincadeirasãoessencialmentemultidimensionais.Talmul-tidimensionalidadeimpõeumamudançadeparadigmasao seformularquestõesedefiniraorientaçãoteóricanoestudo dessesdomínios.
Umanovaordemdehipótesesquesinalizemparaasso-ciaçõesespecíficase,talvez,localizadasemdeterminados períodosdedesenvolvimentodeveserpensada.Comoargu-mentamTamis-LeMondaeBornstein(1994),anaturezade suasinterrelaçõeserelaçõescomoutrasfunçõesmentaisna criança,irádependerdamedidadelinguagemedebrincadei-rausada.Ouseja,associaçõesentrelinguagemebrincadeira parecemsermuitomaisespecíficasdoqueglobais.
Emsegundolugar,cadaestudoempírico,aotraçarsua metodologia,defineprocedimentos,técnicaseinstrumentos, impondo-se,obrigatoriamente,certoslimites.Assimsendo, escolhas e recortes da realidade são feitos em função de interessesepossibilidades.Nessecaso,aotomar-secomo domínioalinguagem,utilizou-seduasmedidasprovenien-tesdoinventárioMacArthur.Umadelasprocuravarefletir alinguagemdobebêemtermosdequantidadedepalavras produzidas,eoutra,darcontadesuadimensãosemântica (diversidadedecategoriasdaspalavrasproduzidas).Entre-tanto,emambososcasos,tratava-sedemedidasindiretaspor nãoseremlevantadasapartirdaobservaçãodacriança.Cabe aventarapossibilidadedealgumadistorçãoderesultadosem funçãodestacircunstância.
Adicionalmente,pode-seargumentarque,mesmoaolon-godosegundoano,quandoparecehavercertasincronianos avançosdobebêemlinguagemebrincadeira,nãosemantém umarelaçãofixaepermanenteentreessesdoisdomínios. ComoverificaramBornsteinecols.(1992),medidasdelin-guagemebrincadeiraserelacionarammoderadamenteaos 13meses,masnãoaos20meses.Contudo,sempreépossível levantar-seaquestãodanaturezadamedidautilizada.As escalasempregadasparaaferiçãodacapacidadedeprodução delinguagemdobebêaos20mesespodemtersevoltado maisespecificamenteparaaaferiçãodecomplexidadeda falaeextensãodevocabulário,enãotantoparaaspectosde estruturaesemântica,talvezmaisafinsaumaassociação comashabilidadesdabrincadeiranestaidade.
Namedidaemqueosresultadosaquiencontradossejam elucidativos,emalgumadimensão,dosaspectosestudados nosbebêsdomeiourbanodacidadedoRiodeJaneiro,ge-ramanecessidadedenovasinvestigaçõesqueosexpandam eaprofundem.Alémdeseexplorarsobnovosângulosede formasdiversasosprismasdabrincadeiraedalinguagem,
pareceenriquecedoradotar-seumaabordagemampliadano tratamentodaparticipaçãomaterna.Pressupõe-sequeuma melhorcaracterizaçãodasinteraçõesdamãecomacriança durantesessõesdebrincadeiraconjuntaajudaacompreender questõesligadasainfluênciasquevenhaaexercernodesen-volvimentodofilho.
Aqualidadedesuaatuaçãosereflete,porexemplo,no tipodelinguagemedecomportamentodirigidosaofilho,na freqüênciadeiniciativasdeumepisódiodebrincadeira,no investimentoembrincadeirasiniciadaspelobebêenacom-plexidadedebrincadeirasempreendidas.Obebê,partícipe ativodasatividades,revela,duranteassessões,muitodafor-macomoviveessasexperiênciasecomoreageàpresençada mãe.Cria-se,dessemodo,ummosaicodepossibilidadesque, combinadas,configuramosdiversosepisódiosdebrincadeira vivenciadosporambos.Aobservaçãoeanálisedessesepisó-diospermitemqueseapreenda,emcertamedida,anatureza das interações e do processo interativo.Acredita-se ainda que, possivelmente, contribuam para algumas inferências decaráterpreditivoquantoaodesenvolvimentodacriançae dasuarelaçãocomamãe.
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Recebidoem10.08.2004 Primeiradecisãoeditorialem03.11.2004 Versãofinalem12.11.2004